Pré-visualização gratuita Capítulo 1
Capítulo 01
Nathália Campos
São Paulo | 31 de Julho
Desde que eu podia me lembrar, sonhava com o que existia fora do Brasil . Não que eu não gostasse daqui, mas a ideia de conhecer o mundo, viajar, encontrar gente diferente, sempre me atraiu, porque eu assistia a filmes e lia sobre lugares distantes, e ficava imaginando como seria estar ali, vivendo tudo aquilo, e mais um pouco .
Mas, claro, sempre soube que uma coisa era sonhar, outra … era fazer isso virar realidade, — ou pelo menos, foi assim até chegar no ensino médio, e a minha a ficha começar a cair : estudar fora podia ser mais que um sonho, por conta de uma coisa mágica chamada : bolsa de intercâmbio .
Cada aula chata, cada prova difícil, e até os trabalhos de escola, tudo parecia um passo a mais na direção certa, enquanto eu me esforçava ao máximo, porque sabia que não ia bastar só querer; tinha que trabalhar duro pra conseguir .
E quando terminei o ensino médio, eu finalmente fiz o teste pra conseguir a bolsa, e … eu fui aceita !
Então , eu só peguei o dinheiro que tinha juntado, depois de ralar em vários empregos de meio período — desde cuidar de criança até ser garçonete —, e já tinha os créditos necessários pra faculdade .
Era isso .
Eu finalmente tinha o suficiente pra ir pros Estados Unidos e começar uma nova fase, começar o meu sonho .
Meu celular vibrou e me tirou dos pensamentos, e quando olhei a mensagem, sorri ao ver que era da Clara .
[Clarita]: Tô aqui fora . Desce logo! ;)
[Clarita]: Se não eu vou te largar aqui, e vou finalizar o processo de mudança sozinha .
Eu ri ao ler a mensagem — porque eu sabia que ela nunca sairia do país sem mim, e Clara sempre foi a minha parceira pra tudo — eu fui descendo as escadas, até ver ela me esperando, enquanto passava aquele gloss da Dior que ela nunca abandonava — e que ela tinha um tremendo ciúme —, usando o retrovisor como espelho .
— Até que enfim! Achei que ia ter que subir pra te buscar! — ela brincou, enquanto eu entrava no carro .
— Quanto exagero, eu desci assim que vi a mensagem, — respondi, rindo, apenas para Clara suspirar, junto de um arquear leve nos lábios, e um leve revirar de olhos .
Clara ligou o carro e fomos rumo à agência de intercâmbio, fazendo o nervosismo e a empolgação se misturarem na minha cabeça, enquanto eu sentia um frio na minha barriga .
Faltava muito pouco … pra tudo se tornar oficial .
— Pronta pra virar americana? — Clara perguntou, me olhando de canto enquanto dirigia .
— Sei lá, ainda parece mentira ... tipo, eu sempre quis isso, mas agora que tá rolando, parece que não é real, sabe? — falei, olhando pela janela e vendo as ruas que eu estava tão acostumada a ver todos os dias, passando por nós .
— Ah, mas é real! E sério, ninguém trabalhou tanto quanto você . — Clara começou, enquanto colocava os seus óculos escuros na cabeça . — Você viveu de café e determinação esses últimos anos todos ! — Clara riu, mas dava pra ver que ela estava orgulhosa .
Sorri, sentindo o apoio dela, e era bom saber que alguém entendia o quanto aquilo significava pra mim .
Quando chegamos à agência, meu coração começou a bater mais forte . Entramos e fomos recebidas por uma atendente sorridente, que logo nos levou pra uma sala de espera, e enquanto aguardávamos, comecei a repassar mentalmente todos os documentos e as coisas que eu tinha feito até ali . Eram muitos detalhes, mas eu sabia que tava tudo certo .
Logo fui chamada pra uma sala pequena, onde uma conselheira de intercâmbio me esperava com uma pilha de papéis, ela explicou os últimos passos que faltavam, e eu fui assinando tudo, e cada assinatura? Era como um passo mais perto do avião que me levaria para bem longe dali .
Quando terminei, ela me entregou uma pasta com todas as informações sobre o intercâmbio — detalhes do curso, orientações sobre onde eu ia morar, contatos de emergência .
“Calma, Nathália … respire fundo …” eu tive que me lembrar que eu precisava fazer isso naquele momento, enquanto segurava a pasta, sentindo o peso do momento .
Saí da sala e encontrei Clara me esperando, com um sorriso enorme no rosto .
— E aí? Agora vai? — ela perguntou, os olhos brilhando .
— Agora vai! — respondi, com uma risada meio nervosa. Ainda parecia meio surreal, mas agora … a minha ficha também parecia ter começado a cair mais (mesmo que fosse aos poucos).
No caminho de volta, Clara falava sem parar sobre as coisas que íamos fazer, os lugares que eu íamos conhecer, e como seria a nossa vida lá, e eu apenas… conseguia ficar escutando ela com um sorriso idiotä no rosto, porque uma parte de mim ainda estava processando tudo, enquanto a outra parte já começava a se imaginar andando nas ruas de São Francisco.
— Eu nem acredito que finalmente vou poder te levar nos lugares que eu fui! Sério! — Ela soltou, completamente empolgada.
— Eu também não! — senti uma alegria que nem cabia no meu peito direito, — e eu quero tanto visitar o Palace of fine arts! Acho que nem vou acreditar quando eu for lá.
— Ai, ai, Nathy… você e o seu gostinho de velho. — Ela zombou, enquanto me olhava pelo canto dos olhos, — mas antes de eu te levar para o Palace não sei das quantas, eu vou te levar para lugares divertidos, como… os clubs que eu fui com a minha mãe! Sério… os de São Francisco são os melhores, — ela parecia a advogada do diabö, tentando me convencer de que ir para um club, seria uma ótima ideia, — mas é claro, eles só perdem para os de Nova York, óbvio… mas não é como se eu não pudesse te levar pra um de lá depois.
Ela piscou pra mim com um dos olhos, enquanto parecia alegre demais com a ideia de poder finalmente me arrastar para algum lugar, que não fosse uma biblioteca, ou um restaurante — e para ser bem honesta? Eu até que estava cogitando não resistir a isso.
Eu finalmente tinha atingido o meu objetivo, e talvez… eu pudesse me permitir viver um pouco.