Capítulo 1

972 Words
RENAN/BRUTOS Me chamam de Brutos. Meu nome de batismo é Renan, mas se tu falar isso aqui no morro, n**o nem sabe quem é. Aqui, é Brutos. E ponto. Porque é isso que eu sou, mermão: brutão mesmo. Frio. Reto. Sem paciência pra gracinha. Branco, loiro, alto, forte, cheio de tatuagem que carrega história. 32 na cara e aquela cara fechada de poucos amigos. Sou o terror quando tem que ser. Resolvo o que os outros só comentam. Sou a voz depois do silêncio. A pancada antes do perdão. Tá ligado? O morro me respeita. E se não respeitar, aprende na marra. Quando eu desço o beco com a cara fechada, n**o já sabe: deu r**m pra alguém. E aqui no morro, prazo é sagrado. Passou, cobro no vapo: bala ou porrada. O que vier primeiro. Coração mesmo, só tem pra minha coroa. Pro resto é só cobrança e respeito. O morro desperta cedo. Mas eu acordo antes. Cinco e meia da matina eu já tô de pé. Camisa no ombro, cigarro pendurado na boca e o rádio rolando aquele sambinha antigo que minha véia ama. Dona Maria. Minha rainha. Meu mundo. Minha fraqueza. — Bom dia, meu filho. — Bom dia, coroa. Vai querer um cafezinho? — E tu vai fazer? — Ué, tá achando que eu só sirvo pra dar pipoco nos outros? Ela riu. A risada dela é o único som que me amolece. Minha mãe me criou sozinha. Lavando roupa pros outros, aguentando traste atrás de traste. Nunca teve sorte com homem. Só vacilão. Por isso, quando ela veio com esse papo... — Tô saindo com um cara aí... Joaquim. Gente boa. Chegou faz pouco aqui no morro... — Pô, mãe... cê já confia assim? — Não é confiança, filho. A gente só quer viver, né? Fiquei na minha. Quando ela sorri, eu fico bolado de estragar o clima. Mas por dentro… Já marquei um dez mental nesse tal de Joaquim. Se ele der mole com minha véia, cê pode anotar: eu vou ralar o peito dele do morro no vapo. --- Mais tarde, fui resolver uma parada. Dois vacilão tavam me devendo: Marquinhos e Nilo. Pegaram uma carga, rodaram, venderam... e sumiram. Achando que ia ficar por isso mesmo. Caô! Isso aqui é favela, mermão. E na favela, ninguém some. A tia de um parceiro conhece a irmã do traficante, que conhece o barraco deles. Já tinham me dado o toque que eles tavam se escondendo lá no beco do fim da linha. Subi o morro sem pressa. Barraco meio torto, telha faltando, colchão jogado no chão. Entrei sem bater. — E aí, mermão... esqueceu do pai? Os dois gelaram na hora. Marquinhos tentou se levantar devagar, já suando. Nilo? Travado. Olho arregalado. O famoso "cagado e sem papel". — Pô, Brutos... era hoje mesmo que a gente ia te procurar... — Ihhh, olha o caô... Sempre hoje, né? Coincidência braba... Puxei minha Glock da cintura na moral. Só no estilo. Nem precisava atirar. Só mostrar já deixa n**o em choque. — A grana, fi... cadê? — A gente tá com metade só, juro! — Metade não paga nem minha subida aqui, parça. Tu tem até amanhã. Senão vai ter que vender órgão. Papo reto. — Tô ligado, tô ligado... Amanhã a gente resolve, fé em Deus! Fiquei olhando nos olhos dos dois. Sem ódio. Sem pressa. Só verdade. Depois virei e parti. --- Na volta, fui descendo devagar. O morro fervia. Sol já batendo forte nas costas, criança jogando bola descalço, tiazinha gritando da janela, laje com pagode e cheiro de feijão no ar. Aí eu vi. Mano do céu... eu vi. Lá no terraço de cima, umas mina dançavam funk naquele auto falante estourado. Rindo alto, rebolando com vontade, curtindo o dia como se o mundo fosse delas. E no meio… tava ela. Parei. Dei até um passo pra trás. Sabe quando o tempo desacelera? Tipo cena de filme? Foi isso. A mina era absurda. Branquinha, olho claro, cabelão liso descendo até a b***a, corpo de boneca e cara de "nem sei fritar ovo", tá ligado? Daquelas mina que tu olha e pensa: "que que tu tá fazendo aqui, princesa?" Camisetinha colada, short jeans cavado que m*l cobria a b***a. Pernão marcado, cintura fininha. Mas o bagulho nem era só o corpo. Era a atitude. Ela dançava como se o mundo não tivesse caindo aos pedaços. Livre. Leve. Sorrindo. Rebolando. Tirando onda com as amiga. Eu ali, travado. Nem percebi que o beck já tava queimando meu dedo. Joguei longe, bolado. Ela riu de uma parada, virou o cabelo pro lado e deu uma rebolada que me fez morder o beiço. — Caralho... Falei só pra mim. Meu p*u já tava acordado na bermuda, duraço. Não tinha nem o que fazer. Aquilo ali mexeu comigo num grau que eu nem sei explicar. E aí... Ela me viu. Olhou direto, na moral. Sem desviar. Sem medo. Aí virou o rosto e continuou dançando, tipo: “Tá olhando o quê, o****o? Aqui tu não tem vez não.” E foi nessa que a parada bateu diferente. Tipo um desafio. Tipo: "tu vai ter que ralar pra me entender." Naquele segundo, eu soube. Essa mina... Ela não era qualquer uma. E mais: ela não era daqui. Não conheço. E eu conheço todo mundo. Cada barraco, cada família, cada irmã de alguém. Essa apareceu agora. Turista? Parente de alguém? Vizinha nova? Sei lá. Mas que bateu, bateu. Voltei a andar com ela martelando na mente. A risada. O gingado. A ousadia no olhar. Não sei o nome. Não sei de onde veio. Mas cê pode anotar aí: Eu vou descobrir. E quando descobrir… Vapo. PARA ME AJUDAR: COMENTE EM TODOS OS CAPÍTULOS VOTE NO BILHETE LUNAR ADICIONE NA SUA BIBLIOTECA SIGA O MEU PERFIL DREAME SIGA NO INSTA: CRISFER_AUTORA
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