Pré-visualização gratuita CAPÍTULO 1
Ela entrou correndo pelo lustroso, luxuoso e longo corredor, segurava a sua bola enlameada embaixo de um braço e os seus livros com folhas soltas e amassadas sob o outro. As suas duas paixões andavam sempre lado a lado com a sonhadora Eliza. Precisava ser rápida ou seu pai a pegaria pelas orelhas. Estava quase lá, era só atravessar mais dois cômodos e alcançaria a porta do lavabo. Só não contava com um grande obstáculo que magicamente apareceu na sua frente.
— m***a! – Ela praguejou depois de se estabacar no chão.
— Você devia prestar atenção por onde anda. – O jovem caído do outro lado, reclamou irritado ao notar a sua camiseta branca, suja de barro.
— Eu? Você aparece do nada no meio do meu caminho e eu sou quem deve prestar atenção? – Incrédula com a audácia do menino, ela começou a recolher as folhas que voaram por todo o lado.
— Garota... Quem você pensa que é para... – Ela tapou a boca dele e o arrastou para debaixo da escada, quando ouviu passos familiares vindo na direção deles. — Me solta! O que você está fazendo? – Ele reclamou abafado, sendo sufocado pelas pequenas, magras, mas fortes mãos da pequena encrenqueira.
— Shhhh... – Os passos diminuíram e então alguém se ajoelhou perto deles. Um homem de terno recolheu algumas folhas jogadas e logo a frente, avistou a bola suja. Ele ergueu o corpo, fechou os olhos e respirou fundo. A garota apertou os olhos e prendeu a respiração. – m***a! – Sussurrou.
— Saia! – A voz dura, porém baixa e contida foi o suficiente para fazer com que a dupla se colocasse rapidamente diante do jovem senhor que os encarava com olhar de reprovação.
Ele observou a menina no seu uniforme de futebol, completamente sujo, assim como os óculos tortos, fruto provavelmente de algum tombo. Mas os cabelos eram uma completa bagunça, as tranças estavam quase desfeitas, com algumas gramas ainda presas. Depois passou os olhos para o menino, que apesar de limpo e quase alinhado, tinha uma imensa mancha recém-adquirida no meio da camiseta do colégio de elite.
— Desculpa, pai! – A menina se encolheu, quase se escondendo atrás do garoto que atropelou minutos antes.
— Pai? – Ele ficou confuso, olhando para seu segurança e depois para a magrela desengonçada ao seu lado.
— Que foi, riquinho? Acha que nasci de chocadeira?
— Liz, cale essa boca, recolha as suas tralhas e saia da minha frente. – Mais uma vez, a voz era falsamente calma, mas soava como trovões aos ouvidos da garota. Ela sabia que estava muito, muito ferrada.
— Pai, eu estava muito apertada e por isso acabei pegando um atalho pela porta da frente...
— Eu disse, cale-se! – O homem já aumentava alguns decibéis da sua voz.
— Desculpe! – Ela baixou o olhar, quase engolindo o pedido.
O menino vendo que Liz estava encrencada, sentiu compaixão e decidiu intervir.
— Olha, senhor... – fez uma pausa ao ver que ela levantou os olhos arregalados para ele. — A culpa foi minha. Eu que desci as escadas correndo e não a vi passando. Ela não teve tempo de desviar e...
— Obrigado Evren, mas conheço essa mocinha muito bem. E ainda que você a tivesse derrubado, ela ainda é a culpada aqui... – Voltou a encarar a filha. — Ela não tem autorização de transitar pela casa. Não deveria sequer pisar nesse lugar!
— Eu já pedi desculpas, achei que não tivesse ninguém em casa, só queria usar o banheiro... – Sempre tentando fazer a sua defesa, ela insistiu, mas mais uma vez, foi repreendida e agora, com a ordem de pedir desculpas ao rapazinho que tentou ajudá-la.
Eliza respirou fundo, virou-se para Evren e pigarreou.
— Foi m*l! – Forçou um sorriso.
— Eu também deveria ter prestado atenção. – Ele recolheu os ombros e retribuiu o falso sorriso.
— Perdão senhor Evren, vou garantir que isso não se repita.
Antes que o menino pudesse responder, Liz já estava sendo arrastada para longe dali, mas não sem dar uma última olhada para trás, sussurrando um tímido “valeu”.
Evren, notou que sorriu sem querer. Se recompôs na sequência e antes de sair, avistou um pequeno caderno perto da porta. Ao abri-lo notou uma foto da garota e os seus dados pessoais, se tratava de uma agenda escolar, provavelmente continha informações importantes para ela. Sentiu que precisava encontrar um jeito de devolver.
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TRÊS ANOS DEPOIS
— Ei, gatinho! – Ela desceu as escadas e atravessou a rua correndo em direção a um rapaz alto de ombros largos, cabelos curtos, negros e com ligeiras ondas jogadas de lado. Seus olhos brilhavam para ela, assim como os dela retribuíam para ele.
— Você está maravilhosa hoje, minha pequena quatro olhos. – Com apenas um braço ele a ergueu facilmente pela cintura, ela aproveitou para envolvê-lo pelo quadril, o abraçando com as pernas.
— Você também não está nada m*l, meu riquinho mimado. – Segurou o rosto quadrado e bem desenhado do seu amado e o beijou com paixão. Todo esse fogo não era sem motivo, não se viam há dois meses, desde que ele entrou para a faculdade e ela agora estudava integral, pois à tarde tinha cursinho preparatório para o vestibular que prestaria no próximo ano.
Evren não esperou as aulas terminarem, pegou o seu carro e correu para a sua cidade, a desculpa era passar o feriado prolongado com a família, mas todos sabiam que o motivo maior da sua pressa estava bem ali, nos seus braços. Ele enfim se sentia em paz e em casa.
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— Seu pai me disse que você está de castigo. O que aprontou dessa vez? – O apaixonado Evren correu os dedos pelo rosto pequeno e delicado da sua amada.
— Nada de mais. – Ela beijou a ponta do indicador dele. — Sabe como meu pai exagera. Sempre cobrando de mim, algo que nem ele mesmo foi capaz: a perfeição! – Rolou de lado, procurando os óculos redondos que estavam perdidos no meio de algumas roupas jogadas no chão. — Sempre perco essa porcaria. Não vejo a hora de poder trabalhar e assim comprar lentes de contato. Meu pai acha que é frescura, mas ele não sabe como detesto ter que usar óculos.
O namorado sentou-se na cama e desceu pelo outro lado, agachou encontrando o objeto procurado. Ele limpou as lentes no lençol e os entregou para a moça.
— Você fica linda de óculos, minha cegueta! – Ela mostrou a língua para ele, fazendo uma careta e depois agradeceu. — Aliás, você é linda de qualquer jeito. Eu sou suspeito para falar, mas nesses quase três anos juntos, você só tem melhorado. – Ele era sincero.
Liz levantou da cama, vestiu a calcinha e foi até o espelho. Olhou bem para seu corpo quase sem curvas de s***s pequenos e depois voltou a olhar o namorado.
— Tá de brincadeira, né? Posso ser inteligente, mas linda? Por favor, Evren... Eu realmente não sei o que viu em mim e só acredito que me ama, porque insiste em ficar comigo todos esses anos, apesar das nossas famílias serem totalmente contra esse namoro... – Ela pareceu cogitar algo, ficou em silêncio poucos segundos e então concluiu. — Fala a verdade, vai... com tantas mulheres aos seus pés, você só pode estar comigo porque quer contrariar seus pais, ou pior... você é gay e me usa de fachada!
Como um felino, Evren deu um bote em Liz, a tomou nos braços e depois a jogou de volta na cama. Ela quase não causou efeito nos lençóis quando caiu de costas, deixando escapar uma deliciosa gargalhada.
— Eu não quero, nem nunca quis outras mulheres. – a sua voz mudou de tom. Era grave, áspera e sedutora. Quase um aço cortante. — Será que um gay saberia como tirar uma calcinha assim? – Evren destruiu o pedaço indefeso de pano com apenas um puxão. Liz arfou e fechou os olhos, quando ele se enterrou dentro dela.
Não. Não havia a menor possibilidade daquele homem ser gay.