Muitas pessoas acreditam em sinais e eu estava começando a acreditar. Talvez eles tenham chegado até mim muito antes de que eu pensasse na existência deles, mas já é tarde para tentar lembrar.
Do que eu me lembro era de uma manhã há alguns anos atrás, quando ainda estava no ensino médio, em que eu tinha perdido a minha carteirinha estudantil. Na verdade, eu a perdi centenas de vezes, mas a daquele dia foi início de uma nova vida, porque tudo tinha mudado a partir de então, especialmente eu.
- MÃE, VOCÊ VIU MINHA CARTEIRINHA? - gritei desde meu quarto
Droga, de novo não! Odiava perder as coisas, mas ainda mais a carteirinha, porque sem ela tinha que assinar o papel na secretaria e a secretária iria me olhar com a cara fechada e dizendo, de novo, que logo eu levaria uma suspensão. É sempre assim.
- EU NÃO VI. VÁ LOGO, VOCÊS NÃO PODEM SE ATRASAR PARA O PRIMEIRO DIA.
Primeiro dia depois das férias de inverno, isso não conta.
Eu odiava aquele lugar, eu não tinha muitos amigos, na verdade apenas uma, Isabella e ela era próxima de quase todos do colégio, assim também não conta. Mas, no ano passado tudo foi h******l, todos zombavam com todos, até os professores eram alvos de bullying, eu não era diferente.
- MILENA, EU VOU SOZINHO SE VOCÊ NÃO DESCER AGORA - Leo falou.
Leo é meu irmão mais velho, por apenas um ano. Nós não nos damos tão bem quanto eu gostaria, mas ainda assim, é meu sangue e portanto, eu o amo. Mas, isso fica entre nós, não quero que ele saiba.
Desci as escadas correndo.
- Tchau mãe - falei.
- Tchau, boa sorte - ela respondeu.
O Leo abriu a porta e começou a me encarar com pressa.
Eu finalmente saí.
- Ei, Mi. Não se esqueça que eu não te conheço no colégio. - ele disse.
- Você continua com vergonha de mim? - falei.
- Não é vergonha, é só que você não tem muitos amigos, sabe?
- Você só quer que eu seja amiga da Bruna, para que você finalmente possa ficar com ela - falei de gozação.
- Cala boca e continua andando.
- Relaxa, eu não vou falar para ninguém que também sou uma Meneses. Ah e só porque você é mais velho não significa que pode me mandar calar a boca.
Nós permanecemos em silêncio pelo resto do caminho, acho que ele não queria uma discussão de verdade.
Quando finalmente chegamos no colégio, ele passou pela catraca tranquilamente, porque ele carregava a carteirinha dele. Mas eu estava na frente daquele papel de presença.
-Outra vez senhorita Meneses? - Fátima, a secretaria, falou.
- Pois é, por vezes acho que minha carteirinha foge de mim.
Ela ficou quieta.
Naquele papel tinha mais um nome de alguém da minha sala, Adam. Esse era novo...
- Você vai ficar de suspensão logo - Fatima completou e eu dei um sorriso envergonhado para ela.
Passei a catraca e segui até a minha sala, 1° ano A. Era uma sala normal que acomodava cerda de 40 pessoas, bem e agora mais uma.
Ainda faltava algum tempo para a aula começar, então peguei meu livro que estava quase no fim.
- Fazendo meu filme? - Isa falou se aproximando de mim.
- Pois é - respondi - estou amando.
- Sim, eu já li a série inteira, muito boa. Como foi de férias?
- Eu viajei para o litoral, e você?
- Eu passei de recuperação em recuperação, sinto saudades do fundamental. Não tinha nada dessa história de química ou física.
- Se quiser eu te ajudo nos estudos - falei.
- Não precisa, meu pai contratou um professor particular - ela respondeu - eu já volto, vou dar um oi para a Giovanna que acabou de chegar, a gente se vê Mi.
- Ok.
Ela saiu e eu peguei o meu bom e velho amigo livro.
" Nesta sala de embarque, eu não sei o que vai acontecer de agora em diante, apenas que - neste momento, este é o melhor final feliz que eu poderia escolher para mim. " Paula Pimenta, Fazendo meu filme.
Eu não acredito nesse final, como pôde fazer isso comigo? Como eu me recupero? Assim não dá.
Mas espera, o professor está demorando demais.
Parecia que ele tinha me ouvido, já que segundos depois chegou na sala.
- Desculpem a demora gente, como é bom vê-los de novo. Sentiram saudades, né? Por favor não partam meu coração.
Ele disse tarde, porque a sala respondeu com um belo não e depois todos riram.
- Vou me lembrar disso na prova - o riso se repetiu - epa estou vendo um rosto novo por aqui, qual é seu nome rapaz? - o professor disse apontando para o garoto novo que sentava na minha frente.
- Adam, mas não sou tão novo assim.
Eu fiquei um tanto confusa com a resposta, eu não entendi o que ele quis dizer com isso.
- Mas enfim, cá estou eu de novo no inferno - continuou.
O professor deu de ombros para o comentário dele e deu início a aula de geografia.
- Que garoto positivo - sussurrei para mim mesma, mas ele escutou.
Ele se virou, olhou em meus olhos e disse:
- Eu só não me dei muito bem aqui.
- E você já se deu bem em algum lugar? - falei.
Ele sorriu.
- Bem, eu acho que não. Você é esperta, como conseguiu perceber isso?
- É que eu acho que você é como um livro aberto demais.
Ele analisou a resposta passando os olhos sobre a minha mesa e esses pararam ao ver o meu livro.
- Pelo que vejo você gosta de livros.
- Eu adoro, mas nem todos chamam a minha atenção.
- E eu consegui chamar a sua?
- E qual é a sinopse?
- Um garoto que fará de tudo para te ter. Você vai querer ler?
- Não, mas obrigada pela oferta.
- Por que?
- O clássico clichê que todas conhecem o final. Não parece uma leitura interessante.
- Mas, às vezes não vale a pena ler um clichê?
- Só se for de qualidade.