CONFISSÕES DE ALMOFADA E UM TOQUE DE SORVETE

1313 Words
Lana entrou em casa com passos silenciosos, segurando os sapatos nas mãos para não acordar ninguém — ou pelo menos era o que imaginava. — Até que enfim! — sussurrou uma voz aguda no escuro da sala. Ela levou um susto. Acendeu a luz. Lena estava no sofá, com uma coberta nas pernas, o cabelo preso de qualquer jeito e uma tigela de pipoca quase vazia no colo. Nisse surgiu da cozinha com um copo de suco e a expressão de quem esperava por aquele momento como um episódio final de novela. — Mas que é isso, uma vigília? — riu Lana, deixando os sapatos ao lado da porta. — Óbvio! Você saiu com o homem mais cobiçado de Boston e achou que ia entrar aqui como quem voltou da farmácia? — retrucou Lena, dando tapinhas no sofá. — Senta aí, desembucha. Lana largou a bolsa no aparador, tirou o blazer e se jogou entre as duas. Tereza devia já estar dormindo, então era o momento ideal para aquele tipo de conversa com risadinhas abafadas. — Então... — começou Nisse, com os olhos arregalados. — Onde ele te levou? — Num restaurante lindo, chamado La Riva. Jantamos à luz de velas, e ele... foi um cavalheiro o tempo todo — respondeu, com um sorrisinho ainda sonhador no rosto. Lena estreitou os olhos. — Ele tentou alguma coisa? — Tentou, me emocionar. E conseguiu — disse Lana, com a voz mais baixa. — Nós dois conversamos como adultos. E depois ele me perguntou se podia me beijar. Nisse levou a mão ao peito. — Ai, meu Deus. Ele pediu? — Sim. E eu deixei. — Ela suspirou. — E foi... lindo. Lena e Nisse se entreolharam, como duas detetives confirmando uma teoria. — Você está apaixonada, né? — soltou Nice, como quem já sabia. Lana hesitou, mas não havia como negar. — Sinceramente? Estou, e não sei como agir. Lena se inclinou, empolgada: — E você acha que ele não está também? Amiga, o cara enfrentou o conselho, falou com nosso pai e agora tá te tratando como uma rainha. Isso é amor que tá tomando forma, e das boas. — E não é só isso — acrescentou Nice, animada. — Sabia que o Louis me chamou pra tomar sorvete? Sorvete! Numa praça pública! Ele disse que sabe que eu sou moça direita e que queria me levar num lugar "sem rótulos e sem maquiagem", palavras dele. — Mentira! — riu Lana, cobrindo a boca. — Pois é verdade! E ainda comprou uma flor de um vendedor de rua e me deu. Eu quase me derreto — disse Nice, rindo sozinha. — E vocês acham que só vocês duas estão passando por isso? — interrompeu Lena, dramática. — O Harry não para de mandar presentinhos pra mim na faculdade. Caneta, lanche, até uma garrafinha de água com bilhete. — Não acredito! — gritaram as duas em uníssono. — E agora... — Lena abaixou a voz, olhando para os lados. — Ele contratou um segurança pra mim. Um guarda-costas discreto. Disse que é só "pra garantir minha tranquilidade" por causa de um “comentário” que ouviu sobre um carinha que tem me perturbado no campus. — Menina do céu... — Lana riu, encostando-se no sofá, as bochechas coradas. — Será que esses dois playboys resolveram mudar de verdade? — provocou Nisse, levantando a sobrancelha. — Não sei — respondeu Lana. — Mas se acham que vão ter o que outros quiseram e a gente nunca deu... — ...vão ter que ralar muito — completou Lena, fazendo as três caírem na risada abafada. — A gente não vai facilitar só porque agora eles resolveram ser românticos — disse Nice, balançando o dedo. — Se quiserem, vão ter que conquistar a gente como nos romances antigos. Com respeito. E com paciência. — Exatamente — disse Lana, mais séria agora. — Porque se for pra amar, que seja inteiro. E se for pra construir, que seja com base firme. Histórias que só mulheres fortes podem viver — e escrever. Elas falam tanto, mas quando chega a minha vez de contar alguma coisa, pronto. Parece que o mundo para. Até o vento escuta. Nice me cutucou com o cotovelo. — Agora é tua vez, Lena. Conta do segurança. Lana já estava encostada no braço do sofá, com um sorriso de canto. E eu,bem, eu não sabia se ria ou se ficava vermelha. — Tá bom. Mas vocês prometem não rir? — Já estamos rindo — disse Nice, antes mesmo que eu abrisse a boca. Revirei os olhos, mas não consegui segurar o sorriso. — Então, foi assim. Eu estava saindo da aula na sexta-feira, e tem um cara novo na portaria. Pensei que era segurança da faculdade. Mas aí ele me segue discretamente. Achei estranho, claro. Quando cheguei no ponto, ele se aproximou e disse: “Estou aqui a pedido do senhor Harry MacAllister. Sou designado à sua proteção.” Nice arregalou os olhos, e Lana sentou reta no sofá. — Ele mandou um segurança para você? — Mandou. E depois ainda teve a audácia de me mandar uma mensagem dizendo: “Não é para você se assustar. Mas se alguém ousar encostar um dedo em você, vai ter que lidar comigo. E isso é mais feio do que parece.” Nice tapou a boca. — Menina, isso é o auge do possessivo protetor. — Isso é coisa de lobo alfa — completou Lana, rindo. — Estilo Patrick mesmo. — Mas o pior, continuei, pegando o celular — é que ele mandou uma foto de um buquê que encomendou. Disse que chega amanhã na faculdade. “Para te lembrar que agora você é prioridade, e não distração.” Elas suspiraram juntas. Eu me fiz de forte, mas por dentro… eu tava tremendo igual à vara verde. — Tá apaixonada — disse Nice. — Não estou! — retruquei. — Está sim — cantarolava as duas em uníssono. — Estou muito confusa. Porque ele é lindocharmoso e, engraçado. Mas também é Harry MacAllister, né? Fama de mulherengo, herdeiro, riquinho, e eu sou só uma estudante, filha de costureira. Eu fico me perguntando se é verdade. Se não é mais um jogo. Lana me olhou com ternura. — Eu pensei a mesma coisa sobre o Patrick, sabia? — E hoje está aqui, toda sonhadora, com gosto de beijo nos lábios e vinho na memória — provocou Nice, fazendo Lana dar risada. — Estou dizendo que às vezes, a gente acha que esses homens nunca vão olhar pra gente com seriedade, mas aí eles nos surpreendem. E quando fazem, não é só um gesto. É uma escolha. Eu respirei fundo. — Eu só não quero me machucar. Não quero acreditar em um sonho que não é pra mim. — Então vamos fazer o seguinte — disse Lana, deitando e puxando uma almofada para o colo. — Se for para acreditar, nós acreditamos juntas. Se for pra quebrar a cara, a gente cola juntas. Mas por enquanto, vamos viver. Com calma. E com critério. — Isso. Nada de entregar o coração de bandeja. Mas também, nada de se fechar por medo. Se for amor, vai mostrar serviço — disse Nice, agora já com o cabelo preso no alto, em um coque improvisado. Nos olhamos, cúmplices. Tínhamos cada uma seu ritmo, suas dores, seus traumas. Mas também tínhamos umas às outras. E isso era tudo. Depois de tanta conversa, fomos cada uma pro seu quarto. Deitei olhando pro teto, abraçada ao celular, onde a última mensagem do Harry ainda piscava. “Sonha comigo. Porque eu já tô perdido pensando em você.” Fechei os olhos e sussurrei, só pra mim: — Se for verdade... que seja inteiro. E naquela noite, mesmo com todas as incertezas do mundo, elas dormiram com os corações aquecidos por possibilidades. Não de contos de fadas, mas de histórias reais.
Free reading for new users
Scan code to download app
Facebookexpand_more
  • author-avatar
    Writer
  • chap_listContents
  • likeADD