Curral

1737 Words
Capítulo- III. Curral " No curral ainda banhado pelo orvalho, o gado ressoa, o céu pinta o amanhecer, teus cabelos ruivos, como um sol despenteado, transformam meu coração em abrigo e luz a brilhar. O aroma da mata se eleva com a brisa, uma fusão de terra, suor e flores no ar, e eu, simples homem do campo, sem versos decorados, te guardo na essência, te cultivo no amor." Cícero Três dias depois... Quando Dona Berenice decidiu dar uma oportunidade para Marrynna, acreditei que tudo ia se encaminhar. A menina precisavade dinheiro para poder regressar para o seu país e eu queria minha organização de volta. Porém aquele ditado que diz: " felicidade de pobre dura pouco", se fez verdade. Marrynna durou nem dois dias trabalhando na pensão. Por qual razão? Eu vou explicar: Era por volta das quatro da tarde quando meu celular tocou, estava ajudando a embarcar os bois que o senhor Florian tinha vendido. Alcancei o aparelho dentro do bolso da calça e atendi. Dona Berenice pedia que eu fosse para a pensão cok urgência. Fiquei nervoso achei que a Marrynna tinha se machucado, assim como se feriu quando falei para ela que tinha linguiça e era só fritar, a ruiva quase decepou o dedo fora com a faca, quando cheguei em casa de noite ela estava com uma cara feia e com o dedo envolvido com uma faixa de tecido. _ O que houve? - perguntei olhando para a ruiva deitada e com a mão apoiada em cima de uma almofada. _ Aquela sua faca assassina partiu para cima de mim, quase arrancou o meu dedo. Saiu tanto sangue, acho que preciso de uma transfusão.- fez um bico enorme. Só faltava essa, além de bagunceira, preguiçosa e manhosa. Retirei o boné cocei a cabeça. _ Tenho uma cesta com medicamentos e curativos, vou buscar. - falei indo até a cozinha. Quando retornei a ruiva estava de pé olhando assustada para algo que se movientava no chão da casa. _ O que é aquilo? Um anelídeo! Que nojo! - Correu até a cozinha e retornou com a vassoura em mãos- Toma, vai lá e bate nele! - segurei o riso porque ela até executo o movimento que eu deveria fazer. Peguei a vassoura, depois de colocar a cesta de medicação em cima do sofá. _ É um diplopódes, vulgarmente conhecido como pilho- de- cobra. Embora possa parecer assustador por seu corpo alongado e cor escura, o gongolo é um animal inofensivo. Não possui veneno. Gongolos são benéficos para o ecossistema, ajudando a decompor matéria orgânica e a fertilizar o solo. _ Até o nome é feio, gongolo. Nossa! Joga ele fora! - fez um gesto com a mão fazendo uma careta de nojo. Varri o bicho é fui ver a extensão do corte. Não foi longo, porém foi profundo. _ Vai precisar de sutura, vou falar com um amigo meu. Vamos ter que ir na casa dele. _ Pronto ganhei uma cicatriz. - reclamou. _ Coloca uma calça e blusa de frio. _ Onde ele mora? É longe? _ Um pouco, vou tomar um banho, enquanto você se prepara. Eu tomei meu banho, troquei de roupa e só depois de cinco minutos Marrynna surgiu, vestindo saltos calça social larga e uma blusa de gola alta. Parecia que estava saindo para uma festa. _ Não tem um sapato baixo? Ela se olhou e fez um vinco no meio da testa. _ Estou feia? _ Não é isso, acontece que vamos a cavalo. Pensei que os olhos dela iriam cair das órbitas. _ Cavalo? Por que não chama um táxi. _ Táxi? Quem vai pagar você? Para vir ate aqui, ruiva, eles cobram o dobro, Moramos na zona rural tudo aqui é distante. _ Ou seja, você se esconde no fim do mundo. _ Fim do mundo ou não, esse lugar eu não troco por nenhum outro. Peguei o cavalo enquanto ela ficou na porta, fiz sinal para a ruiva se aproximar. Puxei a mulher ajudando-a a se acomodar atrás das minhas costas. _ Segura firme.- pedi e cortei caminho por dentro dos matos. _ Você não disse que teríamos que ir pelo capim! - berrou e falou algumas coisas no idioma dela. _ Mato, não capim. A casa dele faz dívisa com o meu terreno. Não tem necessidade de fazer uma volta se posso ir por aqui. Coloquei Soluço para correr. A ruiva se escondeu atrás das minhas costas. Pouco tempo depois chegamos na casa do Luciano. _ Âoi! Luciano? - chamei, descendo do cavalo e retirando Marrynna de cima do bicho. olhei para a calça da mulher, a barra cheia de carrapicho. Luciano surgiu na porta com cara de sono. _ Oi, Cícero! - os olhos dele desviaram para Marrynna. _ Boa tarde, está muito ocupado? - perguntei enquanto Janaína, a filha mais nova do meu amigo- uma pequena que tem apenas três aninhos- Correu para os meus braços. Peguei a garotinha erguendo-a bem no alto e arrancando gostosas gargalhadas dela. _ Não, Cícero. Se achegar para cá. - Luciano olhou mais uma vez para Marrynna- Boa tarde, Dona. _ Boa tarde. - ela respondeu retirando algumas bolinhas de espinhos da barra da calça. _ A minha...- minha o quê? Olhei mais uma vez para a ruiva- Minha hóspede cortou o dedo, tem como você suturar? _ Claro, só um instante que vou pegar o material. Tudo não levou cinco minutos. Assim que chegamos em casa, reparei que ela queria falar algo. _ Vamos, fale. - pedi retirando a sela do Soluço. _ Porque um médico vive afundado dentro dos matos e numa casa tão... _ Simples? _ Pobre! _ É que ele é um médico de animais.- revelei. A ruiva travou no lugar. _ Como?? - seus olhos ficaram enormes. _ Um veterinário. - soltei Soluço para o pasto. _ Teve coragem de me levar num médico de bicho? _ E ele fez o serviço direitinho não foi?- cruzei os braços e olhei em sua direção. A ruiva bateu os pés do chão apontou o dedo em minha direção. _ Nunca mais fala comigo! Entrou brava e falando milhares de palavras em alemão. Eu, fiquei na varanda, deitei na rede e admirei a lua e senti a noite. Mas diferente do que eu temia, a razão para Dona Berenice me chama as pressas era outro. Quando cheguei na pensão encontrei a senhora de cabelos tingidos de preto, parada na porta, bufando de raiva. Saltei da moto e me aproximei. _ O que houve, Dona Berenice? - indaguei aflito. — Essa menina não serve nem para limpar mesa! Assim que um cliente elogiou a beleza dela, ela revirou os olhos, respondeu de forma atravessada falando enrolado, derrubou o copo de suco na camisa do homem. Não posso perder meus clientes! Coloquei as mãos na cintura. — Ele foi desrespeitoso — defendeu-se Marrynna, se aproximando. — Não sou obrigada a ouvir piadinha de ninguém. — E eu não sou obrigada a ter gente metida trabalhando para mim — retrucou Berenice. _ A senhora vai me desculpar, Dona Berenice, mas se ele foi desrespeitoso, mereceu o banho de suco. - falei o que pensava sobre o assunto. _ Dizer que os olhos dela lembram os olhos de uma coruja, porque tem uma expressão forte, não é desrespeito, Cícero! _ Ele me chamou de coruja! Coruja significa feia! _ Não chamou, menina!- Dona Berenice bufa. _ Chamou sim, deveria ter chamado a senhora assim que está passada. - Marrynna falou afrontosa. Puxei a menina pela mão. _ Desculpa qualquer coisa, Dona Berenice. Voltei com Marrynna silêncio. Na garupa da moto, a ruiva parecia tão rígida quanto uma rocha. Mas, após um tempo, murmurou: — Isso aqui é pior do que eu imaginava. — O que é? — O Brasil. Essa vida. Essa gente me olhando torto. Todo mundo sabe da sua vida. Ninguém esquece nada. Devem lembrar do dia que você me atropelou. Suspirei. — Cidade pequena é assim. Todo mundo acha que sabe tudo. Mas a verdade é que ninguém conhece o que se passa no coração do outro. Nem tenta. E a vida segue. — É, são iguais a você. Fiquei em silêncio. Ela prosseguiu: — Me julga o tempo todo. Acha que sou metida, inútil, mimada. Seu olhar não n**a. Encostei a moto na porteira. Ela desceu com passos firmes, jogando os cabelos para o lado. — Julgo é? Ela parou. — Sim! — E você não? - indaguei. Ela me fitou. Havia um cansaço em seu rosto. _ Eu não. - sorri e balancei a cabeça em negação, ela mentia que nem sentia. Naquela noite, lavei a louça. Enquanto a menina se fartava de broa de milho. — A água estava fria demais. Pedi para a tal Berenice comprar luva, sabe o que ela me disse? _ Não faço a menor ideia. - respondi, enxugando o último talher para guardar. — Ah, claro, vou anotar na lista de luxos da madame! _ Queria que ela falasse como se você se arrumou como se fosse para um casamento. Marrynna deu de ombros. _ É as roupas que tenho.- voltou a comer. --- No sábado, levei-a até a feira para tentar arranjar outro trabalho. No caminho, os olhares das senhoras da cidade cochichavam como corvos em galho seco. — Aquela ali é a estrangeira? A que ficou na casa do Florian? — Mas agora está andando com Cícero. _ Eles estão morando juntos? Namorando? — Ele está de caso com ela? Daqui a pouco aparece de barriga. Fiz o possível para ignorar. Mas percebi que ela ouviu tudo. Fingiu não se importar, mas o pescoço dela ficou vermelho. E não era por causa do sol. Na volta, não trocamos uma palavra. Somente quando já estávamos na estrada de terra, ela soltou: — Bando de faladeiras! Falaram que estávamos namorando e que não tarda eu surgir grávida. — Só se for de outro, meu não. _ Claro! Não vou ter filhos com um...- ela percebeu que estava falando demais e se calou. _ Um o que? Peão? Sou com muito orgulho, tudo que tenho e conquistei foi com o meu suor, não subi nas costas de ninguém. Cada palmo dessas terras tem isso aqui- bati em meu braço- meu sangue, minha força. Marrynna empalideceu. Ela me olhou surpresa, mas não disse nada. Algumas coisas a gente aprende com o tempo. Mas às vezes nem com ele.
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