Capítulo 1 - Esperando

4902 Palavras
Não sabia a quanto tempo estava fazendo aquelas repetições, talvez 250, 275 vezes… escovar meus cabelos estava se tornando um hábito bem monótono. Pousei a escova na penteadeira e observei o resultado no espelho. Os cabelos estavam perfeitamente alinhados e descendo em longas ondas acobreadas até a cintura. Tia Rosalie dizia que em sua época como humana as moças não tinham tantos recursos para cuidar dos cabelos, todo o resultado dependia de quanto tempo elas dedicavam na frente do espelho. Rose também dizia que se existisse alguém com os cachos iguais aos meus em seu tempo como humana, ela certamente teria muita inveja. Ri desse comentário absurdo. Tia Rosalie era tão perfeita que era impossível acreditar em uma beleza como aquela. Jacob dizia que a beleza dela era tanta que o assustava, a chamava de loira psicótica e sempre fazia uma careta engraçada quando dizia seu nome. Eu ria ainda mais com isso. Reprimi um suspiro dentro de mim ao pensar em Jacob - sabia que meus pais estavam no outro cômodo atentos aos meus movimentos e preocupados que eu estivesse levemente depressiva. Mas a tristeza era inevitável quando eu pensava no meu melhor amigo e há quanto tempo não o via. Cada maldita hora tornando insuportável sua ausência. Por isso que eu evitava ao máximo não pensar nele, mas era mais fácil arrancar meu cérebro pelo ouvido e fazer uma batida com gelo e limão. O que mais me frustra a era que não tinha o que fazer, Jake não poderia ser meu babá para sempre. Ele tinha responsabilidades agora como líder de uma única matilha, desde que Sam se "aposentou" para se dedicar ao Mark e ao segundo filho que Emily carregava.  Foi muito maluco como tudo aconteceu. Numa manhã Jacob e eu conversávamos animadamente na varanda da casa principal dos Cullen, discutindo que o que Sam pretendia fazer era impossível - não dava pra simplesmente deixa de ser lobisomem - e no dia seguinte recebemos sua ligação dizendo que, no final das contas, isso de fato aconteceu. Sam se esforçou tanto para abandonar a forma de lobo que de uma hora para outra não conseguia mais se transformar. Jake disse que era necessário muito esforço e concentração para obter esse êxito e, claro, outro alfa de bobeira por aí. Então nosso tempo juntos foi reduzido consideravelmente para três visitas por semana, em raras vezes cinco. A maior parte do seu dia era dedicado a cuidar da grande matilha (agora com 15 lobos), patrulhar o perímetro, treinar os novos lobos, frequentar as reuniões do conselho e me ver. Nesses momentos, sempre que ele vinha até minha casa ou quando eu o visitava em La Push, estava sempre muito cansado, como se tivesse acabado de correr uma maratona, mas assim que me via sua expressão mudava e meu sorriso favorito preenchia seu rosto, seus olhos brilhavam como o mar sob a lua, levando embora toda a fadiga. Ali ele era novamente o meu Jacob, alegre e carinhoso.  Não muito tempo depois, outro acontecimento diminuiu ainda mais nosso tempo juntos. Jacob foi para a faculdade.  Na realidade ele foi totalmente contra a sua vontade. Tanto meus pais como Billy insistiram que ele precisava retomar seus estudos, abandonados pouco depois dele se tornar lobisomem, há muitos anos atrás. E olha, foi uma grande conquista! Aquele lobo teimoso relutava desde o meu nascimento contra essa ideia, dizendo que um alfa de um bando de lobisomens idiotas não precisava de um canudo da faculdade. Foram necessários todos esses anos de insistência, somado ao argumento de que meu crescimento já estava atingindo o ápice e que ele não precisava mais se preocupar em perder minha infância, para convecê-lo.  Claro que tive que ajudar com isso também. Dizia a ele constantemente que não era para parar sua vida por minha causa, que eu ficaria muito feliz sabendo que estava cuidando de si mesmo para variar. Foi o que bastou. Jake sempre agiu como se as minhas necessidades fossem prioridades em sua vida, e eu tinha necessidade de vê-lo estudando de verdade. Era injusto e me chateava vê-lo perdendo muito só pra ficar mais tempo comigo.  Nessa hora eu tive que concentrar todas as minhas forças para não demonstrar como essa decisão estava realmente me afetando, como um minuto a mais longe dele me doía até os ossos. Mas eu não seria egoísta quanto a isso, por mais que eu quisesse o meu melhor amigo comigo para sempre, nãoo era justo ele abrir mão do seu futuro só para atender aos meus caprichos. Não! Dessa vez ele tinha que fazer algo pra si mesmo, já fizera muito por sua matilha, por minha família e principalmente… por mim. Foi com essa motivação que tentei me preparar para quando Jacob fosse para a faculdade e nosso contato reduzisse para quase zero. Mas infelizmente essa minha não tão forte represa de controle emocional ruiu por completo no nosso último encontro. Estávamos dando bobeira na praia de La Push, meu lugar favorito no mundo, com o cheiro do sal do mar nos envolvendo. Era quase fim da tarde e já havíamos alcançado o fim da trilha de areias, onde um pouco mais a frente as ondas quebravam nas pedras altas e formavam espirros de água e espuma. Tínhamos evitado o assunto faculdade o máximo possível, sabendo que isso não era agradável para nenhum dos dois, mas era o último dia do verão e na manhã seguinte Jake estaria na Universidade de Washington, a 380km de distância. Então nossa conversa não conseguia mais se desviar desse assunto, por mais que eu tentássemos manter o tom brincalhão o tempo todo. – Sabe que os atletas passar por aqueles exames de sangue antes dos jogos, não é? Eles vão enlouquecer quando examinarem você - disse a ele em meio a nossa conversa, imaginando seus professores surtando com a temperatura elevada de seu corpo. - Você deveria ter escolhido um curso mais discreto. – E você acha que eu vou deixá-los me examinar? Mordo a mão deles antes disso — disse Jacob, mordendo o ar de brincadeira, mas logo em seguida sua expressão se tornou séria - Mas de verdade Nessie, o que você vai fazer enquanto eu estiver fora? Suas aulas na escola de Forks só começam daqui a algumas semanas. Fingi pensar por uns instantes. – Vou ficar na varanda suspirando e esperando meu lobo príncipe – falei brincando. Ultimamente nossas brincadeiras eram sempre assim, fingindo ser um casal. Isso se dava ao fato de que sempre estávamos abraçados um ao outro, e quem olhasse de fora imaginaria que fôssemos realmente dois apaixonados. Nós nos divertiamos com a idéia. Era muito bom ter uma amizade com esse nível de brincadeira. Jake então soltou nossas mãos entrelaçadas e me pegou pelos braços, rodopiando pela água da praia desajeitadamente, parecendo uma dança. Ri junto com ele até retomarmos o ritmo da nossa caminhada. – Mas eu prometo te ligar todos os dias nos intervalos das aulas. - continuou ele - A não ser que esteja acostumada com a minha ausência e nem se importe com isso mais. Ele me olhou pelo canto dos olhos, um sorriso brincando em seus lábios, mas não pude deixar de perceber que era um sorriso um tanto duro. – Nossa Jake, você me conhece tão bem, é exatamente isso que eu sinto - ironizei, colocando a mão no peito e fingindo falsa surpresa. Os olhos de Jacob se estreitaram ligeiramente. Ele sabia que eu utilizava o sarcasmo para esconder meus reais sentimentos, ultimamente eu estava fazendo muito isso. Mas ele me conhecia bem até demais e entendia que se eu quisesse compartilhar o que pensava, o faria, então não me pressionou mais. – Só me faça um favor. – disse depois de um tempo – Pelo amor de tudo que é sagrado, não vai arranjar na escola um amiguinho chicletinho e enjoado feito o infeliz do Mike Newton, como sua mãe. De cachorrinho babando por você já basta eu. Fiz uma careta e usei toda a minha força pra empurrar seu peito pra longe. O máximo que consegui foi fazê-lo dar dois passos para trás, rindo. Estava preparando um segundo empurrão quando o som alto do seu estômago roncando me distraiu. – Hum, acho que está vindo uma tempestade - fingi olhar para o céu procurando nuvens de chuva. – Engraçadinha - riu ele. – Ei, tive uma ideia! Leah e Seth vão jantar na casa de Charlie, Sue está preparando hambúrgueres. O que você acha de aparecermos lá de surpresa?  – Perfeito ruivinha. Uma corrida até o carro?  Ele não precisava pedir duas vezes, meu instinto de vampiro competitivo já preparava meu corpo para correr e eu sentia a adrenalina formigando nos meus pés. Me curvei, pronta para lançar meu corpo. – Só não vale trapacear - disse a ele em tom de desafio. – Rá! Olha só quem está falando - respondeu e se curvou para correr também. – No três. Um, dois…  E me lancei a correr na frente. Atrás pude ouvir um "Ei!" e abri um sorriso largo. Corri o máximo que a velocidade humana me permitia, espirrando água para todos os lados. Quem olhasse com curiosidade pensaria que eu fosse uma atleta olímpica.  Mas eu Jacob me alcançaria em instantes, graças a suas longas pernas e eu me preparei para saltar em suas costas assim que ele passasse por mim. Porém, ao invés disso, senti sua mão no meu calcanhar esquerdo, puxando-o para trás enquanto sua outra mão agarrava minha cintura, me impedindo de cair de cara na areia. Eu não ia deixar barato. Me joguei no chão, com ele ainda me segurando, e puxei os seus ombros junto comigo. Caímos com um baque s***o na areia molhada, gargalhando feito duas crianças. Foi só quando consegui me recuperar dos risos que percebi que Jacob me encarava seriamente. Olhei-o sem entender, procurando algum sentido no seu olhar. Então me dei conta do quanto os nossos rostos estavam próximos, como nunca antes estiveram. Eu podia sentir o calor irradiando de sua pele bronzeada e sua respiração acariciando meu rosto. Neste momento meu estranho coração começou a bater mais forte do que era possível e minha respiração se tornou mais intensa, não por causa da curta corrida, obviamente, aquilo fora tão fácil para mim quanto ficar sentada.  O corpo molhado de Jacob também estava colado ao meu e pude sentir uma onda de eletricidade me atingir desde os meus cabelos até a ponta dos meus pés, se intensificando ainda mais nos lugares onde ele me tocava, na minha cintura, atrás do meu pescoço… Então meus olhos por fim focalizaram seus lábios e fiquei completamente hipnotizada. Eram tão cheios e macios... como seria tocá-los? De repente um forte desejo de beijá-lo surgiu dentro de mim. Um desejo até então desconhecido. Eu queria saber se o beijo de Jake tinha o mesmo gosto rústico que seu cheiro me trazia, amadeirado e quente. Minha boca salivou em resposta, esperando uma atitude. Com muita força de vontade desviei meus olhos, corando de vergonha que talvez ele tivesse percebido que eu não parava de encarava sua boca. Todavia, quando foquei meu olhar em seus olhos, não consegui desviar mais. A escuridão do seu olhar era como um oceano n***o brilhando pela lua. Esses olhos conseguiam enxergar minha alma, disso eu tinha certeza. Mas agora estava diferente, de uma forma como eu nunca tinha visto antes, parecia que as águas daquele oceano eram quentes como um banho, como se o sol as tivesse esquentado durante todo o dia. Ele estava tão perto, seu cheiro maravilhoso era tão forte, que entorpecia todos os meus sentidos. Era só fazer um curto movimento, apenas me inclinar poucos sentimentos para colar os nossos rostos e finalmente descobrir qual seria o sabor dos seus lábios e qual sensação de senti-los pressionando os meus. Mas de repente Jacob começou a se afastar, enrijecido. Quis murmurar um "não" e puxá-lo pela gola de sua camisa ensopada, mas apenas um silvo escapou da minha boca e ele já estava de pé, me puxando delicadamente com ele. – Er… bom… é melhor irmos, não queremos ficar com as sobras do jantar – disse Jake com a voz entrecortada, mas percebi que o oceano quente de seus olhos ainda estava alí. – Certo – tentei melhorar o tom da minha voz, mas o que saiu foi apenas um sussurro. Enquanto seguíamos caminho de volta ao carro, minha mente continuou presa naquele pequeno momento perturbador. Eu tive alguma alucinação ou estava mesmo prestes a beijar Jacob Black? Jake, meu melhor amigo e meu protetor? Não poderia ser alucinação, meu corpo ainda estava estático pelas ondas elétricas. Minha cintura ainda queimava onde sua mão antes me tocava e automaticamente abracei meu corpo para manter aquele calor de alguma forma preso a mim, e também para que Jake não pegasse minha mão novamente e percebesse o tremor nervoso em meus dedos. Meus pensamentos agora funcionavam como se um véu tivesse caído diante dos meus olhos. Não conseguia ignorar o fato de que aquele homem enorme do meu lado, que eu conhecia tanto e que me conhecia ainda mais, estava com um brilho diferente, na verdade era como… como se ele fosse totalmente novo para mim, mas ainda o mesmo meu Jacob. Isso era perturbador, a coisa mais estranha que já passou pela minha cabeça obviamente. Bem, teoricamente o que aconteceu foi insignificante, nós já estivemos próximos milhões de vezes, na verdade ficávamos abraçados um ao outro o tempo todo. O que tinha acontecido de diferente agora para que eu ficasse tão abalada? Só porque senti um impulso violento de beijá-lo? Isso realmente foi uma novidade, essa ideia nunca tinha passado antes pela minha cabeça, mesmo quando fazíamos piada com o fato das pessoas acharem que éramos namorados, nunca passou disso, uma piada. Agora não era tão engraçado assim... Nunca consegui encontrar uma palavra boa o suficiente para definir o que Jacob representava na minha vida. Eu me contentava com os termos "amigo", "irmão" ou "protetor", e nos momento irônicos usava "babá" ou "cão de guarda". Mas sabia que tudo isso não passava de apenas rótulos, porque não existia uma palavra no dicionário que nos definisse com perfeição, até mesmo "namorado" era ridículo. Balancei a cabeça levemente para clarear meus pensamentos. Se Jake percebeu como eu estava ausente, preferiu não comentar nada enquanto andávamos lado a lado. Na verdade pude perceber pela minha visão periférica que ele carregava uma expressão vaga, também perdido em pensamentos. Era claro que ele não havia sentido a mesma erupção de emoções que eu senti, caso contrário não teria levantado tão depressa, certo? Mas eu ouvi claramente seu coração acelerado e a respiração pesada, tão claro como estava ouvindo agora. Reprimi essa ideia com urgência. O que eu estava pensando? Só podia ter outra razão que não fosse essa. Eu estava ficando maluca. Jacob era amigo da família a anos e muito antes quase namorado da minha mãe. Ele foi uma das pontas do antigo triângulo amoroso entre meus pais, antes deles se casarem, antes de eu sequer nascer. No passado travou brigas com meu pai inúmeras vezes, pelo amor de minha mãe. Tudo bem que agora era óbvio que ele não nutria mais nada daquilo e tinha esquecido para sempre todos aqueles tempos, como se tivessem sido vividos por outra pessoa, restando apenas uma linda e verdadeira amizade com Bella. Mas ainda sim, pelo amor de Deus, Jacob me viu de fraldas e me deu mamadeira de sangue! Não era para eu ter essas idéias distorcidas de nós dois, só porque agora eu havia atingido a adolescência e meus hormônios fervilhavam dentro de mim. Reprimi esses pensamentos ainda mais e prestei atenção no caminho de volta a Forks. Em todo o percurso não trocamos uma palavra. Na casa de Charlie meu avô ficou, como sempre, contente com a minha visita. Sue preparou mais hambúrguer que o necessário e nos divertimos até anoitecer com Leah e Seth. Ao final do dia, Jacob me deixou no chalé e me deu seu abraço de urso tradicional, depositando um beijo no meu rosto e correndo de volta para a floresta. Não consegui desgrudar os olhos das suas costas e admirar como sua pele acobreada brilhava a luz da lua, como aquela camisa se colava nos músculos dos seus ombros, braços, costas… Duas batidas baixas na porta do meu quarto me sobressaltaram, acordando totalmente o transe das minhas lembranças. Olhei para trás e meu pai estava encostando na soleira, me olhando com a testa franzida. Baixei a cabeça e tentei esconder a vermelhidão das bochechas com os cabelos. – Não se preocupe querida, eu não ouvi nada. Ou pelo menos, tentei não ouvir – disse Edward com sua voz melodiosa – Só vim te avisar que Esme está te chamando na casa principal. Parece que tem uma surpresa pra você Seu olhar passou a ser mais divertido conforme voltava a encostar a porta do quarto. Me olhei novamente no espelho e decidi passar um pouco de maquiagem no rosto, uma coisa que raramente fazia, mas o rubor vermelho nas bochechas não tinha desaparecido e com uma família curiosa como a minha esse simples fato só levantaria perguntas, ou pior, piadas. Finalmente sai do quarto e encontrei meus pais relaxados no sofá, lendo alguma coisa. – Dormiu bem meu amor? Já preparei seu café da manhã. Você gosta de panquecas, não é? – disse minha mãe levantando seus olhos do grosso volume de romance grego. Ela estava se dedicando a aprender outras línguas, seu novo passatempo.  Fui até o sofá e me sentei em seu colo duro e macio. Toquei seu rosto com meus dedos e lhe mostrei meus sonhos não tão tranquilos daquela madrugada e aproveitando para agradecer pelo café.  A maior parte dos meus sonhos sempre envolvia Jacob, ou melhor, a ausência dele. Eram sonhos inquietos em que eu ficava o tempo todo esperando, ansiosa, sem saber se ele apareceria ou não. Ouvi meu pai trincar os dentes. – Se aquele cachorro não te ligar hoje, eu mesmo o trago pela coleira – grunhiu ao ouvir os pensamentos que transmitia a mamãe. – Oh Nessie, Jake está sem tempo até para respirar, com toda a responsabilidade de alfa e da faculdade. Não está sendo fácil pra ele ficar sem te ver, tenho certeza absoluta. Não fique sofrendo por isso. Quando ele arruma um tempinho a primeira coisa que faz é te ligar, você sabe. Mostrei para ela que entendia totalmente e estava feliz que ele estivesse na faculdade e que tinha uma função tão importante na matilha. Mas pelo jeito a minha felicidade não pareceu tão convincente, pois Bella fez um bico antes de continuar. – Tenho certeza que ele vai te ligar mais tarde, é só esperar. Isso era fácil, o que eu fazia com maestria ultimamente era esperar e esperar. – Tudo bem, não se preocupem comigo. Vou tomar meu café e correr para a casa da vó Esme, já estou curiosa – disse ao me levantar e ir até a cozinha, com pulinhos levemente exagerados. Meus pais não precisavam me acompanhar na melancolia.  O cheiro das panquecas estava ótimo, mas a comida humana não era tão apetitosa quanto sangue e dificilmente o gosto era bom. Eu tinha aberto mão da dieta de sangue a quase três anos, desde que descobri que Jacob adorava as horas da refeição comigo. Parando para refletir, parecia que todas as minhas atitudes rondavam em torno dele… isso me desorientou por um momento. Meu pais e vô Carlisle diziam que eu não tinha necessidade de fazer isso, que a dieta "vegetariana" dos Cullen era o suficiente. Mas eu não precisava de sangue, desde que me alimentasse bem de comida. Na verdade, eu precisava comer mais que a média dos humanos para me sentir tão saciada e forte como depois de uma caçada. Era muito divertido quando e Jake eu competimos para ver quem comia mais… Argh, novamente meus pensamentos me traindo, se não parasse agora voltaria para as lembranças que evitava a todo o custo. Terminei as oito panquecas com rapidez e voltei para a sala, depositei um beijo no rosto de meus pais e sai de casa. – Vamos logo em seguida para acompanhar a medição, querida - murmurou minha mãe quando passei por ela.  Antes mesmo que a porta voltasse a se fechar eu já estava quase chegando a casa grande dos Cullen. Já podia ouvir o barulho de um jogo de baseball na TV, uma caneta riscando papel no segundo andar e uma tesoura cortando plantas nos fundos da casa. Passei pelas grandes portas principais e encontrei tio Emmett e tia Roseli no sofá. Ele deitado com a cabeça em seu colo enquanto ela afagava seus cabelos. Nós últimos anos, minha família tentava ao máximo se comportar como humanos quando eu estava por perto, talvez seja porque eu não conseguia me manter tão imóvel feito estátua como eles, meu corpo logo ficava inquieto. Com o tempo eles acabaram se acostumando tanto em parecer relaxados, que não notaram que se tornou um hábito. – Olha ela aí! Já não basta comer igual aquele lobo, tem que dormir por 30 horas feito ele também? - disse tio Emmett e explodiu em uma gargalhada. - Essa é a semi vampira menos vampira que eu conheço. – Por isso o "semi". E eu também não sou a única híbrida que você conhece - falei, tentando demonstrar um tom sério. – Ah, é verdade! Tem aquele garoto brasileiro. Qual é o nome dele mesmo? Natan… – Nahuel - o corrigi. – Esse aí. Hum… isso tem a ver com a surpresa da Esme e… - tia Roseli lhe lançou um olhar gélido, que fez tio Emmett calar a boca na hora. – O que? - indaguei. – Seu tio tem uma boca grande demais, querida. Esme está te esperando no jardim. Como não tinha sentido tentar arrancar alguma informação deles, me apressei e cruzar a grande casa branca até os fundos do jardim, não sem antes depositar um beijo no rosto de tia Roseli e chutar os pés enormes de Emmett no caminho. Ouvi sua risada ao fundo, mas já tinha passado pelas portas de vidro branco que davam acesso ao novo anexo da casa, um jardim europeu enorme, o qual vó Esme dedicava o seu tempo e paixão no novo rob: jardinagem. A encontrei próximo de uma alta roseira, replantando mudas. – Bom dia minha querida, tudo bem? Dormiu bem? – disse Esme sacudindo a terra de sua calça jeans e guardando as luvas de jardinagem no avental. – Dormi. Ainda não terminou a replantagem? – perguntei, com curiosidade. Achava incrível o trabalho que ela estava fazendo, mas não era algo que despertasse meu interesse em particular. – Quase acabando. O clima de Forks não é nem um pouco favorável para esse tipo de planta, muito frio e chuvoso. Estou pensando seriamente em fechar todo o jardim e transformá-lo em uma estufa – ela não conseguiu disfarçar a empolgação na voz. O que Esme era capaz de fazer em uma estrutura com suas mãos talentosas era quase magia, meu chalé que diga-se de passagem. – Vamos até meu quarto, tenho uma surpresa pra você. Subimos para terceiro andar e cruzamos todo o corredor largo até o último cômodo ao norte. O quarto de Carlisle e Esme era o maior de todos, com uma das paredes totalmente de vidro com vista para a floresta. Todo o restante do quarto era da arquitetura clara, tradicional dos Cullen. – Seu aniversário foi na semana passada e ficamos te devendo o seu presente – disse ela com um tom de desculpas – Não tínhamos te entregado antes porque pensamos que iria atrapalhar seus estudos, mas seus pais iriam de qualquer forma e pensamos que você não queria ficar de fora. Ela se dirigiu até a grande escrivaninha branca e abriu a primeira gaveta, retirando um envelope pardo e entregando a mim. Abri com curiosidade e encontrei duas passagens de avião primeira classe para a Amazônia, no Brasil, dali a uma semana. Desde a vinda de Nahuel com o conflito dos Volturi, ficamos de voltar ao Brasil para pesquisar mais sobre minha espécie. Como meu crescimento estava desacelerando gradativamente, passamos a ficar menos preocupados com isso, mas não sabíamos em que momento eu deixaria de crescer. Carlisle estimava apenas mais um ano, mas minha idade já tinha ultrapassado os anos de crescimento de Nahuel e ainda assim não havia parado. Atualmente tinha atingindo oito anos de idade num corpo de uma garota de dezoito, o que era muito, considerando que minha família estimava que meu crescimento seria interrompido aos meus quatro anos de vida. Abracei minha avó com carinho e lhe agradeci pelo presente, realmente feliz e empolgada com a futura viagem. – Vai ser legal, vou pode rever Zafrina. Mas espera aí… essa segunda passagem é para quem? – perguntei, quando a soltei de meu abraço. – Para Jacob. Provavelmente ele vai querer participar dessa pesquisa. Seus pais vão também, lógico, eles já estão fazendo todos os preparativos. Meu coração acelerou algumas batidas ao ouvir o nome de Jake… e nos imaginar viajando juntos. Tudo bem que meus pais iriam, mas finalmente teríamos algum tempo para nós. Esme fingiu não perceber meus batimentos, com educação, mas de repente minhas esperanças começaram a murchar. – Jake não poderá ir - disse, tentando disfarçar a tristeza em minha voz – ele começou as aulas agora. – Nada que seu pai não possa resolver com a secretaria da faculdade, Nessie – respondeu simplesmente com um dar de ombros. – Sim sim, é verdade – me empolguei novamente. – Vou voltar para o chalé e conversar com meus pais. – Só um instante Renesmee – ouvi a voz de Carlisle vindo do escritório – hoje é dia de medição. Já estava me esquecendo, com tantas coisas passando pela minha mente.  Quando criança e meu crescimento estava uma loucura, Carlisle registrava meu desenvolvimento quatro vezes ao dia. Quando atingi três anos de idade, passou a ser apenas uma vez, pois as mudanças tinham desacelerado consideravelmente. Agora nos últimos meses, fazíamos as medições a cada três dias, pois pouco alterava, mas ainda sim não tinha estabilizado. Fui direto para o escritório de Carlisle com Esme me acompanhando. Normalmente para esses momentos eu tinha uma pequena platéia, então já podia ouvir os passos de Rosalie e Emmett ao subir as escadas e de meus pais cruzando a porta de entrada. Alice e Jasper ainda estavam em seu quarto, talvez ocupados com alguma outra coisa. Depositei um beijo no rosto de Carlisle e ele começou seu trabalho. Primeiro me pesando na balança e depois passando sua fita métrica com muita rapidez e agilidade pela minha altura e por toda a circunferência do meu corpo, tomando notas mentais. Ao final guardou a fita e contornou sua mesa de trabalho para escrever as medidas no caderno. Não que qualquer um de nós precisasse de algo desse tipo para lembrar do meu desenvolvimento, mas Carlisle gostava de manter o registro histórico por motivo de pesquisa. – Muito bem querida – começou ele – você cresceu apenas meio milímetro nas últimas três semanas. Suspirei aliviada, já era incômodo o bastante, atualmente, eu ser cinco centímetros mais alta que minha mãe, estava com receio que meu surto de crescimento fizesse ultrapassar tia Rosalie, mas eu ainda era dois centímetros mais baixa que ela. – O mesmo não posso dizer da sua circunferência – continuou Carlisle, me avaliando clinicamente e franzindo a testa. Automaticamente olhei para meu corpo, de repente me sentindo imensa. Será que era toda aquela comida humana? Não devia ter apostado com Jacob quem comia mais pedaços de pizza em menos tempo. Pior de tudo, eu tinha ganhado. Tentei suprimir o princípio de um desespero, já estava nervosa o suficiente para o início do ano letivo na escola, esses kilos a mais iria alimentar minha neurose. Eu sabia que vampiro frequentar academia era uma piada, mas será que teria alguma utilidade para mim? Certamente teria que ser longe de olhos humanos, a não ser que eu quisesse que eles pensassem que eu usava drogas. _ Renesmee, não é nada disso – interrompeu meu pai aos meus pensamentos. - Você não está nenhum pouco gorda. – Não querida - se apressou a dizer Carlisle – eu já ia comentar sobre seu peso, que mudou tanto quanto sua altura. Aliás, está totalmente relacionado a altura e não a massa corpórea. – Então por que...? - comecei a dizer, mas tia Rosalie já estava ao meu lado em meio segundo, abraçando meu ombros. – Você está ganhando curvas meu amor, está se tornando uma linda mulher. Só tia Rosalie para entender esse tipo de neurose e saber exatamente o que estava acontecendo. – Ah - foi tudo que consegui dizer, antes de sentir minhas bochechas esquentarem. Isso era bem constrangedor, principalmente na frente de todos, mas com minha família não tinha muito o que fazer no quesito i********e. O pior era que esse tipo de constrangimento estava se tornando mais frequente do que eu gostaria. Já não bastava um pai para ler todos os pensamentos adolescentes da filha, ainda tinha que lidar com uma família inteira com audição extraordinária que ouvia todos os sobressaltos do meu coração quando Jacob ligava, ou até mesmo a própria menção do seu nome.
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