Um brinde à amizade

1589 Words
Com intuito de comemorarem o final do semestre, que foi fechado com notas boas, Robson disse a plenos pulmões: — FESTAAA! — E gargalhou. — Merecemos, não é mesmo, pessoal? Após comentários agitados, ele, Dênis e Douglas disseram que poderiam fazer a festa na próxima semana, lá na república mesmo — onde moravam e dividiam as despesas, até o final dos estudos. Será uma renovação de amizade! * * * * * 02 de julho de 2015, quinta-feira - 18h15 Enquanto a noite encobria aquela tarde, Juliet se arrumava para a festa. Sua cabeça era uma espiral de pensamentos, mas todos voltados à palavra amizade.  Uma hora mais tarde, quando a moça desceu as escadas até o salão principal, com um vestido bordô, justo, simples, mas que a deixava sexy, Abilene, que não fazia apenas o papel de governanta, mas de sua "tia postiça", abriu a boca e exclamou: — Minha filha, você está deslumbrante! — Ah, obrigada, tia Be. As duas riram. Juliet entrou no quarto do tio, esbanjando, junto com o perfume, uma alegria incontrolável. Ele citou as recomendações de sempre. E não podia faltar, é claro, o “toque de recolher”. — Meia-noite, mocinha — disse ele com sua voz baixa e meio asmática. — Uma hora — sugeriu ela, pois precisava aproveitar o máximo da festa, já que nunca antes fora convidada para uma. — Por favor, tio querido... — Já está m*l-acostumada, não é, minha filha? — Fez uma pausa. — Tudo bem — ele aquiesceu. Com um beijo estalado, e um obrigada muito sincero, ela se despediu. Na sala, encontrou Abilene e também a beijou. — Estou feliz por você, querida. — Sim, tia Be. Eu também estou. — E saiu. No carro, instruiu ao jovem motorista: — Pode me deixar perto da república. Não quero chegar lá neste carro. Combinado? — Sim — respondeu Alex, prontamente. — Você está linda — confessou ele. Juliet ficou sem graça e, ruborizada, agradeceu. Apesar de ser um simples elogio, ela sentiu-se suar. Alex surtia esse efeito nela com seus belos olhos azuis. Era dono de uma pele clara e limpa, combinava perfeitamente com seu cabelo loiro cortado no estilo militar. Era lindo, não tinha como negar. Ela pegou-se mais uma vez imaginando como seria beijar aquela boca carnuda, mas logo se repreendeu. Apesar de já ter percebido os olhares que ele lançava pelo retrovisor, não tinha por que alimentar uma ilusão. Conforme o combinado, Alex a deixou a um quarteirão da república. Já dava para ouvir a música eletrônica, o volume estava alto. Juliet pegou um espelhinho na bolsa para olhar o seu rosto e certificar-se de que estava tudo no lugar. Típico das mulheres. Quando a moça chegou ao portão, atraiu olhares. Receberam-na muito bem e não pouparam elogios. As meninas ficaram com uma pontinha de inveja, porém tinham que admitir: Juliet estava linda. A festa rolava e todos dançavam ao ritmo do som bate-estaca.  Juliet nunca ingerira bebidas alcoólicas, apenas refrigerantes. Arriscava dar uns passinhos no ritmo da música e se saia bem. A noite e a agitação estavam perfeitas. Conforme as horas foram passando, ela decidiu experimentar o licor de menta que serviram. Foi paixão ao primeiro gole. Ficou mais animada e o resto de sua timidez se esvaiu. * * * * *  Muitas pessoas entravam na cozinha para pegar bebidas ou para comer algo. Alguns dos meninos corriam pelo corredor para usar o banheiro, Juliet ria disso, mas não sabia dizer o motivo.  Às vezes Robson entrava no quarto com alguém, para mostrar suas medalhas — conquistadas em torneios e campeonatos de surf — e fotos em ondas gigantes — de quando ainda morava no litoral e não estudava. Mostrava também uma luva, sem par, que usava para surfar. Defendia ele que aquela era sua Luva da Sorte! Todos achavam estranho, mas não o questionavam. Na realidade não era a luva que lhe dava sorte, o que fazia de Robson um vencedor era ele próprio. Sua habilidade. Sua paixão pelo mar. Seu relacionamento com as ondas. * * * * * Douglas entrou na cozinha e mexeu na gaveta do armário. Depois foi até o quarto, onde dormiam ele, Dênis e Robson, e saiu em instantes com sua jaqueta dobrada nos braços. Estava de saída. — Galera. Tenho que ir — disse ele. — Nossa, por quê? A festa está tão boa! — gritou Juliet, que não havia bebido mais que um copo de licor, mas aparentava estar mais solta do que jamais estivera. — Está boa, sim. Mas me desculpem, pessoal, tenho que ir. Vou visitar uma amiga, vou dormir na casa dela, prometi já faz um tempo... Os caras o interromperam com “Humm, hoje vai rolar” e “Douglas vai se dar bem”. Ele preferiu ignorar, apesar de sua timidez o deixar ruborizado. Inquieto, ele explicou: — Volto amanhã à tarde, não sintam saudades. E Dênis, aquele favor está de pé? — Claro, amigo. Eu entrego o livro pra você, fica sossegado. — Deixei na minha cama, valeu, hein... E boa festa para vocês! "Tchau" e "falou" foram as palavras de despedida. * * * * * — Uhu! — gritou Juliet, servindo-se de mais um copo de licor. — Como isso é ó-ti-mo! Ela avistou de longe o grande relógio de time de futebol instalado na cozinha. Parou de dançar como se tivesse levado um tiro. Faltavam quinze minutos para o ponteiro menor encostar-se no número 1. Ah, não! Meu tio vai me m***r! — Juliet! — Douglas gritou do portão. — Tem um cara aqui esperando você. Acho que é seu motorista. — Gente, gente... — todos olharam para ela. — Olha, a festa está muito boa, mas eu preciso ir, pois prometi ao meu... — Soluço. — Desculpem... Prometi ao meu tio que voltaria cedo e... — Tá bom, não tem problema — disse Andrew, chegando mais perto. — Eu acompanho você até o portão. Vamos. — Tchau, galera! Um coro de despedida foi ouvido. Não posso me atrasar! Juliet entrou no carro, depois de pisar em falso na guia. Ficou envergonhada por estar tonta. O silêncio no interior do automóvel era sufocante, Juliet não sabia onde enfiar a cara, Alex olhava para ela a todo instante. Preciso perguntar. — Alex, como acha que estou? — Mudada. — Eu me referia à aparência. Mas, como assim, mudada? — Você não frequentava lugares assim antes, não tinha essas amizades... Não bebia. — Eu não bebi! — E não mentia também... Droga! — Ah, não fale assim comigo! Não conte a ninguém! Por favor. — Sua voz histérica tornou-se mais normal, como se fosse um apelo. — Não conte a ninguém, Alex, se você é realmente meu amigo, não fará isso, está bem? O silêncio pairou por todo o percurso. — Está entregue — disse ele, sério, quando chegaram. — Prometa que não contará a ninguém! — Prometo. Aliás, não precisarei dizer nada. A mancha no seu vestido denuncia... Desde quando gosta de beber licor de menta? — Ele havia sentido o indiscutível aroma.  Droga, agora que eu vi que manchei meu vestido... e não tenho mais como me limpar! — Agora entre, senhorita. Será melhor, pois terá se atrasado apenas seis minutos. São 1h06. Que desaforo! — pensou ela. — Olha aqui, Alex! Quem você pensa que é? n******e falar assim comigo. Não quero que cuide de mim, eu não preciso de... — Uma e sete, senhorita. — Ah! — Ela bufou e saiu do carro. Invadida por uma tristeza momentânea, ela se pegou pensando: O que meus pais diriam se me vissem assim? Mas, por outro lado, ela não estava arrependida, pois tinha se divertido bastante e isso a deixava bem. Seu tio ainda estava acordado, acompanhado de sua fiel escudeira, Abilene. Juliet levou sermão sobre ingerir bebida alcoólica, e o velho Augusto terminou dizendo: — Concluo que você não deva mais ir a essas festas. Você é uma pessoa tão boa... Não deve estar em certos lugares, com certas pessoas... Ele disse isso mesmo? — Tio, não fale assim de meus amigos, são todos bons. São estudiosos, esforçados, trabalhadores. São pessoas do bem... — Não concordo que saia de casa dessa maneira. É perigoso lá fora. Uma discussão-de-gente-velha se seguiu, e Juliet informou: — Pois muito bem. Concordo! É perigoso lá fora. Sendo assim, trarei meus amigos para cá. * * * * * Depois da conversa, o silêncio gritou mais alto, e isso deu brecha para Augusto comentar sobre a ligação que havia recebido de sua irmã, Valéria.  — É mesmo? E como a tia Valéria está? — perguntou Juliet. — Agora me parece que está bem. De alguns anos para cá, ela andava muito preocupada com o filho, que havia se envolvido com marginais, mas me ligou para dizer que ele mudou drasticamente há alguns meses e que está focado nos estudos. Até viajou para fazer intercâmbio. Eu não acredito muito em mudanças abruptas de personalidade, mas o que importa é que ela está bem. — Realmente é o que importa — disse Juliet, contente pelo desvio no rumo da conversa, que durou por mais alguns minutos. Logo foram se deitar. * * * * * Antes de dormir, Juliet gastou o tempo com reflexões.  Como é bom ter amigos... Como é bom se divertir... Adorei aquele licor, é maravilhoso... Não me arrependi de nada... Quero que seja sempre assim, e quando eu acordar... E dormiu, sem saber que só viveria por mais um dia.
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