Bianca Narrando
- Acordei de madrugada e terminei de fazer todas as nossas malas, o nó entalado na garganta, parece que estou voltando a anos atrás e para o meu pior pesadelo. Sei que esse homem está morto, mas reviver tudo isso é dolorido demais, ainda mais sem a minha mãe ao meu lado. Mas agora não posso pensar em mim, tenho que pensar na minha irmã que agora é totalmente dependente de mim e perdeu a nossa mãe tão precocemente. Depois que fiz as malas, ajeitei tudo na casa, o carro que iria nos levar já estava esperando. Ajeitei minha irmã dormindo mesmo e vamos nessa.
- Fiquei parada olhando pra casa que por muito tempo fui feliz e anestesiada da dor que foi me causada durante muito tempo. Levei as malas para o carro do Senhor que iria nos levar, peguei minha irmã no colo, fechei a casa e deixei a chave na planta como de costume, a dona da casa vai vir buscar. Entrei no carro com a minha irmã ainda dormindo no meu colo, o choro entalado na garganta e partimos para o morro, não sei o que me espera, mas estou convicta de que lá no momento é a nossa melhor opção. A viagem toda não consegui pregar os olhos, a ansiedade tentando vir a todo custo e eu me prendendo pra não desabar. O Senhor viu meu desconforto e ficou me encarando pelo espelho do carro.
Senhor: Está tudo bem menina?
Bianca: Não, mas vai ficar.
Senhor: Não sei o que você está passando, mas lembre-se que Deus participa de tudo, você não está sozinha.
Bianca: Amém, obrigada pelas palavras.
- Depois de longas horas de viagem, chegamos ao Rio e próximo a barreira da Rocinha, o Senhor não sobe e eu super entendo, não sei como estão as coisas por aqui e acho que não conheço mais ninguém. Ele parou na barreira, tirei as malas e a minha irmã acordou, paguei o Senhor que falou algumas coisas lindas pra mim e fiquei emocionada, nos despedimos e fui em direção aos meninos do movimento que fica aqui na barreira.
Bianca: Bom dia, sou a moradora nova. Temos uma casa aqui e voltamos pra morar novamente aqui.
Xxxx: Fé mina, vamos chamar o sub pra resolver essa questão.
Bianca: Obrigada, fico aguardando.
- Me afastei um pouco com minha irmã no colo e as malas ao nosso lado, não demorou muito e o moço que supostamente é o sub chegou e veio na nossa direção.
GB: Fé mina, foi você que fez a conexão com nós pra voltar a morar aqui?
Bianca: Sim, sou eu mesmo. A nossa casa estava alugada mas a inquilina já saiu e ela está vazia.
GB: Mas qual foi que você decidiu voltar a morar aqui?
Bianca: Minha mãe faleceu e não tive muita alternativa, já que agora é só eu e a minha irmã.
GB: Entendi. Você já sabe como funciona o proceder aqui, já que você foi moradora. Então nada mudou, é só seguir o mesmo proceder pra não virar saudade.
Bianca: Ok.
GB: Quem que vou te ajudar a subir com as paradas.
Bianca: Obrigada.
- Fiquei meio que sem reação, lembro bem dele. Ele é alguns anos mais velho que eu, não sabia que ele estava no movimento, também não tem como saber se eu não morava aqui. Ele colocou minhas malas no carro, entrei na parte de trás do carro com a minha irmã e seguimos. Não demorou muito e chegamos no portão da minha casa e aquela nostalgia me acertou em cheio, mas segurei minha onda pra não chorar aqui e passar vergonha. Ele tirou minhas malas do carro, deixou em frente ao meu portão.
GB: De volta às origens, bem vinda de volta gatinha, qualquer parada é só acionar. - Disse me olhando nos olhos e brincando com a minha irmã que começou a rir pra ele.
Bianca: Obrigada mais uma vez.
- Ele deu as costas e entrou em seu carro, entrei na casa com a minha irmã e parece que nada mudou, estava tudo exatamente do mesmo jeito, parece que quem morou aqui, não mudou nada.