Ares
Ficou tudo muito bonito, do jeito que eu pedi, do jeitinho que sabia que ela iria adorar, e eu amava ver Jully com aquele sorriso bobo nos lábios.
– É até difícil de acreditar que você pode ser o mesmo i****a que eu vejo com frequência nos jornais, sabia? – Comentou, deitada ao meu lado enquanto assistíamos ao nosso filme de terror favorito pela milésima vez. – Quem daquelas mulheres poderia imaginar que Ares Bacelar poderia fazer algo desse tipo?
Ri suavemente, sempre gosto da maneira como ela me vê.
– Bem, o mundo adora rotular as pessoas. – Falei, mantendo o olhar fixo na tela. – Eles preferem a imagem que construíram de mim. Mas você, Jully, é uma das únicas pessoas que sabe que por trás dessa fachada tem alguém muito diferente.
Ela sorriu.
– Você sempre será o meu melhor amigo, Ares. As manchetes podem dizer o que quiserem, mas eu sei quem você realmente é.
Era reconfortante ouvir aquelas palavras. Enquanto continuássemos sendo amigos, eu sabia que teria pelo menos uma pessoa que realmente me entendia e aceitava. E isso era inestimável para mim.
Mas ainda havia aquela voz, aquela coisinha irritante no fundo da minha alma que não aceitava aquilo, aquela que queria ser muito mais do que o amigo com quem ela poderia contar, que implorava para que eu tentasse aquele mais que ela insistia em não querer.
O que mais eu precisava fazer para que ela visse que jamais seria como as outras?
Enquanto o filme de terror continuava na TV, aquele pensamento persistente se espalhava como uma sombra em meu interior. A voz da minha própria insegurança me incomodava, questionando por que eu não poderia ser mais do que um amigo para Jully.
Ela parecia absorta no filme, seus olhos fixos na tela, mas eu podia sentir sua presença ao meu lado, a familiaridade reconfortante de sua proximidade.
Passei os dedos suavemente pela lateral de seu rosto, sorrindo quando a vi engolir seco, por mais que eu quisesse manter as coisas como deveriam ser, tem se tonado insuportável estar ao lado dela, sinto uma necessidade, um desespero... medo de perdê-la.
Jully virou o olhar na minha direção. Seus olhos encontraram os meus, e havia algo ali, o mesmo que havia nos meus sempre que a via.
– Ares... – Ela começou, mas não terminou a frase. Em vez disso, seus olhos fixaram-se nos meus lábios por um breve momento antes de voltar a me encarar. Havia uma tensão no ar, algo que nenhum de nós estava disposto a nomear.
Minha mão continuou acariciando sua pele macia, meu polegar traçando um caminho suave sobre sua bochecha. Senti meu coração acelerar, uma sensação estranha e ao mesmo tempo familiar.
– O que foi Jully? – Minha voz saiu num sussurro, quase inaudível, como se estivesse com medo de romper aquele frágil equilíbrio entre nós.
Ela estava tão perto, seu corpo quase se fundindo ao meu. Eu podia sentir sua respiração, seu calor. Meu coração martelava no peito, e eu sabia que estava prestes a cruzar uma linha que poderia mudar tudo entre nós.
O momento estava impregnado de tensão, como se o mundo inteiro estivesse segurando a respiração, esperando para ver o que aconteceria a seguir. Eu sentia o coração batendo tão forte que parecia quase ensurdecedor.
Inclinei-me na direção dela, minha respiração se misturando com a dela. Nossos olhos se fecharam lentamente, e então aconteceu. Nossos lábios se tocaram de forma suave, hesitante, como se estivéssemos explorando território desconhecido.
O beijo começou inocentemente. Nossos lábios se moviam com ternura, um roçar suave e exploratório que fez meu coração se acalmar lentamente. Foi um beijo cheio de promessas e perguntas não formuladas.
À medida que o beijo se aprofundava, as mãos dela encontraram o caminho para o meu rosto, segurando-me com delicadeza. Nossos lábios se pressionaram mais firmemente, os movimentos se tornando mais confiantes, como se estivéssemos nos entregando àquilo que havia sido deixado de lado por tanto tempo.
Eu a puxei para mais perto, nosso corpo se aproximando como ímãs, e o beijo se intensificou. Era apaixonado, cheio de desejo contido que havia sido reprimido por tempo demais. Nossas línguas se encontraram numa dança íntima, explorando-se como se fossemos feitos um para o outro.
Foi um beijo que queimou com a força de anos de amizade, atração reprimida e sentimentos inegáveis. Um beijo que finalmente parecia ter quebrado as barreiras que havíamos erguido.
– Você não pode me confundir desse jeito! – Ela se levantou e esfregou as mãos no rosto, a frustração evidente em sua voz. – Talvez seja melhor voltar para casa.
– Jully, por favor, sente-se. Precisamos conversar sobre isso.
Ela hesitou por um momento antes de finalmente se sentar novamente, os olhos encontrando os meus com uma mistura de emoções.
– Ares, eu valorizo muito nossa amizade. É a coisa mais importante para mim. – Sua voz estava carregada de sinceridade. – Mas eu também tenho medo. Medo de que se tentarmos algo mais, isso possa destruir tudo o que construímos.
Balancei a cabeça lentamente, tentando encontrar as palavras certas para expressar meus sentimentos.
– Eu entendo, Jully, eu realmente entendo. Mas, ao mesmo tempo, não posso ignorar o que sinto. Não posso continuar escondendo isso. Eu não quero destruir nossa amizade, eu só quero explorar a possibilidade de algo mais.
Ela suspirou, passando uma mão pelos cabelos.
– Ares, não é só sobre nossos sentimentos. É sobre o que isso poderia significar para nós. E se não funcionar? E se isso nos separar de uma forma irreparável?
– E se funcionar? E se for algo incrível que ambos estávamos negando a nós mesmos? Não podemos deixar o medo nos impedir de tentar. Além disso, não importa o que aconteça, eu nunca vou deixar que nada nos separe completamente. Nossa amizade é forte demais para isso.
Ela olhou para mim, seus olhos agora cheios de conflito.
– Ares, eu preciso de tempo para pensar sobre isso. Não posso tomar uma decisão tão importante no calor do momento.
Eu assenti, compreendendo sua necessidade de espaço.
– Tudo bem, Jully. Não quero te pressionar. Vou respeitar seu tempo. Mas, por favor, saiba que não importa o que você decida, nossa amizade sempre será preciosa para mim.
Ela pareceu relaxar um pouco, mas ainda havia uma tensão entre nós que eu sabia que não desapareceria tão facilmente.
– Acho que é melhor voltar ara casa, eu amei a surpresa, mas...
– E perder os próximos filmes? – Fiz uma careta forçada. – Ah, qual é Jules, temos um roteiro a seguir. – Queria aliviar o máximo possível a tensão que ainda pairava no ar, mas ela não pareceu ter a mesma ideia, passei o resto da noite me culpando por ter estragado o momento que era para ter sido para nós.