Malfeitor Narrando
A cela tá com aquele cheiro escroto de ferro e suor que gruda na pele, tá ligado? O tipo de fedor que nem banho resolve. Levantei o olhar e fiz um sinal pros cria na grade — só um gesto e eles já entenderam o papo: vigia ligado, atenção redobrada. Aqui dentro é assim, um vacilo e tu vai pro saco.
Puxei o banco e sentei do meu jeito, pesado, como quem manda nessa p***a toda. A posição é de quem sabe que o mundo gira só quando eu deixo. O celular começou a vibrar na minha mão — proibido, claro, mas aqui dentro quem tem poder cria as regras, e o dinheiro sempre abre exceção.
Fiquei olhando pra tela piscando, pensando se atendia ou deixava pra lá. Mas na pørra desse silêncio, até o zumbido do ventilador tá me irritando.
— Solta os olhos nos guardas, mano. — ordenei, na moral, em voz baixa e grossa.
Os dois mais novos fungaram, concordaram e já tão colados na grade, fingindo papo, mas tô ligado, que tão olhando cada passo dos agentes. Respirei fundo e atendi. Encostando o celular no ouvido, o jeito era seco, frio de patrão que não pede licença.
Ligação On
— Fala aí, Cuscuz. Como é que tá o morro? — perguntei com a voz pesada como chumbo.
Do outro lado, Cuscuz deu aquela risada de sempre, meio b***a, meio tenso.
— Tá tudo na moral, chefe. Ninguém fazendo cagada. Tamo controlando a área, ninguém mexe com a gente. — Ele deu o papo como sempre me passando a visão de como tu o corre lá fora.
— E o que tu manda dessa vez? — cortei, direto.
Cuscuz soltou um riso alto, debochado.
— Mano, arrumei uma mina pra te fazer uma visita.
Franzi o cenho na hora.
— Eu não quero visita de ninguém, Cuscuz. Não pedi pørra nenhuma. Não quero nenhuma putä em cima de mim. Não tô afim de gastar grana com mulher arrombada. — Minha voz saiu seca, quase um rosnado.
Ele gargalhou alto do outro lado, o telefone até chiou.
— Se fosse tu, tu não falava assim não, chefe. Não é qualquer uma, não, cara.
Revirei os olhos, já perdendo a paciência.
— Então solta a pørra da voz logo, caralhø. Para de enrolação, que eu não tenho o dia inteiro e não quero ficar pendurado no telefone. Esses guarda aqui tão ligeiro, vão acabar me dando na vista.
Cuscuz respirou fundo e mandou a real.
— A ruiva, mano. Cabelo de fogo. Tá indo te visitar. — e a risada dele veio cheia de escárnio.
— O quê? Como assim, caralhø? A ruiva gostosinha? — quase engasguei com o que ouvi. A voz até mudou sem eu querer.
— Isso mesmo, patrão. A ruiva. Ela tá disposta a pagar a dívida do irmão — ele falou, baixo, todo gozador.
Fiquei em silêncio. Só o som do ventilador batendo nas paredes e o barulho dos cria cochichando lá fora. Mirei as grades, as paredes mofadas, o teto descascado. Tudo que eu controlava só com o olhar.
Um sorriso torto escapou sem eu querer. Porque eu sabia que essa pørra vai dar merdä — mas merdä daquelas que eu curto. Desejo e problema, tudo no mesmo pacote.
— Não me vem com promessa do que eu não pedi — murmurei, ajeitando o corpo no banco. — Mas avisa lá: quem chegar aqui vai ter que respeitar minhas regras.
— Entendido, chefe. Só liguei pra avisar que ela tá indo, na próxima visita. — Cuscuz respondeu, ainda rindo.
Ligação Off
Desliguei o telefone com a mesma frieza que uso pra dar sentença. Fiz um gesto pros cria se ajeitarem de novo.
Aqui dentro, quando o patrão fala… ninguém questiona. Palavra minha é lei.
Manda a real aqui pra vocês. Tô trancado faz quase 365 dias. Caí aqui por armação de gente de dentro, mas já derrubei metade dos filha da putä que me jogaram nesse buraco. No início, tava difícil, porque eu nunca fui de ficar parado. Mas até que tô curtindo essas férias forçadas.
Não preciso falar meu nome. Nunca fui chamado pelo nome de batismo. Me chamavam de Menor até o dia que matei o desgraçado do líder do comando que tramou contra meu pai. Naquele dia, virei Malfeitor. Desde então, todo mundo sabe quem eu sou.
Tenho 35 anos, 1,99 m de altura—bota 2 metros nessa pørra, arredonda logo. Por onde passei, nunca repeti figurinha. Quando repeti, era só pra aliviar as duas cabeças. Não sou de me apegar, só de comer e descartar. Sou chefe do comando, dono do Complexo do Alemão, mas minha residência fica lá na Fazendinha.
Entreguei o telefone pro cria segurar e dei um tapa leve na nuca dele.
— Guarda essa pørra direito aí, menor. Se algum guarda achar, tu já sabe qual é, né?
O Mandela, que tava encostado na parede, levantou a cabeça.
— Tá tudo sob controle, chefia?
— Tá, tá sim. — respondi curto, mas minha mente já tava longe.
Fiquei olhando pro chão por uns segundos, chutando a poeira com o chinelo. Fiquei pensando: que p***a de dívida era essa que o irmão da ruiva tinha feito pra botar ela num bagulho desses?
A mina se enfiar num presídio pra fazer visita íntima… isso não é qualquer parada.
Tem caroço nesse angu.
Encostei na parede fria da cela, passei a mão no rosto e deixei a cabeça encostar.
Mas não adianta, por mais que eu tente não pensar, a imagem dela vem na minha mente — novinha, ruiva, linda pra caralhø.
Cabelo de fogo, boquinha rosada, olho claro que deve hipnotizar qualquer um…
E aquela b***a dela?
Puta que pariu… só de lembrar já dá raiva, porque é o tipo de mulher que me tira do eixo, e eu odeio perder o controle.
Respirei fundo, tentando me concentrar, mas o sangue já tava fervendo.
— Filho da putä do Cuscuz… tá achando que vai ganhar pontinho comigo, só pode — falei baixo, rosnando pra mim mesmo. — Ele sabe que eu fico putø quando tô sem descarregar.
Apoiei os braços no joelho e olhei pro teto.
Tentei afastar a imagem dela, mas quanto mais eu tentava, mais ela vinha — sentando no meu paü, devagarinho, gemendo baixinho…
Bati a mão na parede pra espantar o pensamento.
— Caralhø, Malfeitor… se controla, pørra.
Caralhø, não podia ser ela, tô ligado.
Que quando essa ruiva pisar aqui… fødeu pra mim.
Continua...