POV de Amália
— Amália, você deveria primeiro de tudo ir ver seu noivo!
Eu estava tentando decidir que roupa usar quando meu avô entrou em meu quarto vendo toda aquela bagunça!
— Era tudo o que eu mais queria, vovô. Mas eu liguei pra dona Úrsula, e marquei um encontro com eles no café do complexo da empresa. Eu preciso mesmo falar com o senhor Cavalcante.
— Mas não tem a festa da sua apresentação hoje a noite?
— Sim, vovô. Mas é uma emergência. Houve uma grande queda nas ações dele, e se eu não conversar com ele pessoalmente, é capaz de ele desfazer de todo o projeto, e isso seria uma catástrofe, porque hoje vai ser o dia que vai dar tudo certo.
— Tá, a especialista aqui é você. Salva esse projeto, menina. A cidade e talvez o país dependem dele!
— Me empresta a sua caminhonete?
— Você vai naquela empresa chique com a Marisa? Aquela lata velha vai te fazer passar vergonha. Melhor chamar um carro por aplicativo!
— A Marisa não é nosso meio de transporte há anos, vovô?
— É, mas agora você é importante. Precisa de vestir e andar de acordo com seu cargo!
— Preciso economizar para o casamento, vovô! Mas enquanto viver aqui, vai ser com a simplicidade que sempre tivemos!
Coloquei uma calça jeans, uma camiseta preta, meus allstar que fazia muito tempo que não usava e as chaves da Marisa.
Meu nome é Amália Silva, tenho 26 anos, não tenho diploma do ensino médio porque tive que sair do país para o Canadá antes de concluir as provas finais. Meu pai perdeu o emprego quando eu tinha dois anos e tivemos que voltar a morar no sítio do meu avô, e eles sofreram um acidente de automóvel quando eu tinha quatro, e pra se ter idéia, deu perca total no carro. Meu avô quem me criou, sem muitos recursos mas com muito amor.
Cresci ouvindo como ele veio embora dos Estados Unidos trazendo meu pai, para não atrapalhar a carreira da minha avó, uma gigante das indústrias petrolíferas.
Quando tive que ir para o Canadá, foi ilegal e com um emprego que conseguiria manter meu noivo Tarcísio na faculdade, para enfim nos casarmos!
Logo que cheguei, já comecei a pesquisar sobre minha avó, sobre as indústrias petrolíferas e descobri que eu tinha talento para o negócio. Minha melhor amiga, Evelyn, me ajudou a montar um site de consultoria. Mas como eu era ilegal, tive que usar um pseudônimo. Eu amava Agatha Christie e Poirot sempre foi meu personagem favorito, então me transformei em senhorita Poirot, e como tinha ótimas idéias e conhecimento, logo no primeiro semestre já tinha uma vasta carteira de clientes em todo o mundo. E assim, Vitor Cavalcante, do Brasil e da mesma cidade que eu, me procurou. Com um projeto pelo qual me apaixonei logo de cara!
Enquanto dirigia do sítio do meu avô, onde ele morou sozinho nos últimos oito anos, para a empresa, ia pensando no projeto de Vitor Cavalcante.
Eu peguei esse bebê no papel de pão praticamente, e ajudei a se tornar uma potência. Vitor é o filho do dono da metade da cidade. Hoje, presidente do grupo Cavalcante. Dizem que o Cavalcante pai é sovina, por isso conseguiu montar aquele império. Não sei o que Vitor fez pra conseguir o financiamento, porque o velho não é de investir e nem de ajudar ninguém. Mas, se tudo der certo hoje, o projeto compra a cidade toda!
Vitor Cavalcante trabalhou duro nesse projeto, e soube ser grato a minha ajuda. Me contratou com exclusividade para prestar consultoria apenas pra ele, e há pouco mais de dois anos, me declarou vice presidente de sua empresa!
Quando estava próximo ao complexo, coloquei meus fones de ouvido e dei comando de voz para ligar para a secretária do senhor Vitor.
— Adelaide? Bom dia!
— Senhorita Poirot, como vai? Fez boa viagem?
— Sim, Adelaide. Estou bem, obrigada. Avise ao senhor Cavalcante que estou chegando no prédio e preciso falar com ele, sim?
— Não vai ser possível. Ele teve um compromisso pessoal agora pela manhã, acabou de sair.
— Vá atrás dele e peça que me espere. É urgente!
— Já vim, senhorita. O elevador estava fechando as portas.
— Então eu vou acelerar aqui, talvez consiga pega-lo ao chegar no carro. Libera minha entrada no estacionamento, sim?
— Não vai ser preciso. Ele pediu pra liberar para uma moça que não ia se identificar.
— Ah, perfeito. Estou entrando. Obrigada, Adelaide.
De fato, na hora em que encostei ao lado do carro dele, o motorista tinha acabado de entrar e ele estava em pé, parece que me aguardando. Adelaide deve tê-lo avisado.
Desci da caminhonete desbotada do meu avô, e ele estava me olhando zombeteiro. Mas acho que ele me confundiu, porque foi logo se apresentando. Eu passei oito anos fora do Brasil, mas as coisas mudaram tanto em tão pouco tempo?
— Muito prazer. Meu nome é Vitor Cavalcante, eu tenho 31 anos, me formei em administração de empresas em Harvard. Tenho uma casa avaliada em 21 milhões de reais, alguns apartamentos e terras, sou presidente do grupo Cavalcante e meu carro pessoal é uma Ferrari.
— Muito prazer senhor podre de rico. Meu nome é Amália Silva, eu terminei o ensino médio aqui e depois fui pro exterior sem nem pegar o diploma, não tenho casa, não tenho dinheiro e esse — apontei para a Marisa, sorrindo — é meu único meio de transporte e ainda é emprestado!
Vitor é moreno claro, tem o cabelo preto e na hora que eu o olhei de verdade, percebi que ele tem covinhas nas bochechas. Ele estava me olhando com uma ruga na testa, e eu entendo quando ele abriu a boca:
— Se m*l terminou o ensino médio e não tem posses — ele disse, avaliando minhas roupas e a caminhonete, — Acredito que estava ilegal em outro país…
— Sim, mas…
— Isso não importa! Depois de hoje, você pode escolher o carro que vai dirigir, vai morar um ano em minha casa, mas não se preocupe, ficaremos em quartos separados e vou te dar uma mesada de cem mil reais por um ano. Está tudo aqui no contrato conforme combinamos. Entre no carro e vamos acabar logo com isso, que temos um compromisso importante hoje a noite…
Vitor foi falando e pegou em minha mão, me puxando. Juro que senti uma eletricidade! Que doideira. Preciso ir ver meu noivo logo!
— Espere. — falei, puxando minha mão da dele — Vamos para onde?
— Para o cartório! Você pode dar uma lida no contrato dentro do carro, e assinar no caminho. Precisamos ser breves.
— Fazer o que no cartório?
— Nos casar, moça. Vamos, não temos tempo! — Ele disse, pegando minha mão novamente e me puxando — Você ainda tem que ir comprar roupas adequadas para o jantar de hoje a noite, quando vou te apresentar para meus pais como minha esposa.
— Senhor Vitor, o senhor está me confundindo com outra pessoa. Não posso me casar com o senhor, eu tenho um noivo.
— Você não é a noiva que Alexandre contratou pra mim?
— Não, senhor!
— Aí meu Deus!
Antes que a situação ficasse constrangedora, o telefone dele tocou e ele levantou o dedo, pedindo pra eu aguardar. Claro que eu não ia sair dali, precisava muito avisar ele que o projeto teve uma queda considerável nas ações, mas pra ele segurar por mais dez minutos que ele ia se tornar trilhardário…