— De onde saiu isso? — perguntou ela.
— Estou falando sério, eu sou apaixonado por você.
Síria já sabia disso, mas pensava que, se eles se afastassem, Aurélio logo se encantaria por outra mulher. Pelo que percebia, no entanto, não era isso que estava acontecendo.
— Aurélio, você pensa que gosta de mim. Sou apenas alguém que você não conseguiu levar para a cama. Por isso você pensa assim. Você não está apaixonado por mim de verdade.
As palavras de Síria eram como facas no coração de Aurélio. Ele havia sonhado muitas vezes em tê-la nos seus braços. O que sentia por Síria era diferente. Ele sabia que não era passageiro e que não era apenas porque não conseguira conquistá-la, como ela havia dito. Ele a amava. Com ela, não precisava de máscaras. Podia ser ele mesmo, sem reservas.
— Me dê uma oportunidade para provar que você está errada.
— Eu não te amo, Aurélio. Você é alguém de quem gosto muito, como um dos meninos. Sempre vou me preocupar com você, mas nossa relação não passa disso.
— Mas você disse que gosta de mim! — disse ele, sorrindo.
— Você ouviu o que eu disse? — perguntou, incrédula. Aurélio realmente era incorrigível.
— Não pode me culpar por ter esperança, Síria — disse ele, sério.
— Se eu disser mais alguma coisa, vai adiantar?
— Provavelmente, não.
Ele sabia que estava arriscando, mas tentaria mesmo assim. Pelo menos, se ela o rejeitasse definitivamente, não poderia dizer que não fez tudo o que estava ao seu alcance. Eles passaram mais algum tempo ali conversando. Síria gostava de estar com Aurélio. Ele a fazia rir e era um cara bacana. Era uma pena o seu coração bater apenas por outra pessoa.
— Você conseguiu expandir os seus negócios como queria? — Síria tentou mudar de assunto para dissipar o clima tenso que havia entre eles.
— Quase. Tem alguém tentando atrapalhar os meus negócios, mas ele não vai viver muito para conseguir — um sorriso c***l se abriu no rosto de Aurélio.
Síria conhecia muito bem aquele sorriso. Já o tinha visto várias vezes e sempre terminava com alguém pendurado no galpão de Aurélio.
— Deixe-me adivinhar: seu primo.
Não era segredo para ela que o primo de Aurélio tentava, havia algum tempo, roubar o seu lugar na máfia. Emílio era esperto e nunca deixava rastros. Por mais que Aurélio quisesse dar cabo do sujeito, não poderia. Era contra as regras da máfia derramar o sangue de um parente. Ele precisaria de um motivo muito plausível para isso. Porém, Emílio era como um bagre ensaboado, sempre escapando das mãos de Aurélio.
— Minha vontade é torcer o pescoço dele — disse Aurélio, apertando uma garrafa de água sobre a mesa. — Mas minha espera vai valer a pena.
— Você tem que ter cuidado. Ele é esperto. Não vai ser fácil pegá-lo.
— Eu tô ligado — disse, piscando para Síria.
— Bora, já está ficando tarde.
Pela centésima vez, Xavier olhou para a tela do computador. Agora não havia mais dúvida. Ele fez o download do arquivo e começou a analisar.
— Te trouxe café — disse Charles, colocando uma xícara sobre a mesa e puxando uma cadeira para sentar-se ao lado dele.
Xavier tomou um longo gole, ainda com os olhos na tela.
— Alguma novidade? — Charles já estava acostumado com o jeito taciturno de Xavier. A única pessoa que conseguia arrancar mais de meia dúzia de palavras dele era Síria. Talvez fosse porque Xavier havia perdido a irmã em um acerto de contas. De todos, ele era o mais protetor em relação a ela, e Charles entendia bem o motivo.
— Sim, e temos problemas.
— Como? — Charles ficou surpreso, mas sabia que, no ramo deles, problemas eram comuns. À medida que a organização crescia, cresciam também os inimigos.
— Vou terminar de analisar e depois explico tudo.
Enquanto trabalhava, a mente de Xavier viajou para memórias que ele não desejava revisitar. Todos os membros da Fênix tinham uma história, e Xavier não era diferente.
Flashback On
— Garoto inútil!
Xavier sentiu o sangue escorrer por seu rosto, onde o soco violento de seu pai o havia acertado. Ele tinha apenas sete anos na época.
— Eu fiz como você mandou, papai — tentou se justificar, mas o homem não deu ouvidos e o arremessou contra a parede do quarto.
— Se tivesse feito como eu pedi, não teria perdido!
O motivo de toda a violência? Xavier havia perdido uma luta contra outro menino. Mas o homem não admitia falhas e espancar o garoto havia se tornado o seu passatempo favorito.
— Por favor, James, ele é apenas uma criança! — implorou a sua mãe, segurando uma das mãos do homem.
— Isso é culpa sua! Nem pra me dar um filho forte você presta!
A sua ira voltou-se para a mulher, que, apesar de implorar, não escapou das agressões que se seguiram.
Sem que o homem percebesse, uma menina entrou no quarto. Fez sinal para que Xavier ficasse quieto e arrastou o seu corpo machucado para fora dali. Os seus olhos se iluminaram ao ver Aurora. Era sempre ela que o socorria e cuidava de suas feridas.
— Um dia eu ainda vou matá-lo, Xavier. Assim, nunca mais vamos sofrer com aquele inútil.
Aurora era uma sonhadora. Apesar das surras constantes, sempre andava sorrindo e imaginando-se em outro lugar. Era por causa dela que Xavier conseguia sobreviver, pois pensava que um dia vingaria a sua irmã e a sua mãe das mãos do seu pai abusivo.
Flashback Off
Xavier voltou a si com um gosto amargo na boca. Essas lembranças sempre o machucavam. A impotência diante de tudo o que havia passado o assombrava. Ele era um homem quebrado por dentro.
Ignorando seus pensamentos, voltou à sala. Tinha informações importantes a relatar ao chefe e já imaginava que a reação de Ricardo não seria das melhores.