OLHARES E AUDITORIA

1077 Words
Patrick desceu do carro sem chamar atenção. Ainda estava cedo, mas a entrada da sede da empresa já tinha movimento. Funcionários com crachás pendurados no pescoço passavam apressados, alguns segurando cafés, outros teclando nos celulares. Na recepção principal, sentado atrás da bancada de segurança, Francisco, o porteiro, levantou os olhos ao reconhecer a figura alta e elegante de Patrick entrando pelo saguão. Patrick fez um leve aceno com a cabeça e se aproximou devagar, com as mãos nos bolsos do sobretudo. — Bom dia, senhor Francisco. Francisco tirou os óculos e olhou bem nos olhos do rapaz. — Veio me dar satisfação? — Vim como homem. Como alguém que respeita a sua filha — disse Patrick, sem rodeios. — Não estou aqui como CEO. Vim porque ontem à noite ela me deu uma chance. E se ela disser sim novamente, eu não vou viver isso escondido. Não quero que o senhor descubra por terceiros. Francisco recostou-se na cadeira, cruzou os braços com firmeza. — E o que exatamente você pretende? — Ser digno dela. E de vocês. E se um dia eu falhar, o senhor terá todo o direito de bater na minha porta. Mas enquanto eu estiver aqui, só quero uma coisa: fazer a Lana feliz. Francisco ficou em silêncio por alguns segundos. Então, respirou fundo e disse: — Você sabe que, pra mim, essa empresa é quase família. E que minha filha é meu maior tesouro. Então escuta bem, Patrick. Se for pra brincar, não brinque. Porque ela não é como as outras moças com quem você já apareceu em foto de revista. Patrick sorriu de lado. — Eu sei disso. Justamente por ela ser única... é que eu estou aqui. O senhor me permite tentar? Francisco fitou o chão por um instante. Depois levantou o olhar e estendeu a mão. — Eu permito. Mas vou ficar de olho. E se ela chorar por sua causa, Patrick... eu não vou precisar de crachá pra te achar. Patrick apertou a mão dele com respeito. — Combinado, senhor Francisco. --- Na sala de reuniões do terceiro andar, Lana estava com Henry desde às nove da manhã. A auditoria interna começava com uma revisão nos contratos de fornecedores, especialmente os que haviam sido firmados nos últimos doze meses. Henry, um analista metódico e com fama de inflexível, mostrava-se respeitoso com Lana, apesar da diferença de idade e hierarquia. — Esse aqui é o contrato com a LogiTrans. Olha o valor dessa renovação automática. Está 18% acima da média do mercado — disse ele, entregando uma planilha. Lana analisou com atenção. — Precisamos verificar se houve justificativa formal para esse reajuste. E se foi aprovado por todos os responsáveis. Se não houver ata, isso entra no relatório como ponto de alerta. Henry assentiu, visivelmente impressionado com a objetividade dela. — Você leva jeito pra isso. Direta, mas sensata. — Meu pai diz que quando a gente trabalha com gente poderosa, tem que ser como um lápis: afiado, mas sem cortar — respondeu ela com um leve sorriso. — Então hoje o CEO está com sorte — brincou Henry, antes de voltar ao foco da auditoria. No corredor do segundo andar, dois funcionários da equipe financeira cochichavam enquanto Lana passava com uma pasta nas mãos. — É ela... — murmurou um. — A assistente do Patrick? A que...? — Shhh. Fica quieto. Ela ouviu. Mas não reagiu. Passou com postura impecável, o salto firme nos pisos frios, os olhos verdes fixos no destino. Estava vestida com o mesmo conjunto masala — poderoso, elegante e sóbrio — que combinava perfeitamente com sua nova postura: confiante, centrada, e acima de qualquer fofoca. No elevador, cruzou com Amanda Clark, a diretora de RH, que sorriu para ela com gentileza. — Lana, vi seu nome no cronograma da auditoria. Se precisar de algo, minha sala está sempre aberta. — Obrigada, diretora. Vamos manter as análises objetivas. Acredito que a verdade sempre protege quem está do lado certo. Amanda assentiu. — Boa resposta. E excelente postura. Continue assim. No andar superior, de portas fechadas, Patrick estava em sua sala, mas não conseguia se concentrar completamente. Observava pela câmera interna (instalada apenas na área comum de reuniões) o desempenho de Lana e Henry. Nada invasivo — apenas um homem fascinado com a mulher que começava a desabrochar sob seus olhos. — Olha só pra você... — murmurou, mais pra si mesmo. Louis entrou sem bater, como sempre fazia. — Ela vai virar estrela dessa empresa se continuar nesse ritmo. — Já virou — respondeu Patrick. Louis se encostou na parede. — E você vai virar o namorado mais vigiado de Boston. Tá preparado? Patrick girou a cadeira, olhando para o irmão. — Se ela estiver comigo, eu aguento tudo. Louis sorriu, mas seu olhar ficou mais sério por um momento. — Você sabe que tem gente aqui dentro que vai tentar usar isso contra vocês. Ficar atento nunca foi tão importante. — Eu estou atento. Mas pela primeira vez... eu não estou com medo. Pela primeira vez, eu estou investindo em algo real. --- No final do dia, Lana ainda estava revisando documentos com Henry quando recebeu uma mensagem discreta no celular. "Sala da diretoria. 18h15. Sem obrigações. Só eu e você." – P Ela sentiu o coração dar um pequeno salto. Olhou para Henry. — Acho que encerramos por hoje. — Boa sorte com... o que quer que seja essa mensagem. — Ele sorriu. — E, Lana... você está mandando muito bem. Não deixa ninguém te fazer pensar o contrário. Ela assentiu, respirou fundo e seguiu para a sala indicada. Ao entrar, encontrou Patrick sozinho, sem blazer, com as mangas da camisa dobradas e um sorriso leve no rosto. — Eu queria terminar esse dia com você. Sem planilhas. Sem metas. Só eu e a mulher que está me deixando louco — disse ele. Ela entrou devagar, fechando a porta atrás de si. — Você causou um terremoto hoje. — E você segurou a estrutura como uma rainha — respondeu ele, se aproximando. Ela sorriu, mas os olhos estavam marejados. — Eu nunca pensei que alguém fosse me escolher. Que fosse dizer pro mundo: “É com ela que eu quero ficar.” Patrick tocou o rosto dela com ternura. — Eu escolho você. E vou continuar escolhendo, dia após dia. Ela o abraçou, forte. E ali, no silêncio confortável da sala vazia, entre papéis e conquistas, dois corações começavam a bater no mesmo ritmo.
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