####Avaliação Psicológica: A Hora Está Chegando

2030 Words
A psicóloga entrou no quarto suavemente, sem alarde, e encontrou Brittany sentada na poltrona, terminando o café da manhã enquanto Lena recolhia a bandeja. — Bom dia, Brittany — saudou a profissional com um sorriso leve. — Bom dia, doutora — respondeu ela, ajeitando-se um pouco na poltrona, os olhos atentos, mas calmos. — Vejo que está melhor hoje... Dormiu bem? — Dormi sim. A dona Helena me deu um remédio e... pela primeira vez, eu não sonhei com desespero — disse com sinceridade. A psicóloga puxou a cadeira e sentou-se ao lado da cama. — Isso é ótimo. O sono é o primeiro passo para a mente começar a se reorganizar. E essa noite foi um marco importante, não foi? Brittany sorriu, emocionada. — Foi... Eu tive meus filhos no meu peito. Eu senti o coraçãozinho deles batendo. Era como se eu estivesse viva de verdade... pela primeira vez. Eu chorei. Mas foi um choro bom. A psicóloga observou sua expressão, a tranquilidade no olhar, o semblante que já não carregava a tensão dos últimos dias. Ela anotou mentalmente: conexão materna restabelecida, estabilidade emocional evidente, a******a à escuta e ao afeto, discurso coerente e esperançoso. — E como você se sente agora em relação a você mesma, Brittany? Ela hesitou um pouco, mas respondeu: — Eu sinto que... eu mudei. Que eu estou aprendendo a amar sem medo. Eu não sei se sou boa o suficiente, mas sei que quero tentar, e... eu não quero mais fugir de mim. A psicóloga assentiu com suavidade, com um leve brilho de aprovação nos olhos. — Brittany, você sabe que está indo muito bem, não sabe? Sua recuperação emocional tem sido tão boa quanto a dos seus bebês. — Às vezes eu fico pensando... será que eu mereço isso tudo? Esse carinho... essa segunda chance... — Merece sim. Todos nós erramos. Mas você está fazendo algo que muitas não fazem: enfrentando a dor, criando laços, cuidando mesmo sem certezas. A psicóloga fechou o caderno de anotações e respirou fundo. Ela havia analisado os sinais com cautela: Padrão de sono restaurado. Vínculo afetivo forte com os bebês. Alimentação regularizada. Rede de apoio bem recebida. Ausência de respostas defensivas. Aceitação de ajuda e busca por diálogo. Estava claro: Brittany estava emocionalmente apta para lidar com verdades difíceis, desde que tivesse ao lado a pessoa certa — e essa pessoa era Dreew. — Brittany, você mencionou hoje a sua mãe, não foi? Ela assentiu, pensativa. — Eu fico pensando se ela já veio aqui... se está bem... se se importa. — Isso mostra que você está se permitindo sentir saudade, e isso é bom. Mas, me diz, se um dia você precisasse ouvir uma verdade difícil sobre alguém que você ama... você acha que conseguiria escutar, desde que tivesse uma pessoa de confiança do seu lado? Ela refletiu por um instante e respondeu com a voz embargada: — Se fosse o papai do meu lado... eu acho que sim. A psicóloga sorriu com doçura. — Bom saber disso. Eu vou pedir que amanhã, às nove da manhã, ele esteja aqui. Só quero fazer uma última análise com você até lá. Mas adianto... você está mais forte do que imagina. Brittany fechou os olhos por um instante, apertou os lábios num esforço para não chorar e sussurrou: — Obrigada, doutora. Obrigada por confiar em mim. A profissional se levantou, tocou levemente no ombro dela e saiu do quarto com discrição. No corredor, já em seu celular, ela digitou uma mensagem: Sr. Dreew, bom dia. Avaliei a Brittany hoje pela manhã. Ela apresentou estabilidade emocional, vínculo restaurado com os bebês, e está receptiva a conversas profundas. Solicito, por favor, que esteja aqui amanhã às 9h. Será o momento adequado para conversarmos com ela sobre o estado da mãe. Com você ao lado dela, ela vai aguentar. O Pai que Espera a Hora Certa Minutos depois de enviar a mensagem para Drew, o celular da Dra. Evelyn vibrou com a resposta. Ela atendeu rapidamente, reconhecendo o número particular. — Doutora Evelyn? — a voz grave do outro lado estava firme, mas carregada de preocupação. — Sim, senhor Dreew. Estou aqui. — A senhora tem certeza de que a minha filha está apta a ouvir algo assim? Eu sei o quanto a Brittany é sensível... E não quero que isso abale os progressos dela. A doutora respondeu com serenidade e precisão: — Senhor Dreew, hoje de manhã, eu fiz uma análise cuidadosa do estado emocional da sua filha. Ela apresentou estabilidade afetiva, consciência materna aguçada, boa aceitação da rede de apoio e ausência de quadros de ansiedade. Ela dormiu bem, se alimentou, chorou com consciência emocional, e verbalizou questões profundas com clareza. Houve um breve silêncio na linha. — Entendo. E vai repetir essa análise? — Sim. Ainda esta tarde. Eu sou criteriosa, o senhor sabe disso. Se notar qualquer sinal de instabilidade, aguardaremos mais um ou dois dias. Mas, sinceramente, senhor Dreew, não há mais como adiar. Brittany está perguntando pela mãe com frequência crescente, e começa a desconfiar que algo está sendo escondido. Se o senhor deseja que ela receba a verdade de forma controlada e segura, este é o momento de prepará-la. Dreew respirou fundo do outro lado. — Tudo bem. Amanhã, às nove horas em ponto, eu estarei aí. Quero estar ao lado dela... se for mesmo a hora certa. — Acredito que será. E talvez a aceitação seja menos dolorosa por isso mesmo: porque o senhor estará ao lado dela. E também porque uma das amigas estará presente — a Lena. A Brittany parece se apoiar bastante nesse vínculo. — Sim, elas criaram um laço muito forte. E quanto à mãe dela, há alguma novidade? A doutora fez uma breve pausa, antes de responder com profissionalismo e esperança: — A senhora Maris não corre mais risco de vida. O estado atual é de coma leve, não mais profundo. O quadro é estável. Ela não está sendo mais sedada artificialmente. A qualquer momento ela pode despertar. E esse despertar será natural, do próprio organismo. Drew soltou um suspiro que misturava alívio com emoção contida. — A qualquer momento... É o que eu tenho pedido a Deus todos os dias. — E, se Deus permitir, sua filha poderá estar mais preparada do que nunca quando esse momento chegar. — Obrigado, doutora. De verdade. — Eu que agradeço, senhor Dreew. Pela confiança, pela presença constante. Amanhã nos vemos, e eu espero que seja o início da cura — da sua filha e da sua família. Eles encerraram a ligação com um silêncio respeitoso. Do lado de fora da ala neonatal, a Psicóloga fez uma última anotação em sua prancheta, olhando para a porta do quarto onde Brittany conversava com Lena e sorria discretamente. Ela sabia — a hora estava chegando. Final da Tarde. A profissional entrou no quarto com leveza e tom cordial: — Boa tarde. — Boa tarde, doutora — responderam Lena e Nice em uníssono. — Boa tarde — completou Brittany, com um pequeno sorriso. A psicóloga observou o ambiente. A luz suave do fim de tarde entrava pela janela, e Brittany parecia mais viva, mas despertava — mas seus olhos ainda carregavam uma oscilação emocional. — E aí, como passou o dia? — Melhor do que ontem... muito melhor. Meus filhos ficaram no meu colo de manhã, como dois pacotinhos de vida. Eu chorei, mas foi de alegria. Eu senti como se eles me perdoasse — respondeu Brittany, emocionada. — Isso é muito bom de ouvir — comentou a doutora, pegando o prontuário ao pé da cama e, com o canto do olho, observando suas reações sutis. A profissional ficou com elas por cerca de 25 minutos. Fez perguntas leves. Observou a forma como Brittany reagia a menções sobre infância, figuras de apoio, e como evitava nomes. Notou o esforço que ela fazia para parecer bem — o que era legítimo, mas ainda não estruturado emocionalmente. Quando saiu do quarto, foi direto ao consultório. Abriu um dos livros que vinha consultando nos últimos dias: “Teoria do Apego e Puerpério”, de Bowlby e estudos contemporâneos de Mary Ainsworth adaptados à realidade de mães solo em puerpério precoce. Também revisou trechos do manual da OMS sobre trauma agudo em parturientes sem rede de apoio afetiva conjugal. Fechou o livro. Respirou fundo. Pegou o telefone e ligou. — Sr. Dreew? Boa tarde. — Boa tarde, doutora. — Estou entrando em contato para lhe dizer que avaliei sua filha novamente. E, apesar da melhora, ela ainda não está pronta para receber a informação sobre o estado da mãe. — A senhora tem certeza? — Sim. Eu acompanhei a reação dela durante o dia, e ela teve avanços, mas não sustenta ainda uma estrutura de enfrentamento emocional. Se dermos essa notícia agora, podemos comprometer todo o progresso feito até aqui — inclusive o vínculo com os gêmeos. — Entendo... — O senhor me pediu para estar presente quando fosse revelado, e eu mantenho esse compromisso. Mas peço mais 48 horas a 72 horas. Estou aplicando uma abordagem segura, com base em vínculo afetivo, proteção materna e estabilidade interna. — Está bem, doutora. Se a senhora achar melhor, eu confio. — Obrigada, senhor Dreew. Eu volto a lhe contactar assim que minha próxima avaliação for concluída. Tenha uma boa noite. Ela desligou. Fez suas anotações. Nota da Terapeuta (para o leitor) Nota profissional – justificativa de conduta clínica Caso você, leitor ou leitora, ache que esta psicóloga está “protelando demais” a entrega de uma notícia importante para a personagem Brittany, permita-me explicar como terapeuta e profissional da saúde mental: Brittany encontra-se em estado pós-parto prematuro, com dupla maternidade simultânea, ausência de rede conjugal, histórico recente de abandono afetivo e tentativas de autossabotagem emocional. Mesmo com o avanço visível em 36 horas, a entrega precoce de uma notícia traumática poderia quebrar seu sistema de defesa recém-construído, ocasionando: Regressão emocional e desconexão afetiva com os filhos; Interrupção no processo de aleitamento e vínculo físico; Gatilho de pânico, colapso ou luto antecipado, mesmo sem confirmação de perda real; Revolta contra o pai e amigas por terem “escondido” a verdade. Eu, como terapeuta, estou utilizando uma metodologia baseada na linha Carl Rogers – centrada na paciente, com reforço de vínculos afetivos e suporte progressivo. A verdade será revelada sim — mas de forma ética, humana e segura. Se você é pai, mãe ou já passou por uma dor parecida, entenderá. Se ainda não passou, apenas respeite. Nota da Autora – Reflexão e Justificativa Você, leitor ou leitora, pode até pensar que estou exagerando nos cuidados com a personagem Brittany, que estou adiando demais uma revelação importante, ou que poderia simplesmente acelerar o enredo. Mas o que talvez você ainda não tenha compreendido é que, para mim, cada história que escrevo é como se fosse uma vida real. Eu não estou apenas criando um romance — eu estou mergulhando em emoções, dores, traumas e curas. E, por isso, tudo o que coloco aqui é cuidadosamente pesquisado, refletido e sentido. A Brittany não é só uma personagem. Ela é o retrato de muitas mulheres que enfrentam gestações inesperadas, solidão, reconciliações com a própria história e conflitos familiares m*l resolvidos. No caso dela, houve sim um afastamento com a mãe. E se essa notícia — de que a mãe está entre a vida e a morte — for dada no momento errado, ela poderá se perder em culpas, arrependimentos e remorsos que ainda não sabe administrar emocionalmente. Ela pode pensar: “Eu deveria ter deixado o orgulho de lado?” “Por que eu me concentrei só nos bebês?” “E se eu tivesse feito diferente?” E eu, como autora e mulher, não posso ignorar esse tipo de dor. Por isso, toda decisão tomada no texto — até mesmo o momento certo de revelar uma verdade — é pensada com base em consequências reais, emocionais e humanas. Sempre que for necessário, ao final dos capítulos ou trechos mais sensíveis, eu vou trazer essas abordagens explicativas. Porque a minha missão aqui não é apenas entreter tocar, transformar e fazer pensar. Obrigada por estar aqui comigo. Com amor, A autora.
Free reading for new users
Scan code to download app
Facebookexpand_more
  • author-avatar
    Writer
  • chap_listContents
  • likeADD