Pensamentos e decisões

1158 Words
Vi o pai delas estacionar do outro lado da rua. Um homem simples, de aparência forte e digna, com olhar protetor. Lana correu para abraçá-lo. Lena ajeitou o cinto do banco de trás. Nisse entrou por último. A porta se fechou e o carro sumiu na escuridão da noite. Eu fiquei ali. Imóvel. Harry se aproximou e me deu um leve tapa no ombro. — Pegando ar, primo? — Observando... — murmurei, ainda encarando o vazio. — E aí, vai continuar se enganando ou vai fazer alguma coisa? — Vou fazer o que tem que ser feito — respondi. Louis se juntou a nós, já com as chaves do carro em mãos. — A noite foi boa. Mas pra você, eu diria que foi... reveladora. Assenti em silêncio. Entramos no carro. O trajeto de volta parecia mais longo do que deveria. As luzes da cidade passavam pela janela, mas minha mente não acompanhava o caminho. No meio do silêncio, soltei: — Isso precisa parar... Harry me olhou pelo espelho retrovisor, curioso. — Ou vai acontecer de vez — completei. Assim que entramos no carro, o silêncio inicial foi preenchido pelo som discreto do motor e pelas batidas ainda pulsando nos nossos corpos. A noite tinha sido intensa. E, de alguma forma, definitiva. — E a Pathy? — perguntei, enquanto ajeitava o cinto. Harry foi o primeiro a responder: — O motorista veio buscá-la. Ela saiu antes das meninas. Assenti, absorvendo a informação. Patricia sempre foi prática. Sabia exatamente a hora de sair de cena. — Certinha, como sempre — comentei. — Meninas bem educadas. Louis riu no banco de trás. — Bem educadas, lindas e... perigosas. Harry virou de leve no banco do carona, com um sorriso travesso. — Patrick... eu fiquei deslumbrado com a Lena. Sério mesmo. Aquela garota... tem algo nela. Um brilho, sei lá. Não é só beleza. É... personalidade. Ela me respondeu de um jeito lá na pista que eu ainda tô processando. — Você está dizendo que ela te colocou no lugar? — provoquei, com um meio sorriso. — Me colocou. E eu gostei — confessou, com sinceridade surpreendente. — Vou tentar investir. Quem sabe ela me dá uma chance. Louis soltou um assovio baixo. — E eu? Fiquei completamente amarrado na ruiva. Aqueles cabelos vermelhos... aqueles olhos verdes. Será que tudo nela queima desse jeito? Harry riu, batendo no ombro do irmão. — Tu não presta. — Tô falando sério — Louis insistiu. — A Nisse é... única. Fiquei encarando ela dançando com aquele jeitinho leve, como quem não quer nada, mas domina tudo. Se ela der uma chance... ah, primo, eu vou com tudo. Soltei um suspiro demorado e soltei: — Vocês dois precisam entender uma coisa. Essas meninas não são como as mulheres que vocês estão acostumados. Elas não se encantam com status, nem com carros importados, nem com convites pra resorts. Eles ficaram em silêncio por um momento. Harry foi o primeiro a responder, com tom firme: — Quem disse que a gente quer brincar? — É — Louis completou. — A gente tá falando sério. A diferença é que, dessa vez, a gente quer conquistar. Sem joguinhos. Olhei os dois por um instante. Nunca imaginei que veríamos o dia em que os irmãos Bianchi se renderiam... de verdade. Mas parecia que algo naquela noite mudou a direção das coisas. E não era só com eles. Porque, apesar de todo o discurso racional que eu tentava manter, a imagem de Lana... não saía da minha cabeça. Seu perfume ainda estava grudado na minha pele. Seu olhar ainda queimava na minha memória. E eu sabia — essa história estava longe de terminar. O carro estacionou em frente ao meu prédio com o ronco suave do motor se dissolvendo no ar da madrugada. Harry virou-se para mim com aquele sorriso irritantemente afiado. — Dorme bem, primo. E sonha com a Lana — disse, com uma piscadela carregada de ironia. Revirei os olhos, mas não consegui conter o riso. — Vai pro inferno, Harry. — Com passagem de ida, por favor — ele respondeu, rindo. Louis apenas acenou do banco de trás, aquele aceno silencioso que entre irmãos significava: Eu te entendo. E sim, você tá lascado. Subi sozinho. A noite ainda pulsava na minha pele, mas por dentro, tudo já se reduzia a uma única imagem: os olhos dela. A voz dela. A dança, o toque leve, e a forma como ela me olhou antes de se despedir. Desfiz o nó da gravata no corredor. Soltei os sapatos no canto da sala, joguei o paletó no encosto do sofá, e fui direto para o banheiro. Deixei a água escorrer pelo meu corpo como se pudesse levar embora a tensão, o desejo, o desconcerto. Mas não levou. Pelo contrário. Cada gota parecia reacender as lembranças dela. O cheiro dela. O som da risada quando me respondeu “nem pra mim, doutor Patrick.” Fechei os olhos. Lana. A mente tentou resistir, mas o corpo já havia se rendido. Deitei ainda com o cabelo úmido, os lençóis frios contrastando com o calor interno que me consumia. E então ela veio. Nos meus sonhos, Lana usava o mesmo jeans da boate, mas a blusa desaparecia lentamente sob meus dedos. Estávamos na minha cama, ela deitada de lado, o cabelo espalhado no travesseiro. Ela sorria para mim. Não havia culpa, não havia regras. Só desejo, e algo além dele. — Patrick — ela sussurrava. E naquele sonho, era a primeira vez que eu ouvia meu nome soar como promessa. Ela era só minha. E eu era só dela. Lana Na casa modesta dos pais, no quarto dividido com a irmã e a prima, Lana tentava conter o vendaval dentro do peito. As luzes estavam apagadas. Lena já roncava baixinho. Nisse respirava profundo, enrolada no lençol como um burrito. Mas Lana... não dormia. Ela apertava o travesseiro contra o peito, sentindo ainda a vibração da noite. Não era o som da boate, não era a música. Era ele. Patrick. O jeito como ele desceu até a pista, como se tivesse sentido ciúmes. Como se tivesse precisado dizer: ela está comigo. E o pior... uma parte dela quis estar mesmo. Virou-se na cama. O coração teimava em bater fora do compasso. Fechou os olhos e deixou a mente se soltar. Patrick surgiu nos pensamentos com o cabelo levemente bagunçado, a barba por fazer, a expressão carregada daquele misto entre controle e desejo. No sonho, ele a tomava pela cintura, erguia o queixo dela com dois dedos e dizia: — Você é diferente. E eu... não consigo mais negar. Ela respondeu com um beijo. Um beijo que só existia na imaginação dela, mas que parecia tão real que seus lábios chegaram a tremer. Acordou com os olhos úmidos. Era só um sonho. Mas deixava uma marca profunda. Como se o destino tivesse começado a tatuar um nome no coração dela. Ninguém disse nada. Mas a decisão estava tomada.
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