Benjamin Narrando
Finalmente ganhei alta do hospital. Pela manhã, o doutor que me operou passou no quarto dizendo que pediria alguns exames para avaliar minha recuperação. Caso estivesse tudo certo, eu estaria de alta. Para minha felicidade, recebi a boa notícia: estava bem e podia finalmente ir para casa. Claro, meus pais decidiram que ficaríamos em um hotel até que eu me sentisse bem o suficiente para enfrentar uma longa viagem de volta à nossa cidade.
Com a ajuda da minha mãe, levantei da cama pela primeira vez em semanas. Fui ao banheiro para tomar um banho. Que sensação incrível! A água caindo sobre meu corpo parecia lavar não só a sujeira, mas todo o peso acumulado nos últimos dias. Eu me sentia renovado, quase como se tivesse voltado à vida.
Meu pai, que havia passado a noite no hotel onde estávamos hospedados, ainda não tinha retornado. Após me vestir com uma roupa confortável, sentei novamente na cama do hospital. Ainda tinha os pontos da cirurgia, e o médico me orientou a tomar cuidado nos próximos dias.
— Bom dia! Tudo bem contigo, senhor Benjamim? — perguntou a enfermeira ao entrar com uma bandeja cheia de frutas.
— Estou bem, sim. Muito obrigado pelo café! — agradeci, com um leve sorriso.
— Coma tudo. Daqui a pouco o doutor virá entregar os papéis da alta.
— Finalmente vou sair desse lugar! — falei, aliviado.
Minha mãe sorriu, emocionada.
— Sim, meu filho. Voltaremos à nossa vida como antes.
Depois de terminar meu café, a enfermeira recolheu a bandeja. Logo em seguida, meu pai chegou com um sorriso que iluminava o ambiente. Ele veio até mim e me abraçou. Era como se, naquele instante, toda a dor desaparecesse.
— Tenho uma novidade para vocês dois, mas vou contar só quando estivermos no hotel. — disse ele, com um brilho nos olhos.
— Ah, pai! Vai nos deixar curiosos? — brinquei, rindo nervosamente.
— Calma, logo vocês saberão. — Ele pegou minhas malas e saiu do quarto.
— O que será que seu pai está aprontando? — perguntou minha mãe, curiosa.
Eu apenas dei de ombros. Minutos depois, com a ajuda da enfermeira, sentei na cadeira de rodas e fui levado ao carro, que já nos aguardava na entrada do hospital. Enquanto me acomodava, escutei uma risada familiar. Quando olhei, vi meu pai conversando com Jacaré, o mesmo homem que ordenou o ataque que quase tirou minha vida. Meu estômago revirou. Como meu pai poderia conversar tão animadamente com ele, como se nada tivesse acontecido?
— Filho, olha quem veio te ver! — disse meu pai, aproximando-se junto com Jacaré.
— Ah, sim, já tinha notado, mas não quis interromper a conversa de vocês. — Respondi, tentando esconder minha irritação.
— E aí, moleque? Como tá se sentindo? — perguntou Jacaré.
— Meu nome é Benjamim, não moleque. Estou bem, obrigado.
Meu pai e minha mãe me olharam, surpresos com meu tom.
— Tá nervoso, hein? Mas tranquilo, só queria saber como você tá. Já vi que melhorou. — Ele falou, com um tom ríspido.
Meu pai tentou amenizar:
— Não se importe, ele acabou de sair do hospital e está um pouco irritado por causa das dores.
Jacaré soltou uma risada seca.
— Já é, tô ligado. Bom, vou voltar pro meu barraco.
Quando ele se despediu com um toque de mãos com meu pai, minha mãe, para minha surpresa, o convidou:
— Que tal marcarmos um jantar na semana que vem?
Meu coração disparou.
— Mãe, não pode ser sério! — pensei, desesperado.
— Maneiro! O jantar pode ser no meu barraco. Faço questão de receber vocês lá. — Jacaré respondeu.
No mesmo instante, comecei a sentir dores no estômago. Avisei aos meus pais e, por fim, eles se despediram de Jacaré. Ainda assim, fiquei perplexo quando vi meu pai trocando contatos com ele. Como eles podiam confiar tanto no homem que quase destruiu nossa família?
Chegando ao hotel, fui direto para o quarto. Deitei na cama e, como o médico recomendou, apoiei as pernas sobre algumas almofadas. Ainda que me sentisse desconfortável fisicamente, era meu coração que parecia pesar mais naquele momento.
— Como está, meu filho? — perguntou meu pai, sentando-se ao meu lado.
— Melhor, mas não acredito que vocês marcaram um jantar com ele. Só podem estar ficando loucos! — desabafei.
Minha mãe, com um tom firme, tentou me convencer:
— Jacaré já pediu perdão, Benjamim. Ele está tentando mudar. Não podemos julgá-lo para sempre. Ele achou que o carro era de um inimigo.
— Mesmo assim, ele continua sendo um bandido. Eu não vou nesse jantar.
— Dê uma chance a ele! — minha mãe insistiu.
— Minha decisão já está tomada.
Pouco depois, eles saíram do quarto, aparentemente frustrados. Fiquei sozinho, refletindo sobre como tudo havia mudado desde aquele ataque. Mais tarde, meus pais voltaram, e meu pai pediu que conversássemos:
— Não é sobre o jantar, filho. Eu e sua mãe decidimos algo importante.
— O que foi agora? — perguntei, preocupado.
— Vamos nos mudar para esta cidade. Gostamos muito daqui. A casa antiga será alugada.
O impacto da notícia me deixou sem reação. Com um aceno de cabeça, me virei de lado na cama e acabei adormecendo.