Capítulo 4 -Helena

1592 Words
Helena Depois de alguns segundos me encarando intensamente, que pareceu mais uma eternidade ele tira a mão de cima da minha e pergunta: — Você é enfermeira? — Tentando controlar a minha respiração que estava ofegante, respondi: — Não, não sou, mas para sua sorte fiz um curso de primeiros socorros há pouco tempo… Ele riu tentando sentar na cama… — Sorte? Que horas são, agora? — Um pouco mais de quatro horas da tarde. — Então, fazem quase dois dias que quase me mataram e ainda estou sobrevivendo… — Ele diz fechando os olhos e encostando a cabeça na cabeceira da cama. — Está sobrevivendo sim. Você está melhorando, mesmo que seu corpo ainda esteja bastante quente, mas a febre baixou um pouco. As duas injeções que eu apliquei em você estão fazendo efeito. Ele riu e eu entendi que ele não estava falando do estado de saúde dele e sim do que aconteceu… — Você é uma enfermeira muito boa, mesmo tendo só um curso de primeiros socorros. — Ele elogia, com um sorrisinho desanimado no rosto… — Saiba que eu estou muito orgulhosa de mim, não tenho aptidão pra ver sangue, corte, essas coisas e mesmo assim fiz um ótimo trabalho com você, mas você precisa fazer repouso e tomar mais injeções e remédios. Seus ferimentos estão abertos e você levou um tiro, e mesmo ele pegando de raspão, lhe feriu. E teve também os ferimentos causados pelo impacto da bomba. — Não sei porque, mas eu sobrevivi a um belo ataque… — É verdade, mas é muito cedo pra dizer que você está livre de infecção. Tem que se cuidar, porque você pode morrer. — Não posso ficar aqui muito tempo… Eles podem me achar e seus pais podem aparecer a qualquer momento… — Não se preocupe com isso, confie em mim, ninguém vai aparecer. Agora você vai provar da minha segunda especialidade. — Segunda especialidade? E qual seria? — Sei fazer um caldo de frango delicioso e acho que você deve está morrendo de fome. — Falei animada. — Fome? Confesso que não sei, porque no momento só sinto muita dor. — Como sou sua enfermeira, trate de me obedecer e coma pelo menos um pouco para poder tomar outro remédio para dor. Ele fica me observando enquanto eu coloco o termômetro nele e vou pegar sua comida. Com um pouco de dificuldade ele come tudo… Com o estômago cheio, o cansaço bateu e ele se encostou na cabeceira da cama novamente e fechou os olhos. Eu me aproximei, fiz ele descer mais na cama para ele ficar mais confortável e dormir… ajeitei seu travesseiro e nesse momento, ele passa a mão no meu rosto e diz: — Você é muito boa e linda, menina… mas cometeu um erro… — Como assim? Qual? — Perguntei sem entender. — Não devia ter me deixado viver… Foi um erro! — Porque você diz isso? Por acaso você é um b@ndido? Vai fazer algum m*l comigo? — B@ndido, eu? Sinceramente não sei o que sou… ou melhor, não sei o que fui… Por isso você não deveria ter me deixado viver… Eu não esperava por isso, mas não sei porque eu entendia sua dor… — Não diga isso, você tem que viver e enfrentar o que houve e descobrir o que restou da sua vida… por você e talvez pela moça… Quando me dei conta que tinha dito isso, já era tarde demais… Coloquei a mão na boca e vi que seus olhos mudaram de cor, ficando completamente escuros… — Desculpe, eu não tive a intenção de magoá-lo… Mas Sophia era sua parceira e… — Como você sabe o nome dela? — Você gritou o nome dela algumas vezes quando estava delirando, e… — Me deixe dormir, eu estou com sono, com dor e com frio. — Ele manda com a voz rouca, firme e autoritária e não me deixa continuar. Encostou a cabeça no travesseiro, puxou o cobertor pra cima dele e fechou os olhos. Eu achei melhor sair de perto dele, ainda tremendo da excitação que aquele momento me causou. Arrumei a cozinha, tentei estudar um pouco, mas não consegui me concentrar… Jantei, tomei banho, coloquei uma camisola de malha confortável e deitei no sofazinho, e quando estava conseguindo dormir um pouco, ouvir gemidos e era ele delirando de novo… Levantei, vi sua temperatura e que a febre tinha voltado e ele falava frases desconexas que eu não conseguia entender. Sentei ao lado dele… e antes de colocar a mão em sua testa, falei baixinho, perto do seu ouvido… — Gabriel, você está delirando… eu estou cuidando de você… Vou colocar a mão na sua testa… Fique calmo. Dessa vez ele não segurou meu pulso, apenas me encarou e disse sussurrando… — Você estava no meu sonho de novo… — Não é um sonho… Vou cuidar de você até você melhorar de vez… Levantei e peguei água morna, molhei uma toalha e fui passando pela testa dele, fazendo uma espécie de compressa… — Nos filmes, isso sempre funciona… Espero que não seja mentira… — Fui passando e falando pra mim mesma. Aquela madrugada eu passei inteira ao lado dele, passando a toalha no seu rosto, fazendo ele tomar água aos poucos para hidratá-lo. Foi tão cansativo que eu acabei deitando ao lado dele e adormecendo… só acordei quando ele se mexeu tentando levantar sozinho… — O que é isso? onde você pensa que vai? — Ai, ai… — Ele gemeu, com a mão no ferimento… — Preciso ir ao banheiro e quero tomar banho… — Como é? Você deve tá louco. Você passou mais de 24 horas delirando de novo… sabia? E agora que está um pouco melhor, quer levantar sozinho e ainda tomar banho. — Falei brava. — Nossa, você é brava, menina… mas eu tô melhor, e também não quis te acordar, eu vi que você ficou o tempo todo cuidando de mim e com certeza está cansada. — Estou mesmo. Como eu disse Gabriel, você piorou muito… Quase que te levei pro hospital. — Ainda bem que não levou… Pelo seu próprio bem… — Não entendi… — Eles tinham me matado e matado você também… — Arregalei os olhos e ele falou se virando: — Preciso ir ao banheiro. — Eu, eu… Vou te ajudar… — Consigo ir sozinho… — Nossa como você é teimoso… Me obedece… eu salvei sua vida. — Ele balançou a cabeça com um sorrisinho no rosto. — Tá certo, mandona… Ele colocou o braço por cima de mim, dividindo o peso do seu corpo e fui ajudando ele a entrar no banheiro e quando ele ficou de frente pro vaso me olhou… — Vai ficar aí assistindo? Por mim não tem problema… — Nesse momento eu me dei conta que ele tava de cueca e queria fazer xixi… Virei de costas, mas não sai do banheiro… Ele não estava bem e se caísse o estado dele ia piorar muito. — Agora preciso tomar banho, estou muito quente e me sentindo muito sujo. — Você pode cair e seria seu fim. Mas se você tomar banho de cueca e sentado num banco, eu deixo. — Ele respirou fundo impaciente e resmungou algo que eu não entendi. — Não adianta reclamar, que eu vou te dar banho. Coloquei o banco e quando a água do chuveiro começou a cair em cima dele, ele tremeu e sua respiração foi ficando ofegante… — Você tá bem, Gabriel? — A água batendo no meu corpo tá parecendo facas… tá doendo tudo. Estou enjoado e tonto… — Ai meu Deus… Não desmaie que eu não consigo segurar você assim… Ele me puxou, encostou a cabeça no meu peito e eu vi que ele estava apoiando seu corpo em mim… meu coração disparou com aquela proximidade… A água escorria pelo corpo de Gabriel, deixando a cueca colada, e não pude deixar de ficar curiosa e dei uma olhadinha… Eu deveria pensar apenas em sustentá-lo, em não deixar que ele desabasse ali no box, mas meus pensamentos me traem. — Respira fundo, Gabriel… devagar. Eu tô aqui. — sussurrei, com a boca tão perto do ouvido dele que cheguei a sentir sua pele arrepiar. Ele ergueu os olhos para mim, e por um instante esqueci a gravidade da situação. Aquele olhar queimava, mesmo na dor, mesmo na fraqueza. — Quem é você menina? — Ele sussurrou com a voz trêmula. — Já te disse que sou um anjo. — E eu já te disse que anjos são traiçoeiros… Ele sussurrou tremendo e gemendo… Minhas mãos foram até os ombros dele, massageando devagar para aliviar a tensão. A água deslizava, e cada vez que eu passava os dedos, sentia os músculos rígidos, o corpo quente. Gabriel fechou os olhos, respirando cada vez mais fundo. Ele ergueu o braço com dificuldade, mas o suficiente para pousar a mão na minha cintura. Mesmo fraco, mesmo ferido, o toque dele tinha força. — Eu preciso deitar… — Me deixe passar shampoo nos seus cabelos… Ele não respondeu e eu lavei seus cabelos e passei sabonete em algumas partes do seu corpo, sempre protegendo seus ferimentos. Terminei e enxuguei ele com calma e com dificuldade levei-o para cama… — Pronto teimoso… Agora você está limpinho, mas agora fique quieto que eu preciso fazer seus curativos. — Estou muito tonto e me sentindo fraco, sem força. — Eu falei que você não estava bem. Seu corpo continua muito quente… Depois de cuidar dos seus curativos, medicá-lo e fazer ele comer, finalmente ele adormeceu… ***
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