Capítulo 13 — O Nome da Oitava Voz

792 Words
Não era um nome no sentido humano. Era um eco. Um som anterior à linguagem. Antes do fogo. Antes do tempo. Era a frequência nula. Nyra flutuava sobre um trecho do mar que havia se tornado a Planície Morta, onde nem peixes nem a luz ousavam penetrar. O Livro Afogado, invisível, havia se fundido completamente à sua carne, e ela agora irradiava o poder do vazio. Elian a observava, inquieto, da borda da Cidade de Correntes. O pulso da Ponte Viva estava errático. Ele era o equilíbrio e ela era a dissolução. Desde que emergira com o Livro, Nyra não era mais a mesma. Sua voz, antes um sussurro de amor, tinha o peso do ferro em brasa. Seu silêncio, antes um convite, tinha forma de mármore. E ao redor do seu corpo, o sal se erguia como espinhos invisíveis, repelindo a água e a vida, uma Aura de Não-Ser. — Diz o nome — pediu Elian, uma noite, no centro da nova cidade. Ele precisava nomear o inimigo para contê-lo. Ela hesitou, sentindo a palavra moldar sua língua, um som que rasgava o tecido da realidade. E então falou: — Yhsa. A palavra se espalhou como uma rachadura na superfície do oceano. Não foi um som, mas uma desorganização estrutural. O ciclo foi quebrado. Peixes mortos emergiram em uma vasta mancha escura. Corais se apagaram, transformando-se em cinzas brancas. E as Guardiãs — Saphiel, Mharza e Inyr — se curvaram, involuntariamente, com dor na alma. — Você não devia ter dito isso — sussurrou Inyr, olhos cheios de espuma. — O silêncio era o selo! — Mas já foi dito — respondeu Nyra, e o sorriso que se formou em seus lábios não era dela. Era o sorriso da Oitava Voz. Yhsa. A oitava voz. A voz enterrada. A que fora silenciada pelas outras sete para que a criação pudesse existir. Aquela que cantava o fim da origem e o início do esquecimento. A palavra era um portal. Os Sonhos do Vazio Nyra começou a sonhar com ela, com Yhsa, a Mãe da Destruição. Nos sonhos, Yhsa era uma mulher sem olhos, feita de ossos molhados e véus de algas que se moviam em contradição às correntes. Ela caminhava por praias onde o tempo não tocava. Ela dizia: — O mar não pertence a ninguém. Ele é apenas o rastro do meu lamento. — O trono foi tomado, não concedido. A Ponte Viva é uma usurpação do meu direito ao Vazio. — E tu, filha da sombra, és minha ponte de volta. Teu amor por ele é a rachadura perfeita. Nyra acordava com sangue nas mãos. Não era sangue Aquático azul; era denso, n***o, o sangue da própria sombra. A Contraofensiva de Elian Elian tentou interceder. A ameaça era existencial. Reuniu as Guardiãs, que agora m*l conseguiam manter a forma. Fez oferendas às Correntes de Ligação, tentando reforçar as pontes que ele havia criado. Cantou as canções sagradas, o Hino da Unidade, mas a canção dele soava fraca, desafinada pela nota de Yhsa que Nyra carregava. Mas o nome já havia sido dito. O selo estava desfeito. O mar começou a sussurrá-lo nas marés. Crianças de Sal repetiam-no sem entender, e o poder delas se multiplicava de forma caótica. Alguns humanos enlouqueciam ao ouvi-lo em conchas fechadas. — Ela está voltando — disse Mharza, a vidente, cujos olhos agora viam apenas a escuridão. — Ela nunca se foi — corrigiu Saphiel, a mais sábia, compreendendo que Yhsa era a própria tendência do universo ao retorno. Na cidade de correntes, fissuras de silêncio começaram a aparecer nas colunas do templo. O trono de Elian chorava gotas negras, o resíduo do Sal-Primário que ele não conseguia mais purificar. E Nyra… Ela sorria. Mas era um sorriso que não era dela, e sim a promessa de um abismo. O Olho Fechado Uma tarde, Nyra desapareceu. Ela não nadou. Ela se dissolveu na Aura de Não-Ser que a cercava. Deixou apenas uma marca: um símbolo gravado com sangue n***o na pedra da f***a que agora era o portal entre a terra e o trono. Era um olho. Fechado. Elian chegou à marca. Sentiu a frieza do Livro e o calor do sangue misturados. — Ela foi despertá-la — disse Elian, sua voz-coro rachando em duas frequências diferentes. — Ela vai abrir a última ponte. A ponte entre o que é e o que não será. As Guardiãs entenderam o código da Sombra. O Olho Fechado significava que Yhsa não veria o mundo, apenas o consumiria. E todos souberam: A oitava voz não viria de um portal distante. Ela já estava vindo através de Nyra. A Fundadora se tornaria a Matriz do Fim. O confronto seria direto, e a própria essência de Elian estava em risco.
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