ISABELA
O silêncio que se instalou depois que Lucas abriu a porta era quase físico, denso, sufocante.
Eu dei um passo para trás, tentando parecer natural — fracasso total — enquanto Arthur endireitava a postura como se estivesse diante de um diretor.
Lucas nos olhava com aquela expressão estranha… como se tivesse entrado no meio de uma conversa proibida.
Porque tinha.
E eu precisava destruir essa impressão antes que criasse raízes.
Respirei fundo.
— Não — falei rápido demais. — Não estávamos… nada disso. Eu só… estava perguntando ao professor sobre a matéria.
Lucas arqueou a sobrancelha.
Claro que ele não acreditou de primeira. Ninguém acreditaria.
Mas eu continuei.
Firme.
Convincente.
— A última redação… aquela sobre ética e integridade pessoal — minha voz falhou, só um pouco — me deixou meio abalada. Foi muito parecida com algo que aconteceu com a minha mãe… e eu não estava conseguindo escrever direito.
Lucas piscou, surpreso. A menção à minha mãe sempre desmontava qualquer resistência.
Continuei antes que ele pudesse falar:
— Eu pedi ao professor para… revisar comigo o texto. Só isso.
Meu tom dizia por favor, acredita nisso.
E também por favor, não faz mais perguntas.
Arthur permaneceu quieto por um segundo longo demais.
Um segundo que me queimou por dentro.
Então, finalmente, ele falou.
ARTHUR
— É verdade — confirmei, medindo cada sílaba.
Lucas relaxou um pouco.
Eu não.
— A redação da senhorita Duarte demonstrou… dificuldade emocional na composição — continuei, mantendo a voz neutra, profissional, completamente diferente do que eu realmente sentia. — E, como professor, achei que seria adequado oferecer orientação acadêmica.
Aquilo era uma mentira com roupa de verdade.
Eu sabia disso.
Ela sabia disso.
E, de algum modo, Lucas também parecia saber — mas sem provas, sem contexto, sem motivo para duvidar abertamente.
E então fiz algo que eu NUNCA deveria ter feito:
— Inclusive — falei, com a calma de quem segura dinamite — você realmente precisa se esforçar mais em sala, senhorita Duarte.
O olhar que ela me lançou quase me matou.
Era indignação.
Era surpresa.
Era desejo ferido.
E era… perigoso.
Mas Lucas precisava ouvir aquilo.
Precisava achar que nada de extraordinário estava acontecendo.
— Se quiser — acrescentei, olhando rapidamente para ela e depois para longe — pode passar na minha sala após a aula. Apenas hoje. Revisaremos o conteúdo que você perdeu.
“Conteúdo que você perdeu.”
Eu disse aquilo sabendo exatamente o que significava: que eu percebi cada vez que ela me olhou em vez de tomar notas.
Que eu percebi… tudo.
Isabela piscou lentamente, sem saber se me matava ou agradecia.
— Certo — ela murmurou. — Só… hoje.
Lucas assentiu, acreditando completamente na explicação.
— Se você precisar de ajuda também, Isa, posso estudar com você — ele ofereceu, genuíno como sempre.
Aquela frase fez meu controle interno estremecer.
ISABELA
Lucas era gentil demais.
Bom demais.
Seguro demais.
Tudo que Arthur não era.
E ainda assim… meu corpo escolhia o perigo.
— Obrigada, Lu — respondi, forçando um sorriso. — Mas eu acho que hoje… é melhor revisar diretamente com o professor mesmo. Já estou com a cabeça cheia.
Lucas pareceu aceitar. Mas seus olhos ficaram um segundo a mais em mim.
E depois em Arthur.
Como se guardasse aquela imagem para interpretar mais tarde.
Quando ele finalmente saiu da sala, deixando a porta aberta atrás de si, eu quase desmoronei.
Arthur cruzou os braços.
Olhou para mim com aquela frieza calculada que escondia tudo que ele realmente sentia.
— Você improvisa mentiras rápido demais — ele murmurou.
— E você foi bem convincente — retruquei.
— Não faça isso de novo — ele disse, dando um passo para perto. Não encostou, mas o ar entre nós vibrou. — Não me coloque na posição de ter que justificar… situações como essa.
Minha respiração falhou.
— Situações como qual, professor?
A provocação saiu antes que eu pudesse evitá-la.
Ele não sorriu.
Mas os olhos dele escureceram.
— Aquelas que não deveriam acontecer — respondeu. Baixo. Mortal.
Silêncio.
Então, com esforço visível, ele se afastou.
— Depois da aula — repetiu. — Uma única vez. Para revisar o conteúdo.
Eu assenti, mas meu coração estava em guerra.
Ele virou as costas e saiu primeiro.
E foi só quando fiquei sozinha na sala que percebi que minhas mãos estavam tremendo.
Não era medo.
Era antecipação.
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ARTHUR — Mais tarde, no fim da aula
Ela hesitou na porta. Por um segundo, achei que fosse embora.
Parte de mim desejava isso.
A outra parte…
— Pode entrar, senhorita Duarte — falei, antes que ela decidisse fugir.
Ela fechou a porta atrás de si.
E eu deveria ter pedido para deixá-la aberta.
Mas não pedi.
E essa foi minha primeira queda naquele dia.
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(cliffhanger: porta fechada, atmosfera carregada, tensão proibida prestes a explodir)