📓 NARRADO POR MIGUEL SANTANA O morro parecia respirar comigo quando dobrei a última curva. O céu tava pintado de laranja, o cheiro de comida vindo das casas e o barulho de panela misturado com risada de criança. Nada no mundo tem som mais vivo que o Cruzeiro ao entardecer. Subi a ladeira devagar, o motor da moto vibrando no mesmo compasso do coração pesado, firme, conhecido. Cada esquina tinha um pedaço meu. O portão enferrujado da dona Elza, o cachorro do seu Tadeu latindo no mesmo ritmo de sempre, o rádio velho tocando samba de raiz em algum canto. O Cruzeiro envelhece, mas nunca muda. Quando parei diante do portão, o peito já pesava diferente. Casa. O mesmo portão de ferro torto, a mesma parede pintada de azul, o mesmo vaso que minha mãe nunca deixou morrer. Desliguei a moto

