O som das fichas ecoava em sua cabeça como um Lembrete de memórias passadas.
Lara tentava se concentrar na mesa, mas a mente a traía, arrastando-a de volta para o passado — para o dia em que tudo desabou.
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Dois anos antes.
O escritório da Monteiro Investimentos cheirava a madeira, Luxo e sucesso.
Seu pai, Eduardo Monteiro, sorria atrás da mesa de mármore, orgulhoso da filha que havia acabado de ser promovida a analista-chefe da empresa.
Ela se lembrava do brilho nos olhos dele, e de como aquele orgulho durou pouco.
Naquela mesma semana, Rafael Vieri — o homem em quem ela confiava, o advogado brilhante com quem sonhava casar — entregou à imprensa documentos sem o consentimento de ninguém, e esses documentos que ligavam a empresa a um esquema de fraude que nunca existiu.
As manchetes destruíram tudo.
Os investidores sumiram.
Os sócios fugiram.
E Lara viu o pai desmoronar diante dela, silenciosamente, como um rei que perde o trono.
O som da voz dele ainda doía na memória:
“A culpa não foi sua, filha… mas é você quem vai ter que limpar meu nome e da nossa família.”
A culpa a corrói até hoje, por confiar em alguém se nem conhecer direito.
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Agora
O barulho das cartas voltando ao presente fez Lara piscar.
Ela estava de volta ao salão, os holofotes refletindo o brilho de suas fichas.
Na frente dela, Dante a observava, calado, como se pudesse ouvir os pensamentos dela.
Ela não gostava disso.
Não gostava de como ele parecia ler o que ninguém mais via nela mesma.
— Está desconcentrada — ele disse, após o dealer revelar as cartas.
— Não. Só… lembrando o motivo de estar aqui.
— E qual seria? — ele perguntou, apoiando o queixo nas mãos, os olhos fixos nos dela.
Lara respirou fundo.
— Justiça.
Um pequeno sorriso apareceu nos lábios dele.
— Bonita palavra. Pena que, para este mundo, é apenas mais uma aposta perdida.
Ela o ignorou e empurrou suas fichas para o centro da mesa.
O dealer anunciou:
— All in.
A plateia prendeu o fôlego.
Dante arqueou uma sobrancelha, impressionado.
— Apostando tudo, Rainha de Copas?
— Às vezes, é a única forma de vencer o jogo.
Ele deu um leve sorriso.
— Ou de se destruir mais rápido.
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Horas depois, o torneio do dia terminou.
Lara subiu até o quarto, o corpo está cansado, mas a mente fervendo .
Tomou banho, amarrou o roupão e foi até o cofre portátil que mantinha na mala.
Lá dentro, guardava uma pasta — o que restava da investigação sobre a ruína da família.
Nomes, documentos, transferências... e um nome recente que Sofia encontrara há pouco.
Ela abriu o arquivo no tablet.
Os olhos percorreram as linhas.
Uma empresa de fachada, usada para mover dinheiro ilegal.
O proprietário?
Dante Moretti.
O coração de Lara parou por um instante.
Não podia ser coincidência.
O homem que a provocava, que a ajudara a entrar no torneio, que a fazia perder o ar com um simples olhar...
Era o mesmo nome que aparecia nas entrelinhas da tragédia da sua família.
— Não… — ela sussurrou, sentindo o peso do choque apertar o peito.
O celular vibrou. Uma mensagem anônima.
“Nem tudo é o que parece. Cuide bem da sua aposta, Rainha.”
Ela gelou.
Olhou pela janela — e lá embaixo, no estacionamento iluminado, viu um carro preto.
E um homem parado ao lado, encostado, acendendo um cigarro.
Mesmo à distância, ela reconheceria aquela postura em qualquer lugar.
Dante.
O cigarro brilhou quando ele tragou e ergueu o rosto para cima, olhando direto para a sacada do hotel.
Eles se encararam.
Por um instante, nada existia além daquele olhar.
Até que Dante soltou a fumaça devagar, jogou o cigarro fora e entrou no carro, desaparecendo entre as luzes da Strip.
Lara sentiu o frio percorrer a espinha.
O passado estava de volta — e dessa vez, tinha um nome e um rosto.
E ela jurou, silenciosamente: se Dante Moretti fosse parte da ruína da sua família, ela o destruiria.
Mesmo que isso significasse destruir o próprio coração.