O Nome Que Rasgou o Silêncio
O relógio marcava quase oito da noite quando Dreew entrou na ala intensiva. Vestia roupas simples, mas o semblante denunciava dias sem dormir. Cada passo até a porta da UTI parecia pesar uma tonelada. Ele higienizou as mãos, vestiu o jaleco descartável, a máscara… e respirou fundo antes de entrar.
Ali estava ela.
Maris. Frágil, pálida, perdida entre fios e monitores. Um corpo que já havia enfrentado a morte… mas agora lutava para segurar a vida.
Por um instante, ele parou na porta, sentindo a garganta queimar. As lembranças vieram como uma enxurrada: os anos juntos, os erros, as palavras cortantes, as decisões que os afastaram. E agora… aquilo.
Uma enfermeira se aproximou, com tom calmo:
— Ela está sob efeito leve da sedação. Pode ouvir, mas ainda não vai conseguir falar direito. Evite emocioná-la demais, tudo bem? Qualquer alteração, eu volto.
Ele assentiu, mas o coração dele estava em pedaços.
Caminhou devagar até a beira do leito e segurou a grade da cama com força.
Os olhos dela estavam fechados, mas as pálpebras tremiam.
— Maris… — sussurrou, a voz embargada. — Sou eu. Dreew.
E então aconteceu.
As pálpebras dela se ergueram lentamente. Primeiro, um olhar turvo, confuso… depois, o reconhecimento.
As lágrimas brotaram nos olhos dela sem pedir licença.
— Maris… estou aqui. — Ele aproximou a mão, hesitante. — Não precisa ter medo. Eu não vou sair.
Ela fez um esforço sobre-humano para erguer os dedos. A mão fraca tremeu no ar, perdida. Dreew não esperou: segurou-a entre as suas, com delicadeza, como quem segura algo sagrado.
Foi então que ele ouviu.
Um som rouco. Arranhado. Mais ar do que voz.
— D… Dree…w…
O coração dele parou por um segundo.
— Sou eu, estou aqui. Sou eu.
Os lábios dela se moveram de novo, tentando formar outra palavra.
Um chiado quase inaudível escapou, junto com uma lágrima quente:
— P… per…dão…
Dreew sentiu o peito se despedaçar. Apertou a mão dela com suavidade, as lágrimas agora correndo livres pelo rosto.
— Shhh… não fala. Não força. Não precisa me pedir perdão. — Ele se inclinou e beijou a testa dela, com reverência. — Eu só quero você viva. Eu só quero que você fique e bem.
O monitor apitou levemente, sinalizando o aumento da frequência cardíaca. A enfermeira lançou um olhar rápido pela porta, mas não interveio. Sabia que aquele momento valia mais do que qualquer remédio.
Maris fechou os olhos devagar, exausta… mas com a mão ainda presa à dele. Como se aquele toque fosse a âncora que a manteria no mundo.
E, pela primeira vez em quase trinta dias, o vazio dela começou a se encher de esperança.
As pálpebras dela se ergueram lentamente. Primeiro, um olhar turvo, confusos e depois, o reconhecimento.
As lágrimas brotaram nos olhos dela sem pedir licença.
— Maris… estou aqui — ele disse, com a voz baixa e controlada. — Pode ficar tranquila. Você está segura agora.
Ela fez um esforço sobre-humano para erguer os dedos. A mão fraca tremia no ar, sem direção. Dreew não hesitou: segurou a dela entre as suas, com o cuidado de quem segura uma coisa rara e delicada.
Foi então que ele ouviu.
— D… Dree…w…
Ele se aproximou um pouco mais, com os olhos marejados.
— Sou eu. Estou aqui. Pode descansar.
Os lábios dela se moveram de novo, tentando formar outra palavra.
Saiu apenas um chiado entrecortado de lágrimas:
— P… per…dão…
Dreew fechou os olhos por um momento, sentindo o nó se formar na garganta. Depois, apertou levemente a mão dela e respondeu com firmeza, sem precisar de muito:
— Não fala agora. Você precisa se poupar.
— A gente conversa depois, com calma. Eu estou aqui, e vou continuar por perto, como for preciso.
O Choro Que Rompe o Silêncio
Maris mantinha os olhos fixos nos de Dreew, como se temesse que ele desaparecesse se piscasse. A mão dela ainda estava presa à dele, fraca, mas agarrada com o que restava de força emocional.
E então, as lágrimas vieram de vez.
Não foram suaves. Nem controladas.
Vieram como um rio represado por décadas de dor, culpa, medo e saudade.
O corpo ainda imóvel… mas a alma gritava em lágrimas.
O peito dela subia e descia com esforço. O choro era silencioso, mas o rosto contorcido falava por si. A respiração ficou irregular.
— Enfermeira! — Dreew chamou imediatamente, preocupado. — Por favor, ela está chorando… ela tá ficando agitada!
A enfermeira entrou no quarto em segundos, analisando o monitor cardíaco e os sinais vitais.
— Frequência elevada. Respiração superficial.
Ela se virou para o interfone:
— Chamem o neurologista plantonista e a psicóloga. Agora.
Dreew afastou-se um pouco, respeitando o espaço, mas manteve o olhar nela, o coração apertado. Queria abraçá-la, mas sabia que não podia. Ela estava vulnerável demais.
Maris fechou os olhos com força, como se quisesse fugir de tudo aquilo — do presente, do passado, da dor. Os ombros se contraíram num tremor fraco. Os soluços começaram a aparecer.
— Ela está consciente, mas emocionalmente desorganizada. — disse a psicóloga ao chegar, se aproximando com voz suave. — Vamos manter estímulo verbal apenas. Sem toque por enquanto.
O neurologista entrou em seguida, analisando o estado dela:
— Ela está respondendo emocionalmente ao reencontro. É esperado. Mas precisamos evitar exaustão neurológica. Vamos acompanhar por alguns minutos antes de qualquer medicação.
A psicóloga se abaixou, na altura do olhar de Maris, e falou com doçura:
— Maris… você está segura. Pode chorar, sim. Pode sentir. Mas não está sozinha. Estamos aqui. Respira devagar, tudo bem?
Maris tentou obedecer. Os olhos voltaram-se rapidamente para Dreew, buscando nele a âncora que sua alma ainda reconhecia.
A psicóloga notou.
— Você quer que ele fique?
Maris piscou devagar. Duas vezes.
— Então ele fica. Mas só se você quiser. Aqui é o seu tempo, o seu momento.
O neurologista anotava observações. Os monitores voltaram a estabilizar lentamente. O choro ainda vinha, mas menos convulsivo, mais profundo. Era um choro de alma lavando dor.
Maris, mesmo tão frágil, estava vivendo.
E aquele choro… era o primeiro passo para renascer.
Onde Está Minha Filha?
O ambiente da UTI estava em silêncio tenso. A psicóloga permanecia ao lado da cama, observando a paciente com olhos atentos. O neurologista havia terminado a avaliação inicial e recuado para analisar os dados vitais no monitor. A enfermeira mantinha as mãos preparadas para qualquer intervenção, mas… por ora, tudo estava sob controle.
Dreew permanecia em pé, um passo atrás, as mãos trêmulas e os olhos vermelhos. A emoção da cena anterior ainda pesava no ar, como um véu.
Maris piscou devagar, como se cada movimento exigisse energia que o corpo ainda não tinha. A voz, quando veio, foi um sussurro rouco… quase imperceptível. A psicóloga teve que se inclinar um pouco mais para captar o som.
— B… Britt… an… y…
A psicóloga olhou para Dreew, depois voltou-se para ela com cuidado.
— Você está perguntando pela Brittany?
Maris assentiu levemente com os olhos, enquanto uma nova lágrima escorria pela lateral do rosto. Os lábios rachados se moveram de novo, num sussurro seco:
— Onde… ela…?
Dreew se aproximou, com o coração em pedaços.
A psicóloga se adiantou, segurando o momento com a serenidade que a situação exigia.
— Maris, sua filha está bem. Ela está sendo acompanhada, em repouso. Está segura. Mas… ainda não sabe que você despertou. A psicóloga que a acompanha vai preparar esse encontro com muito cuidado, tá bom?
Os olhos de Maris brilharam de novo. Era a dor de uma mãe. A dúvida. A vontade de proteger mesmo sem forças.
— Ela… sabe… que eu... estou viva?
A psicóloga hesitou por um segundo, depois respondeu com honestidade calma:
— Ela não sabe o que aconteceu com você, ele teve os bebês prematuros . Mas a condição dela também é delicada. Ela está no mesmo hospital, e está sendo cuidada com muito amor. E você… vai reencontrá-la. No tempo certo. Quando as duas estiverem prontas.
Maris fechou os olhos, apertando-os como quem deseja apagar a dor.
— Dree…w… cuida…
— Eu estou cuidando, Maris — respondeu ele, engolindo a emoção. — Da Brittany dos bebês. E de você também, no que me for possível.
Ela tentou sorrir, mas o rosto m*l obedeceu. Apenas uma lágrima silenciosa foi sua resposta.
A psicóloga se aproximou e tocou de leve no braço dela:
— A sua filha vai ficar muito feliz em te ver. Mas agora… você precisa descansar. A sua recuperação é a chave para esse reencontro acontecer.
Maris assentiu fracamente, os olhos pesando. O cansaço tomou conta de novo. Mas dessa vez… era um cansaço mais sereno. Ela tinha ouvido o que precisava. Brittany estava viva. Estava ali.
E estava esperando.