Maris estava sentada na cama branca e luminosa. A paz do lugar contrastava com a inquietação em sua alma. Com o livro aberto nas mãos, ela olhou para a mãe, que se sentava ao seu lado com serenidade.
— Mãe... posso te perguntar uma coisa?
— Claro, filha. O que desejar.
— Aqui diz... “Que é Deus?” — é a primeira pergunta desse livro. Foi a primeira coisa que Allan Kardec perguntou ao Espírito da Verdade. E a resposta foi: “Deus é a inteligência suprema, causa primária de todas as coisas.”
Mas... o que isso quer dizer exatamente?
A mãe sorriu com doçura, e seus olhos brilharam com compaixão.
— Essa pergunta, filha, é o alicerce de todo o Espiritismo — e, na verdade, de todas as doutrinas espirituais sinceras. Quando Kardec perguntou “Que é Deus?” em vez de “Quem é Deus?”, ele quis mostrar que Deus não é uma figura humana, vingativa ou limitada. Ele é a inteligência suprema, o espírito mais puro e elevado, que tudo criou. Ele não tem forma, nem corpo, nem idade. Ele é. Ele está em tudo.
— Então... não é um velho de barba branca sentado em um trono?
— (sorri) Não, minha filha. Isso é uma forma simbólica de representar algo que não podemos compreender plenamente ainda. Mas com o tempo, com o estudo, o coração e a mente se abrem. Deus é amor, é justiça, é sabedoria, é a fonte de todas as leis que regem o universo. Inclusive, a lei da reencarnação.
Maris fechou os olhos por um momento, tentando absorver tudo. Depois, voltou-se novamente para a mãe.
— E esse Espírito da Verdade... quem é?
— O Espírito da Verdade, filha... é o guia maior da Doutrina Espírita. Ele não se apresentou com nome humano. Mas... suas palavras, seu amor, seus ensinamentos, suas mensagens... tudo leva a crer que se trata do próprio Cristo, que prometeu voltar, não em carne, mas em espírito, como Consolador Prometido. Ele disse: “Enviarei o Espírito da Verdade, que vos guiará em toda a verdade.”
— Mas... nós éramos cristãos. Na Terra, nós nos dizíamos cristãos. Por que nunca nos falaram disso?
— Porque o homem, minha filha, muitas vezes deturpa a verdade. Retira o que lhe convém e omite o que liberta. A reencarnação estava na Bíblia. Jesus falava dela. Disse que João Batista era Elias que havia voltado. Disse que ninguém veria o Reino de Deus se não nascesse de novo. Mas os poderosos da Terra, aqueles que controlavam as religiões, esconderam. Tiraram. Deturparam. Porque a reencarnação liberta. Ela tira o medo do inferno eterno e mostra que a justiça de Deus é reparadora, e não vingativa.
Maris levou a mão ao peito, emocionada.
— Então... o Espiritismo é cristão?
— Com toda certeza. O Espiritismo é o Cristianismo redivivo, em sua essência mais pura. Sem dogmas, sem castigos eternos, sem promessas de salvação em troca de dinheiro ou sofrimento. Ele ensina que o amor é a lei suprema, e que colhemos o que plantamos. Ele nos mostra o caminho da reforma íntima, da bondade, da caridade — e da responsabilidade.
A jovem deixou cair uma lágrima.
— Mãe... por que eu fui tão cega?
A mãe pegou sua mão com ternura.
— Porque você não estava pronta. Mas agora está. Deus não cobra de ninguém antes do tempo. Ele espera. Ele ensina. Ele dá novas chances. E agora, você está vivendo a sua. Vamos continuar a leitura?
Maris assentiu com os olhos marejados. O coração ainda doía — mas já não era um peso de culpa, e sim de esperança. Pela primeira vez em anos, ela se sentia amada sem condições. E, mais do que isso: sentia que podia mudar.
A Pergunta que Move os Mundos
Maris sentou-se com o livro aberto no colo. As páginas estavam marcadas por um suave brilho, como se tivessem vida própria. Ela passou os dedos pela folha e murmurou, em voz baixa, como se conversasse com sua própria consciência:
— “Que se deve entender por infinito?”
A mãe, que estava perto organizando alguns tecidos claros em uma prateleira, virou-se lentamente com um sorriso terno nos lábios.
— Leu a segunda pergunta, filha?
Maris assentiu e ergueu o olhar.
— Mãe, essa palavra... “infinito”. Eu nunca entendi de verdade. Pode me explicar? O que o Espírito da Verdade quis dizer com a resposta?
A mãe se sentou ao lado dela com calma, tomou o livro em mãos e leu em voz alta:
> Pergunta 2 – Que se deve entender por infinito?
Resposta: “Aquilo que não tem começo nem fim. O desconhecido; tudo o que é desconhecido é infinito.”
Maris franziu levemente a testa.
— Isso parece simples, mas também tão imenso. Como pode algo não ter começado e não ter fim?
A mãe sorriu e segurou sua mão.
— Essa é justamente a beleza do conceito, filha. O infinito não é algo que nossos sentidos físicos conseguem compreender com facilidade. É como tentar colocar o oceano dentro de um copo. O infinito é tudo aquilo que transcende os limites do nosso entendimento material. É a eternidade de Deus, a grandeza da Criação, a vastidão do Universo, os segredos do tempo.
Ela passou os dedos de leve sobre a página.
— Quando os Espíritos dizem que o infinito é “o desconhecido”, eles não estão dizendo que é algo que nunca conhecemos. Estão dizendo que, por enquanto, é algo que ainda está além do que conseguimos entender. Mas, conforme evoluímos, estudamos e iluminamos o nosso espírito, passamos a entender partes desse infinito.
Maris olhou para cima, como se contemplasse um céu invisível.
— Então... o infinito também é o que não conseguimos explicar... mas que sentimos?
— Exatamente. Quando você ama de verdade, quando você olha para o céu estrelado e sente algo que não sabe explicar, quando você perdoa alguém e sente paz... você está, por um instante, tocando o infinito.
Ela sorriu com os olhos úmidos.
— E o infinito também está dentro de você. Porque você é um espírito eterno. Sem começo... e sem fim. A sua consciência, filha, sua alma, é parte dessa vastidão. Deus nos criou simples e ignorantes, mas nos deu a capacidade de crescer eternamente.
Maris baixou o olhar com emoção. Seu peito doía, mas era uma dor boa, como a de um coração que começa a renascer.
— Eu nunca pensei assim. Sempre achei que tudo tinha limite. Até o amor.
— O amor verdadeiro é infinito. Assim como a sabedoria. Assim como Deus.
Ela olhou para a filha e acariciou seu rosto.
— E agora que você começou esse estudo, essa cura não vai mais parar. Está tocando o infinito com o pensamento. E é assim que começa a transformação de um espírito.
Maris fechou os olhos e respirou fundo.
— Eu quero aprender tudo, mãe. Quero estudar esse livro, quero conhecer Deus de verdade. Não aquele Deus que eu tinha medo... mas esse que vocês estão me mostrando: justo, bondoso... infinito.
A mãe assentiu, emocionada.
— Então vamos continuar, filha. Cada pergunta desse livro vai abrir uma nova janela na sua alma.