Capítulo 5

1462 Words
JR narrando Meu dia começa cedo, tipo… muito cedo mesmo. Cinco da manhã e eu já tô de pé, antes até do sol acordar. O despertador nem toca mais, meu corpo já tá programado. Levanto com o peso de ser o patrão do morro nas costas, mas com a mente afiada de quem sabe que cada segundo vale grana, respeito e sobrevivência. Vou direto pro banheiro. A água quente cai no meu corpo e espanta o resto do sono. Enquanto a água escorre, eu penso em tudo que preciso resolver: boca, fornecedor, menor que deu mole, polícia rondando demais… é f**a. Aqui não tem folga pra chefe, não. Cinco e meia eu já tô pronto. Camisa preta justa, corrente brilhando no pescoço, Glock na cintura e o olhar daquele que ninguém encara por muito tempo. Desço as escadas com o cheiro do café tomando conta da casa. É a Dona Lurdes, como sempre, cuidando do meu lar como se fosse dela. Mulher de fibra, dessas que já viu coisa demais pra se abalar com homem armado. Nunca trouxe ninguém pra essa casa. Aqui só entra quem é de verdade. Meu mano Hades, a Layla e meus sobrinhos. Fora isso, ninguém. Nem p**a. Pra comer, eu levo pro barraco lá de baixo, no cantinho onde não entra sentimento, só gemido. — Bom dia, meu filho — ela fala, com aquele sorriso de vó que nem o crime consegue endurecer. — Bom dia, Dona Lurdes. Café tá no ponto, né? — Do jeitinho que tu gosta. Pão na chapa, café forte. Me sento e como rápido. Aqui ninguém perde tempo com frescura. Cada minuto é ouro. Termino, limpo a boca com o pano de prato e dou um beijo na testa dela. Ela sorri como se eu ainda fosse um moleque que ia pra escola com mochila nas costas. — Já vou descer. Lá fora, os menor da contenção tão ligados. Acabaram de trocar de turno, mas já tão com os olhos acesos, rádio na mão, dedo no botão, prontos pro que der e vier. — Fica esperto. Qualquer coisa fora do normal, me chama. Nada entra, nada sai sem eu saber. Isso aqui é minha casa. — Pode deixar, patrão. Tamo na atividade. Subo na minha moto, ronco forte, e desço na direção da boca. Chego na frente, os vapor tão na troca também. Os da noite tão saindo, os do dia chegando com os bolsos vazios e sede de fazer grana. Passo no meio deles, todo mundo abaixa a cabeça, respeito puro. Entro na minha sala. A vista é pra todo o morro. Cada viela, cada beco, cada escada, tudo ali na minha mira. Mas não tô sozinho. Tem um filho da p**a com o pé em cima da minha mesa. Lobo. O mais fiel e mais abusado também. — E aí, cria — ele levanta e me dá o toque. — Fala, Lobo. — Hoje é o dia, hein. — Que dia? — pergunto, sem entender de cara. — A morena… Aquela que veio ver a casa. Hoje ela se muda. Minha mente vai direto no rosto dela. Sandrinha. A mulher que fez meu mundo parar por uns segundos quando apareceu depois de quatro anos, do nada, na minha frente. — Eu não esqueci não, Lobo. — Eu sabia… — ele ri, debochado. — Manda limpar a casa da Rua Dez. Capricha. Quero tudo no lugar. Ele arqueia a sobrancelha. — Tem certeza? — Tô mandando. Só faz, Lobo. Ele sai, dando risada. Eu sigo meu dia. Contato com fornecedor, acerto com os menor que tão devendo, cobrança, grana das drogas entrando, vida de quem manda. Tudo na palma da mão. Mais tarde, Lobo volta, batendo na porta com aquele sorrisinho safado. — Ela já tá na casa. — E aí, qual foi a dela? — Disse que não podia pagar um aluguel daquele. Queria uma casa simples de dois cômodos. Dou um risinho de canto. — Ninguém vai cobrar aluguel dela. É uma ordem. Lobo gargalha. — Ahhh, JR… tu tá caidinho, hein. Já vi esse filme antes. Tá afim da morena! — Cala tua boca, Lobo — mando na moral, mas o sorriso não n**a. Antes que ele responda, a porta se abre com tudo. Sem bater, sem pedir licença, sem nada. Bruna entra com o Arthur no colo, cuspindo fogo. — Tá afim de quem, JR? Me viro, impaciente. — Primeiro: isso não é da tua conta. Segundo: quem tu pensa que é pra entrar assim na minha sala? — Eu sou a mãe do teu filho! Arthur me vê, solta um sorriso e já pula do colo dela. Corre pra mim. Me agacho, abro os braços. — Vem cá, campeão. Ele se joga no meu colo, me abraça forte. Meu sangue, meu pedaço. O que eu tenho de mais precioso nesse mundo. Lobo vê a cena e sai de fininho. — Vou fazer a ronda no morro. Se vira aí, pai… Agora sou eu, Bruna e o silêncio carregado. Ela cruza os braços, atitude de quem acha que tem o direito de mandar. — Quem é essa mulher? É do morro? Tu tá botando qualquer uma perto do meu filho? — Tá maluca? Não te devo satisfação, Bruna. Nem vem querer criar cena aqui. — Eu te conheço, JR. Sei quando tu tá interessado em alguém. — E eu já disse… para de encher meu saco. — E o Arthur? Tu tá pensando nele? Vai botar qualquer vagabunda perto do nosso filho? Meu sangue sobe. Me levanto devagar, olho nos olhos dela. — Tu acha mesmo que eu sou i****a? Que eu vou colocar qualquer uma perto do meu filho? Ela fecha a cara, mas não recua. — Jura que tu vai jogar fora tudo que a gente teve por causa de uma mulher que nem faz parte desse mundo? Dou um passo pra frente, frio. — Tudo que a gente teve? Bruna, o que a gente teve foi uma f**a que terminou com o Arthur. E só. Ela tenta rebater, mas minha paciência já esgotou. Dou a volta nela, abro a porta. — Se tu entrar aqui de novo sem permissão, a porta vai tá trancada pra sempre. Ela me olha com ódio nos olhos, mas sai sem dizer mais nada. Quando a porta se fecha, eu suspiro. Me aproximo da janela. Lá fora, o morro segue pulsando. Pego o rádio. — Fala, irmão. — Manda comprar móvel novo pra casa da Rua Dez. Sofá bom, cama king size, lençol novo. Capricha. Lobo ri no outro lado. — Vai trabalhar, Lobo. — Desligo. Sento na minha cadeira, olho pra vista. As luzes do morro começam a acender. Vida de chefe é isso. Todo mundo acha que é fácil. Que é luxo, poder e respeito. Mas ninguém vê que até o patrão… …sangra por dentro. E que às vezes… tudo que ele queria era uma paz que esse mundo não tem pra dar. Mas a real é que paz não combina com quem nasceu no fogo. Com quem aprendeu a atirar antes de aprender a confiar. Aqui, ou tu endurece… ou tu morre. Tô ali parado, encarando o morro pela janela, quando o rádio chia de novo. — Patrão, deu r**m na Baixada. Tentaram roubar nosso carregamento. Pegaram dois dos nossos. Fecho os olhos por um segundo. Respiro. Mais merda pra resolver. — Quem foi? — Não sabemos ainda. Tão falando que foi o Guto. Tão se mexendo de novo. Esse nome me faz travar o maxilar. Guto é o tipo de inimigo que não bate de frente ele rói por dentro, devagar, até o império ruir. — Pega o Lobo e prepara o carro. Vou pessoalmente resolver essa p***a. — Fechou, patrão. Tamo junto. Desligo o rádio, pego minha Glock e encaixo na cintura. O olhar que encaro no espelho agora não é o mesmo de cinco da manhã. Agora tem raiva. Tem sede. Tem fúria contida. Antes de sair, abro a gaveta da minha mesa. Tiro de lá uma foto antiga do Arthur ainda bebê no meu colo, com a Bruna sorrindo do lado. Não porque eu amo ela… mais por ser a mãe do meu filho. Pego a foto. r***o o pedaço onde ela aparece. Só deixo o Arthur. Dobro com cuidado, guardo na carteira. Hoje não tem paz. Hoje é dia de sangue. E se o Guto quer brincar com fogo… …então eu vou fazer esse morro virar o inferno. Saio da sala sem olhar pra trás, com o peso da guerra no peito e a certeza de que quem mexe com o JR… …vai ter que aprender do jeito mais difícil que eu não deixo dívida pendente. Porque aqui, ou tu respeita… ou tu desce. E quando eu desço… É pra matar.
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