O Ciúme e o Contrato Quebrado

1004 Palavras
Daniel estava imerso nos balanços da PHOENIX TECNOLOGIA, mas sua concentração era um castelo de cartas. Ele revia as transcrições da audiência, não buscando falhas legais, mas procurando o momento exato em que Helena o olhou com aquele misto de desafio e medo. Ele ainda podia sentir a raiva fria que o consumiu ao vê-la ao lado do jovem. Aquele garoto. O substituto. Ele bateu a caneta na mesa, frustrado. Dezoito anos. Dezoito anos de paz quebrados por um terno azul-marinho e um par de olhos penetrantes. Ele se perguntava se ela havia fugido naquela época sabendo que estava grávida, se aquele garoto era, na verdade, um lembrete vivo do que eles poderiam ter sido. Não. Ele não podia permitir-se tal fantasia. O garoto era jovem demais para ser seu filho. O garoto era, sem dúvida, o motivo de sua partida e de seu retorno. Nesse momento, Lucas bateu na porta. — Promotor Albuquerque, podemos conversar? Daniel endireitou a postura, voltando ao Promotor implacável. — Entre, Lucas. Espero que seja sobre a análise de fluxo de caixa que lhe pedi. Lucas não entrou totalmente na sala. Ele permaneceu na soleira, visivelmente tenso. A camisa social estava amarrotada, e ele evitava o contato visual. — Eu… eu preciso me desligar do estágio. A caneta de Daniel parou no papel. Ele demorou alguns segundos para processar. — O quê? Por quê? Você está indo bem, Lucas. Você é um dos estagiários mais promissores que já tive. — É… é uma questão ética, Promotor. — A voz de Lucas era incerta. Ele recitava as palavras que Helena havia praticamente lhe forçado a engolir. — Recebi uma proposta melhor. Meu escritório me disse que, com a Doutora Monteiro entrando no caso, minha permanência aqui seria... um conflito de interesses. O ar na sala ficou pesado. O sorriso de Daniel era puro veneno. Ele se levantou lentamente, contornando a mesa, diminuindo a distância entre eles. — Conflito de interesses? — Sua voz era um sussurro perigoso. — Ou a Doutora Monteiro não confia em você? Ou ela tem medo que você acidentalmente me conte um segredo dela? Lucas empalideceu. — Não é nada disso, senhor. Ela só está sendo profissional. — Profissional. — Daniel riu sem humor. Ele estava a centímetros de Lucas. Ele viu o nervosismo, o pavor nos olhos do jovem, e interpretou tudo como culpa. A culpa de um garoto pego em um jogo de espionagem. — Profissional. A Dra. Monteiro nunca foi profissional, Lucas. Ela é uma jogadora. E você é apenas uma peça descartável no tabuleiro dela. Ele colocou as mãos na mesa, inclinando-se para o jovem. — Diga-me, garoto. Ela te pagou bem por essa lealdade cega? Ou ela usou outros métodos para convencê-lo a trabalhar contra mim? Lucas deu um passo para trás, chocado com a acusação aberta. — Eu não sei do que o senhor está falando! — Ah, sabe. — Daniel não lhe deu tempo para respirar. O ciúme se transformava em uma convicção fria e absoluta. — Diga a ela que a sua "proposta melhor" só me deu uma coisa: a prova de que ela está desesperada. Lucas balançou a cabeça, incapaz de entender a raiva que emanava do seu mentor. — Eu sinto muito. Eu sinto muito por tudo. O "tudo" de Lucas era a demissão. O "tudo" de Daniel era a confirmação de que Helena o estava traindo, zombando dele com a presença de seu amante na sua própria sala. — Vá. — Daniel voltou para sua cadeira, a derrota misturada ao ódio. — E não volte. Lucas saiu quase correndo. Daniel pegou seu telefone e ligou para o único número que poderia dar vazão à sua raiva. Viviane entrou na sala de Daniel dez minutos depois. Ela não precisou perguntar nada; o odor de fúria e mágoa era tangível. Daniel estava de costas para ela, olhando a vista da cidade. — Lucas se demitiu. — Ele disse, a voz rouca. Viviane se aproximou devagar, estrategicamente. — Eu ouvi. É uma pena, ele era talentoso. Mas, francamente, a Doutora Monteiro é conhecida por intimidar adversários. — Não é intimidação. É traição. — Daniel se virou, e Viviane viu a dor que ele tentava disfarçar com raiva. — Ela o mandou. Ela o usou para tentar se infiltrar. E agora, ela o tirou do jogo para que ele não escorregasse. Viviane sorriu internamente. Daniel estava vulnerável. Ele precisava de uma aliada, de alguém que pudesse lhe dar a certeza de que estava certo em sua raiva. — Então, Daniel, o que faremos? Vamos deixar a Doutora Monteiro vencer emocionalmente? Ou vamos destruí-la onde realmente importa? — Vamos destruí-la no tribunal. — Daniel socou a mesa. — Quero que você monitore cada movimento dela. Cada almoço, cada reunião. Quero saber exatamente o que ela está fazendo com aquele… com aquele garoto. Viviane se inclinou na mesa, olhando Daniel nos olhos. Seus dedos roçaram sutilmente o terno dele. — Você não precisa se preocupar com Helena, Daniel. Você me tem. Vou cuidar da PHOENIX TECNOLOGIA. E eu vou garantir que a vida dela aqui seja um inferno profissional. — É exatamente isso que eu quero, Viviane. — Ele não notou o flerte, apenas a lealdade. — Ela me deixou por ele, Viviane. Ela me deixou e agora volta para esfregar isso na minha cara. — Não mais. — Viviane colocou a mão no braço dele, um toque consolador, mas possessivo. — Foco total no caso. Deixe o drama pessoal para trás. Concentre-se no que você faz de melhor: vencer. Daniel assentiu. Ele se sentia esgotado, mas a presença fria e calculista de Viviane era o antídoto que ele precisava para a paixão e a dor que Helena trazia. Viviane era segura. Viviane era previsível. E Viviane odiava Helena tanto quanto ele, por motivos muito diferentes. Viviane se afastou, o sorriso de predadora voltando aos lábios. Ela tinha a sua missão: destruir Helena Monteiro. O caos emocional de Daniel era apenas a alavanca que ela precisava para finalmente conquistar seu lugar.
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