Capítulo 02
Nathália Campos
São Paulo | 01 de Agosto
O sol ainda nem tinha dado as caras , mas eu já estava acordada , com os olhos fixos no teto do meu quarto , porque o sono ? Esse tinha fugido há horas , junto com a calma que eu achava que teria , porque desde que voltei da agência de intercâmbio com Clara , a ansiedade tomou conta de mim — afinal, o futuro que eu sempre sonhei estava logo ali , tão perto que eu quase podia tocá-lo, mas a proximidade me deixava inquieta .
Era como se cada segundo que passava … aumentava a realidade de tudo .
E quando eu fui notar , a porta do meu quarto se abriu devagar , e minha mãe apareceu , junto do meu pai que estava segurando uma bandeja com um café da manhã caprichado .
— Bom dia , minha filha ! — Disse ela , com aquele sorriso orgulhoso nos lábios .
— Bom dia , mãe . — Sorri de volta , tentando não deixar transparecer o turbilhão de emoções que eu estava sentindo .
Ela colocou a bandeja no meu colo e se sentou na beira da cama , enquanto o meu pai continuava em pé . E eu sabia que eles estavam tão emocionados quanto eu — mesmo que eu conseguisse ver a leve preocupação em seus olhos .
— Fiz o seu café favorito , do jeito que você gosta , com bastante leite e pouco açúcar . — disse ela , enquanto acariciava meu cabelo . — E aquelas torradinhas que você adora .
— Você é a melhor , mãe . — Peguei a xícara , tentando aproveitar o momento e o calor da presença dos meus pais , sabendo que em algumas horas eu teria que me despedir de tudo isso .
Enquanto comíamos , conversamos sobre coisas banais , como o clima , as últimas notícias da família e até sobre a novela que estava passando . Parecia que ambos tentavam evitar o óbvio : a despedida que se aproximava .
Eu não queria que o momento acabasse , mas sabia que não podia adiar o inevitável — ainda mais , quando o inevitável , era algo que eu tinha lutado tanto para conseguir .
Quando terminamos , minha mãe se levantou e me deu um longo abraço , daqueles que quase te fazem mudar de ideia . Senti o cheiro familiar do perfume dela , misturado com o amaciante da roupa .
Era um cheiro de casa, de aconchego .
— Estou tão orgulhosa de você, Nathalia… sei que vai brilhar lá fora. — Ela disse com a voz embargada, por conta do choro que estava tentando segurar. — Mas se precisar de qualquer coisa, você sabe onde nos encontrar. — Ela deu um beijo na minha testa e saiu do quarto, me deixando sozinha com o meu pai.
— Minha menina… — ele se aproximou, deixando aquele rosto sério de sempre de lado, — eu vou sentir a sua falta.
— Eu também vou, pai… — falei com certo aperto no peito.
— Me avise quando chegar, está bem? — Ele disse ao se afastar, enquanto olhava bem pra mim, como se não quisesse esquecer nenhuma parte do meu rosto, — e não faça nada que eu não faria.
— Eu não vou, pai… — falei entre risos.
— Ótimo. — Ele disse ao pegar a minha mala, — essa aqui já está pronta, né? Eu já vou deixar lá embaixo pra você.
Ele disse ao levar a mala mais pesada pra mim, e comecei a me arrumar, pegando as últimas coisas que faltavam para colocar na mala de mão. As roupas estavam separadas, o passaporte e os documentos na bolsa, e a ficha de intercâmbio em mãos.
Estava tudo pronto, e eu? Estava prestes a pirar!
Mas assim que desci as escadas, dei um último abraço nos meus pais, me despedindo deles — o que teve direito a choro e tudo o que eu tinha direito — apenas para ir pra fora, e ver que Clara já tinha chegado, com uma energia digna de uma pilha de 220v.
— Tá pronta, garota? — Ela perguntou, com um sorriso largo.
— Acho que sim... — respondi, apenas para olhar para os meus pais pela última vez, enquanto acenava para os dois.
— Ótimo, já se despediu deles antes de ir, né? — Ela disse ao descer do carro, e começar a me ajudar com as malas, — e vai colocando tudo aqui logo, antes que você mude de ideia, princesinha do papai. — Ela zombou, apenas para eu começar a colocar tudo no porta malas, junto com ela (porque infelizmente, eu sabia que ela estava certa).
No caminho para o aeroporto, eu estava em silêncio. A cidade que eu conhecia tão bem passava pela janela como um filme, e eu sabia que estava prestes a me despedir de tudo aquilo. Clara, percebendo minha quietude, começou a falar sobre as coisas que faríamos em São Francisco, os lugares que visitaremos, as festas, os restaurantes... ela estava tentando manter o clima leve, e eu era grata por isso, porque… eu precisava de uma distração naquele momento.
Quando chegamos ao aeroporto, o frio na barriga voltou com força total. Clara estacionou o carro e me ajudou a pegar as malas, e enquanto caminhávamos para o check-in, eu olhava em volta, tentando absorver cada detalhe, porque o aeroporto era enorme, cheio de gente indo e vindo.
— Vamos lá, amiga. — Clara me deu um empurrãozinho, me incentivando a continuar.
Depois de fazer o check-in e despachar as malas, fomos para a área de embarque, e a cada passo, a realidade se aproximava mais, tudo o que eu sempre quis, se aproximava mais.
Finalmente, quando chamaram nosso voo, senti uma mistura de euforia e medo, enquanto Clara segurava minha mão e juntas, seguimos em direção ao portão de embarque.
Era o começo de uma nova fase, e mesmo com todas as incertezas, eu… estava pronta para encarar o que viesse pela frente.
O avião decolou, e enquanto as luzes de São Paulo ficavam cada vez menores, eu senti uma liberdade que nunca havia experimentado antes. A vida que eu conhecia estava ficando para trás, e pela primeira vez, eu estava no controle do meu próprio destino.
Fechei os olhos e tentei relaxar. A ansiedade começava a ceder espaço para a empolgação, porque finalmente, aquilo estava acontecendo, meu sonho estava finalmente se tornando realidade.
Em breve, eu estaria em São Francisco.