Capítulo 19. Descobertas do Corvo

910 Words
O ronco grave do motor ecoou pela garagem subterrânea da mansão, antes mesmo que Oliver o percebesse pela câmera do portão. Ele estava sentado no sofá, ainda com a cabeça cheia, quando o sistema inteligente anunciou: — Visitante autorizado: Corvo. Oliver franziu o cenho. Corvo não aparecia pessoalmente sem um bom motivo. O homem era um fantasma, surgia, entregava o que tinha e sumia. Se veio até ali, em plena luz do dia, é porque a situação era mais séria do que Oliver imaginava. Ele desceu os degraus que levavam à garagem, o ambiente amplo e impecável contrastando com a figura que acabava de descer da moto: couro preto, capacete espelhado, postura relaxada, revólver a vista, em alerta. Corvo retirou o capacete, revelando o rosto sereno, o cabelo escuro preso e olhos extremamente atentos, olhos de alguém que vê tudo e fala pouco, mas age sem hesitar. — Você está de pé bem cedo pra alguém que vive na sombra — Oliver disse, cruzando os braços. Corvo deu um meio sorriso. — E você está metido em problema, FrankWood. — Ele estendeu um envelope grosso. — Aqui está tudo o que me pediu… e mais um pouco. Oliver pegou o envelope, sentindo o peso literal e figurado no material. — Entra — ele disse, caminhando até o elevador interno. Corvo o seguiu em silêncio até o andar principal. A mansão era ampla, moderna, quase fria. Linhas retas, vidro, mármore. Nada que revelasse muito sobre o homem que ali morava. Apenas ordem, controle e riqueza. Ao chegarem à sala, Corvo se jogou no sofá como se estivesse em casa, porque era assim que ele era. Ele vivia na fronteira entre o civil e o criminoso, e não se curvava a ninguém. Oliver abriu o envelope. Fotos. Impressões de tela. Relatórios. Cópias de boletins. E uma ficha detalhada de Henry. Corvo falou antes mesmo que Oliver perguntasse: — O pai da garota está atolado em dívidas. Não com bancos com o querido Henry Flynn. Dívida alta. Cobrança suja. E adivinha? — Ele apontou para uma das fotos de Henry sorrindo com Clarice ao fundo, claramente sem consentimento dela. — O cara é obcecado. Tudo o que é rede social dele tem a garota. Tudo. Ele parece acreditar que ela pertence a ele, como se a mina fosse um...troféu. Oliver sentiu o maxilar travar. Corvo continuou: — Clarice não tem rede social desde… — ele puxou outra folha — desde que trancou a faculdade de enfermagem. Motivo? Barraco no campus. Henry deu um show de ciúmes, atacou um aluno que estudava com ela. Quase foi preso. A garota entrou em colapso, trancou o curso e desapareceu da vida online. Oliver respirou fundo, tentando manter o controle. Cada nova informação alinhava-se com a inquietação que ele já tinha sentido no hospital. — Tem mais — Corvo disse, cruzando os braços. — Henry vive rondando lugares onde ela trabalha, por isso a coitada não para em serviço nenhum, fazia só quatro meses que ela tava no hospital. Tem registro de brigas, ameaças veladas, discussões familiares. A família dela… — ele fez um gesto com a mão — …acoberta tudo. Ou prefere não saber, talvez, prefere fingir que não tá vendo. Oliver fechou os olhos por um instante. Clarice. Frágil no leito. Ele abriu os olhos novamente. — Você acha que ele pode ter atirado nela? Corvo deu de ombros, mas seu olhar era sério: — Eu acho que esse cara é louco, obcecado, se ele acha que ela deu motivo na cabeça louca dele, pode ter sido ele sim ou quem sabe alguém que ele pagou pra dar um "susto" nela… — O que quer dizer com "susto"? — Simples, caras como esse louco, pensam de forma...ampla. Na cabeça dele a machucando ela ficaria mais frágil e aberta pra ele, assim ele se aproxima como o bonzinho, que quer cuidar, proteger, curar as feridas. Talvez com a fragilidade dela, ele conseguiria o que quer dela..algo recíproco. FrankWood assentiu. — Sobre os hematomas dela, descobriu algo ? — Nada, pelo menos não tem boletim feito por ela. Só que no barraco que ele fez no campus por ciúmes ele acabou demonstrando ser agressivo com ela também, isso já é uma resposta. — Corvo fez uma pausa, coçando a lateral do rosto ponderando se continuava ou não.— Quem não tem o que quer no "amor" tenta..na dor. — Completou Corvo. — Acha que ele tem alguém de confiança na polícia ? — perguntou FrankWood. — A ficha dele está limpa demais pra alguém tão problemático,FrankWood. Vazio demais, e sabe o que mais eu acho, ninguém atira em uma garota num beco sem deixar ao menos um rastro… a menos que tenha experiência. Oliver sentiu o estômago pesar. A respiração afundar. — Tem certeza disso tudo? Corvo levantou uma sobrancelha. — Eu nunca erro, Doutor. Oliver guardou os papéis devagar, com uma precisão quase cirúrgica. O silêncio entre os dois ficou espesso carregado, denso, cheio de implicações que nenhum dos dois precisava dizer em voz alta. Após um momento, Corvo se levantou. — Cuida da garota, se possível— disse simplesmente. — Ela está no meio de um ninho de serpentes, ou melhor, ela foi jogada em um ninho de serpentes. Ele colocou o capacete, caminhou até o elevador e desceu de volta à garagem. Oliver ficou sozinho na sala, olhando para o envelope como se fosse uma bomba prestes a explodir. E, de certa forma… Era.
Free reading for new users
Scan code to download app
Facebookexpand_more
  • author-avatar
    Writer
  • chap_listContents
  • likeADD