Quem consegue deixar aquele que ama?
Quem consegue abrir mão de sentir-se completo?
Acredito que ninguém; ninguém consegue afastar-se do que lhe faz bem; ninguém consegue rasgar aquela fotografia que tem muito significado; ninguém consegue apartar-se das cartas recheadas de puro derramamento de paixão eternizadas em letras caprichadas; ninguém consegue esquecer aquela mensagem que chega, quando menos se espera, porque simplismente tem coisas que não marcam somente o corpo e a mente, marca a alma e essa por ser eterna, leva tudo consigo.
Sem saber Camila marcou Varuna e ele estava feliz e infeliz por isso. Feliz por saber que conhece deste sentimento que muitos, quando vivo, mencionavam, porém não o era do seu conhecimento e agora que conhece não o quer deixar escapar.
A infelicidade dele, era por essa razão. Sentia-se infeiror, muito inferior, comparado aos demais rapazes, afinal ele não era ninguém, quando morremos nos tornamos ninguém, senhores de coisa alguma e mais do que esquecidos, somos deletados e o tempo encarrega-se de executar esse papel com perfeição.
Camila, na manhã daquele dia, estava perdida no meio do roseiral, gostava de andar por lá, acreditava que o cheiro das flores espantava as energias ruins. A jovem caminhava, deslizando as mãos pelas pétalas das flores que despontavam, flores da cor da paixão.
O espectro estava na ponta oposta observando-a , sua trança jogada por cima do ombro esquerdo, seu olhar perdido e o vestido simples.
Varuna não entendia como pessoas saídas de um mesmo ventre podiam ser bem diferentes. Camila era ternura que tinha vida, a simplicidade que respirava e a ingenuidade encarnada, enquanto Tabata era a futilidade escancarada nua e crua, além de, naquele tempo, ser irresponsável. O fantasma por muitas madrugadas espiava a jovem ter encontros secretos longe das vistas dos pais.
O espectro não impotava-se uma vez que a pequena a quem atribuía o pertencimento estava dormindo, protegida dentro do seu quarto. Fato é que não posso dizer que ele não apreciava as energias sexuais que absorvia desses encontros, sentia prazer sem efetivamente sentir prazer.
Confuso? Pois é, quem não ficaria com essa situação de energia para lá e para cá.
Camila andava por entre as flores e Varuna sentia que se ainda tivesse de posse do seu corpo, o órgão responsável pelos seus batimentos e que se encontraria guardado, protegido, pelo seu tórax estaria a ponto de explodir, se ainda respirasse estaria sem ar em seus pulmões.
Contemplou-a com devoção, contemplou com puro deleite a sua amada por entre as flores, seria uma bela fotografia para guardar de recordação, se pudesse registrar para sempre aquela imagem. Ou pintá-la para adornar alguma das paredes sem vida e graça do seu quarto, iria gostar de dormir e acordar tendo a bela para olhar sempre que desejasse.
Camila ergueu o olhar e abriu um sorriso, ela amava aquela sensação de pertencimento, de contato com a vida.
O espetro perdeu-se nela outra vez. O que era aquilo que crescia fincando suas raízes dentro do seu corpo abstrato? O sentimento não diminuía, apenas medrava, era um gigante despertando com todo o seu gáudio, cingido pela simetria fulgurante das miríades da paixão. Por mais que ele soubesse que esse sentimento era banhado pelo impossível, forcejava contra isso, o estridulo que este causava em sua essência era assaz não tinha como fingir que era algo corriqueiro, porque não era.
O espectro aproximou-se movido pela necessidade de estar perto, que querer senti-lá.
_ Uma rosa no meio de tantas outras...- sussurrou ao pé do ouvido da jovem que assustou-se .
_ Senti seu cheiro, mas não sabia que estava tão próximo. Por que assusta-me? - indagou Camila sem poder vê-lo.
_ Não parte deliberadamente de mim a idéia adredemente concebida. Tu sabes o que sou e sua mente lhe preparar para ter tal reação. - respondeu o fantasma com outro leve sussurrar, ele mudou de posição saindo de trás das costas da moça e indo para sua frente.
Camila sentiu a leve brisa, propagar-se e os pelos do corpo ouriçaram.
_ Frio?- o fantasama quis saber, percebendo o estado de arrepio da menina.
_ Não...- a voz de Camila foi um fiapo esfrangalhado e nada mais.
_ Então? - ele quis saber, aproximou-se mais e tocou o pequeno rosto.
_ Você ....- a resposta dela, encheu-o de um breve contentamento, até dar-se conta que não sabia se era bom ou r**m aquela redação por parte dela.
_ O que sente, Camila?- o espectro quis saber mais.
A jovem tibeou em sua resposta, nunca se fizera essa pergunta: O que sentia na presença do fantasma?
Varuna colheu uma rosa, manifestando-se para a moça que sorria levemente ao ver a flor nas mãos do fantasma.
_ Posso?- indagou o fractal.
Timidamente a jovem balançou a cabeça em concordância.
O deslizar da flor por entre o espaço de cima da sua orelha, adornando-a, foi suave, delicado, quase não sentiu.
Tolhida de uma singeleza encantadora, a garota sibilou um obrigada, erguendo os olhos para encontrar os olhos claros mais lindos que já deparou-se em sua pacata vida.
No mesmo corredor, o patriarca da família olhava com estranheza as atitudes da filha. Evaristo estava com cenho franzido, tinha coçado a cabeça e olhado ao redor.
_ Camila!- vociferou o pai que encontrava-se há uns bons metros de distância.
A voz potento do pai estrugiu, fazendo o corpo da moça tremer por inteiro.
Varuna saiu da frente, liberando a visão de sua amada, e lá estava Evaristo, olhando firmimente para sua menina.
Camila engoliu os perfumes das rosas, e deu uma olhada para o fantasma, virando a sua cabeça na direção lateral esquerda, o que fez Evaristo colocar o decorrer do que presenciava como sinistro.
O progenitor, munido de susto, aproximou-se .
_ O que se passa, minha filha? Falando sozinha? - indagou, fitando-a com avaliação.
_ Há muito está por aqui, papai?- procurou saber a jovem, temendo que o progenitor pudesse ter visto a rosa flutuar sozinha.
_ Não muito, minha flor, mas o suficiente para ver você sorrir e falar sozinha. - respondeu, olhando mais uma vez ao redor.
_ Conversava com as flores, elas são excelente para nos ouvir, não nos criticam, não nos julgam e nem aponta nossos defeitos. - fez arranjo de um bom argumento para dar credibilidade a sua resposta e explicação.
_ As rosas não falam, meu bem, não pode falar do primor que tu és e tão pouco da beleza que possui, elas não fazem julgo da sua suave voz. Mas apreciam da sua presença por essa razão, florescem aos montes.- proferiu Evaristo, sempre encantado com a simplicidade da sua filha.
_ Eu posso falar-te desses e de muitos mais.- o espectro sussurrou e Camila estagnou, procurou pelos olhos do pai.
_ Estás branca que nem uma folha de papel, menina! Venha vamos para casa. Precisa repousar, sua pressão deve ter baixado.- determinou o pai zeloso e preocupado.
Camila foi embora com pai, contudo não deixou de dar aquela última olhadinha para trás e viu o espírito parado, olhando-a partir.
Algo estava acontecendo, movendo um ao encontro do outro, como as engrenagens de um relógio suíço que funciona perfeitamente.
As linhas estavam sendo cruzadas e enroladas, começavam os nós e o que todos desconhecem é que linhas invisíveis não há como desatar, não há como desenrolar.
Corriam os novelos, corriam um ao redor do outro, um intróito perfeito, que não tinha nada de perfeito, apenas de funesto, porém ninguém atentou-se para esse ponto.