Capítulo 3: Ele é o Rafael
O dia começava cedo, como sempre. Clara ajeitou a mochila de Lucas e amarrou os cadarços de Ana enquanto tentava esconder o cansaço por trás de um sorriso. Ela precisava ser o alicerce dos irmãos, mesmo quando sentia o peso do mundo sobre os ombros.
Após deixá-los na escola, correu para a faculdade. Publicidade era sua paixão, mas também sua única chance de construir um futuro melhor. Nas aulas, Clara se destacava; sua criatividade e dedicação eram notórias entre os colegas e professores. Ainda assim, equilibrar estudo, trabalho e responsabilidades familiares era um malabarismo constante.
Durante o intervalo, Clara se acomodou no canto mais silencioso da biblioteca para revisar anotações das aulas anteriores. Quando o celular vibrou na mesa, viu uma enxurrada de mensagens de Alicia, sua melhor amiga.
"CLARAAAAA!!! OLHA ISSO, AGORA!!!"
Com as mãos tremendo, Clara abriu o print anexado. Era um e-mail oficial da Crown Advertising.
"Parabéns! Você foi selecionada como uma das finalistas do nosso concurso criativo. Para celebrar, convidamos você e os demais finalistas para um jantar especial com o CEO da Crown, Rafael Monteiro, na próxima sexta-feira às 20h."
Clara piscou várias vezes, tentando absorver as palavras. CEO... Rafael? Aquela palavra e aquele nome trouxeram flashes da semana anterior, na lanchonete. O homem que havia puxado conversa com ela. Educado, elegante e, de certa forma, intrigante. Eles não trocaram nomes, mas ele viu o dela no crachá. Seria possível que fosse o mesmo Rafael?
Alicia chegou correndo, radiante e com um brilho no olhar.
— Eu sabia! Sabia que você ia arrasar nesse concurso! — disse, quase pulando de empolgação.
Clara encarou a amiga, ainda atordoada.
— Alicia... E se eu te disser que acho que já conheço esse CEO?
Alicia arregalou os olhos.
— O QUÊ? Como assim? Conhece de onde?
— Semana passada, na lanchonete. Ele estava lá. A gente conversou um pouco. — Clara hesitou, sentindo as palavras saírem mais devagar. — Eu não sabia o nome dele... mas ele viu o meu crachá me chamou pelo nome e se apresentou como Rafael. E agora estou começando a pensar que pode ser ele.
Alicia colocou a mão na boca, chocada, mas logo deixou escapar um sorriso conspirador.
— Isso é sério? Ele viu seu crachá? Isso quer dizer que ele já sabe quem você é!
Ela riu muito
— Amiga esse cara é podre de rico ele não iria naquela lanchonete por nada nessa vida, existem muitos Rafael por aí.
Clara cruzou os braços, nervosa.
— Você tem razão, não deve ser o bilionário da publicidade, mas bem que poderia ser.
Clara adorava romances e acreditava que o destino reservava um grande conto de amor para ela.
— Já estou ansiosa e insegura. E se esse CEO achar que eu não sou boa o suficiente?
Alicia balançou a cabeça com firmeza.
— Para com isso, Clara. Ele vai ver o talento que você tem. Você tem uma chance incrível nas mãos, então para de se preocupar. O mais importante agora é se preparar para o jantar.
Clara suspirou, com um misto de ansiedade e curiosidade. Ela ainda não sabia se o jantar seria um desastre ou uma oportunidade única, mas, de qualquer forma, sentia que nada seria igual depois daquela noite.
Ainda com o e-mail ecoando em sua mente, Clara terminou o dia na faculdade e correu para o trabalho na lanchonete. O turno da noite era sempre agitado, e isso a ajudava a manter a mente ocupada. Ela não queria parecer ansiosa, mas a ideia de conhecer Rafael Monteiro no jantar a deixava nervosa.
Vestiu o avental e prendeu o cabelo, enquanto a colega de turno, Mônica, comentava sobre o movimento.
— Hoje está tranquilo até agora. Mas você sabe como é, em questão de minutos tudo muda.
Clara deu um sorriso de leve, arrumando as mesas. Minutos depois, o sino da porta tilintou, anunciando a chegada de um cliente. Sem levantar os olhos, ela pegou o bloquinho e foi em direção à mesa.
— Boa noite, posso anotar seu pedido? — disse automaticamente.
Quando ergueu o olhar, o ar pareceu escapar de seus pulmões. Era ele. O homem da semana passada. Ele estava ali novamente, com aquele mesmo semblante tranquilo e postura impecável.
Rafael ergueu os olhos do cardápio e sorriu.
— Boa noite, Clara.
A forma como ele disse seu nome, de maneira tão casual e familiar, fez seu coração acelerar. Ela tentou manter a compostura.
— Ah... boa noite. Você... voltou Sr Rafael.
Ele riu de leve, fechando o cardápio.
— Parece que sua recomendação da última vez foi boa o suficiente para me trazer de volta.
Clara forçou um sorriso enquanto pegava a caneta, tentando não demonstrar seu nervosismo.
— E o que vai querer hoje?
Ele passou os olhos pela lanchonete, como se analisasse algo além do cardápio, antes de responder.
— Surpreenda-me.
Clara hesitou, mas assentiu, decidindo anotar o que sabia que era o prato mais pedido da casa. Quando estava prestes a sair, ouviu a voz dele novamente.
— Clara.
Ela se virou.
— Sim?
Ele ajeitou o relógio no pulso e olhou para ela com um sorriso discreto.
— Eu estou intrigado sobre em qual faculdade você faz seu curso de publicidade, seria na Alabama do Centro?
As palavras pairaram no ar por um momento antes de se cravarem em sua mente. O calor subiu por seu rosto. Era ele. Não havia mais dúvidas. O CEO da Crown Advertising estava sentado ali, na mesa da lanchonete.
— Eu... — Clara tentou formular uma resposta, mas sua mente parecia correr em círculos. — Oh sim.
Rafael sorriu, percebendo o impacto de sua pergunta.
— Nos vemos no jantar, Clara. Estou curioso para conhecer o que você criou para o concurso.
Ela assentiu lentamente, quase sem palavras, enquanto ele a observava por mais alguns segundos antes de pegar o celular e focar nele. Clara voltou ao balcão com as pernas tremendo e o coração acelerado.
Mônica olhou para ela, confusa.
— Clara, tá tudo bem? Você tá vermelha.
Clara balançou a cabeça, tentando processar tudo.
— Tá. Tá sim. Só... tô precisando respirar.
Enquanto preparava o pedido de Rafael, sua mente girava com possibilidades. Ele sabia quem ela era, sabia de seu crachá, mas agora parecia ainda mais interessado em conhecê-la no contexto do concurso. Clara sentia que a linha entre o profissional e o pessoal ficava cada vez mais tênue.
Entregar o prato naquela noite parecia simples, mas o que viria depois estava longe de ser previsível.
Clara caminhou até a mesa de Rafael com o prato em mãos, tentando manter a expressão neutra enquanto sua mente fervilhava de perguntas. Ele estava tão confortável ali, como se o ambiente não fosse completamente contrastante com o mundo sofisticado que ela imaginava para um CEO.
— Aqui está o seu pedido — disse, colocando o prato na mesa com cuidado.
Rafael ergueu os olhos, aquele mesmo olhar atento e curioso de antes.
— Obrigado, Clara. — Ele fez uma pausa antes de continuar, como se escolhesse as palavras. — Você parece surpresa.
Ela piscou algumas vezes, sem saber exatamente como reagir.
— Acho que só não esperava que você... fosse quem é.
Rafael riu de leve, uma risada tranquila que parecia dissipar qualquer tensão.
— Isso acontece às vezes. Mas, para ser justo, você também é mais do que aparenta.
— Mais do que aparento? — Clara franziu a testa, confusa.
— Sim. Uma garçonete dedicada, estudante de publicidade, finalista de um concurso criativo... E tudo isso, com seu nome no crachá e um sorriso que disfarça muito bem o peso que você carrega. — Ele a olhou com uma intensidade que fez Clara desviar o olhar por um momento.
Ela sentiu o calor subir ao rosto, desconfortável por estar tão exposta.
— Você tem o costume de observar tanto as pessoas?
Rafael sorriu, tomando um gole de água.
— Quando vale a pena.
O silêncio pairou por um momento, e Clara não sabia se deveria sair ou continuar ali. Mas antes que ela pudesse decidir, Rafael voltou a falar.
— Clara, estou ansioso para ver o que você criou para o concurso. Se for tão bom quanto você foi em recomendar pratos na semana passada, acho que temos algo especial.
Ela soltou uma risada nervosa.
— Não sei se a comparação é muito justa, mas... obrigada.
— É justa, sim. Criatividade está em tudo, inclusive nas pequenas coisas. — Ele olhou para o relógio e se levantou, ajeitando o paletó. — Bem, não quero ocupar mais o seu tempo aqui. Nos vemos na sexta-feira.
Clara assentiu, ainda processando tudo.
— Até lá.
Rafael deixou o pagamento na mesa e se dirigiu à porta, mas antes de sair, virou-se para olhá-la novamente, como se quisesse dizer algo mais. Por fim, apenas sorriu e foi embora.
Assim que ele desapareceu pela rua, Clara desabou no balcão, soltando o ar que nem percebera estar prendendo. Mônica veio correndo até ela, curiosa.
— Tá me dizendo que esse cara era o tal CEO bilionário que você vai encontrar no jantar?
Clara assentiu lentamente, ainda zonza.
— Era ele. Rafael Monteiro.
— Meu Deus, Clara! E ele veio aqui de novo! Acho que ele gostou mais do que só do prato, hein?
— Para, Mônica. Não é nada disso. Ele só... é atencioso. — Mesmo enquanto dizia isso, Clara não podia ignorar o brilho nos olhos dele e o tom curioso de sua voz.
Enquanto terminava o turno naquela noite, uma pergunta não deixava sua mente: por que Rafael voltou à lanchonete? Afinal, ele já sabia quem ela era. E, mais importante, o que ele realmente esperava encontrar naquele jantar?