O garoto de Moicano

2271 Words
A vida pode ser subjetiva e muitas vezes objetiva, observar as coisas atentamente, milímetro por milímetro, pode fazer com que se perceba fatos que nem ao menos notamos cotidianamente. Porventura não faz sentido agora, mas se analisar atentamente verá que eu estou certo. A vida é como se fosse à matemática, ainda mais na adolescência, porém, muito mais complicada, tendo como exemplo uma das frases de um dos ilustres heterônimo de Fernando Pessoa, o mestre ingênuo Aberto Caeiro: "Não tenho filosofia, tenho sentidos". Talvez para você essa comparação não faça o menor sentido agora, todavia, se parar de se afundar no mar da abstração do pensar e começar a olhar pelo lado da razão e da lógica, quem sabe atinja a alegoria. Quero viver a vida de uma forma direta, como uma pista em linha reta, sem as curvas que ficam fazendo mais curvas e não chegam a lugar nenhum, quero praticar a ação sem nem me arrepender, contudo, o pensamento é um dos piores vilões que se agitam no meu ser. É ele que me assombra sobre a madrugada de insônia, que me faz voltar atrás e que me enche de culpa por não ter feito tudo diferente. Certas coisas são assim, porque não há concerto e pronto! Basta aceitar e seguir em frente como pode. A essa altura do texto, devem estar pensando que apenas estou enrolando, em partes sim, no entanto, também quero transmitir uma mensagem que possa lhes trazer algo de relevante, uma lição de moral e mesmo que acaso não tenham absorvido o preceito, garanto que uma semente foi plantada. Quero que vocês vejam minha vida, mais especificamente quando conheci meu primeiro amor, não vou dar nenhuma prévia, quero que desfrutem o máximo dessa experiência como se estivessem vivendo cada momento e fato, aguardo que não me juguem por ter feito o que eu fiz, vou começar pelo inicio, claro, quando tudo começou... ... Meu nome é Wally, tenho cabelos e olhos castanhos, pele um pouco queimada, mas mesmo assim clara, começara o ano na escola, estava no primeiro ano do ensino médio, entorno dos meus 15 anos de idade. Chegara à escola, não conhecia ninguém, era tudo novo para mim, não criava grandes expectativas de que esse ano fosse diferente dos outros, mas sabia que no fundo terminaria sozinho no canto da sala por conta do meu fenótipo e minha timidez. Era e sou ainda muito magro para minha idade e também muito alto, as pessoas me olhavam com dó, se deixando levar pela primeira impressão, com pensamentos repetitivos com o qual: "talvez ele passe fome", no caso nunca aconteceu e sou muito grato a isso. Às vezes os olhares de dó eram substituídos por desdém, como seu eu tivesse algum tipo de doença transmissível, eu não os culpo, nós seres vivos agimos de forma negativa quando estamos diante do desconhecido. No meu primeiro até o quarto ano do fundamental um, passava o intervalo sozinho, admirando os outros jovens brincar, rir e passar seu tempo falando m*l e jogando conversas fora, os funcionários da escola tinham pena de mim, pois era encontrado sempre solitário, por isso, faziam praticamente tudo o que eu mandava, havia suas vantagens, quanto também às desvantagens, claro! Como me obrigar a comer, principalmente, feijão, sempre na hora do intervalo, ah! Como eu odeio feijão, só de sentir o gosto dá vontade de vomitar. O que muitos não entendem é que eu sou o que sou, tenho um problema de metabolismo, que faz com que ele fique muito acelerado, então se eu não comer a cada três horas, perco peso. Meu quinto ano não foi tão r**m, pela primeira vez tive amigos, o Geovanni, Pedro, José Tiago e o Rogerio. Viramo-nos amigos literalmente por conta de um desenho que passava na TV da época, mais precisamente um anime. Naquele dia, a sala encontrava-se livre, todos esperavam o sinal do intervalo bater, conversara com o Geovani, até o momento algo raro, eu e ele tínhamos desavenças no passado em virtude de o mesmo ser um pouco afeminado com relação aos outros garotos da época. Sempre era debochado, mas uma coisa que admiro muito nele, é que mesmo com tudo isso, nunca demostrou se importar de fato, sempre transparecia seu lado forte. Uma vez ele já me perguntara se sentia atração por meninos, algo inesperado para mim na hora, eu nunca parara para pensar daquela forma, então estava um pouco indiferente, entretanto, como dito antes, agimos de forma brusca diante do desconhecido e comigo não foi diferente, relacionei essa pergunta com o apelido que alguns garotos o depravavam e entrei na onda para parecer legal aos outros. Arrependo-me muito dessa atitude, pois agora sinto o que ele sentiu. Enfim, retomando a cena, perguntara para o Geovanni se ele assistia tal desenho e ele disse que sim, logo o José Tiago e o restante ouviram e disseram que também assistiam e desde então viramos amigos, a turminha do barulho do fundo. Todavia, nos separamos depois que acabamos o ensino fundamental dois, alguns foram para outra escola, outros foram para a turma da manhã, já que eu estudava à tarde. Balanço a cabeça para afastar tais pensamentos, olhei a lista que estava no painel próximo à diretoria, caíra no primeiro D, dei uma olhada rápida na lista de nomes e a maioria era desconhecido, não havia ninguém que tinha muita afinidade. O meu irmão também já estudou nessa escola e por isso alguns amigos dele me conheciam, como o Rafael que estava no segundo e o Thomas que estava no terceiro, eles eram um pé no saco, ficavam me zoando e dizendo que se alguém me ameaçar é pra eu avisar a eles que os mesmos me protegeriam, ah duvido, é mais fácil se juntarem para me bater também. Antes de eu entrar na sala, o Thomas me apresentara um amigo dele, que também estava no primeiro, no entanto não na mesma sala que eu. O nome dele era Luiz e ele usava um moicano, até ai tudo bem, não vira nada de mais no Luiz, cumprimentei ele e como sou tímido, dei poucas palavras e entrei na sala. Por incrível que pareça, no instante que olhei na primeira cadeira da fileira do meio, se encontrava o Geovanni distraído, sentado, arregalei meus olhos surpreso e disse: - Ué! Você não é dessa sala. Ele olhou pra mim, dá um sorriso semicerrado e disse: - É claro que sou, parece que alguém não deu uma olhada direito na lista. Crédulo como sou, dei novamente uma olhada na lista e realmente ele estava na minha sala, fiquei muito feliz, aquilo significava que eu não estava sozinho, e que não passaria o resto do ano solitário na parede. Antes da aula começar, ficamos conversando de variados assuntos, colocando o papo em dia. O sinal tocara e uma professora gorda, morena, com cabelos amarrados, expressão austera, entrou, ela se apresentou: seu nome é Luciene e sua disciplina, português. Estava tudo andando bem, Giovanni fazia as horas passarem rápido, nos divertíamos com as nossas palhaçadas internas. A professora passara um texto planejando como faria as notas e eu e o Geovanni como sempre apostamos corrida para ver quem escrevia mais rápido, mas ele sempre ganhava e dessa vez não foi diferente. De repente uma mulher com óculos, de pele preta, com cabelos meio curtos, também gorda, apareceu na porta, ela disse: - Com licença professora Luciene, preciso que três alunos me acompanhe – fiquei curioso, eu e Geovanni trocamos olhares, esperávamos que nenhum de nós fossemos chamados – Daniel, Ester e Wally me acompanhem, arrumem os seus materiais - continuou ela. Por ironia do destino ela me chamou... eu e os outros dois arrumamos os nossos materiais e acompanhamos aquela mulher, antes dei uma ultima olhada para Geovanni, estava meio triste com o que me esperava e ele demonstrava o mesmo. A escola era dividida em 10 salas, 3 na frente, adjuntas a secretaria e o resto atrás. Os primeiros anos se encontravam próximos, lado a lado, à diretoria se encontrara em frente às salas, e ao lado da mesma, havia um jardim que era chamado de jardim da leitura, que por incrível que pareça, ninguém lia lá. A mulher nos coordenou até a sala do sexto E, a essa altura já deduzira tudo. Ela se apresentou, seu nome é Sol e ela é a coordenadora, nos orientou antes de entrar na classe que houve um erro e ela precisou preencher essa sala com os nossos nomes e por isso foi necessário nos trocar de classe. Eu achei uma patifaria, uma pura s*******m, o universo estava conspirando contra mim para eu ficar sozinho esse ano, entrelaçado nas paredes, solitário novamente. Entramos na sala, a coordenadora Sol orientou a professora que estava dando aula sobre a situação, e eu e os outros alunos sentamos na fileira da janela, um atrás do outro sem trocar nenhuma palavra. Durante as aulas, o tal de Daniel ficou me irritando, me questionando por que eu era magro e eu não dava bola, apenas respondia com "sim", "não" e "não sei". Estava odiando tudo aquilo, mais ainda ele, por me incomodar. A professora de matemática parara de passar lição, então resolvi dar uma olhada melhor na classe, examinar os meus colegas como um observador nato que sou, no canto da porta, nos fundos, encontrava-se algumas meninas que pareciam ser muito frescas, patricinhas, pelo jeito que conversavam, esbanjando seus materiais e roupas. Ainda na fileira da porta, na frente, havia dois alunos, acho que dois amigos de longa data, pela forma que conversavam, eles dialogavam sobre jogos. Na fileira do meio, nas carteiras da frente, havia umas meninas conversando sobre Disney e ainda na fileira do meio, todavia nas carteiras do fundo, encontrava-se aparentemente a turma do barulho daquela sala, naquele momento uma pontada de nostalgia se formou, senti saudade da minha turma do barulho, e um pouco de inveja da deles, eles conversavam, brincavam, riam e eu só os admirara com vontade de estar entre os mesmos. Quando eu reparei melhor em um dos meninos da turma do barulho, havia sido como se eu tivesse tomado um espeto no peito, mas precisamente uma flecha do cúpido, era o tal de Luiz do moicano, o amigo do Thomas, porém, agora ele estava diferente, eu não sei, alguma coisa no meu peito doía sobre ele, não sabia identificar o que era, eu achava seu rosto suava e diferente dos outros, me culpava por achar aquilo. Ficava sempre o observando conversar com os seus amigos, brincar, rir, aproposito seu riso, era muito... lindo, suas covinhas mais precisamente, como assim, o que está acontecendo comigo? Eu nunca vira um homem daquela forma, porém, quanto mais o observava, mais eu queria me aproximar, todavia me contive. A hora foi passando e aquele dia acabara finalmente. No intervalo, eu passava o tempo com o Giovanni quando ele não estava andando com as suas amigas. Então descobri que o Rogerio também estudara aqui só que no primeiro F, ele me disse que o José Tiago também, porém hoje não viria, eu estava muito feliz com essa informação, embora eu tenha perdido o Giovanni, ainda sobrara dois amigos e comecei a passar o intervalo com eles. Porém com os dias se passando, o Geovanni se distanciou mais de mim, ele ficou mais íntimo das amigas dele que por algum motivo não gostavam de mim nem um pouco, sempre me fitando com olhares mortíferos, talvez elas estivessem com ciúmes de amizade. O José Tiago só andava com os garotos metidos a sabichã da sala dele, pois no quinto ano ele era o mais inteligente do grupo e também o mais exibido, em virtude disso ele começou a ficar mais nariz em pé e me distanciei dele também. Já o Rogerio, eu não passara mais os intervalos com ele, porque o mesmo virou amigo de um menino que me excluía dos assuntos, mesmo eu tentado entrar. Como previra, não apenas era solitário na sala, como também no intervalo, passara o mesmo sentado em um banco encostado a minha sala, imaginado aventuras ou dando volta pela escola sem rumo. Certo dia, como sempre, sentado no mesmo banco, esperara a funcionária chegar para abrir a porta, pois o sinal já tocara, o pessoal da sala começou a aglomerar ao redor da porta, alguns me olhavam pelos ombros e davam risadinhas e eu sempre tentava não me importar, com um olhar de receio. De súbito, uma sombra se projetou sobre mim, estava com a cabeça esguia, ergui-a para ver quem era e fui surpreendido pela projeção da imagem do tal garoto de moicano a minha frente, o Luiz. Ele me olhara fixamente e de repente dá um sorriso... A propósito um belo sorriso com suas covinhas, fiquei envergonhado, tímido, ele dissera: - Então você é da minha sala também – estendeu o braço e eu o cumprimentei, senti o calor da sua mão e um frio passou por minha barriga, ele continuou – você devia andar mais comigo e meus amigos. No instante que terminou de falar, a funcionária abriu a porta e todos entraram e eu e ele fizemos o mesmo. Sentei na minha cadeira, observando ele, imaginando o calor da sua mão novamente e a sensação confortante que incidiu, desde aquele dia, eu tracei um objetivo, me aproximar dele e da sua turma do barulho. De modo que toda noite, ficava imaginando eu amigo deles, mas precisamente, amigo "dele", eu não entendia, mais quando trazia os pensamentos de estar próximo ao Luiz, eu corava, só queria está mais próximo dele e sentir o calor de sua mão novamente...
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