O sol já começava a se pôr quando ela saiu pela entrada da área VIP do shopping, segurando com firmeza a bolsa caríssima que ainda usava para tentar manter o padrão que há muito não podia mais bancar. Os saltos batiam contra o piso de mármore com a altivez de sempre, mas por dentro, o medo a corroía — medo das cobranças que fingia não ouvir, das ameaças que ignorava.
Ela apertou o controle do carro importado. As luzes do alarme piscaram. Estava prestes a abrir a porta quando dois homens encapuzados apareceram do nada, surgindo de trás de um dos pilares de concreto. Um deles segurava uma pasta, o outro... uma arma.
— Boa noite, madame, — disse o mais alto, num tom debochado. — Viemos buscar o que é nosso.
— Pelo amor de Deus, — ela recuou um passo, tentando manter a compostura. — Eu só preciso de mais um pouco de tempo. Eu vou conseguir! Já estou negociando uns valores...
— Já demos tempo demais. O prazo venceu hoje. Dinheiro ou consequência.
Ela tentou recuar novamente, mas o som do disparo interrompeu o tempo.
PÁH!
O impacto a fez cair de joelhos. Uma dor aguda rasgou o abdômen, e o sangue quente escorreu pela seda branca da blusa de grife. O segundo homem puxou o comparsa e ambos correram pela lateral, misturando-se aos carros que saíam do shopping.
Um grito ecoou: era o segurança, que correu até ela e gritou por socorro no rádio.
— Chama o 911, agora! Código crítico! Mulher baleada na área VIP!
Dois paramédicos que estavam de plantão no centro médico do shopping correram com uma maca. Em poucos minutos, ela já estava sendo entubada e imobilizada. O diagnóstico preliminar era devastador:
— Perfuração no abdômen, possível hemorragia interna, a bala pode ter atingido a coluna... Ela está em estado gravíssimo.
Sem saber, seria levada diretamente para o Hospital Saint Claire, o mesmo onde sua filha Brittany estava internada, amamentando os netos recém-nascidos.
O destino, implacável, começava a cobrar.
Entre a Vida e o Orgulho
As luzes da ambulância refletiam no teto do pronto-socorro enquanto os paramédicos corriam empurrando a maca. A mulher — antes tão arrogante e segura — agora jazia coberta de sangue, segurando o ventre com as mãos trêmulas, a voz fraca e embargada.
— Fale comigo, senhora! Qual seu nome? Consegue me ouvir? Qual seu nome?
Ela tentou falar, os lábios se movendo com esforço.
— E-eu... eu estava devendo... idiotas... eles... eles me acharam...
— Concentre-se! Fale comigo! Você está em boas mãos agora.
— Eles... não esperaram... atiraram... salvem a minha vida! — ela murmurou com um fio de voz, os olhos arregalados pelo pânico.
— Estamos fazendo isso, senhora. Fique comigo!
— Ch-chamem o Dreu... chamem meu ex-marido... Dreu... pelo amor de Deus...
O paramédico olhou para a colega que monitorava os sinais.
— Pressão despencando! Saturação em queda! Está entrando em choque hipovolêmico!
— Rápido! Máscara de oxigênio! Vamos intubá-la! Ela está desmaiando!
A médica de plantão surgiu correndo com a equipe:
— Vamos! Pulso fraco, quase imperceptível. Preparem o tubo. Adrenalina! Agora!
Ela arquejou, o corpo estremecendo, os olhos revirando enquanto o monitor emitia um bip irregular.
— Ritmo cardíaco instável. Ela está entrando em parada!
— Ressuscitação! Carga 200! Um... dois... TRÊS!
— ZZZZT!
O corpo sacudiu-se com o choque. O monitor ainda emitiu um apito constante e mortal.
— De novo! Carga 300!
— ZZZZT!
— Temos ritmo! Fraco, mas voltou!
O enfermeiro completou:
— Ela perdeu muito sangue. A bala atravessou o estômago e possivelmente perfurou o intestino. E parece que se alojou próxima à coluna.
— Vamos levá-la direto para o centro cirúrgico. Agora!
Enquanto isso, uma enfermeira anotava os dados. Ela havia pedido por Drew, o ex-marido. Era o único contato próximo que poderia ser acionado.
— Alguém liguem para o senhor Drew. Urgente. Usem o número do cadastro da filha, Brittany.
E assim, o destino começava a selar o preço de toda a vaidade, soberba e maldade daquela mulher.
O Eco da Consequência
O corredor branco da ala neonatal ainda exalava o leve perfume antisséptico e a paz silenciosa das incubadoras. Lana ajeitava a máscara descartável, ao lado da futura sogra, enquanto ambas saíam da UTI em passos leves, emocionadas pela cena que haviam presenciado com Brittany e os bebês.
Mas ao virarem o corredor, o clima mudou repentinamente.
— Código Vermelho! Emergência! Chegando uma vítima de atentado! Foi no shopping! Perdeu muito sangue!
O som das rodas da maca ecoava alto. A voz de um paramédico surgiu forte:
— Chamem o senhor Drew! Ela pediu! Disse que é o ex-marido! Rápido! Chamem o pai da filha dela!
Lana e a mãe do Patrick pararam de andar, instintivamente virando o rosto. Os olhos de ambas buscaram a origem da comoção. E então, viram.
O corpo ensanguentado sendo empurrado em alta velocidade...
A roupa de marca ainda visível, o vestido bege que ela usava horas antes, no restaurante.
— Meu Deus! — a mãe do Patrick sussurrou, segurando o braço de Lana.
— É ela! É a mãe da Brittany!
Lana levou a mão à boca, o coração acelerando.
— A mesma roupa... é a mesma! A senhora viu também, né? Ela estava com isso no almoço!
O segurança, que observava o fluxo dos socorristas, se aproximou, curioso ao ver as duas paralisadas.
— Aconteceu alguma coisa? — perguntou ele.
— É... quem é a mulher que entrou? — Lana indagou, aflita.
— Parece que foi a ex-esposa do empresário Drew. Levaram um tiro no abdômen, tentativa de homicídio. Foi no estacionamento do shopping. Dois suspeitos fugiram numa moto. Testemunhas disseram que ela estava sendo cobrada por dívidas antigas. Estava pedindo pra chamar o ex-marido enquanto sangrava.
Lana fechou os olhos por um segundo. O choque era real.
A mãe do Patrick não pensou duas vezes: pegou o celular da bolsa com mãos trêmulas.
— Patrick? É urgente. A mãe da Brittany está entre a vida e a morte. Levaram ela agora para o centro cirúrgico. Tentaram matar ela, meu filho. Estávamos saindo da UTI neonatal e vimos tudo. Ligue pro Drew. Agora!
— Sim... sim, mãe. Eu vou. Já tô indo. — respondeu Patrick do outro lado, a voz firme, porém impactada.
Lana sussurrou, com tristeza nos olhos:
— A vida cobra, não cobra? Mas, mesmo assim, ela é mãe. É a mãe da Brittany. Isso vai doer se ela se for.
A mãe do Patrick assentiu, em silêncio. O barulho da maca sumindo pelos corredores, rumo à cirurgia... e talvez, à redenção.
Quando o Passado Cobra em Sangue
Do outro lado da linha, Patrick atendeu em viva voz. Ele ainda estava em casa, organizando alguns papéis do trabalho, quando o telefone da mãe tocou.
— Alô? Mãe?
— Patrick, escuta com atenção...
— Como?! — ele interrompeu, erguendo-se da poltrona de imediato, com o rosto contraído.
A mãe dele continuou, a voz levemente trêmula:
— Nós saímos para comprar os vestidos das meninas, depois paramos no shopping para almoçar. Foi lá que encontramos a mãe da Brittany. Ela foi até nossa mesa. Você sabe como ela é, né? Deu as alfinetadas de sempre. Mas... Patrick, quando saímos daqui do hospital agora há pouco, depois de visitarmos a Brittany e os bebês... escutamos uma emergência. Médicos correndo, gente gritando... estavam pedindo para chamar o Drew. A mulher que levavam na maca era ela, Patrick. Aquela mesma roupa.
Patrick sentiu o mundo girar por um segundo. A imagem da mulher arrogante e fria não combinava com o que estava ouvindo.
— Ela...? A mãe da Brittany...? Levando um tiro?
— Foi o que disseram aqui, meu filho. Um segurança nos contou que atiraram nela no estacionamento do shopping. Ela devia dinheiro para alguém, e parece que tentaram matá-la. Disseram que ela perdeu muito sangue. Está entre a vida e a morte. Os médicos gritaram para chamarem Drew.
Lana tomou o celular da sogra por um instante e falou, com a voz urgente:
— Patrick, amor, ela pediu ajuda. Gritava pedindo socorro. Falava para salvarem a vida dela. Pediu para chamarem o Drew... Nós vimos ela sendo levada na maca, sangrando. Já foi direto para a cirurgia. Traz o Drew, por favor. Brittany não pode saber. Ela está tão frágil com os bebês... ela não pode saber disso agora.
Patrick pegou as chaves do carro num impulso.
— Já estou saindo. Vou passar na casa do Drew agora. Ele precisa saber. Não se preocupem, não vamos deixar Brittany saber disso enquanto não for necessário. Eu juro.
— Tá bom, meu filho. Vem com cuidado. Nós estamos na recepção do hospital.
A chamada se encerrou. Patrick já descia as escadas do prédio com o celular em mãos, os dedos voando na tela para localizar o número de Drew. Ele precisava avisá-lo... antes que fosse tarde demais.