Perigoso, Mas...

630 Words
Maitê. Os sons de tiros diminuíram, e a sirene cessou. A Dona Neide me abraçou forte. — Graças a Deus, Maitê. Mais uma vez, Rael nos salvou. Eu ainda estava tremendo, mas meus olhos não saíam da fresta da janela. Ele estava lá fora, em pé, conversando com seus homens, a postura relaxada agora, mas ainda com a aura de poder. Ele havia me protegido. A mim e a todos. No meio de todo o caos e perigo do morro, ele era o ponto de estabilidade. — Ele é perigoso, Dona Neide. Ele... Ele... é um traficante, é perigoso... vai saber as coisas... — sussurrei, tentando convencer a mim mesma, mais do que a ela. — Perigoso, sim. Mas também é um homem que cuida da gente do jeito dele. Ele nasceu aqui, cresceu aqui. Não conheceu outra vida — ela respondeu, com uma sabedoria que me atingiu em cheio. — Não é um santo, minha filha. Ninguém aqui é. Mas tem um coração, por mais que ele tente esconder. — Preciso ir para casa — Mateus nos interrompe. Até havia me esquecido que ele estava aqui. — Preciso ver como estão as coisas por lá. — Obrigada pela ajuda. — agradeço. — Não precisa agradecer — Mateus sorri — Terminamos com as plantas depois, ok? — Tá! Mateus se despede e com calma, sai pela porta. Volto meu olhar a Dona Neide e respiro fundo. — Isso tudo é uma loucura. Meu coração ainda está disparado. — Sinto muito que tenha presenciado algo assim, mas essa é a realidade das pessoas que moram aqui. A gente tem uma vida, na maior parte do tempo uma boa vida, mas temos nossos problemas também. — Quando eu cheguei aqui... — Eu sei o que disse quando chegou. E minha opinião segue a mesma. Você precisa se concentrar no seu futuro. Por outro lado, você está aqui. Essa é sua vida também. Quero que tome cuidado, mas não posso ser injusta em relação as pessoas que tomam contam desse morro, principalmente sobre Rael. — E se algo acontecesse com ele ? — sussurro. Minhas voz quase falha. Consigo sentir o gosto amargo da minha pergunta. — Seria muito triste. Rael é perigoso, mas ele cuida dos seus. A gente sabe que tem lideres por ai horríveis. Que não se preocupa com a comunidade. Que se esconde atrás dos soldados para não se ferir em uma guerra. Não ele. Apesar de muitos defeitos, ele foi criado para ser um líder e esta cumprindo bem seu papel. As palavras dela ecoavam na minha cabeça. Eu via o lado obscuro de Rael. O poder, o controle, a violência que o cercava. Mas eu também via os lampejos. A forma como ele me ajudou com a sacola, o jeito que ele me olhou depois que eu o enfrentei, e agora, a forma como ele se postou como um escudo para proteger a todos. Ele não era um príncipe encantado, nem um mocinho de novela. Nossa, ele estava muito longe disso. Rael não era bom, mas ele também não era só m*l. Era um homem complexo, cheio de contradições. E isso, de alguma forma, o tornava mais real. E mais atraente. Sim, atraente. A palavra me pegou de surpresa, mas eu não podia negar. Havia algo nele, uma força bruta misturada com uma humanidade escondida, que me puxava. Eu queria conhecê-lo melhor, entender o que se passava por trás daqueles olhos duros. Era uma atração perigosa, eu sabia. Uma chama que poderia me queimar. Mas eu, Maitê, a garota do interior que veio buscar uma vida diferente, estava curiosa demais para resistir. O morro era perigoso, sim. Rael era perigoso, com certeza. Mas, para mim, ele também se revelava como uma promessa de algo intenso e inesperado.
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