CAPÍTULO 01

2436 Words
CARMIN Me visto adequadamente para a entrevista de emprego. Faz alguns meses que eu não trabalho, desde que deixei o antigo emprego na Mundial Global. Foi a última emprega grande que pretendo trabalhar por um tempo, tudo que quero é um salário que seja suficiente para manter a mim e minha mãe. Por um tempo precisei de folga, de um pouco de descanso físico e emocional. Mas agora está na hora de ir a luta. Desde a faculdade de design venho trabalhando em grandes empresas, primeiro o estágio nas Indústrias Smooklife que se tornou efetivo e depois na empresa da mãe do Christian Patt. Vim economizando desde o estágio e com um tempo consegui comprar um carro, uma casinha longe da capital para minha mãe descansar e um apartamento pequeno para mim na cidade – Preciso ficar perto dos empregos. Sim, o salário era ótimo. Também consegui economias que nos ajudaram até aqui, mas agora preciso dessa contratação para conseguir manter nossa estabilidade. Cresci vendo minha mãe trabalhar como doméstica. Felizmente os chefes dela sempre foram ótimas pessoas. Primeiro ela ficou anos na casa da Sr. Beatrice e só saiu de lá para... Respiro fundo enquanto seco meus cabelos em frente ao espelho do banheiro e acabo não consigo segurar meus pensamentos, que viajam até anos atrás. O último chefe da minha mãe, Romeo Montanari. Depois da partida do Romeo, minha mãe não pôde arrumar outro emprego. Não que ela não quisesse, é claro, mas ela precisou dedicar todo seu tempo para mim. Foi um período difícil, as vezes não tínhamos nem o que comer já que nenhuma de nós estávamos empregadas – o que na época não fazia diferença para mim. Nada fazia falta. Nada além dele. Flashback on ~ — Não! Por favor, não! Não vá embora! Não pode me deixar assim... — Estendo a mão tentando toca-lo. — Romeo! — Filha? Minha filha! — A voz da minha mãe se mistura. Não consigo distinguir nada, nem pensar. — Você está alucinando de novo. Carmin, meu amor? Está ardendo em febre e tremendo. Meu Deus, nos ajude... — Eu não posso mais viver... Não posso... — Não diga isso! Por favor, não diga isso, minha vida! — As palavras de minha mãe são como um pedido bem longe. — A mamãe está aqui. Eu não vou a lugar nenhum, está bem? Só espere um pouco. Meu corpo parece flutuar, por um tempo não ouço nada e depois sinto uma aproximação novamente. Meu coração bate num ritmo acelerado, meu corpo está úmido e eu pareço estar me mexendo demais. Pisco os olhos. — Romeo. — Chamo o nome dele e estico minha mão novamente. Dessa vez não fico com ela estendida, mas recebo o toque que eu precisava. — Promete que não vai mais embora? Por favor... — Lágrimas escorrem e eu tremo em desespero. — Você vai ficar comigo, não vai? — Sim, estou aqui. Nada vai te acontecer, vou cuidar de você. — Começo a me acalmar, os tremores vão diminuindo. — Essa compressa de água vai ajudar a diminuir a febre e as alucinações vão embora. Logo vai passar, confie em mim. Flashback off ~ Por quase um ano eu tive febres altas a ponto de ter inicio de convulsões. Meu corpo suava frio, eu tinha alucinações, não importava a hora e vinha sem aviso. Eu não conseguia comer ou levantar da cama, não podia ficar sozinha e por isso minha mãe não pôde arrumar um emprego. Apesar das dificuldades, ela ficou ao meu lado todos os dias até eu ir me recuperando. Ela é minha vida e a única em que posso confiar. Após tanto tempo sem comer, eu perdi alguns quilos. Não era mais acima do peso, não tinha mais uma vida, não sabia mais quem eu era. Então, eu decidi que teria que me reinventar. Comecei uma alimentação melhor, corria todas as manhãs, fiz visitas a salões de beleza e após tirar o aparelho e os óculos, eu retomei a minha vida. Terminei a faculdade e depois daí tudo andou. Tive meu próprio dinheiro para a minha nova eu e para dar um conforto a minha mãe. Ela não é mais tão jovem e agora pode descansar em sua casinha, é a minha vez de cuidar dela. Seria pouco dizer que Romeo Montanari quebrou meu coração. Quando algo está quebrado é possível juntar suas peças, cola-las uma por uma mesmo que dê trabalho ou demore um pouco. Mesmo que não vá ficar igual pelo menos existe. Romeo não deixou peças para serem coladas, nada que pudesse existir. Ele simplesmente roubou meu coração, ele mesmo arrancou do meu peito e levou consigo. Eu vivo por minha mãe, eu estou de pé, mas é como se... Eu fosse apenas uma máquina programada e se algo falhar eu vá desabar novamente a qualquer momento. Eu não posso falhar, não posso. Não tenho mais dezoito anos, não posso ser uma menina apaixonada por um homem que nunca me amou. Eu tenho que seguir em frente. O pior de tudo é não poder culpa-lo. Não, Romeo não teve culpa alguma, ele foi a maior vítima dessa história. Eu o amei por anos, em segredo. Também era impossível não ama-lo. Romeo é carinhoso, gentil, daria a própria vida pelas pessoas que ama e principalmente pela família. Sempre se preocupou até com quem não conhecia, com os empregados da casa e da empresa, ele não machucaria nem mesmo uma folha de árvore. Romeo é o melhor homem que eu já conheci e também o mais bonito. Seus cabelos negros que brilhavam mais que as estrelas e estavam sempre bem cortados, caindo sobre os olhos porque eram lisos demais para ficar de pé mesmo que ele penteasse mil vezes. Os olhos... Era apenas ele olhar para fazer as pernas de qualquer uma sumir, com sua força e seus cílios longos e negros. O corpo atlético, forte, que mesmo sem tocar você sabia que era duro como uma pedra – E meu pior erro foi desejar toca-lo. Para completar... aquele sorriso, aquelas malditas covinhas. Eu era uma adolescente desajeitada, filha da empregada. Romeo era um homem feito, era encantador, iluminava o mundo com seu sorriso e sua gentileza. Ele nunca me viu da forma que eu o via, eu era apenas uma garota que ele cuidava e apoiava. Para ele eu era uma menina travessa como seria uma filha dele, por isso ele me dava atenção. Mas para mim, receber atenção de Romeo Montanari era um sonho. Quem era eu para pedir que ele ficasse? Eu não era ninguém. Após um café da manhã reforçado e terminar de ficar pronta eu dirijo até a D’Mage. Chego no horário e após alguns minutos na recepção sou chamada para a entrevista. — Você tem todas as qualificações, Srta. Guttierrez. Pedimos nível superior e experiência. Você tem a graduação numa faculdade muito boa por sinal. — Olívia é a dona da empresa e ela mesma está fazendo as contratações. Na verdade eu entendo, a D'Mage é uma empresa pequena e ela não tem tantos funcionários, acredito que nem mesmo tenha um setor de RH já que ela está cuidando pessoalmente disso. Sua sala é pequena e ela tem uma secretária que pelo que notei deve ser também sua assistente. É uma empresa exatamente como eu queria, pequena, poucos empregados e eu vou apenas fazer algumas criações no computador se contratada. — Sim. Eu ganhei um bolsa integral, por isso consegui cursar lá. — Explico. Olívia é jovem, acredito que na faixa dos trinta e já tem sua própria empresa. Não importa o tamanho, isso é f**a e ela deve se orgulhar. Estar perto de mulheres fortes é sempre bom para mim, é inspirador e me lembra da força que preciso ter para continuar olhando em frente. — Aqui cita duas experiências, Indústrias Smooklife e Mundial Global. Apesar da empresa do Dante ter falido logo após sua prisão, até um tempo atrás era uma das maiores empresa do estado. — Devo comentar que tive participação na prisão do meu antigo chefe e na falência da empresa dele? Melhor não. — Já a da Âmbar Patt, o nome já diz. É uma empresa global e com certeza você tinha salários enormes. Por que deseja trabalhar numa empresa que ainda é pequena? Por que gostaria de descer o nível? — Eu não chamaria assim, Srta. Olívia, de descer de nível. Na verdade eu considero valiosa toda e qualquer experiência profissional. Deve ter notado que eu mesma pedi dispensa, das duas grandes empresas como você chama. Apesar de tudo,e eu não encontrei em nenhuma delas o que eu procurava, mas estou pronta para encontrar aqui e também dar de meus conhecimentos para a D'Mage. — O que exatamente é isso que você procura? — Paz, claridade e verdade. Nenhum deles era um emprego normal e não foi para isso que eu me formei. Mas agora está na hora de eu ser uma designer de verdade. Se a senhora desejar, eu gostaria muito que fosse aqui. — Eu noto o sorriso em seu rosto e me animo. — Bem vinda a D'Mage, Carmin. — Me estende a mão. — E pode me chamar apenas de Olívia. — Tudo bem, Olívia. Não vai se arrepender, eu garanto. — Aperto sua mão. — Muito obrigada mesmo. — Você trouxe os documentos e a carteira de trabalho? Se sim, já pode deixar comigo e pegar amanhã se puder começar imediatamente. — Sim, sem problemas. Eu adoraria começar amanhã. — Já abro a bolsa, retiro os documentos e entrego a Olívia. Após me despedir, saio animada da D'Mage e mando uma mensagem para minha mãe avisando que consegui, tenho certeza que ela ficará muito feliz por mim. Ficar parada é perigoso para mim, pode trazer memórias que infelizmente ainda existem e a última coisa que eu preciso agora é pensar no Romeo. Eu tentei rastreá-lo para encontra-lo e saber se estava bem, mas nunca consegui, então acabei desistindo. Agora não vai ser bom para mim pensar em onde ele está. Mas onde quer que esteja, espero que esteja bem. Fico alguns minutos dentro do carro, ainda no estacionamento da empresa porque minha mãe viu a mensagem e acabou me ligando. Conversamos um pouco e ela me chamou para ir tomar café com ela hoje, inclusive me prometeu waffles – que é golpe baixo, já que os dela são os melhores. Me preparo para dar partida quando ouço gritos, gritos finos e doloridos. Olho ao redor tentando ver algo, o estacionamento é grande afinal são várias pequenas empresas nesse prédio e aqui parece um estacionamento de shopping. Também não é bem iluminado, por isso decido sair do carro ao perceber que os gritos continuam. Sigo o som chamativo. Não parece haver mais ninguém por aqui além de mim. Não desisto até achar o lugar de onde os gritos estão vindo, há um casal atrás de um carro. Observo afastada, nenhum dos dois notam minha presença. Mas como poderiam? O homem está de costas para mim, de pé, enquanto a mulher está no chão tentando se defender dele. — Por favor, pare. — A moça suplica escondendo o rosto. Entro em choque e por um momento cubro minha boca com a mão ao ver ele acertar um golpe forte em seu rosto, ignorando seus pedidos e acertando-a em cheio, sem piedade alguma. A moça volta a gritar e perde o apoio dando de cara com o chão. É uma loucura, mas não posso mais assistir isso. Meus instintos e a minha raiva me levam até eles. — Seu animal! — Chamo. — Saia de perto dela, agora! — Estamos resolvendo um problema e não é da sua conta. — Agora é! — Me aproximo mais, ficando frente a frente com ele. Olho a moça no chão, o corpo trêmulo e os olhos chorosos, o rosto ensanguentado e inchado. — Saia, ou vai ficar igual a ela. Ela é minha namorada e como eu resolvo meus problemas com ela sou eu quem decido. — Você pode tentar. — Paro entre os dois, ficando na frente da moça. — Por... Por favor... — A mulher faz força para falar, está bem machucada. — Nos deixe sozinhos. — Você ouviu o que ela disse. — Não vou a lugar algum, seu pedaço de merda. Mas você vai nos deixar em paz e vai embora daqui ou vai se meter em grandes problemas. Sou amiga de pessoas poderosas e se algo acontecer comigo, tenha certeza que você nunca mais vai mover nenhum m****o, o que eu adoraria ver. — Solto. — Encoste em mim e é a sua sentença de morte. Pode vir! — Sua p**a louca! — Levanta a mão e dou um passo a frente encarando-o. — Vai, pode bater! É assim que você se sente um homem, batendo em mulher? Você sente que isso aumenta sua masculinidade? Então vai, bem aqui. — Dou uns tapinhas no meu próprio rosto. — Quero ver se tem culhões. — Nós nos vemos em casa, Desirée. — Ele me lança um olhar feio, que retribuo e fico na mesma posição até ele ir embora. — Você está bem? — Me lanço ao chão e analiso o rosto dela. Desirée tem machucados nos supercílios, nos olhos, nas maçãs e boca. O sangue escorre pelo pescoço e o cabelo está bagunçado. A blusa de um tom creme está manchada de sangue e um pouco rasgada. Eu a ajudo a ficar de pé, que com dificuldade ela consegue e leva a mão até a altura das costelas. — Obrigada. — Geme de dor, segurando as lágrimas. — Mas não devia ter feito isso, quando eu chegar em casa a situação vai ser bem pior. — Quem foi que disse que você vai voltar para casa com aquele filho da p**a? Você vem comigo. Primeiro vamos a um hospital, está bem? — Caminhamos devagar até o carro, ela grita baixinho a cada passo que acaba se mexendo um pouco mais. Parece que o desgraçado quebrou alguma costela. Após acomoda-la direito no banco do carona e ajustar o cinto nela, vou para meu lugar e confiro o celular encontrando várias chamadas perdidas. Como minha mãe pôde me ligar umas cinquenta vezes desde que nos falamos há pouco? Me preocupo de início, mas acredito que não seja nada importante, talvez tenha esquecido algo para o café que infelizmente terei que cancelar. Com certeza não foi nada de r**m que aconteceu. Mas agora, tenho algo importante para cuidar primeiro antes de retornar as ligações. — Pronta? Vamos cuidar de você.
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