Antananarivo, Centro - 2021
- Olha só esse sol, cara! Ei Ulisses, você tá perdendo essa brisa, irmão.
Um homem estava sentado em uma varanda de apartamento tomando um sol, enquanto tinha um outro dentro de casa tomando uma caipirinha enquanto lia alguma coisa em um laptop.
- Ulisses, vem logo!
- Eu já vou, Marcos.
Ulisses é um homem branco e forte com o braço e o peito esquerdo fechados com uma tatuagem de tigre preto. O cabelo topete dele bem arrumado, a barba e os óculos escuros davam uma aparência elegante.
Ulisses fecha o laptop e vai até o lado de fora, na varanda, e se senta em uma cadeira, também tomando um pouco de sol.
- A vibe desse lugar é muito boa. - comentou Ulisses.
Ele olha para Marcos, que é n***o, também é bem forte e com um cabelo disfarce, usando seus óculos escuros também.
- Isso aqui é o paraíso. - comentou Marcos.
- É bem legal. Mas eu não sei porquê paramos aqui, deveríamos estar surfando na Austrália ou pelo menos em alguma praia daqui, mas estamos bem longe das duas coisas.
- Relaxa irmão, eu sei que você sente falta das praias do Rio, mas vai por mim, esse lugar tem uma vibe muito boa.
- É, tô vendo.
Os dois ficam pegando um bronzeado, e Marcos pergunta:
- Fala aí, desde que nós chegamos, com quantas gatas malgaxes você já pegou?
Ulisses ri e responde:
- Não mais do que você.
- Que kaozeiro! Eu sou um anjo, você é que é a má companhia.
- Ah oh! Viaja não.
Eles riem, e Marcos responde:
- Ao menos é bom ver que você esqueceu da doida da Bruna, cara.
- Quem disse que eu esqueci?
- Aquela garota é completamente surtada, ela terminou contigo por causa do teu trampo. A não ser que você fosse traficante ou ator de filmes adultos, eu não vejo sentido.
- Ela falava que ser surfista não te dá futuro.
- Tudo kao, parceiro. Olha só pro Gabriel Medina, duvido que se ele der em cima da tua ex, ela não aceita ficar com ele na mesma hora.
- Tá dizendo que ela é uma interesseira?
- É exatamente o que eu tô te falando, mano.
- Tô ligado. Mas essas coisas não funcionam assim, tá ligado? A gente não manda no coração.
- Manda, sim. Esqueci minha ex 1 mês depois do término, você ainda tá aí se fazendo de pão pela Bruna 1 ano depois.
Ulisses tenta ignorar ele tomar o resto da caipirinha em paz, até que os dois levam um susto quando do nada uma sirene toca e Ulisses acaba quebrando a taça na mão, cortando seus dedos.
- Que m***a é essa?!
- Irmão, você tá bem? - disse Marcos, vendo a mão dele cortada.
- Que m***a!
Marcos vai pra dentro e pega um pano bem rapidamente e dá para Ulisses, que começa a estacar o sangramento com o pano.
- Que barulho é esse?
A sirene continua tocando com tudo e bem alto, e sem entenderem o que estava acontecendo, os dois ligam a TV, e de repente todos os canais tinham sido bloqueados.
- Será que deu r**m na antena? - disse Marcos.
- Não, deveria estar funcionando.
- E essa sirene? Será que tem como desligar?! Tá uma barulheira do inferno.
Os dois ficam assustados com aquele susto, e Ulisses vai direto até a porta, mas ela estava trancada.
- Tá com a chave ae, Marcão?
Marcos pegou a chave na mochila e jogou para Ulisses, e ele tentou destrancar, mas algo tinha sido quebrado dentro da fechadura, e não estava sendo possível abrir.
- Tá de s*******m?!
- O que foi?
- Liga pra recepção do hotel, alguém zuou nossa porta.
- Beleza.
Rapidamente Marcos agarrou o interfone, e ligou para a recepção, e assim que atenderam, ele só ouviu uma coisa:
- NÃO SAIAM DE SEUS QUARTOS!
E de repente desligaram, isso deixou Marcos bem preocupado.
- O que foi, Marcos?
- Acho que tá rolando uma parada sinistra, irmão.
Os dois então vão até a janela e vêem vários prédios da cidade onde as pessoas também estavam saindo pra ver o que estava acontecendo, tão confusas quanto eles.
Ao longe eles viram a polícia vir cortando uma avenida toda em alta velocidade, e um helicóptero vindo logo depois com uma mensagem em um alto falante:
- ATENÇÃO! PERMANEÇAM EM SUAS CASAS, ISSO NÃO É UM TESTE!
O helicóptero ficava transmitindo essa mensagem repetidamente por todo o lugar onde passava, e Marcos entra em pânico, então vai direto até a porta e começa a chutar, mas Ulisses o segura.
- TÁ FICANDO MALUCO? A GENTE TEM QUE FICAR AQUI DENTRO, MARCOS!
- A GENTE PRECISA SAIR DAQUI MANO!
Ulisses afasta Marcos da porta e tenta acamá-lo:
- Aí, fica namoral, beleza? Vamos ficar um pouco aqui, quem sabe se comunicar com os vizinhos? Só não abre aquela porta pelo amor de Deus!
Marcos tenta se acalmar, e ele respira fundo, e diz:
- A gente tem que descobrir o que tá acontecendo, mano.
- Eu vou tentar falar com a galera na janela, vai ver a geladeira, a gente precisa tomar cuidado com a comida, não sabemos quanto tempo vamos ficar aqui.
- Beleza.
Marcos se levanta um pouco trêmulo com a ajuda de Ulisses, e então vai até a cozinha. Ulisses voltou até a janela e viu as pessoas no prédio ao lado, então tenta se comunicar com elas:
- O que está acontecendo?!
Elas também tentavam falar alguma coisa, mas ele não ouvir nada, então tenta gritar mais:
- O QUE ESTÁ ACONTECENDO?!
Mas ficou na mesma, então ele procurou alguma coisa dentro de casa e encontrou a própria prancha e a de Marcos com seus nomes assinados nelas, e ele pegou uma caneta e escreveu em malgaxe:
"Estão todos bem? O que está acontecendo?"
Ele tentou mostrar a parte escrita na janela, mas assim que voltou, os vizinhos tinham saído da janela, e Ulisses ainda tentou chamar por eles, mas ninguém atendeu. Ele desiste, e bota a prancha no lugar, quando Marcos aparece e diz:
- Ainda bem que fizemos compras, tem o suficiente pro resto do mês.
- Tomara que sirva.
- Não mete essa irmão, nem ferrando que a gente vai passar todo esse tempo trancado aqui. Mais cedo ou mais tarde eles devem passar a visão do que tá rolando aqui.
- Eu acho que você tá certo, mas nada impede de a gente olhar por aí.
Então os dois foram pra varanda, e ficaram olhando os helicópteros passarem ao longe. A sirene finalmente parou depois de um tempo, e Marcos ficou observando as ruas com um binóculo, e viu que pelo menos o quarteirão inteiro estava completamente deserto.
- Não tem uma alma viva na rua. - comentou Marcos.
- Devem estar todos dentro de suas casas.
- Que bom que a gente pegou uma cobertura.
Eles ficaram ali o resto do dia, a noite já estava começando a chegar, e pelas luzes acesas nos prédios, eles viram que a maioria das pessoas estavam em suas casas, e isso os tranquilizou um pouco.
Ulisses ficou olhando no laptop por informações, mas não tinha nenhuma notícia comentando sobre o que estava acontecendo naquele momento.
- Achou alguma coisa, Ulisses?
- Não.
Ulisses minimizou o Google e abriu o chat com sua ex namorada, e ele digita:
"Aconteceu alguma coisa aqui em Antananarivo, parece que foi algo ruim."
Ele envia, mas a mensagem ficou carregando e deu erro, sem conseguir enviar.
- Mas o que?
Ele tentou novamente, mas falhou. Em seguida ele tentou pegar o celular para ligar para alguém, porém estava sem sinal.
- Sem sinal? Aqui em cima? Sério?
Ele fica tentando enquanto Marcos tentava ver se tinha algo na TV, mas não acha nada. Ulisses revira a própria bolsa e encontra um velho rádio de pilha.
- Ah, o radinho de pilha que a minha avó usava.
- Que conveniente pra nossa situação. - comentou Marcos.
- Ela costumava ouvir a rádio Tupi de manhã cedo. Ela deu pra mim quando soube que eu ia viajar, disse pra usar quando ficasse de saco cheio da internet.
- Sua avózinha é uma mulher sábia.
Ulisses liga e tenta sintonizar as estações, mas pra surpresa dele, as rádios estavam normais, nenhuma relatava nada de anormal acontecendo.
- Devem estar pregando uma peça na gente, não é não? - disse Marcos.
- Eu simplesmente não tenho a mínima ideia.
Marcos se senta e bufa.
- Devia descansar um pouco, Marcos, você tá muito nervoso. Deixa que eu fico aqui e qualquer novidade eu te aviso.
- De jeito nenhum, irmão. Eu não vou te deixar aqui sozinho
- Tá suave, mano. Pode ir deitar sossegado.
Marcos suspira e diz:
- Quando der oito horas, a gente reversa a vigia.
- Fechou, irmão.
Marcos foi deitar enquanto Ulisses ficou ali tentando captar alguma coisa pelo rádio, mas aos poucos foi ficando mais difícil conseguir algum sinal, parecia que as emissoras de rádio estavam parando de transmitir também.
- Que m***a!
Desistindo do rádio, Ulisses volta ao chat com sua ex namorada, e vendo que as mensagens realmente não estavam enviando de jeito nenhum, ele escreveu outra:
"Oi Bruna, eu não sei se isso vai chegar até você ou não, eu nem sei se você vai chegar a ler, nas eu torço pra que sim nos dois casos. Eu e o Marcos demos uma parada em Madagascar antes de irmos para a Austrália, alguma coisa muito esquisita tá acontecendo aqui, de repente a sirene de emergência começou a tocar e eles nos trancaram dentro do quarto do hotel. Eu não sei o que vai acontecer, nem sei se existe razão pra eu estar tão preocupado assim, mas o Marcos tá apavorado, você sabe como ele costuma ser sentimental. Eu não sei como dizer isso, mas de alguma coisa me acontecer, quero que saiba que independente das nossas diferenças, eu amo você, e sempre vou amar. Talvez, eu devesse ter dito isso mais vezes, talvez as coisas não estariam assim agora."
Ele envia a mensagem, e leva um susto quando do nada ouve uma correria no corredor do lado de fora do quarto e alguém começa a gritar, parecia um homem muito desesperado.
Sem nem pensar, Ulisses foi até a porta e tentou abrir, mas ainda estava emperrado.
- MARCOS!
Marcos chegou rapidamente na sala.
- O que tá acontecendo?!
- Me ajuda a abrir essa porta!
Os dois se juntaram e tentaram forçar a fechadura a ceder, mas estava muito difícil.
- Vamos juntos no 3, tá bom? - disse Ulisses.
- Bora!
- 1, 2, 3!
Os dois deram uma massa juntos na porta com toda a força e a porta finalmente cedeu, arrebentando a fechadura, e os dois caem no chão, mas se levantam logo em seguida e olham na direção do grito, e vêem uma cena grotesca.
Tinha um cadáver no chão com o torso completamente aberto e uma sujeira de sangue pra todo lado, e em pé no meio do corredor, tinha uma criatura bizarra, um homem pálido e bem musculoso com as bochechas rasgadas e vários dentes expostos formando um sorriso medonho. Os olhos dele eram extremamente pequenos e o nariz dele eram só dois furinhos. Aquela coisa era completamente lisa, sem pelo algum, e estava mastigando a carne daquele cadáver com gosto.
Ulisses e Marcos ficam em choque vendo aquilo, e pouco tempo depois, a criatura percebe a presença deles, e foca o olhar nos dois.