Jardim de Chegadas

2463 Palavras
Mais tarde, em meados da tarde, a matriarca reunira seus filhos como uma mãe pata recolhe seus filhotinhos, enfileirados por ordem de idade, indo do mais velho ao mais novo, em uma caminhada rumo ao castelo. Para todos, um chá, para Changkyun, a morte seria servida em uma bandeja de prata. “Não me envergonhem” ela disse, sem se dar ao luxo de se perguntar se não seria ela a responsável pela vergonha dos filhos, sempre demonstrando publicamente o afeto diferente entre eles, gritando aos quatro ventos que sequer era capaz de amar seus filhos de forma igualitária. Nada bonito de se ver, mas naquela sociedade movida por bons casamentos, quem a julgaria errada? Diante da imensa porta do palácio, a família por acompanhada por servos e também dois guardas, sendo guiados até o jardim, onde o príncipe os aguardava ansioso, segundo fontes. A essa hora as mãos do mais novo estavam frias como neve, e tão escorregadias quanto as pedras do rio, além daquela gota de suor que teimava em ficar em sua testa, berrando seu pânico interno. — Tem certeza de que está se sentindo bem? — Kihyun o perguntara mais uma vez, sempre que os dois trocaram olhares, a indagação se repetia, e Changkyun sempre afirmava com a cabeça. Se abrisse a boca certamente gritaria “Não, ele vai me matar!”. Os portões pesados já estavam fechados, mesmo se decidisse fugir naquele exato momento, já era tarde demais. Deveria ter feito antes, mesmo que não houvesse chance, qualquer segundinho de vida já seria uma grande vitória. Onde estava com a cabeça quando aceitou ir junto? Era melhor ter se recusado, surrado por sua mãe e forjado sua própria morte. — É uma honra ter vocês em meu jardim! — a voz sedosa do príncipe escorreu junto ao vento, chegando até os ouvidos do ômega — Acomodem-se! Cínico! Ele os tratava como se tudo aquilo não passasse de uma armação de sua mente sádica. O ambiente tão bem planejado, a mesa de pernas curtas tão bem arrumada e bem servida, as almofadas macias, sempre ostentando as cores favoritas do loiro, o vermelho sempre em destaque. Os quatro ômegas se acomodaram, da forma como a mais velha havia ditado antes de saírem de casa, deixando que Minhyuk ocupasse o lugar mais próximo ao príncipe. Changkyun fizera questão de se afastar o máximo que podia, não arriscando sequer ficar olhando muito para o loiro. Aqueles olhos finos lhe davam arrepios estranhos. — Sirvam-se! Mandei que preparassem os melhores chás que temos em nossa casa. — a educação transbordante não combinava com a personalidade real do príncipe herdeiro, isso o Im mais novo tinha plena certeza. Cínico! O príncipe herdeiro era um cínico! A família passou a apreciar os chás como havia sido dito, sendo que a matriarca não parava de elogiar os mesmos, sempre arrancando um sorriso agradecido do alfa, que ao ver de Changkyun eram todos falsos. Ele só estava esperando o momento certo para arrancar a espada da cintura e decepar sua cabeça bem ali. E diante disso, o mais novo se mantinha um pouco mais abaixado. — Me fale um pouco mais. — ele dissera. A mulher continuava seu discurso em relação aos filhos, sempre citando o nome de Minhyuk mais que os outros. Francamente, ela nem disfarçava, enquanto o mais velho, insinuava-se como o de costume, fazendo uso de façanhas que sequer eram suas, dando a ele dons que nem tinha. Poupe-me, ele nem era tão prendado assim, e em alguns momentos, se notava que o mesmo até se constrangia com algumas coisas que sua mãe dizia. — E quanto ao mais novo? — em algum momento, os olhos do príncipe se voltaram para ele, o encarando de uma forma diferente em relação ao jeito que olhava os outros. Mas o ômega não baixou a cabeça, ao se ouvir citado o encarou na mesma intensidade. Cabeça erguida, morra com orgulho e não implore por sua vida, ele mesmo se disse. E iria adiantar implorar? — Ah, Changkyun é... — um sorriso falso se formava nos lábios da matriarca, após encarar rispidamente o filho — Um rapaz maravilhoso, claro, possui uma personalidade excêntrica, mas certamente- — Eu já me decidi! — o príncipe a interrompera, de uma forma que havia deixado a mulher um tanto aliviada, pois ela não conseguia mais pensar em adjetivos que fossem positivos em relação ao filho mais novo. Ambos os ômegas ficaram em silêncio, encarando o alfa com certa aflição. A mulher, em plena certeza de que o príncipe havia ficado encantado com seu filho mais velho, já expunha um sorriso enorme, imaginando que milhões de privilégios sua família receberia ao se unirem com a família real. Nobres, eles seriam nobres, aliás, bem mais do que isso, ela seria a sogra do futuro rei de Daegu. — Obviamente que meu convite se seguia de uma segunda intenção. — confessou o príncipe — Como muitos sabem, alcancei uma idade que se torna essencial que eu me case. Nesse momento, o sorriso da mesma triplicara, e uma certa esperança se formou em Changkyun, o príncipe não seria capaz de mandar matar o irmão de seu futuro noivo no mesmo dia em que noivaram, seria? Não, isso já seria ultrapassar o limite da crueldade humanada, e de certa forma o príncipe era um humano. Um alfa, mas humano. — E se a senhora me der a sua permissão, eu gostaria de pedir a mão de um de seus filhos. Fingindo-se de surpresa, a mais velha repousara a mão sobre o peito, se enchendo de lisonjeia. Por fora, um sorriso de satisfação, e por dentro centenas de planos. — Jamais poderia negar o desejo de vossa majestade. — ela disse. — Sendo assim. — parecendo satisfeito, o príncipe depositou a xicara novamente sobre o pires, estendendo a mão na direção do ômega ao qual o pedido se dirigia, enquanto todos observavam aquele movimento e discreto, os olhos passavam a transbordar o susto e a surpresa — Tenho certeza que será feliz ao meu lado, Changkyun. O ômega mais novo alargara seus olhos, soltando um “Mas o que...” em um sussurro breve e surpreso. As palavras do príncipe pareciam desconexas em sua mente, como se estivessem sendo balbuciadas ao invés de ditas, e a mão estendida no ar lhe parecia monstruosa demais, sequer era humana aos seus olhos. O ômega menor m*l respirava, ficando totalmente confuso por dentro, onde duas partes de si discutiam. Seu lobo, feliz ao pedido de um alfa, e sua raiva pelo príncipe, dizendo para ficar quieto e sossegar o facho. Vendo que Changkyun não reagiria, e com medo do irmão ser repreendido devido a isso, Kihyun pegara a mão do mesmo, a puxando na direção da mão do príncipe, até que ele a segurasse. E somente nesse momento que o mais novo conseguiu acordar um transe imediato que foi acometido. — Mas eu não... — ainda formulando sua frase, Changkyun tentava dizer que não havia entendido nada, e que nem sequer estava de acordo com aquilo tudo. Era a mesma guilhotina, só que por motivos diferentes. — Será uma honra para a nossa família, que o príncipe se case com nosso amado Changkyun! — a matriarca o interrompeu, antes que o mais novo abrisse a boca para estragar tudo. Não, não podia deixar a teimosia de Changkyun estragar a única chance que estava tendo de ganhar um título na nobreza. Ele não tinha esse direito. — Eu agradeço a sua confiança. — o loiro sorriu brevemente, soltando a mão do ômega. Ergue-se da pequena mesa, tendo seu gesto imitado pelos demais — Agradeço a todos por terem estado comigo nesta tarde tão agradável, mas se me permitem, ainda tenho muitos afazeres para este dia. Todos se curvaram e se puseram a sair, menos Changkyun, que ainda paralisado, encarava fortemente o príncipe, pronto para usar de sua língua afiada. Uma das mãos de Kihyun o segurava pelo pulso, o irmão o encarava como quem implorava que ele ficasse quieto. E de certa forma o do meio sabia que qualquer coisa que Changkyun fizesse, os respingos de sua atitude cairiam em toda a família. Sendo puxado para fora, o ômega mais novo não parava de pensar no que havia acabado de acontecer, o príncipe não havia mandando o matar, muito pelo contrário, anunciara noivado à sua família, e em sua cabeça aquilo não fazia sentido nenhum. Só podia ser alguma brincadeirinha de m*l gosto, era a única explicação plausível. — Ah! — o loiro aparentou ter se recordado de algo, fazendo a família parar no meio de seu caminho — Meus servos o acompanharam, para que Changkyun faça suas malas, hoje mesmo quero que se mude para o castelo. Por uma questão de... segurança, prefiro que fique aqui até que nos casemos. Changkyun teve seu pulso agarrado com força por Kihyun, que o encarou como quem implorava para que ele não disse nada. E mesmo com a zanga subindo pela garganta, o mais novo não disse nada. Carruagens foram disponibilizadas para os levarem até a residência da família Im. E o tempo todo o então noivo do príncipe, sequer abriu a boca. A mãe o encarava o tempo todo, ainda calada e pensativa, como se formulasse um plano para resolver o que julgava ser um engano infeliz do príncipe. Para ela, algo estava fora do lugar, como se o mundo houvesse virado de cabeça para baixo. Os servos os esperaram do lado de fora da casa, enquanto a família entrava para preparar tudo para a partida do mais novo, e foi no fechar daquelas portas, que as coisas, até então estranhas, passaram a se tornar ainda mais confusas para o jovem ômega. A mãe se resumira em uma única frase: — Não estrague tudo. E parecendo abalada, ela se retirou para os seus aposentos, deixando os três irmãos sozinhos na sala. Kihyun foi o primeiro a despertar daquele transe mutuo, puxando o mais novo pelo pulso até o quarto, tentando aparentar animação com aquilo. — Precisamos aprontar suas malas! — ele disse, com um sorriso no rosto. Changkyun não estava animado com aquilo, na verdade, ao contrário disso. Aquele pedido parecia estranho, não condizia nada com o que imaginava, além de que de todas as formas, ele não queria se casar. Não, agora, não com alguém como o príncipe. Changkyun não gostava muito de alfas, em sua visão, se casaria com um beta, que fosse doce e agradável com ele. E não com alguém como... como o príncipe, que carregava aquele ar de superior, um jeito mandão que deixava o ômega completamente incomodado. — Não precisa colocar muita coisa. — eram Kihyun que arrumava tudo, enquanto o caçula apenas olhava, calado — Certamente o príncipe comprará muitas roupas novas para você, e claro, muitas joias, além de... — o do meio não parava de tagarelar, e o mais novo sabia que ele estava fazendo aquilo para anima-lo. Do outro lado do quarto, Minhyuk estava calado, apenas os observando com uma expressão nada feliz no rosto, beirando a raiva, sentado em sua cama como se a mesma lhe servisse como um Forte de proteção. Minhyuk nunca fora muito próximo a eles, e pelo visto as coisas não mudariam nunca. Kihyun fechou a mala do mais novo, parecendo satisfeito. — Pronto, Chang, vamos, os servos estão te esperando! Kihyun passara pela porta levando sua mala, o mais novo o acompanhou, mas acabou dando meia volta e indo até seu irmão mais velho. Estava receoso, mas mesmo assim lhe abriu um sorriso pequeno e fez menção de o abraçar, abraço este que foi recusado pelo outro. — Não pense que esse é o fim, Changkyun. — rispidamente, em um tom que era costumeiramente mais usado pela mãe da casa, o mais velho o encarou, a expressão dura era estranha de ser vista nele — Quando o príncipe enxergar o erro que cometeu, virá correndo para os meus braços. O mais novo abriu a boca duas vezes, havia ficado surpreso. Mas já era de se esperar. — Se assim o dizes. — se limitou a isto, deixando Minhyuk para trás. Saiu pela porta do quarto, e talvez naquele segundo, só naquele segundinho, devesse ficar satisfeito com seu noivado, pois aquilo era bem mais do que qualquer um poderia esperar de si. É, era de causar inveja em qualquer um, e justo ele, alguém por quem ninguém dava nada. Kihyun o abraçou calorosamente antes do irmão caçula entrar na carruagem, o único abraço de despedida que havia recebido. Aquilo deveria ser considerado algo deveras triste, e talvez humilhante, seus demais parentes pareciam inconformados demais para sequer lhe dar um adeus decente. Changkyun foi levado para o palácio, e durante todo o caminho, dentro daquela carruagem tão bonita, que com certeza valia bem mais que sua própria casa, o ômega não parava de pensar, e ao mesmo se desesperar com aquilo. Ainda não conseguia enxergar como algo sério, como se o príncipe estivesse apenas brincando consigo, querendo deixa-lo em um estado de felicidade, para depois rir dele como forma de vingança. Vindo de alguém da família real, o ômega conseguia esperar de tudo. Ao descerem, um dos servos fora designado para o acompanhar até o quarto onde ficaria. O mesmo ia carregando sua mala, enquanto o ômega apenas admirava tudo, as paredes em tons dourados e os imensos com pessoas em poses estranhas, além daquele corredor lotado de estátuas, as quais ele mesmo havia se repreendido a não toca-las, pois por se conhecer muito bem, o rapaz sabia ser capaz de quebra-las por um simples toque. Haviam mais quadros estranhos, a maioria com pessoas nuas sendo retratadas em poses sensuais. “eu disse que ele era um pervertido sem limites” pensou consigo mesmo. E no fim do corredor, uma imensa porta foi aberta pelo servo que o acompanhava, mostrando a ele o imenso quarto, este em tons claros por toda parte, bem diferente do restante do castelo, além dos quadros retratarem flores e paisagens ao invés de pessoas. Estava encantado, isso ele não podia negar a si mesmo e nem a ninguém. Encantado com a paisagem da janela, que dava para os fundos do jardim, o ômega foi se deixando ir até ela, ficando ali a olhar o céu vermelho do fim de tarde, e o jardim roxo de alfazemas abaixo de sua janela. E tão envolto naquela visão, inundado pelo cheiro viciante e relaxante das flores, que eram sopradas pelo vento calmo da tarde, o ômega acabou por se surpreender ao sentir dois braços rodearem sua cintura pelas costas, e algo frio tocando seu pescoço e deslizando por ele. — Seja bem-vindo. — a voz tão sedosa lhe arrepiou os pelos da nuca — Meu ômega.  
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