Capítulo 33 - O lamento da Loba

1521 Palavras
Mia acordou no hospital. Antes mesmo de abrir os olhos, o cheiro de antisséptico, o zumbido monótono dos aparelhos e a sensação de estar deitada em algo duro demais já lhe diziam onde estava. Parecia ser manhã. Uma tontura persistente a envolvia. Abriu os olhos e confirmou a realidade: paredes brancas, equipamentos médicos, o ambiente estéril. Não tentou se levantar, apenas fechou-os novamente, sentindo uma dor lancinante que parecia vir do mais profundo de seu ventre, espalhando-se por todo o abdômen, uma agonia que ia além do físico. Um pânico gelado começou a se instalar. Foi então que Bryan apareceu em seu campo de visão, seu rosto pálido e marcado por olheiras fundas, a barba por fazer, os cabelos bagunçados – uma imagem bem distante do Alfa imponente que ela conhecia. — Calma, amor, você não pode levantar. Tente se acalmar, por favor — ele disse, a voz embargada, enquanto passava a mão pelo cabelo dela e beijava sua testa. Em seguida, virou-se para as enfermeiras que se apressaram em seu auxílio. — Chamem os médicos! Mia sentiu a boca seca, mas as palavras saíram, carregadas de repulsa. — Tira as mãos de mim. Bryan recuou, seus olhos arregalados, a dor que o consumia claramente visível. Mia queria entender o que havia acontecido. Por que sentia aquela dor excruciante, para além da dor em seu coração, da dor sentimental que a dilacerava? E por que, diabos, já era de manhã? Foi então que o Doutor Alexander Blackwolf, o médico-chefe do hospital e m****o de sua alcateia, entrou no quarto. Seus olhos, usualmente firmes, carregavam um olhar de profunda compaixão e preocupação para Mia. Aquilo a atingiu: provavelmente, toda a alcateia já sabia do chifre, do seu sofrimento. Seria esse o tipo de olhar que ela receberia de seus agora em diante? O olhar de pena. — Bom dia, Luna — o médico começou, a voz suave. — Como você está se sentindo? Mia piscou, confusa, mas respondeu, a voz fraca. — Estou com dor. O que está acontecendo? O Dr. Alexander deu a ela um olhar de compaixão que fez o estômago de Mia revirar ainda mais. Aquele tipo de olhar, ela sabia, a seguiria a partir de agora. Um olhar que carregava consigo o conhecimento da sua humilhação, da sua dor, que confirmava que não era mais um segredo íntimo, mas sim a tragédia de uma Luna exposta a todos. — Mia, você sabia que estava grávida? — O médico perguntou, e a pergunta a pegou de surpresa, fazendo-a sentir-se ainda mais desorientada. Grávida? Não, ela não estava grávida! O pânico que havia sido contido explodiu. — Não! Eu não estava grávida! Eu desmaiei porque vi uma coisa horrível ontem à noite, a dor Do vínculo sendo corrompido... não foi? Ela perguntou atordoada. O Dr. Alexander negou com a cabeça, o olhar cheio de pesar. — Sinto muito, Mia. Você estava grávida de um mês, já estava indo para o segundo mês. Ontem, com o que aconteceu, o estresse que você vivenciou... você sofreu um aborto. Você perdeu o bebê. As palavras caíram sobre Mia como pedras, uma avalanche. Grávida. Um bebê. E agora, perdido. Uma dor avassaladora a preencheu, roubando-lhe o ar e a capacidade de pensar. Um grito agudo rasgou sua garganta. — Não! Não! Isso não aconteceu comigo! Suas mãos instintivamente foram para o ventre, que agora ela sabia estar vazio. Mia, que já era mãe de três crianças lindas, sempre teve gestações boas e saudáveis, três partos normais. Dentro dela, Mika rugia, implorando para que fosse mentira. O instinto materno da loba feria como garras por dentro — ela queria lutar, mas não havia mais nada a proteger. Ela amava seus filhotes, amava com todas as fibras do seu ser cada vida que se desenvolvia dentro dela, cada parte de seu próprio corpo que agora sentia se destroçar. O choro e o uivo de dor irromperam dela, um lamento pela perda de uma vida que ela nem sabia que estava crescendo dentro de si e que agora se fora. Bryan se aproximou, hesitou por um segundo, e então a abraçou com força. Por mais que Mia estivesse fervendo de ódio por ele naquele momento, a dor que sentia era tão avassaladora, tão esmagadora, que ela sabia que se estendia a ele também. Eles estavam devastados. O sofrimento era nítido, insuportável, e ela simplesmente se deixou ser consumida por ele, permitindo que toda aquela dor reverberasse através de cada célula de seu ser. Eles choraram juntos, dois corações batendo em uma dor só. No fundo, Mika, sua loba, se contorcia em agonia, uivando pela perda do filhote delas. Depois de um tempo, o choro de Mia diminuiu, mas a dor permaneceu, crua e latente. Ela permanecia ali, imóvel, as lágrimas descendo silenciosamente pelo rosto pálido. Os soluços de Bryan, abafados contra seu ombro, eram a única coisa que a ancoranva à realidade. Mia estava processando tudo: a traição, o desmaio, a descoberta da gravidez, e agora, a perda irreversível. Parecia uma punição c***l, uma sentença que a deixava vazia. As enfermeiras entravam e saíam, rotineiramente. Verificavam seus sinais vitais, colhiam amostras de sangue, administravam analgésicos para a dor física que ainda a perfurava. A única coisa que Mia conseguiu forçar-se a perguntar, sem sequer olhar para Bryan, a voz quase um sussurro, foi: — As crianças? Bryan respondeu, a voz rouca pela emoção. — Elas estão com a minha mãe e a sua mãe, Mia. Não se preocupe, elas estão bem. O Doutor Alexander Blackwolf explicou que ela precisaria ficar ali mais um dia, para que pudessem verificar seu estado e garantir que sua recuperação física fosse completa. Mia apenas assentiu, os olhos vazios. O mundo exterior, as responsabilidades, os olhos de seus... agora, seu povo... tudo parecia distante. Havia apenas a dor, o vazio em seu ventre e a imagem de uma traição que a assombraria para sempre. A noite caiu no hospital, mergulhando o quarto em uma penumbra melancólica. As luzes fracas dos aparelhos e a iluminação externa que se infiltrava pela janela eram as únicas fontes de claridade. Bryan permanecia ao seu lado, uma presença silenciosa e desolada, mas Mia não conseguia encará-lo. A dor do luto, a vergonha da traição e o peso da perda a esmagavam. Antes que o sono a tomasse por completo, as palavras que vinham martelando em sua mente finalmente se descolaram de seus lábios, ditas para o vazio, sem direcionar o olhar a ele. Sua voz estava fraca, um sussurro carregado de uma amargura profunda. — É isso que acontece quando a gente ama alguém, né? — As lágrimas voltaram a rolar livremente, quentes e incontroláveis. — A gente dá a capacidade à pessoa de nos destruir assim. Mia chorou, o soluço engasgado em sua garganta, até que a exaustão a dominou por completo e ela finalmente adormeceu, os sonhos que viriam certamente povoados por fantasmas de um futuro perdido e a imagem indelével da traição. Mia chorou, o soluço engasgado em sua garganta, até que a exaustão a dominou por completo e ela finalmente adormeceu — os sonhos que viriam certamente povoados por fantasmas de um futuro perdido e a imagem indelével da traição. Mas antes que o sono a tomasse por inteiro, algo dentro dela se partia. Algo profundo e irreversível. E, no fundo de sua alma, Mia soube — o que sentia por Bryan jamais seria o mesmo. O amor que um dia a fez lutar por ele agora sangrava junto com tudo o que havia perdido. Bryan permaneceu sentado ao lado da cama, observando o rosto adormecido de Mia. As lágrimas ainda marcavam o caminho pelo rosto dela, e cada uma delas parecia gravar uma cicatriz dentro dele. O silêncio do quarto era quase insuportável, interrompido apenas pelo som suave das máquinas e pelo bater irregular do próprio coração. Ele havia cometido o pior dos erros. Não havia desculpa, não havia justificativa. "Não importa o que eu diga," pensou, "o que eu fiz já está feito." Aquela verdade o atravessava como uma lâmina. Ele tinha destruído a confiança da mulher que era sua alma, sua Luna, sua razão. E agora, mesmo se passasse o resto da vida tentando consertar, sabia que nada apagaria o olhar dela — aquele olhar de dor e repulsa que o perseguiria até o fim. Dentro dele, Bones uivava. O lobo estava em puro sofrimento, contorcendo-se em agonia. A perda do filhote era um buraco aberto na alma deles, uma dor que não distinguia homem e b***a. Bryan podia sentir o desespero de Bones, o instinto paterno dilacerado, o lamento primal de algo que jamais voltaria. " Vamos fazer de tudo pra não perder elas... — " a voz rouca do lobo ecoou em sua mente, carregada de desespero. " Mesmo que leve a vida inteira... não podemos viver sem elas." Bryan fechou os olhos, e lágrimas silenciosas escaparam. Ele concordou, sentindo o peso esmagador da verdade. Porque não existia para ele um mundo onde Mia não lhe pertencesse... Sem ela, sem Mika, ele era apenas uma sombra — um Alfa despedaçado, condenado a carregar o próprio arrependimento como castigo.
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