O adeus ao monstro

1452 Words
— Você não teria coragem — disse ele, com a voz trêmula. — Quer apostar? — respondi, mantendo a arma apontada para o chão. Naquele instante, ouvi o som das sirenes da polícia se aproximando. Ricardo olhou para os lados, em pânico, e então correu para longe da minha porta, desaparecendo no corredor. Aliviado, abri a porta e vi Leila parada na sala, com o telefone na mão e o rosto pálido. — Eles já estão chegando — disse ela, com a voz trêmula. — Ótimo — respondi, guardando a arma. — Agora vai ficar tudo bem. A sirene da polícia se aproximava cada vez mais, ecoando pelos corredores do prédio. Senti um misto de alívio e adrenalina. O confronto havia terminado, pelo menos por enquanto, mas a tensão ainda pairava no ar. Leila continuava pálida, com o telefone ainda na mão, os olhos fixos em mim. — Eles já estão chegando — repetiu ela, a voz ainda tremendo. — Eu sei — respondi, colocando uma mão em seu ombro, tentando tranquilizá-la. — Vai ficar tudo bem agora. Poucos segundos depois, dois policiais chegaram ao meu andar, com as armas em punho. Eles me viram na porta e se aproximaram rapidamente. — Senhor, o que aconteceu aqui? — perguntou um dos policiais, com a voz firme. — Tentativa de invasão — respondi, apontando para a porta, que ainda mostrava as marcas dos chutes de Ricardo. — O ex-namorado da minha… amiga tentou arrombar a porta. Expliquei a situação rapidamente aos policiais, mostrando as marcas na porta e contando sobre as ameaças de Ricardo. Leila confirmou minha versão dos fatos, ainda muito abalada. — Ele estava armado? — perguntou um dos policiais. — Não, eu o dissuadi com a minha arma — respondi, mostrando minha identificação de policial. Os policiais assentiram, aliviados por eu ser um m****o da corporação. Eles examinaram a porta e conversaram entre si por alguns instantes. — Vamos fazer uma busca na área — disse um dos policiais. — Precisamos localizá-lo o mais rápido possível. — Ele fugiu assim que ouviu as sirenes — expliquei. — Provavelmente já deve estar longe daqui. — Mesmo assim, precisamos fazer uma busca — insistiu o policial. — Vamos registrar um boletim de ocorrência. Vocês dois precisam ir à delegacia prestar depoimento. Assenti, concordando com a necessidade do registro. Agradeci aos policiais pela rápida resposta e voltei para dentro do apartamento com Leila. — Precisamos ir à delegacia — disse a ela, com um suspiro. — Vai ser rápido. Leila assentiu, ainda visivelmente abalada. Pegou sua bolsa e fomos juntos para a delegacia. Na delegacia, prestamos depoimento sobre o ocorrido. Leila descreveu o relacionamento abusivo com Ricardo e as ameaças que ele vinha fazendo. Eu relatei a tentativa de invasão e mostrei minha identificação de policial. Os policiais registraram o boletim de ocorrência e nos garantiram que fariam o possível para localizar Ricardo. Após os depoimentos, voltamos para o meu apartamento. Leila estava exausta e visivelmente traumatizada. — Acho melhor você ficar aqui mais alguns dias — sugeri, assim que entramos no apartamento. — Até que a polícia o encontre ou até que você se sinta segura para voltar para sua casa. — Eu não sei o que faria sem você, Henry — disse Leila, com os olhos marejados. — Você me salvou. — Não precisa agradecer — respondi, colocando uma mão em seu ombro. — Eu só fiz o que era certo. Naquele momento, percebi que a situação havia criado um laço entre nós. Um laço forjado pela tensão, pelo medo, mas também pela proteção e pelo cuidado. Eu não sabia o que o futuro nos reservava, mas sabia que faria o possível para proteger Leila, não apenas como um policial, mas como um amigo. A partir daquele dia, minha vida havia mudado. E a dela também. Naquela noite, a escuridão se tornou minha cúmplice. Vesti preto, calcei luvas e me preparei para o que tinha que ser feito. Leila dormia profundamente, alheia à tempestade que se formava. Eu precisava protegê-la, custasse o que custasse. Ricardo era uma ameaça constante, uma sombra pairando sobre nós. A lei falhou em detê-lo, então eu tomei a justiça em minhas próprias mãos. Com movimentos calculados, me movi pelas ruas desertas até a casa de Ricardo. A adrenalina pulsava em minhas veias, misturada com uma frieza que eu nunca havia sentido antes. Arrombei a porta dos fundos sem hesitar. Ricardo roncava em seu sono profundo, completamente vulnerável. Um nó se formou em minha garganta, mas eu não podia vacilar. Sufocá-lo com o travesseiro foi mais fácil do que imaginei. A vida se esvaiu de seus olhos em questão de segundos. Enrolei o corpo em um lençol velho e o carreguei até meu carro. Dirigi até uma área isolada na zona rural, um lugar que eu conhecia bem. A fogueira crepitou sob o céu estrelado, consumindo o corpo de Ricardo e apagando os vestígios de minha ação. O cheiro de carne queimada impregnou minhas roupas, um lembrete constante do que eu havia feito. Voltei para casa antes do amanhecer, exausto, mas com uma sensação de dever cumprido. Leila continuava dormindo, um anjo alheio à escuridão que eu havia enfrentado por ela. Tomei um banho demorado, esfregando a pele até sentir que o cheiro de fumaça havia sumido. Precisava estar impecável, como sempre. Afinal, eu era um delegado. Nos dias seguintes, agi como se nada tivesse acontecido. Compareci ao trabalho normalmente, conduzi investigações, conversei com meus colegas. Ninguém suspeitou de nada. Eu conhecia o sistema por dentro e por fora. Sabia como plantar provas, como desviar o foco, como garantir que nenhuma pista me ligasse ao crime. Leila notou o sumiço repentino de Ricardo. Perguntou se eu sabia de alguma coisa, e eu apenas dei de ombros, com um ar de mistério. Ela pareceu aliviada com o desaparecimento dele, mesmo que um pouco confusa. Eu a observei de perto, certificando-me de que nenhum resquício daquela história a alcançasse. O peso do segredo me acompanha a cada dia. Sei que o que fiz foi errado, mas em minha mente, foi a única solução. Eu protegi Leila, e isso é o que importa. O fantasma de Ricardo pode me assombrar nas noites escuras, mas seu nome nunca mais sairá dos meus lábios. Ele se foi, e Leila está segura. Esse é o meu fardo, e eu o carregarei sozinho. Os dias se transformaram em semanas, e as semanas em meses. A vida seguiu seu curso, aparentemente normal. Leila aos poucos retomou sua rotina, o medo dando lugar a uma cautelosa sensação de alívio. Ela me agradecia com frequência, por tê-la ajudado, por tê-la abrigado. Eu aceitava os agradecimentos com um sorriso calmo, enquanto o peso do meu segredo se acumulava em meu peito. No trabalho, continuei a ser o delegado exemplar, resolvendo casos, ganhando promoções. Ninguém jamais suspeitaria da escuridão que se escondia sob minha fachada. Eu me tornei um mestre na arte da dissimulação, separando meticulosamente minha vida pública de meu ato secreto. Às vezes, durante a noite, o rosto de Ricardo surgia em meus sonhos. Seus olhos vazios me encaravam, acusadores. Acordava em um sobressalto, o coração batendo forte, o corpo coberto de suor. Mas, com o tempo, até mesmo esses pesadelos se tornaram menos frequentes, como se minha mente estivesse se adaptando à nova realidade. Leila começou a sair mais, a se encontrar com amigos, a reconstruir sua vida. Eu a observava de longe, feliz por vê-la sorrir novamente. Um dia, ela me convidou para jantar em um restaurante. Aceitei o convite, um pouco hesitante no início. Durante o jantar, conversamos sobre tudo, menos sobre Ricardo. Era como se ele nunca tivesse existido. Naquela noite, enquanto a levava para casa, Leila me olhou com um brilho diferente nos olhos. — Henry — disse ela, com a voz suave. — Eu… eu queria te agradecer mais uma vez. Por tudo. Você foi incrível comigo. — Não precisa agradecer — respondi, desviando o olhar. — Eu só fiz o que era certo. Ela se aproximou e me deu um beijo na bochecha. Um beijo demorado, que me fez sentir um arrepio percorrer o corpo. — Você é uma pessoa muito especial, Henry — sussurrou ela. Naquele momento, senti uma pontada de culpa me atingir. Eu havia cometido um crime terrível, e agora estava recebendo afeto e gratidão por isso. A ironia da situação era quase insuportável. Com o passar do tempo, a relação entre nós se intensificou. Os jantares se tornaram mais frequentes, os passeios, os encontros casuais. A atração entre nós era inegável, mas eu me mantinha cauteloso. O segredo que eu carregava era uma barreira invisível entre nós, uma sombra que pairava sobre cada momento de i********e.
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