CAPÍTULO 4

1497 Palavras
MAIA SOLIS   Faltando meia hora para a entrega e sem um sistema de transporte muito eficiente, ajeito meu vestido leve e colorido demais para a cidade, solto os cabelos tentando parecer decente, ajeito o arranjo e percorro o trajeto  na minha bicicleta. Eu mentiria se não soubesse que não me encaixo nessa selva de pedra na qual fica o centro comercial, mas, gosto da sensação de que posso colorir um pouquinho o dia. O prédio imenso se apresenta diante de mim e as pessoas me olham como se eu fosse invadir o local. Quem por ali passa ou está de uniforme de entregador ou vestido como um executivo. Vestido florido e bicicleta não se adequam. Muito menos com essa minha latinidade gritando em minha cara.  — Boa tarde. — Cumprimento a recepcionista. — Boa tarde. A área de serviço é por trás. — Na minha mente, eu pulei o balcão e mostrei o serviço. Mania dessa gente achar que imigrantes ou os seus descendentes são apenas serviçais. — Que gracinha você. — Ironizo. — Vim entregar essas flores para Damon Fox. — Você pode deixar aqui. — Ela diz com desdém. — A avó dele pediu que entregasse pessoalmente. — Afirmo inventando. Mas não serei despachada.  — A avó? — Ela pergunta arregalando os olhos e por pouco me assustando. — Um momento. — Mariana, dona Sophia mandou flores para o Dr. Fox. — Ela parece não entender o que a tal Mariana fala. — O que? Sua responsabilidade então, pois ele ainda está com o figurão. — Reclama,  desliga e logo me encara. — Pode subir. Seja discreta e use o último elevador. — Discreta. — Rio, tentando entender que hospício é esse. — Com licença. O elevador toca aquelas musiquinhas irritantes e quando chego na cobertura, encaro o corredor chique diante de mim. — Então, vamos aplaudir essa gente doida e preconceituosa. Entregar, sair e fugir dessa selva de pedra. Mas, se bem me lembro, a minha vida está uma confusão. Mas mesmo confusões devem ter limites bem determinados que as diferenciam do verdadeiro caos. E, nesse dia, definitivamente, descobri que quando eu tracei limites, Deus riu.  Meu primeiro passo para o corredor me leva diretamente a um impacto doloroso com um muro que olha para mim como se estivesse aliviado. Tipo, feliz por me ver. Eu, a florista metade americana, metade colombiana, talvez com algum resquícios de terra do meu jardim, um vaso de cacto-coração na mão e minha absoluta cara de espanto. É então que meu cérebro parece reconhecer a muralha. Damon Fox, que me apoia e me ajuda a equilibrar, salvando o arranjo de flores. Mas fico completamente atordoada quando seu braço musculoso atravessa minhas costas e sua mão aperta minha cintura e diz o maior absurdo que eu já ouvi. — Querida, achei que não viria. Senhor Hidalgo, essa é minha noiva. É o que? — Noiva? Senhor eu...— Ele me interrompe com um aperto leve em minha cintura e os olhos quase implorando para que eu não o desminta. — Mas... Não sei exatamente o momento em que tudo se tornou confusão e meu corpo uma massinha modelável. Pode ter sido quando aquela enormidade de homem se aproximou de mim ou quando minha pele teve ciência da quentura da sua mão sobre o tecido do vestido.  Mas se eu tinha dúvidas, elas caíram por terra quando o homem número um dos paparazzi colou sua boca na minha, como se fossemos um casal que há muito não se via e morria de saudades. Sinto meu rosto esquentar, enquanto sua boca começa a se afastar, deixando-me com o suave aroma de café que ele provavelmente acaba de beber.  Bem, se a finalidade era me deixar em silêncio, ele conseguiu, pois acho que desaprendi a falar nesse segundo. Os segundos em que nossos lábios se tocaram agora se repetem em looping. Céus! Há quanto tempo não beijava alguém! Mas por que raios esse homem acha que pode beijar alguém assim, do nada? Estou pronta para chamá-lo de doido, dar tapa na cara ou apenas fugir dali, mas o homem, que aparenta ter aproximadamente uns cinquenta anos, sorri com pouca vontade, como se duvidasse que a menina de vestido de flores fosse, de fato, noiva do homem. Bem, já me chamaram de serviçal e cheguei aqui aguentando ser destratada pela loira que encomendou as benditas flores que eu não trouxe. Se a vida me deu a chance de desmontar a cara de um esnobe, eu uso.   — Pois é, resolvi vir assim, de última hora. — Sorrio e o suposto noivo devolve em alívio.  — Que jovem mais adorável! Damon, você me surpreendeu. Fico feliz em saber que os jornalistas não sabem do que falam. Muito bom, muito bom. — O senhor me encara diretamente, ainda incrédulo, e reconheço o sotaque espanhol gritante. — Miguel Hidalgo. A senhorita é...? — Quem eu sou? — Minha mente derreteu. Encaro o homem que se diz meu noivo, totalmente sem ação. Ele arregala os olhos de novo desesperado e eu arrisco dizer que desmaiei no elevador e isso é um sonho. Ou pesadelo.  — Está cansada, meu amor? — Amor? Maia. Meu nome é Maia. — Digo olhando para ele, mas logo sorrindo ao senhor pouco simpático. Por que estou fazendo isso? Lembra da massinha de modelar? Então... — Desculpe-me meu espanto Maia, mas Damon conseguiu ser muito discreto sobre você. — Não tem ideia. — Eu afirmo, sem entender nada.  — Irá conosco para as Bahamas? — Bahamas? — Eu devo aparecer uma criança que apenas aprendeu a falar, pois não consigo coordenar nenhum pensamento e me agarro as insanidades que os homens diante de mim não param de falar.  — Não consegui falar com ela ainda, Miguel. Não se preocupe, que em breve nos reuniremos.  — Perfeito.  — O homem encara o arranjo em minhas mãos e me lembro do recado de dona Sophia. — Linda planta.  — Lindas não é? — Pronto, a pessoa ouve falar do tema que ama e esquece da loucura que está acontecendo. — Sua avó enviou senhor… amor! — Viro abruptamente para o homem que segue agarrado em minha cintura, quebrando o contato, quando ouso chamá-lo intimamente mesmo sem saber o motivo, mantendo o seu teatro. — Sua vó me pediu que te entregasse. — Digo, quase jogando o vaso em cima dele.  — Minha avó? — Isso. Dona Sophia falou algo sobre o escritório precisar de cor. — Eu realmente me sinto como se estivesse aprendendo a falar.  — Espero encontrá-los todos juntos essa semana, Damon. Senhorita, muito prazer em conhecê-la. — Sorrio com um riso congelado, encarando a incredulidade do homem.  Ele se dirige ao elevador, mas quando a porta se abre, a samambaia loira que encomendou a orquídea surge, olhando em choque as mãos do senhor Damon em mim. Se ela está em choque, ficaria passada com o que eu estou sentindo agora.  — Damon, querido. Recebeu as flores que mandei? Aliás, não foram essas que escolhi. — Ela encara o vaso, a mim e, por fim, o CEO.  — Flores? — Somente agora ele parece perceber o vaso em suas mãos e noto quando pressiona os lábios, pensando sobre a melhor desculpa para explicar receber flores da samambaia enquanto é noivo.  — Querido. — Digo irônica, mas decidida a salvar o homem até que ele explique o que está acontecendo. Faço isso apenas porque é o neto da senhora mais doce que já conheci. — Ela queria te agradecer pelo favor que você fez e lhe mandou flores. Mas sua avó também solicitou e acabei esquecendo o outro arranjo.  — Como? Que espécie de floricultura é essa que... — Ela diz de mau humor, sem nada entender. Bem vinda ao clube! — Lauren, que surpresa! — Um outro homem surge e me cumprimenta como se me conhecesse, tomando a loira pelo braço. — Venha, vamos tomar um café. — E eu preciso voltar aos negócios. Maia, me acompanha? — Todos na missão incrível de fechar a boca da loira e se livrar do velho.  — Mas...— Ela ainda tenta. — Nos vemos na casa dos meus avós, senhor. Ficarão felizes em recebê-lo.— Damon indica o elevador e o senhor se vai. Não tenho tempo de pensar, quando o meu suposto noivo parece fugir do d***o e me arrasta corredor adentro até uma porta imensa. Não consigo ver nada, pois ele corre como um velocista e, assim que estamos seguros, fecha a porta. Eu congelo no azul dos seus olhos e tenho a ligeira impressão de que ele sequer me vê. Parece que está em transe, sabe aquela torpeza após uma sensação de alívio avassaladora? Ele claramente vivencia uma, quando se encaminha para um pequeno mini bar daquela sala exageradamente grande, derrama um líquido marrom em um copo com gelo e bebe em uma única golada.  — Acho que é um bom momento para o senhor me explicar o que está acontecendo, não?
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