Luca Smith
- Você precisa pedir ela em casamento, hoje! - O meu pai exige, assim que eu entro no escritório.
- Eu sei. - Respondo, mas ele não parece satisfeito.
- Luca, me diz que fará isso, essa noite? - Sinto a caixinha com o anel no meu bolso e ela parece queimar ali.
- Pai, sei das minhas responsabilidades. - Quase cuspi as palavras.
- Hoje, Luca! - Agora ele usa o tom de comandante.
- Sim senhor. - Respondi no automático e saí do escritório.
Eu consegui fugir desse casamento por 6 meses, o tempo que o meu pai ficou fora de Londres, mas, assim que ele pisou os pés aqui, ele me entregou o anel. E quando Junior Smith faz uma exigência você não pode negar.
Fujo para o jardim, não tem outro termo para o que estou fazendo, enquanto me esgueirei pela saída de funcionários, fugindo também da minha mãe, que está muito animada. Acho que Rose Smith é a única genuinamente feliz com a união das famílias, qualquer outra pessoa envolvida apenas está conformada e satisfeita que o plano dará certo. Não a minha mãe. Ela está realmente feliz e animada.
O dia está começando a dar lugar a noite e eu me pego pensando nos próximos passos da minha vida.
Sou filho do comandante da maior organização de Londres, organização essa que é uma espécie de seita entre os ricos, para garantir que todos continuem cada vez mais ricos. E eu gosto da minha posição, gosto de saber que assumirei tudo um dia e serei o homem mais poderoso do Reino Unido, depois do rei.
Talvez mais poderoso que o Rei.
Mas, ser obrigado a casar com uma mulher insuportável, a pessoa mais chata que eu conheci na vida, é como pagar por todos os pecados que cometi nessa vida e em vidas anteriores. Patricia Walker é insuportável e esse é o real motivo para que eu tenha postergado o pedido de casamento.
Nossa união será exclusivamente comercial, com foco em aumentar e unir os patrimônios e gerar herdeiros. Afinal, os ricos devem ficar cada vez mais ricos.
- Querido! - Ouço a minha mãe chamar. - Estamos prontos para ir. - Ela anuncia e eu caminho com calma até a garagem. Assim que entro na garagem ela sorri para mim. - Você está lindo, falta apenas um sorriso! - Forço um sorriso e ela sorri de volta. - A Patrícia é linda, filho e tenho certeza que você será muito feliz!
Ignoro completamente o comentário e entro no meu carro, dispensando a limousine em que eles vão. Quero poder ir embora no momento que eu quiser, e dirigir até lá vai me dar tempo de me preparar para o que terei que fazer.
Não é como se eu não soubesse que a minha vida ia acabar dessa forma, que eu ia precisar casar com alguém que eu não escolhi e que eu ia precisar continuar em Londres, mesmo que a minha vontade fosse viajar para muito longe e que os meus amigos seriam resumidos aos filhos dos amigos dos meus pais, que são filhos dos amigos dos pais deles… Enfim essa é a vida do herdeiro da família mais rica de Londres.
E eu também não acho que o amor deva ser a prioridade na vida de alguém.
Eu gosto de poder, de ter dinheiro, gosto de comandar as coisas e de participar ativamente dos negócios.
Fiz a faculdade que eu queria e assumi o cargo de CFO na empresa, e isso apenas por ter o sobrenome que tenho. E eu posso fazer tudo o que eu quero.
E agora que os caminhos se direcionaram para um único destino me dei conta que sempre me foi dada a sensação que posso fazer tudo o que eu quero, mas na verdade, não posso.
Eu esperava mais da vida. Algo surpreendente.
Eu esperava encontrar o que a minha irmã encontrou. Uma companheira, que faz os olhos dela brilharem e que mostra que cumplicidade existe, mesmo em um mundo como o nosso. Acredito que isso é possível, mas tenho certeza que nunca vou ter isso com a Patricia.
Respiro fundo algumas vezes, depois que eu passo com o carro pelos portões da propriedade dos Walker. É inevitável o que terei que fazer essa noite e quanto antes eu me conformar com isso, melhor.
- Querido você está lindo! - A minha futura sogra me saúda, assim que eu entro na sala em que ela me aguarda junto com meu futuro sogro.
- Obrigado Ruth, você também está deslumbrante! - Dou um beijo no na bochecha dela, e aperto a mão do meu futuro sogro. Logo percebo que, infelizmente, eu fui o primeiro a chegar. E o silêncio que nos cerca depois dos comprimentos é vergonhoso. Os meus pais chegam logo em seguida e não demora muito para que outros dois sócios apareçam.
- Onde está a Patricia? - A minha mãe pergunta, com uma simpatia nitidamente forçada.
- Ah ela deve descer em breve, vamos aguardar.
Sempre houve uma tensão entre a minha mãe e a minha futura sogra, em todos os eventos, as duas nunca trocam mais que algumas palavras e eu nunca entendi muito bem o motivo, mas também pouco me interessa.
Posso apostar que seja a antipatia natural que Ruth Walker têm, a mesma antipatia que a Prática carrega, que faz com que minha mãe se sinta desconfortável.
Já o meu pai e o meu futuro sogro são amigos desde a infância, e esse é um dos motivos que levou o meu pai a exigir que eu me relacionasse com a filha dele, afinal de contas, as duas famílias mais ricas e poderosas de Londres, unidas, seria uma coisa indescritível!
Não demora muito para a minha futura noiva fazer uma entrada triunfal. Preciso me controlar para não bufar.
Ela desce as escadas, feitas de mármore, em um vestido vermelho, extremamente extravagante, para um jantar simples, com uma maquiagem muito forte e o cabelo em um penteado completamente elaborado e eu não posso deixar de observar o quanto ela é bonita. Os olhos verdes e o cabelo loiro deveriam dar um ar angelical, mas não é o caso, e ela tem uma pele impecável, um corpo muito bem definido, mas o que me chama atenção é o rosto marcado pela falsidade.
Ela ignora todos os presentes e vem na minha direção, sorrindo forçadamente
- Luca! - Ela chama o meu nome com um gritinho. - Fiquei esperando você me responder o dia inteiro - A voz fina chega a me dar arrepios.
- Eu estava ocupado, Patrícia! - Explico sem me aproximar muito dela. - Tive compromissos na empresa, e realmente não pude te dar atenção. - Percebo olhar de todos em nós. - Me desculpe. - Me forço a dizer e recebo um olhar de censura do meu pai. Com certeza ele esperava que eu fosse mais caloroso com ela, mas isso exigiria um esforço fora do comum da minha parte.
- Fiquei muitoooo chateada que você não me respondeu! - Ela força a voz até ficar infantil e isso é vergonhoso demais. - Mas, agora você está aqui e estou muitooooo feliz! Meu dia melhorou 1000%!
Te ignorar é um esporte em que eu sou o melhor do mundo!
O pensamento me arranca um sorriso, e ela parece satisfeita.
- Bem, já que estamos todos aqui, podemos nos acomodar na sala de jantar. Me acompanhem. por favor. - Ruth Walker fala e a seguimos.
E tudo parece ter sido preparado para um evento grande pelo que eu percebo. Tem flores para todos os lados e a mesa está posta como se estivessem recebendo a família real. O que como diz muito sobre a posição dos Smiths, que controlam cerca de 90% das maiores empresas do Reino Unido. Isso faz com que as pessoas nos tratem muito bem, e na maioria das vezes de forma falsa, por isso me tornei um especialista em ler as pessoas.
Eu consigo identificar a verdade das pessoas pela forma com que elas falam comigo e até como me olham, ou como olham para os meus pais. E digo, seguramente, que 10 em cada 10 pessoas, não são verdadeiras.
O jantar é servido pelos garçons e a conversa ocorre de forma natural. A Patrícia, que está sentada ao meu lado, puxa assunto a todo momento. Pergunta a marca do meu terno, pergunta se eu já viajei para algum lugar dos Estados Unidos que eu não tenho nem ideia de onde é, mas que ela adoraria conhecer. Uma dica leve sobre a lua de mel, sem dúvidas.
Quando a sobremesa é servida, estamos falando sobre um investimento milionário que estamos fazendo, em parceria com um grupo na Itália. Um investimento que apenas eu e o meu pai sabemos que não é apenas exportação de vegetais e uvas. E sim uma exportação que vai assegurar que o nosso lucro seja 5 vezes maior.
Não demora muito para que a conversa comece a ficar cada vez mais escassa, e a Patrícia começa a mudar a feição, parecendo cada vez mais incomodada com a minha falta de atitude.
Ela sabe, é claro que ela sabe!
Muito provavelmente o meu pai conversou com o pai dela, e disse que me faria fazer o pedido hoje.
E esse pensamento bastou para a caixinha no meu bolso começar a pesar uma tonelada.
Peço licença e me encaminho até o lavabo. Eu preciso de alguns minutos para me acostumar com a ideia do que eu vou fazer.
Tranco a porta atrás de mim, olho no espelho e respiro fundo. É quando eu percebo que eu não vou conseguir fazer isso