Assim que Lloyd saiu da loja, visivelmente decepcionado e com passos firmes, restou apenas o eco de seus sapatos no piso impecável. A cliente grávida permaneceu ali por alguns segundos, em silêncio, mas não por muito tempo. Com os olhos faiscando de raiva e o salto alto marcando seu descontentamento no chão, ela avançou até Lisbeth, que tentava retomar suas atividades junto ao mostruário de carrinhos.
— Viu, sua sonça? — disparou ela, com o tom de voz levemente elevado. — Viu o que você causou? Você provocou uma briga entre mim e o pai do meu filho!
Lisbeth respirou fundo, mantendo a postura impecável, apesar do nó no estômago e do sangue pulsando nas têmporas. Levantou o olhar, firme e direto, e respondeu com toda educação e firmeza que uma mulher digna poderia reunir.
— Senhorita, eu apenas atendi ao chamado do seu acompanhante. A gerente da loja me informou que ele gostaria de falar comigo. Eu apenas cumpri meu dever. Não disse nada, não me envolvi, nem tomei partido. Com todo respeito, eu não tenho absolutamente nada a ver com o que ele falou ou com o que a senhora sentiu.
Ela fez uma breve pausa, respirou fundo e prosseguiu com voz clara e calma:
— Se ele expôs algo que a senhora considera íntimo, lamento, mas isso é um problema entre vocês dois. Agora, se me permite, eu estou em horário de trabalho e preciso atender outros clientes. Peço licença.
Sem esperar resposta, Lisbeth virou-se com classe e caminhou com passos serenos em direção ao balcão. Atrás dela, a cliente bufava de indignação, ofendida pela serenidade que não conseguiu abalar.
Irritada, ela se dirigiu até a gerente:
— Eu exijo que a senhora demita essa vendedora!
A gerente, acostumada com clientes difíceis, cruzou os braços com elegância e ergueu uma sobrancelha.
— Demitir por quê, senhorita?
Nesse instante, a porta de vidro se abriu e uma senhora distinta, usando um tailleur bege, entrou com postura altiva e elegância discreta. Era a dona da loja. Ela caminhou com segurança até as duas e perguntou com serenidade firme:
— O que está acontecendo aqui?
A gerente respondeu prontamente:
— Essa senhorita está insatisfeita. Houve um desentendimento entre ela e o acompanhante que a trouxe até a loja. Agora, ela está tentando responsabilizar a Lisbeth pelo constrangimento e pediu que eu a demitisse, sendo que a vendedora apenas cumpriu sua função.
Um silêncio tenso se instalou, mas logo foi quebrado por uma cliente grávida, que observava tudo com indignação e empatia.
— Olha, querida — disse a mulher com voz firme — eu também estou grávida. Meu marido tem condições de me dar tudo. Mas aqui dentro, eu sou apenas uma cliente. Preciso da ajuda dessas vendedoras porque eu não entendo de tudo. E se alguém merece respeito, é quem está nos atendendo com gentileza.
Ela apontou para Lisbeth:
— Essa moça foi exemplar. Educada. Paciente. Delicada. E você… você chegou aqui com empáfia, destratando quem nem te conhecia. Agora quer bancar a ofendida?
Outra senhora interveio, indignada:
— Se eu fosse a Lisbeth, entraria com um processo. E pode contar comigo como testemunha, viu? Eu ouvi tudo. E não foi ela que causou escândalo aqui, foi você.
Um senhor idoso, que analisava um berço ao lado da esposa, completou:
— Isso mesmo. O jovem que estava com você estava envergonhado. Você deveria sair daqui agradecendo por ainda ser atendida com respeito, depois do que fez.
A cliente, agora pálida e nervosa, sentiu-se encurralada. A dona da loja, percebendo a tensão e o ambiente pesado, falou com firmeza:
— Senhorita, por gentileza, venha comigo até a sala da gerência. Vamos conversar em particular.
A mulher bufou e, sem alternativa, seguiu a dona da loja, murmurando palavras inaudíveis. Enquanto isso, Lisbeth foi levada pela gerente para a copa.
— Vá tomar uma água, minha filha. Você se saiu melhor do que eu imaginava. E ganhou o respeito de todos, inclusive da dona.
Lisbeth apenas assentiu, contendo as lágrimas de nervoso. Ela sabia: estava em prova… e havia passado com louvor.
O VENENO DA VAIDADE E A LIÇÃO DA DIGNIDADE
A porta foi fechada com um clique firme assim que a dona da loja entrou na sala da gerência acompanhada da cliente grávida, que já entrava bufando, o salto alto tilintando no porcelanato com fúria contida.
Assim que se sentou na poltrona acolchoada à frente da mesa, a mulher cruzou as pernas com arrogância e começou a disparar:
— Eu exijo que a senhora tome providências. Aquela vendedora, aquela… aquela mulher disforme! Não sei nem como chamá-la! Francamente, como a senhora contrata alguém com aquele perfil físico para trabalhar numa loja tão fina? Aquela moça é gorda demais! Sem postura! Ridícula! Olha o uniforme esticado! Uma visão lamentável.
A dona da loja manteve-se em silêncio, com as mãos unidas sobre a mesa, escutando cada palavra como quem assiste um espetáculo vergonhoso prestes a desabar. A cliente seguiu, sem filtro, destilando veneno:
— Eu sou modelo. Uma modelo reconhecida. Mesmo grávida, mantenho meu peso, minha elegância, minha imagem. E entro numa loja de alto padrão e sou atendida por alguém totalmente fora dos padrões! Francamente… isso mancha o nome da loja.
A dona da loja respirou fundo, inclinando-se levemente à frente, com o olhar sereno, mas firme.
— Senhorita… me permita lhe fazer uma pergunta: por que tanto ódio gratuito contra uma funcionária que sequer respondeu às suas ofensas? É porque ela está fora dos padrões de beleza que a senhora considera aceitáveis?
A modelo bufou, revirando os olhos.
— É exatamente isso! As pessoas têm que se cuidar. Têm que se policiar. Eu, por exemplo, trabalho com imagem! Não é aceitável…
A dona da loja a interrompeu com classe e firmeza:
— Por a senhora ser modelo, a senhora acredita que todas as pessoas devam morrer de fome? A senhora não faz ideia da vida difícil que essas meninas levam. Não conhece suas histórias. Não sabe as contas que elas enfrentam todo mês. Não sabe dos esforços diários para trabalhar de pé, atender bem, mesmo com a alma cansada.
Ela se recostou na cadeira e cruzou os braços:
— Se a senhora tem dinheiro, se tem prestígio, beleza, status… ótimo! Que bom por você. Mas isso não lhe dá o direito de humilhar ninguém.
A cliente agora suava levemente, sem saber onde colocar as mãos. A dona da loja prosseguiu, implacável:
— As câmeras da loja registraram tudo. O tratamento que a senhora deu à Lisbeth. As palavras que usou. Os clientes também presenciaram e estão indignados com a sua postura.
E então, com voz pausada e olhos fixos na mulher à sua frente:
— Se essa moça decidir mover uma ação judicial contra a senhora por assédio moral e constrangimento público, eu lhe garanto: a senhora vai perder. Vai perder feio.
A mulher engoliu seco, tentando recompor a pose. Mas a maquiagem de empáfia já começava a derreter.
— Eu… eu vou comprar as coisas do meu bebê em outra loja. Aqui não volto mais.
— Sinta-se à vontade — respondeu a dona da loja, com um leve aceno de cabeça. — Agora, aceite um conselho de uma mulher mais experiente: não trate outra vendedora como a senhora tratou a Lisbeth. Porque a próxima pode não ser tão educada. E o escândalo pode ser ainda maior.
A mulher se levantou, segurando a bolsa com força e saindo em silêncio, com os olhos apertados e os passos mais contidos. Não havia mais nada que dissesse. A vergonha tinha feito o que ninguém mais pôde fazer: calar seu veneno.