Era o primeiro dia de trabalho de Daniel, ele teria que ir sozinho para a boate de agora em diante, Miguel deixou claro na noite passada quando lhe deixou de volta no apartamento que o Neri teria que se virar de agora em diante.
Foi cansativo chegar até o lugar, se arrependeu de não ter pedido um carro para Bernardo, pois isso lhe pouparia pelo menos metade do tempo que levou para chegar ali, demorou uma hora para que Daniel encontrasse um táxi que aceitasse o levar pelo menos até a entrada da rua de terra que daria no terreno da boate. Ainda teve que pagar mais caro para convencer o motorista a lhe deixar ali. Todos os outros motoristas que tentou chamar lhe diziam a mesma coisa: "Só um louco pisa no território dos Killers sem ser convidado".
Daniel ainda teve que andar todo o caminho da estrada de terra para chegar a boate, suas panturrilhas formigavam pelo esforço e sua respiração estava para lá de ofegante, o Neri não estava acostumado a andar tanto e quando finalmente chegou ao destino não teve muito tempo para descansar, apenas bebeu um copo d'água e logo teve que começar a trabalhar, estava dez minutos atrasado e era seu primeiro dia.
"Comecei muito bem nessa merda" Daniel pensou enquanto limpava o balcão.
O Neri ficou surpreso quando soube que trabalharia na área vip do lugar, pensou que depois do episódio com Pietro não iriam querer lhe manter por lá para evitar "imprevistos", mas felizmente se enganou, ali ficavam as pessoas mais importantes, em quem realmente deveria ficar de olho.
O movimento ainda estava pouco, já que ainda era cedo, então vez ou outra Daniel aproveitava os poucos pedidos para se encostar no balcão e relaxar, porém seu momento de descanso foi interrompido.
-Dia cansativo?-Ouviu uma voz familiar se dirigir a si e quando ergueu os olhos se deparou com Levi e aquele belo sorriso que ele tinha-Não deveria estar tão cansado, você acabou de chegar.
-Pois é, eu vim andando da avenida até aqui, só não estava acostumado a andar tanto, mas logo vou me acostumar-Forçou um sorriso em direção ao outro.
Daniel ainda não sabia muito bem o que iria fazer para ganhar a confiança de quem quer que fosse ali, mas era algo que gostaria de descobrir rápido, se esforçaria pelo menos para ser o mais simpático possível, principalmente com que ditava as regras naquele ambiente, apesar de saber que de quatro líderes provavelmente só conseguiria se aproximar facilmente de três, já que Pietro demonstrou logo de início não ter ido com sua cara. O Neri queria se sair bem naquele trabalho, sua ficha limpa dependia disso, além é claro do dinheiro que já estava sendo bastante útil.
-Sugiro que junte dinheiro e compre um carro, os táxis e carros de aplicativos não trazem nem levam ninguém daqui-Levi falou mantendo o sorriso no rosto, ele parecia simpático e amigável o que Daniel considerava ótimo.
-Percebi, mas é bom andar um pouco, pelo menos não serei mais um sedentário para as estatísticas do país-Daniel falou arrancando uma risada do outro, ao que parecia estava tudo indo muito bem para um "primeiro contato", apesar de não achar o que disse anteriormente nem um pouco engraçado para que o outro estivesse rindo daquela maneira, afinal de contas quem estava realmente fingindo simpatia ali entre os dois? Talvez os dois estivessem.
Fingir sem parecer forçado era difícil e Daniel se esforçava ao máximo para parecer o mais natural possível em meio a suas mentiras. Naquele momento ele teve certeza que Levi estava fingindo ser simpático consigo, só não tinha entendido o porquê.
-Você é divertido Dan-Levi falou colocando os cotovelos sobre o balcão e se debruçando um pouco para ficar mais perto ainda do outro-Quero uma taça de vinho tinto por favor-O Neri apenas assentiu indo pegar a bebida pedida-Eu soube como a gangue do seu pai chegou ao fim.
Daniel foi pego de surpresa com aquilo quase derrubando a garrafa de vinho no chão ao ouvir o outro tocar naquele assunto, sua visão ficou turva por alguns instantes e ele podia sentir seu estômago revirar tamanho o enjoo que lhe atingiu, mas tratou de ignorar todos os sentimentos e lembranças que se apossaram de si, não podia expressar sua vulnerabilidade diante daquele assunto, não ali. O Neri não disse nada, apenas fechou os olhos por alguns segundos, respirou fundo e pegou a taça começando a servir o vinho que o outro pediu.
-Você estava lá?-Levi perguntou assim que o outro colocou a taça em sua frente.
-Sim-Daniel falou em um tom baixo suspirando em seguida, teria mesmo que falar daquele assunto?
-É, então você sabe o que acontece quando mexemos com alguém que não podemos enfrentar-Falou por fim pegando sua taça e saindo dali.
Depois de ouvir aquilo ficou fácil para Daniel entender o que o outro queria consigo.
-Não se preocupe-O outro barman que estava limpando um copo um pouco afastado de si falou lhe chamando a atenção-Eles costumam ameaçar os novatos, na verdade isso começou depois que descobriram o primeiro infiltrado, mas se não estiver escondendo nada não tem o que temer, só não os provoque.
Daniel olhou para ele com uma expressão neutra, mas por dentro seu interior se revirava, primeiro uma arma apontada para sua cabeça e agora isso? Pelo menos Levi não insistiu naquele assunto por muito tempo, não queria relembrar a noite em que tudo em sua vida desmoronou de vez, não que já não tivesse rachaduras antes, mas daquele dia em diante ele nunca mais conseguiu sair dos escombros.
O Neri só esperava que aquelas ameaças não durassem muito tempo.
Enquanto isso, um pouco mais afastado do balcão onde Daniel agora tentava se distrair servindo os clientes e tentando se enturmar conversando um pouco com seu novo colega, três homens estavam sentados no mesmo sofá de sempre conversando entre si.
-Vocês acham que ele é realmente confiável?-Ian perguntou tomando um gole de sua bebida em seguida.
-Ele não esboçou nenhuma reação com a minha "insinuação", mas acho melhor ficarmos de olho nele por alguns dias-Levi falou com um tom completamente diferente do que usou com Daniel, agora ele estava sério.
-Mandei um dos homens seguir ele e o Miguel ontem quando foram embora, ele disse que não viu nada de estranho, Miguel o deixou em casa como disse que faria e depois disso Daniel não saiu mais para lugar nenhum, mas você tem razão, temos que tomar cuidado, não acho que aquele delegadozinho de merda vá parar de mandar infiltrados logo agora.
-Eu não confio nele-Pietro falou mantendo o olhar em Daniel-Não consegui acreditar em nada que ele disse ontem.
-Sabe o que eu acho?-Levi falou ganhando a atenção dos outros dois-Que estamos paranoicos demais, para falar a verdade eu achei ele uma gracinha-O de cabelos vermelhos falou com um sorrisinho sacana nos lábios fazendo Ian e Pietro revirarem os olhos.
-Você não leva nada a sério mesmo Levi-Ian falou voltando a beber-Devia mandar Lorenzo vir aqui mais vezes Pietro, é bom que as pessoas vejam nós quatro juntos.
-Eu sei, mas você sabe como é o Lorenzo, ele odeia ficar no meio de tanta gente.
Dali em diante eles mudaram de assunto, começaram a falar de algumas coisas importantes e outras triviais, porém durante o restante da noite os olhos de Pietro não saíram de Daniel, havia algo nele que lhe prendia a atenção.
…
O dia para Daniel tinha sido cansativo, teria que se acostumar logo com aquela nova rotina e lembrar de começar a jornada para o trabalho mais cedo no dia seguinte para que não corresse o risco de se atrasar novamente. Assim que chegou ao seu apartamento, o Neri se deparou com um envelope no chão em frente a sua porta, já imaginava o que deveria ser e quando o abriu apenas confirmou, era a ficha de Miguel.
Depois de um bom banho e de comer apenas um macarrão instantâneo acompanhado de um refrigerante, Daniel começou a ler a ficha de Miguel se surpreendendo com o que encontrou ali, parece que tanto ele quanto o delegado Garcia fizeram questão de esconder algumas informações sobre o homem de si. Agora sabia que ter conseguido ficar na área vip da boate, talvez se devesse ao fato de Miguel ser líder de uma das gangues parceiras da Killers Pain, sim líder e não um simples subordinado como o fizeram pensar.
Se lembrava muito bem de quando Bernardo falou que os dois tinham um acordo, deveria ser um acordo parecido com o que o delegado lhe ofereceu, porém o Garcia estava mesmo tão disposto a derrubar os Killers que deixaria um outro líder de gangue livre? Não sabia, e sinceramente não tinha coragem de perguntar.
A única certeza que Daniel tinha é que seja lá qual for o motivo que levou Miguel a se aliar a Bernardo e passar informações sobre a Killers, era melhor que ele não soubesse. Disputas de gangues só trazem sangue e morte e por enquanto Daniel gostaria de se manter seguro e longe dessas coisas.