####Na manhã seguinte

1441 Words
O sol da manhã atravessava as cortinas suaves do quarto hospitalar, e Brittany já estava desperta, ajeitando os travesseiros com cuidado para não incomodar os fios conectados ao monitor. A porta se abriu suavemente, revelando Lena com um sorriso carinhoso no rosto e uma marmita térmica nas mãos. — Bom dia, dona Helena, — disse ela em voz baixa, ao ver a enfermeira ainda ali, sentada discretamente ao lado do leito da paciente. — Bom dia, minha querida, — respondeu Helena, levantando-se com delicadeza. — Veio trazer o café da nossa mocinha? — Trouxe, sim. Feito pela minha mãe com muito amor. Tem panquequinha de aveia e suquinho de uva orgânico. Brittany sorriu, demonstrando gratidão. — Bom dia, Lena. Que cheirinho bom... — Bom dia, flor. Dormiu bem? — Até que sim, — respondeu ela, sentando-se melhor. — A Helena me ajuda muito à noite. Eu me sinto segura. Helena tocou o ombro da paciente com carinho e aproveitou para recolher alguns utensílios discretamente. Lena aproveitou o momento para chamar a enfermeira um pouco de lado, num cantinho mais reservado do quarto. — Dona Helena, eu queria te pedir um favor, se for possível. Na segunda-feira, minha irmã Alana vai oficializar o casamento com o Patrick. Vai ser no civil, bem cedo. E ela pediu muito que a família estivesse presente. Helena ouviu com atenção, já imaginando o motivo do pedido. — Eu posso ficar um pouco mais com a Brittany, sim. Faço isso com todo prazer. Inclusive, amanhã à noite eu chego um pouco mais tarde para equilibrar o horário. — Muito obrigada. De coração. Helena assentiu com um sorriso caloroso. Quando voltaram para perto de Brittany, a jovem olhou de uma para outra com um misto de curiosidade e leve preocupação. — A Lana está bem? Lena se sentou devagar em uma poltrona ao lado da cama, ajeitando a marmita na mesinha. — Ela está em observação. Os médicos diagnosticaram início de diabetes gestacional e alguns picos de pressão. Então, por precaução, ela vai ter que fazer exames com mais frequência e repousar o máximo possível. — Nossa... — É. Por isso o Patrick resolveu adiantar o casamento. Vai ser só no civil por enquanto, mas depois que os bebês nascerem, eles pretendem fazer a cerimônia religiosa. Brittany sorriu de leve, assimilando a informação. — Ele está certo. É importante garantir o bem-estar dela e dos bebês. — Eles até começaram a montar o quartinho. Foram comprar o enxoval numa loja chique lá do centro. E lá indicaram uma arquiteta... Eles já contrataram. Brittany ergueu levemente as sobrancelhas, curiosa. — Como é o nome dela? Lena fez uma expressão de quem puxava pela memória. — Sabe que eu não sei? Mas é da loja que tem aqueles móbiles bordados à mão... Aquela loja que parece uma boutique francesa... Brittany arregalou os olhos, com uma mistura de surpresa e nostalgia. — Ah! Eu já sei quem é! Se for a arquiteta que estou pensando... Ela foi minha professora na faculdade! Nossa... O quarto vai ficar lindo. Ela tem um gosto incrível, sério, você não tem noção. Lena riu, um pouco aliviada com a reação leve da amiga. — Você não ficou chateada? Brittany riu também, com doçura. — Chateada? Deus me livre! Se caiu nas mãos da minha ex-professora, eu estou feliz. Ela vai caprichar como ninguém. Helena observava a cena em silêncio, com um olhar tranquilo. Lena se levantou devagar. — Então está tudo certo. Segunda eu vou rapidinho no cartório e volto. A dona Helena vai ficar com você até eu chegar, tá bom? — Tudo bem. Eu fico tranquila com ela. Vai dar tudo certo. A luz suave da manhã já se espalhava mais plenamente pelo quarto quando a dona Helena começou a recolher discretamente os itens do turno. Com um carinho evidente no olhar, ela se aproximou da cama, alisando de leve o lençol ao lado de Brittany. — Minha querida, agora eu vou descansar um pouco. Mas hoje e amanhã eu venho mais tarde para compensar a segunda-feira, tá bom? Brittany assentiu com um sorriso sereno. — Tudo bem, dona Helena. A Lena já me avisou. Vai ser só no cartório, né? — Vai sim. E você vai ficar bem acompanhada até ela voltar. Lena, que ainda organizava as coisas da marmita, se despediu com um beijo no rosto da amiga e saiu logo em seguida. Brittany então se ajeitou melhor nos travesseiros, olhando para Helena com uma expressão nostálgica. — Engraçado, sabia? Quando eu estava na faculdade, eu me inspirava tanto nessa professora que está fazendo o quarto dos bebês da Alana. Helena se virou interessada. — Ah, é? — Sim... Ela dava aula de composição de ambientes infantis e ergonomia emocional. Era uma mulher incrível. Sempre dizia que cada quarto de bebê precisava contar uma história. E eu acreditava tanto nisso... Mas me perdi no caminho. Ela suspirou fundo, o olhar perdido por alguns segundos no nada. — Agora, vendo que ela está cuidando dos meus sobrinhos... Isso reacendeu algo dentro de mim. Quando eu sair do hospital, eu vou atrás dela. Quero saber se posso fazer uma parceria. Sei que ela tem escritório próprio. E, olha... ninguém é como ela. Ela era a melhor professora que eu tive. Pena que perdi tanto tempo vivendo uma vida fútil, distante do que eu amava. Helena sentou-se na poltrona próxima e segurou com carinho a mão da jovem. — Você ainda tem tempo, Brittany. E tem talento. Essa paixão que você carrega vai florescer outra vez. E quem sabe, com mais força agora que você entende o valor da sua própria luz. — Eu vou fazer cursos, dona Helena. Me atualizar. Já tem uns programas novos, vi por alto. Design afetivo, neuroarquitetura... Nossa! Eu quero tudo. Eu vou entrar de cabeça. Helena sorriu largo, os olhos marejando levemente. — Eu estou tão feliz por você. Sabe... você não é mais aquela Brittany que encontrei aqui, naquela primeira noite. Aquela menina estava sombria, vazia. Eu cheguei a pensar que você estava prestes a desistir de tudo. Até me assustei... Brittany riu, um pouco sem jeito, mas com sinceridade. — Eu estava mesmo... Mas com a ajuda da senhora, da psicóloga... eu fui voltando. Meus pensamentos começaram a mudar. E os meus bebês... ah, eles estão cada dia mais fortes, mais lindos. Você viu como eles melhoraram, Helena? — Sim, sim! Os meus sobrinhos estão ficando uns bonequinhos. Cada dia mais gordinhos, com aqueles olhinhos brilhantes. Eles sentem a sua força, Brittany. E vão se orgulhar muito da mãe que têm. Brittany apertou a mão da enfermeira com ternura, os olhos marejando, mas dessa vez de emoção boa, de gratidão. — Obrigada por não ter desistido de mim. Helena se levantou, passando os dedos delicadamente pelos cabelos da jovem. Lena já estava de pé ao lado da porta, organizando as coisas para Brittany, quando percebeu que Brittany ainda estava acordada, com aquele mesmo olhar doce de quem estava reconstruindo planos dentro da cabeça. Ela voltou alguns passos, cruzou os braços e disse com aquele jeitinho firme e carinhoso que só ela tinha: — Por favor, pode parar, viu? Pode parar com esse melodrama todo. Já entendi tudo... Brittany piscou, confusa e divertida ao mesmo tempo. — Melodrama? — Ué, desde que eu escureci esse quarto você tá aí nesse teatrinho interno. Acordada desde cedo, sonhando acordada, cheia de pensamentos. Se já está acordada, então tome esse cafezinho que a sua mãe mandou na marmita, escove seus dentinhos, tome um banho e... durma novamente! — Helena apontou com o dedo, fingindo bronca. — Aproveite enquanto você tem ajuda, mocinha. Porque vai chegar o dia em que vai ter que dar conta de tudo isso sozinha. Aí eu quero ver se vai ter tempo de ficar aí toda filosófica com o teto... Brittany caiu na risada, rindo com gosto pela primeira vez naquela manhã. — Ai, Lena... Eu te amo! A enfermeira soltou um sorriso maroto e respondeu sem hesitar: — E eu te amo mais, minha rabugenta favorita. Elas riram juntas, o quarto ficando mais leve, mais aconchegante — como se o amor e a cumplicidade entre as duas se materializam no ar. Lena se aproximou mais uma vez, ajeitou com delicadeza a franja de Brittany e sussurrou com carinho: — Vai dar tudo certo. Agora vá, vá tomar seu banho e depois durma de novo. A vida espera, mas o descanso é um presente que você tem que aceitar também. E saiu do quarto com um aceno, enquanto Brittany pegava a xícara de café da marmita com um sorriso bobo, o coração mais aquecido do que nunca.
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