Assim que passámos os portões tive a confirmação de que algo não estava certo. Olhei em redor, assim como Emily e Eliot, avançando com cuidado enquanto o fazia, procurando por um sinal de que Dylan estava ali. Ao chegarmos à porta os guardas começaram a entrar com cuidado no pequeno palácio, ao que lhes imitámos o gesto, sendo surpreendidos pela total ausência de vida no espaço.
- Vamos subir – afirmou Eliot, confiante, virando-se para os guardas. – Entretanto verifiquem as masmorras, quem sabe o que encontrarão.
- Tens a certeza de que queres continuar Laila?
- Não, mas não posso passar o resto da minha vida a esconder-me. – Segui Emily em direcção ao primeiro andar, passando por estátuas e quadros que nunca reparara durante a minha estadia naquele lugar.
Entrámos em várias salas, encontrando-as totalmente vazias: as mobílias estavam limpas, as janelas abertas e os tapetes impecáveis, como se Dylan e Sloan esperassem receber visitantes, deixando-me apavorada com a ideia de poderem estar à nossa espera.
- Eles têm de estar aqui! Onde mais iriam? – Abanei a cabeça em resposta à minha prima, dirigindo-me à janela mais próxima e olhando para o exterior.
- Majestades, sua alteza, encontraram um prisioneiro nas masmorras. – Assustada pelo guarda saltei do lugar onde me encontrava, sacando da espada ao mesmo tempo que me virava para a voz. – Peço desculpa se a assustei princesa Laila.
- Não faz m*l – respondi, ainda com o coração aos saltos. – Quem acharam?
- Não tenho a certeza alteza, só me disseram que era uma mulher e que está muito debilitada.
- Vamos até lá. Enquanto isso explorem o próximo piso, embora não ache que nem o Dylan nem o Sloan estejam por cá. – Emily olhou para o marido, visivelmente preocupada, começando a se mover para fora da sala instantaneamente.
- Como queira majestade.
Descemos rapidamente em direcção às masmorras, dando de caras com alguns guardas que debatiam o que deviam fazer em r*****o à prisioneira. Assim que perceberam a nossa presença Eliot perguntou de quem se tratava, ouvindo em resposta aquilo que nenhum de nós esperava.
- n******e ser… Porque estaria ela presa?
- A carta deveria ter um fundo de verdade – atalhou a minha prima, dirigindo-se a mim. – Se a Ebony está aqui encarcerada e maltratada é porque têm alguma coisa contra ela. – Não falei enquanto Emily debatia o assunto com Eliot, entrando nos meus próprios pensamentos por alguns minutos, só percebendo que a minha prima me chamava quando me agarrou carinhosamente na mão direita. – Eu sei que estás abalada Laila, mas ela não deixa de ser tua mãe. Vens comigo? – Olhei em redor, reparando que os guardas se tinham afastado e que Eliot desaparecera da nossa vista. Suspirando assenti, seguindo-a para dentro da cela.
- Ebony? – Não consegui olhar para Emily, pois ficara petrificada ao ver aquela mulher acenar afirmativamente. Preparava-me para abandonar aquele lugar quando a minha prima me agarrou o braço. – Espera Laila, tu querias saber o que realmente se passou, não podes ir embora agora! – Anui, sem saber ao certo o que fazer.
- Laila…?
- Sou eu – respondi a Ebony com certa aspereza.
- Tu és a Laila… Tu és a minha filha!
- Infelizmente – atalhei, com rancor. Emily largou-me, passando a falar-me em pensamento.
“Ouve-a. A verdade nem sempre é aquela que nos contaram.” – Suspirei, pedindo-lhe para que saísse, sem fechar a minha mente pois não achava possível passar por aquilo totalmente sozinha.
- Não sei o que te revelaram acerca de mim, mas muito do que escutaste não deve corresponder com a realidade.
- Então deixe-me adivinhar: não se casou com o Sloan, não é mãe da Brook e do Keith, nunca quis fazer m*l a ninguém como me fez a mim…
- Eu nunca te quis m*l, tens de acreditar em mim! – Desviei o olhar, demasiado constrangida pela situação. – O Ernest nunca teria encontrado forças para te levar se não tivesse visto o meu desespero para te salvar, Laila.
- Para me salvar de quem? – Embora a resposta me parecesse óbvia queria ouvi-la de Ebony.
- Do Sloan. Eu já havia perdido a Brook e o Keith para as trevas, não queria que tivesses o mesmo destino.
- E porque devo acreditar nisso?
- Porque é a verdade!
“Devias tentar conversar com ela, Laila.” – O pensamento da minha prima não estava de acordo com os meus sentimentos e foi isso que lhe respondi. – “Olha para ela. Não lhe resta um pingo de magia no sangue, não te pode fazer m*l e, no estado em que está, duvido muito que o consiga fazer.” – Suspirei, cedendo à sua sugestão.
- Vou-lhe dar uma oportunidade de me contar a história toda, uma oportunidade apenas. Após isso decidirei o que fazer.
- Não precisarei de mais do que isso. Se tiver de morrer estou preparada. Já te conheci, era tudo o que eu queria.
- Deixe-se de sentimentalismos, não necessito disso. – Ebony suspirou, começando a relatar os factos no instante seguinte.
- Na altura em que conheci o Sloan eu era muito ingénua. Sabia perfeitamente que o seu pai aterrorizava Cyon há anos, mas para mim ele era diferente, como se fosse um escape na minha vida tediosa. A minha família nunca aprovou o nosso relacionamento, avisando-me várias vezes que me iria arrepender, o que aconteceu no exacto momento em que me casei.
- Como é que foi tão estúpida a ponto de não ver a realidade?
- Ao contrário de ti, Laila, eu cresci numa pequena aldeia, sem conhecer muito do que me rodeava. Obviamente sabia da guerra e de quem a provocava, mas naquela altura os governantes eram muito vagos a relatar as suas preocupações, o que me fez pensar que Sloan não era uma ameaça.
- Mas foi…
- Sim, a partir do nosso casamento, como eu estava a dizer. De alguma forma ele encantou os nossos votos, de maneira a poder roubar a minha magia, o que tu, infelizmente, já sabes o que faz ao nosso corpo. – Assenti, sem grande compaixão. – Não vou falar noutros acontecimentos, acho que podes ter uma ideia, o facto é que consegui fugir passados treze anos.
- Como? Eu não estava presa numa cela e foi dificílimo para mim fugir.
- Tinhas as atenções voltadas para ti, no meu caso elas estavam na Brook e no Keith. O Sloan estava demasiado ocupado a treiná-los, então esquecia-se de me retirar os poderes, que foram voltando aos poucos. Quando tive uma oportunidade para escapar, aproveitei-a.
- E ele não deu por isso?
- Penso que levou alguns dias a dar-se conta, mas naquele momento tinha coisas mais importantes para fazer do que me procurar. – Ebony mexeu-se lentamente, gemendo a cada movimento. – Acho que pensou que eu voltaria, já que a minha fama no reino, embora não correspondesse com a realidade da minha vida, me seguiria para onde quer que fosse.
- Então fugiu e encontrou o meu pai…
- Dias depois, sim. Eu era só pele e osso, m*l me mantinha em pé. Ele ajudou-me enquanto lutava com a sua própria dor, e eu mais uma vez fui ingénua e deixei-me levar, acreditando que tudo poderia mudar. – Preparava-me para interromper, mas ela não me deixou. – Dois meses depois soube que engravidara, o que me deixara profundamente feliz, embora tudo se tenha complicado quando estavas prestes a nascer. Sloan decidira ir atrás de Ernest devido a ele ser da realeza, o que nunca me havia contado. Nessa altura ele já andava à minha procura, apesar de conseguir roubar a minha magia à distância, pelo que me tornei um alvo fácil. Ele descobriu-nos, lutou com o teu pai, perdendo, pois os treinos com os meus filhos deixavam-no esgotado, e ficou a saber que eu estava grávida. Com toda a agitação da luta eu entrei em trabalho de parto e tu nasceste horas depois.
- Se derrotaram o Sloan no combate porque é que não se voltaram a esconder?
- Já deves ter ouvido dizer que o Sloan é o mestre das artimanhas.
- Sim, mas continuo sem compreender porque não fugiram.
- Eu estava demasiado fraca devido ao parto, além de ter sido enfeitiçada pelo meu marido durante o combate, o que impossibilitava de sair do local onde estava. Quando reparámos nisso eu percebi que se te quisesse a salvo teria de te deixar ir. O Ernest estava demasiado fraco para outro confronto e o Sloan só precisava de tempo para retirar alguma energia aos gémeos. – Não tive como não me lembrar da história de Emily, tão parecida com aquela. – Implorei ao Ernest que te levasse e escondesse e, embora ele não me quisesse deixar sozinha, cumpriu o meu d****o.
- E levou-me para o palácio.
- Exactamente. O último lugar onde Sloan iria procurar por ser tão óbvio e que a Brook e o Keith pensaram ser óptimo para procurar assim que souberam da história. Por anos o Sloan tentou que eu lhe dissesse onde estavas mas felizmente eu não sabia, ou terias sido obrigada a ter o mesmo destino dos teus irmãos.
Apesar de perceber o porquê de Emily querer que eu ouvisse tal relato, algo em mim dizia que poderia viver sem saber a história que ainda não conseguia considerar verdadeira. Pelos meus pensamentos, pedi à minha prima que mandasse alguns guardas para a cela, sem responder às suas perguntas, e ergui o escudo mental, não sabendo se a minha decisão estaria certa. Assim que quatro guardas apareceram mandei levarem Ebony para o palácio. Três deles saíram, carregando-a, enquanto o último me perguntava onde deveriam coloca-la.
- Peçam à Eileen que arranje um quarto, mas mantenham alguns guardas a vigiá-la. Quero que ela seja vista por um médico e que descubram se é verdade que não tem mais poderes. – O guarda fez-me uma vénia e saiu, deixando-me só por alguns segundos, pois Emily voltara para perto de mim.
- Como te sentes?
- Não sei – retorqui com sinceridade. – Não sei se consigo lidar com tudo isto Emily.
- Já lidas-te com coisas bem piores, não te deixes ir abaixo por causa da Ebony.
Abracei-a, simplesmente abracei-a. Naquele momento não sabia o que pensar nem o que sentir, mas aquele abraço acalmava-me. A minha prima não me largou até que eu estivesse mais calma, deixando-me grata por aquele carinho.
- Há mais uma coisa que precisas de saber – adiantou, antes que eu saísse da cela. – Encontrámos o Cole.
- E só agora é que me dizes? Como é que ele está?
- Por incrível que pareça está muito bem. Devem tê-lo deixado quando saíram.
- Leva-me até ao meu sobrinho, por favor. – Comecei a andar, mas Emily agarrou-me o braço, não me deixando continuar.
- Tenho um mau pressentimento, Laila.
- Ele é uma criança, que m*l pode nos fazer?
- Não sei, mas terem cuidado dele e agora o abandonarem sem mais nem menos é estranho. Estão neste momento a examiná-lo.
- Para o fazerem a tua suspeita é forte…
- Existe uma maneira de quebrar a minha barreira. – Aquela revelação deixou-me em choque. – Ninguém pode entrar sem ordens minhas ou do Eliot, mas se algum de nós levar alguém para dentro da fronteira que tenha sido alvo de um encantamento de quebra a barreira desfaz-se.
- Eu mandei a Ebony para o castelo!
- Eu sei, mas ela nasceu em Cyon, n******e transportar tal feitiço, portanto não é uma ameaça, tal como todos os cidadãos que estão sob o controlo do Dylan – respondeu cheia de certeza.
- Mas o Cole é? – Emily soltou-me, avisando-me para ter cuidado.
Dirigi-me para o quarto do meu sobrinho, recordando o que passara naquele sítio a cada passo que dava. Assim que o encontrei percebi o porquê de tantas desconfianças acerca de Cole. O menino estava muito limpo, bem vestido e alimentado, assim como bem-educado, o que não era de todo o que eu esperara encontrar. Três homens rodeavam-no: um guarda cujo nome não me lembrava, Eric que o estava a observar, e Eliot.
- Ainda bem que estás aqui.
- O que descobriram, Eliot?
- Vem comigo. – Segui-o para fora da divisão, ansiosa. – Confirma-se, o Cole é uma isca para nós.
- Conseguem reverter o feitiço?
- Talvez tu e a Em sejam capazes, é necessário utilizar muita energia. Porém, se o conseguirem, teremos de regressar a Cyon imediatamente.
- Porquê? Nada nos impede de continuar…
- Desconfio que o Dylan tenha previsto que viríamos. Porque outra razão estaria apenas o teu sobrinho no castelo?
- Talvez o Dylan se tenha fartado de ter uma criança por perto…
- Ele não ia perder uma oportunidade de te chantagear Laila, sabes bem disso, e não me parece que ele achasse que levaríamos o Cole sem o examinarmos antes. Há algo que não faz sentido nesta história, mas posso apostar que ela não acaba aqui.