Capítulo 7

2016 Palavras
Depois do jantar, Alice correu para o quarto e pegou sua bolsa de ensaio, não iria treinar nada de verdade, mas precisava fingir. Avisou Tori para onde iria e seguiu diretamente para o auditório. — Você tem uma hora, vou deixar tudo destrancado e as luzes acesas, depois dessa hora, vou desligar tudo e trancar. Ela assentiu e deixou a bolsa em uma das cadeiras da frente enquanto colocava a sapatilha de ponta. Era um pouco desconfortável para andar por aí, mas se alguém aparecesse por ali, principalmente a madame, precisava fingir que estava ensaiando, por isso a sapatilha. Suspirou e colocou a playlist do balé para tocar, especificamente as músicas da Odette. Por onde ela deveria começar a procurar? Talvez pela coxia, olhar os cenários, objetos de cena e qualquer coisa que pudesse achar. Imediatamente se lembrou do vulto que viu pouco antes de Ethan entrar no outro dia. Ela caminhou até o lado esquerdo do palco e entrou na coxia, era ali que tinha visto a pessoa, pelo menos, imaginava ser uma pessoa, não estavam fazendo O Fantasma da Ópera para ser assombrada. Ao olhar para o chão percebeu um ** branco no chão e uma pegada de sapatilha. Abriu a câmera do celular e tirou uma foto, o auditório tinha sido limpo depois da investigação da polícia, então aquilo era novo. Provavelmente daquela manhã. Alice ajoelhou no chão e tocou o **, esfregou entre o dedão e o indicador, era fino, mas também um pouquinho granulado. Levou próximo ao nariz, cheirou. Era ** de breu! E a pegada parecia feminina, então era uma bailarina que estivera ali. O que não significava muita coisa, infelizmente, qualquer uma poderia ser a bailarina e por qualquer motivo poderia ter estado ali.  Ainda assim, era uma possível pista. Continuou andando pela coxia, encontrou o colchão. Ela se jogou nele, tudo normal. Fechou os olhos por um momento. O que exatamente estava procurando? Não sabia, só sabia que estavam, possivelmente, plantando pistas tentando acusá-la do que aconteceu com Donna. Abriu os olhos e se levantou do colchão. Quem teria motivos para querer Donna e ela fora do caminho? Se fosse presa por conta da morte da amiga, não iria conseguir dançar como Odette. Isso não ajudava muito, muitas bailarinas tinham feito o teste para a protagonista, mas ainda era um caminho. — Olá? — ela ouviu uma voz chamando. Caminhou para fora da coxia e viu Callie entrando no auditório. — Madame disse para eu vir e ver se você queria ajuda. — explicou a loira. — Oi, eu aceito, mas não estou ensaiando. — ela disse ao se aproximar da borda do palco. — Como assim? Fez Callie se sentar ao lado dela e com a voz pouco mais alta que um sussurro explicou sobre as acusações da polícia, as provas que estavam sendo implantadas, do vulto que viu de manhã ensaiando e do que ela achava ser o motivo de tudo acontecer. — Não acho que a pessoa planejava m***r Dominique, queria machucar e tirar ela do papel. O papel veio para mim e agora que ela está morta e estão investigando, quem quer que fez isso, está tentando me colocar como culpada para eu também sair e o papel ficar vago. — É uma teoria maluca, mas faz sentido. — ponderou Callie — O problema é que ainda temos umas 20 bailarinas que fizeram audição para Odette. — Eu sei. Depois de mim, para quem iria o papel? — Eu não sei, a Madame avalia cada bailarina por uma série de categorias e cada uma conta uma pontuação. Somando tudo ela monta um ranking, Donna foi a mais pontuada, você foi a segunda. Teríamos que ter acesso a essa lista e mesmo assim pode ser a terceira ou a última. — Callie respondia pensativa — Quem ficou como sua suplente? Ela deve ter sido a terceira. —  Melissa, mas tenho certeza de que não foi ela. — Ela é uma ótima bailarina, mas é bem medrosa, deve ser por isso que Madame a colocou, combina com a Odette do início da peça.  Alice assentiu e se levantou oferecendo a mão para ajudar a amiga. Precisavam voltar a investigar, vinte minutos já haviam se passado. Elas voltaram juntas para a coxia, Alice mostrou o passo de ** de breu, Callie não tinha ideia de a quem poderia pertencer. — O que estamos procurando? — Callie perguntou. — Alguma coisa, qualquer coisa. Eu não sei. Só acho que como pistas estão sendo plantadas aqui, talvez tenha algo verdadeiro também. — explicou calmamente. — Será que nos diários de Donna não tenha algo? — Mas como teremos acesso? — Podemos ver com os pais dela, falamos que queremos ver anotações sobre técnica, ideias pra personagem, você quer honrar todo o trabalho de Donna no papel e toda a ajuda durante esse ano. — ofereceu a loira. — Não seria completamente mentira. — As melhores mentiras estão misturadas com a verdade. — Por que alguém faria isso com alguém como Donna? — É simples. Alice ficou esperando que Calissa completasse a sentença. — Dominique estava no topo de sua carreira acadêmica e provavelmente seria contratada para algum lugar grande e bom. Ela estava chamando a atenção, Madame tinha ela como favorita para dar aulas, dançar, ser sua mão direita. E aqui a pressão para ser perfeita e entregar tudo é muito grande, quem quer que fez isso deve ter sentido que estava sendo ofuscada por Donna e com ela sendo o sol do momento, ninguém mais teria chance e então a tirou da jogada. Alice refletia sobre as palavras da amiga e percebeu que aquilo era de fato verdade, mas não importava se Donna tinha ido embora, agora tinha outra estrela na qual Madame apostava os cavalos e era por isso que também estavam tentando se livrar dela. O ciclo nunca iria terminar, a próxima seria Melissa e depois dela outras, até finalmente chegar a vez de quem estava fazendo tudo aquilo. Só que talvez até lá já fosse tarde demais. — Você sabe demais sobre isso para seu próprio bem, Callie. Não converse com a polícia ou é capaz de acharem que você a matou. — Alice expressava sua preocupação. — Relaxa, eles acham que sou simplesmente fria demais como minha personagem. Eu me importava com ela, mas infelizmente a vida acabou para quem morreu, a nossa não e temos que continuar vivendo. A hora correu mais rápido do que elas queriam. Voltaram para o dormitório, mas não tocavam no assunto da investigação, simplesmente falavam de técnicas e o que poderiam melhorar, não levantar suspeitas era a principal questão.                                                                                *** Flashback, 1 mês antes das audições.  Alice, Calissa, Dominique, Verona e Victoria, todas juntas em um canto da sala discutindo sobre os papéis que queriam. Três delas queriam Odette, as outras duas queriam fazer Odile.  — A regra é clara, quem conseguir Ethan como parceiro tem mais chances de ganhar qualquer papel. É praticamente garantido que ele será Siegfried. — comentou Verona. — Então será de Alice, ele anda atrás dela desde que nossa querida amiga chegou. — apontou Tori. — Mesmo que eu acabe tendo ele como parceiro, é Donna quem vai ganhar o papel, ela é a melhor bailarina. — argumentou Alice. As meninas continuaram conversando por mais algum tempo e em pouco tempo estavam divididas em trio e dupla para que pudessem ensaiar os movimentos. Dominique na frente do trio Odette, Alice e Verona um pouco atrás fazendo os movimentos. Alice movia os braços como se fossem asas enquanto andava na ponta como se fosse um cisne voando. Observava como as outras garotas se moviam e percebeu que Verona brigava com Dominique por conta da interpretação da garota. Ela foi se aproximar, mas uma mão em seu braço a impediu. — Não recomendo que faça isso, elas vivem brigando e não gostam que ninguém se meta.  — Mas se a Madame entrar e elas estiverem discutindo, não vai ser nada bom. — Isso é com elas, Alice, não tente resolver os problemas de todos, amor, não vai acabar bem pra você. — Amor? — Mania. Ela bufou uma risada e percebeu que Ethan ainda segurava seu braço, ele a puxou para outro canto ao ver que ainda a segurava. — Vem, vou te ajudar a ensaiar. Faça o arabesque que estava treinando antes, agora faça direito, vou te dar o apoio. Ela assentiu e girou levemente o corpo para o lado, um pé era a base, o outro ela erguia esticando a ponta, era um ângulo de noventa graus perfeito. As mãos de Ethan firmaram sua cintura e ela deixou que o corpo fosse mais para baixo enquanto a perna ia se erguendo. Ao mesmo tempo, ela mexia os braços como se fossem asas. Era estranho a diferença que certos passos faziam quando se tinha um parceiro. Era provavelmente por conta disso que se chamava pax de deux, uma dança de casal, um precisava do outro. Voltou à posição normal e agradeceu Ethan pela ajuda. Um breve olhar a fez perceber que as meninas haviam parado de brigar, mas que agora estavam afastadas.  — Acontece com frequência e não só entre elas, eu costumo chamar de briga de divas. Uma acha que sabe mais que a outra e quer corrigir tudo, a outra não aceita e aí vira essa briga. — ele explicou. — Bem, brigas acontecem, só espero que elas façam as pazes logo.                                                                                *** Na tarde seguinte à busca no auditório, ali estavam Alice e Callie batendo a porta dos Carpentier. Na verdade, de um dos hotéis que eram sócios e Calissa sabia que estariam ali. Depois de uma grande burocracia na recepção do Hotel, foi permitido que elas subissem para o andar onde ficavam os escritórios e elas foram diretamente para o do casal. Ao bater na porta foram recebidas pela secretária que os encaminhou para o escritório do casal. — Meninas, que bom vê-las, o que as trazem aqui? — perguntou a senhora Carpentier. Alice percebeu que ela ainda estava abalada, a voz soava alegre, mas a expressão dela ainda era triste. Não era fácil perder um filho, ela imaginava. — Eu gostaria de honrar Donna no papel que ela tanto queria. E pensei que talvez os diários dela pudessem conter anotações sobre técnicas, passos e essas coisas de dança a respeito da Odette. E gostaria de perguntar se vocês me permitiriam ler os diários em busca dessas anotações. Ambos se calaram por um momento, obviamente era um pedido repentino, ela sabia disso. Talvez fosse pedir muito dos pobres pais que perderam a filha. Só que Alice estava querendo provar sua inocência e talvez aqueles diários fossem a chave. — Bom, a polícia não demonstrou interesse neles mesmo, acho que não faz m*l que você os leia. Apenas cuide deles e nos devolva quando terminar, sim, querida? Alice assentiu imediatamente e se prontificou a cuidar dos diários e devolvê-los no momento que terminasse o que precisava. Elas seguiram com a secretária para o apartamento do casal e lá as meninas seguiram para o quarto de Donna. Algumas coisas estavam encaixotadas, outras não. O quarto era amplo, piso de madeira e tinha em um canto um espelho e uma barra, ela praticava mesmo fora do internato. A parede era branca, mas havia vários pôsteres de musicais da Broadway, cantores Pop e também cartazes de peças de ballet. Uma cama encostada no canto perto da janela. Uma grande prateleira cheia de livros e uma televisão ao lado. Era um bom quarto e mostrava muito sobre tudo o que Donna valorizava. Alice tropeçou em uma caixa e ao ler o que estava na lateral deu um viva, era a caixa com os diários.  — Um por mês desse ano letivo, incluindo o não finalizado desse mês. — afirmou Callie depois de contar. Elas pegaram a caixa e seguiram para fora do apartamento e depois do hotel. O carro dos Carpentier as levou de volta para o internato. Elas pediram para Madame que pudessem prestar condolências e ver como eles estavam, não era inteiramente mentira.
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