Depois que Inácio saiu, a sala parecia respirar com eles. Uma luz dourada da manhã entrava pelas janelas altas, iluminando o tapete persa e lançando reflexos nos olhos de Serena, que pareciam brilhar com alguma tristeza contida.
Ela ajeitou a barra do vestido de algodão claro sobre os joelhos, tentando disfarçar o desconforto pelo silêncio que pairava pesado no ar. Alessandro ainda estava parado ali, o corpo relaxado no sofá, mas a tensão nos ombros denunciava que sua mente estava em outro lugar — perdida nas palavras do pai.
Serena pigarreou baixinho, a voz delicada, quase um sopro.
— Acho que… o seu plano acabou dando certo — comentou, um sorriso tímido surgindo em seus lábios. — Mesmo que algumas coisas tenham saído meio do controle…
Alessandro ergueu o olhar para ela, os olhos escuros a analisando como se fosse a primeira vez. Franziu o cenho, confuso e ao mesmo tempo intrigado. Sua voz saiu grave, lenta, como se estivesse provando cada palavra antes de dizê-la.
— Que coisas… deram certo? — perguntou, inclinando-se um pouco, aproximando o rosto do dela.
Serena respirou fundo, sentindo o coração acelerar.
— O nosso casamento… — murmurou, hesitando. — Está… está tão real aos olhos dos outros.
Por um segundo, ele pareceu se perder em um abismo de pensamentos. Então balançou a cabeça, voltando ao presente de forma abrupta.
— Ah, claro! — exclamou com um sorriso forçado. — O casamento…
Mas Serena continuou, a voz quase falhando.
— Não vai demorar muito, Alessandro. Logo você vai estar livre disso. Livre de mim.
Aquelas palavras pareciam ter sido esculpidas no peito dele como uma adaga. O maxilar de Alessandro se contraiu, e o ar em volta pareceu ficar mais pesado. Ele se endireitou no sofá, os olhos faiscando de algo que ele mesmo não sabia nomear.
— E você quer isso? — perguntou num tom mais baixo, mas havia uma força contida, quase um rugido reprimido.
Serena arregalou um pouco os olhos, sem entender o porquê daquela pergunta tão carregada. Um calor subiu em seu rosto, e ela enfiou uma mecha de cabelo atrás da orelha, buscando palavras que não encontrava.
— Eu… — começou a dizer, mas foi interrompida quando a porta se abriu e Eleonora entrou com a leveza de quem não percebia a tensão que existia ali.
— Serena — disse a sogra com um sorriso suave — antes de você ir embora, pensei em irmos amanhã ao centro. O que acha?
Serena piscou, surpresa pela mudança brusca de assunto. Tentou sorrir de volta.
— Ah, sim… seria ótimo, dona Eleonora — respondeu, a voz trêmula, mas educada.
Enquanto as duas conversavam, Alessandro mantinha o olhar preso em Serena. Havia algo de possessivo naquele silêncio. Algo que ele não entendia, mas que o queimava por dentro. Como se as palavras dela sobre “logo estar livre” tivessem se tornado um desafio que ele não estava disposto a aceitar.
Eleonora se virou para o filho, percebendo a estranheza em seu semblante.
— Alessandro, querido… e quando vocês pretendem voltar para a cidade?
Ele pareceu despertar de um transe, demorando um instante para focar nos olhos da mãe. O silêncio dele se prolongou por segundos que pareceram eternos.
— Depois de amanhã — respondeu finalmente, a voz grave. — Tenho muitos assuntos da empresa para resolver.
Serena forçou um sorriso, tentando parecer casual.
— E a faculdade me espera também, dona Eleonora — disse, ajeitando a postura e brincando com a barra do vestido. — m*l posso esperar para retomar as aulas.
Eleonora, alheia à tensão entre os dois, animou-se.
— Ah, é mesmo! Então me conte mais sobre isso… — disse, inclinando-se para a frente com um sorriso.
Serena começou a responder, tentando manter a voz firme enquanto sentia o olhar de Alessandro sobre ela como um toque invisível. Ele estava ali, calado, mas havia algo em seus olhos que não a deixava em paz — algo que dizia que, apesar de tudo, essa história ainda estava longe de terminar.