Capítulo 3

915 Palavras
A dor no rosto foi a primeira coisa que Elisa sentiu ao acordar. Não era só física — era um peso que esmagava o peito, queimava atrás dos olhos. Ela tentou se sentar, mas o inchaço do lado esquerdo da face latejava com tanta força que a obrigou a morder os lábios para não gritar. O quarto ainda estava escuro, e o silêncio da casa dava a sensação de que o mundo tinha parado. Elisa tateou o caminho até o banheiro. Quando se olhou no espelho, m*l se reconheceu. A bochecha estava roxa, os olhos inchados de tanto chorar e a alma... destruída. Ela encostou a testa no espelho frio, tentando conter a avalanche de emoções que ameaçava transbordar. Foi só então que fez o que sempre fazia quando não sabia o que fazer: chamou por Júlia. — Ju... — a voz saiu fraca. — Júlia... Foi o suficiente para a amiga aparecer no corredor, sonolenta, os pés arrastando no chão de madeira. Ao ver o estado de Elisa, seus olhos se arregalaram. — Elisa? Meu Deus, o que aconteceu com você? Elisa não conseguiu responder de imediato. Simplesmente caiu nos braços de Júlia, chorando como uma criança. Júlia a levou para o quarto e a ajudou a sentar na cama com cuidado. — Fui... o Jonas — disse Elisa, entre soluços. — Ele apareceu na boate ontem. Disse que queria levar o Gael... disse que eu não prestava... e... e me deu um soco. Júlia ficou em silêncio por alguns segundos. O choque misturado à raiva deixava seu rosto pálido. — Mas... eu não estava lá ontem. Tirei a noite de folga, achei que você estaria bem... — Eu sei, Ju... não é sua culpa. Só que... ele sabia onde eu trabalhava. E eu achei que ele fosse me tirar o Gael... Júlia apertou as mãos, contendo a raiva. — E ninguém fez nada? Ninguém te ajudou? Elisa hesitou por um instante, depois olhou nos olhos da amiga. — Teve alguém. Aquele homem... o que eu te falei uma vez, que me olhou no shopping como se me conhecesse. Júlia piscou, confusa. — O cara do terno escuro? Elisa assentiu. — Ele estava lá. E... ele é o nosso chefe, Júlia. O dono da boate. O nome dele é Dominic. Júlia arregalou os olhos. — O quê?! Espera aí... aquele homem estranho que te observava no shopping é o dono da boate? Ele é o Domic? — Dominic, sim. Eu não sabia até aquela noite em que ele me chamou no camarim. E ontem, ele apareceu do nada. Quando o Jonas me bateu, ele interveio. Expulsou o Jonas de lá, ficou do meu lado. Ele até me levou pra fora, cuidou de mim... Júlia se sentou devagar, absorvendo tudo. — E você confia nele? — Não sei — Elisa respondeu, sincera. — Ele é frio, Ju. Quase não fala, mas... quando me protegeu, foi diferente. Ele sabia o nome do Gael. Sabia mais sobre mim do que deveria. Isso me assusta. — Isso é muito estranho — disse Júlia. — Mas ele fez o que ninguém mais fez, né? — Sim. E é isso que me confunde. Ele poderia não ter feito nada. Mas... ele me olhou como se realmente se importasse. Júlia respirou fundo e pegou a mão de Elisa. — Tá. Vamos respirar. Primeiro, vamos cuidar desse rosto. Depois... a gente pensa no que fazer com esse Dominic. Mas você tem que tomar cuidado. Pode ser que ele só esteja interessado... ou pode ser algo maior. E se ele for perigoso? Elisa olhou para baixo. — Eu sei. Mas, naquele momento, ele foi o único que ficou do meu lado. Antes que pudessem continuar, passos pequenos vinham do corredor. Gael surgiu com os olhinhos ainda sonolentos, coçando a cabeça. Ao ver Elisa, parou de repente. — Mamãe... o que aconteceu com o seu rosto? Elisa tentou sorrir, mas a dor impediu. — Ah, meu amor... a mamãe caiu ontem. Foi um acidente, só isso. Tá tudo bem. — Tá doendo? — ele se aproximou, preocupado. — Um pouquinho só — ela mentiu. — Mas já estou melhor. Gael a abraçou com força, e ela segurou o choro. Não podia deixá-lo com medo. — Promete que vai tomar cuidado, mamãe? — Prometo, Gael. Sempre. Júlia levou Gael para a cozinha, deixando Elisa com alguns minutos de silêncio. Minutos depois, as duas se reencontraram na sala, enquanto o menino assistia desenhos no sofá. — Você não pode mais esconder essas coisas de mim, Eli — disse Júlia, num tom mais firme. — Estamos juntas nessa desde que o Gael nasceu. Eu preciso saber dessas coisas, pra poder te proteger também. — Eu sei — Elisa respondeu, com um sorriso fraco. — Ontem foi tão confuso... eu ainda estou tentando entender o que aconteceu. E o Dominic... ele me deixa nervosa. Ele olha como se enxergasse tudo que eu tento esconder. — Então a gente vai manter os olhos abertos. — Júlia se levantou. — Você precisa de tempo pra curar isso no rosto e na alma. Mas também precisa estar atenta. Homens assim... não aparecem por acaso. Elisa ficou em silêncio, olhando pela janela. A cidade ainda acordava, enquanto dentro dela tudo parecia um caos. O rosto doía, o coração doía mais ainda. Mas havia uma nova presença em sua vida agora. Uma sombra silenciosa chamada Dominic. E por mais que ela tentasse negar... parte dela queria saber por que ele estava tão perto.
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