Capítulo 05

1262 Words
Felipe narrando Depois de uma longa noite, enfim amanheceu. Ali eu vi de verdade o sol nascer quadrado, com uma pequena claridade entrando pelo buraco daquela chapa de ferro. Bateram na chapa, mas dessa vez era a SOE, eles são os responsáveis pela transferência dos presos. Foram lá me buscar, para me levar pro presídio de Benfica, que funciona como uma triagem pra ver pra qual presídio cada um vai cumprir a sua pena. — Bora vagabundagem, mãos pra trás e cabeça baixa. Algemaram eu e o maluco(22) juntos. p***a, aquela viatura deles cabem 6, mas devia ter uns 15. Eles passaram em outras delegacias antes pra levar geral de uma vez só pra Benfica. Imagina 15 onde deveria ter 6, um jogado por cima do outro igual merda, tudo fechado e sem respiração direito. E eles aceleram aquela p***a de s*******m, quanto mais rápido pior fica pra quem tá lá trás, cada quebra mola que eles pulavam era uma cabeçada naquele teto de ferro. Um caindo por cima do outro em cada curva que aquele mandado fazia na estrada. Ficamos cerca de uns 40 minutos nessa viagem, que parecia que não ia chegar. Nunca pensei que fosse querer chegar logo em um presídio, só pra sair de dentro daquele carro, cada vez ia piorando mais. E esses mandados do SOE botavam o terror, quem não respondia correto o CPF e RG eles metiam a porrada, acho nunca falei meu CPF tão rápido. Enfim abriram aquele carro, confesso que quando olhei pra fora me assustei. Aqueles muros enormes, com aquelas cercas elétricas em cima. p***a eu só via aquilo assistindo Prison Break e nos filmes. Olhei e vi aquele nome escrito com letras enormes (Presídio José Frederico Marques) que nós conhece como Benfica. Aqueles muros são da altura de um prédio, um presídio com vários andares. Cheio de canas de fuzil e de 12, ali acabou todo o meu pensamento de tentar fugir, realmente não dava pra tentar nada. — Bora vagabundagem, desce todo mundo. Tá todo mundo com cara de assustado agora né? Mas quando estavam fazendo merda tava gostosinho né? Fica tranquilo geral que isso aqui é só o começo. Eu cheio de ódio por dentro, mas não podia falar nada. Estavam algemados de 2 em 2, e mandaram ir entrando de 2 em 2. Fomos pra uma sala de revista, tiraram as algemas e mandaram geral ficar pelado e agachar 3 vezes para revistar. p***a não acreditei que estava passando por aquilo, o ódio só ia aumentando. Depois da revista, mandaram vestir as roupas novamente. A mesma roupa que tinha vindo de SP, só tinha aquela né. Foram chamando cada um pelo nome pra fazer como se fosse uma ficha, mostrar onde tinha tatuagem, ou se tinha alguma doença. Me deram uma vacina lá que diziam ser pra gripe, que me deixou gripado uns 3 dias. Daqui a pouco o cana grita. — Felipe você vai pra Cela 7, e os outros aguardam aí. Fui subindo aquelas escadas assustado, nunca tinha visto nada parecido, e cada andar eu ia passando por outras celas, e os presos nas grades tudo me olhando passar. Do lado de fora já deu pra ver que estava lotado. Parei em frente ao número 7, ouvi quando gritaram “água no feijão” mas não tinha entendido até então, o desipe abriu a grade e disse de deboche: — Bem vindo ao inferno. Porra, literalmente aquilo lá é um inferno. Pensa em um quadrado gigante, só que ao invés de ter paredes, tem grades nos 4 lados. E cada cela era uma colada na outra. Mano tinha uns 150 ali dentro, em um lugar que só suportaria 34, eu contei e só tinham 34 comarcas. Comarca é como os presos chamam a cama, só tinham 34 camas e 150 presos na cela. Cheguei assustadão, réu primário sem conhecer nada de cadeia. Uma rapaziada veio falar comigo, me dar os boas vindas, se é que pode chamar de boa vinda aquele lugar. Um cheiro muito forte de coisa suja, cheiro de merda misturado com cheiro de cecê dos caras que já estavam lá a dias com a mesma roupa. Uma podridão total, lugar precário. Lotado de ratazanas gigantes e de percevejos. Estava morrendo de fome, a última coisa que comi tinha sido o xtudo que a Beatriz levou pra mim lá na delegacia. A rapaziada da cela arrumou uma brilhosa pra mim, aquela embalagem de alumínio horrível. p***a, quando eu abri aquilo, já subiu o cheiro de podre. Um fígado verde babando, parecia que tinha ficado no sol antes de levarem pra lá. E não tinha garfo, colher, nada. Tinha que dobrar a tampa da brilhosa pra fazer de colher. Fui direto na lixeira jogar aquele fígado podre fora, eu já não gosto de fígado nem em casa, imagina podre de cadeia, nunca que eu ia comer aquela merda. A minha ideia era comer pelo menos o arroz e o feijão, quando eu coloquei aquilo na boca eu quase vomitei, o arroz tão duro que parecia que jogaram direto do pacote pra brilhosa. A rapaziada até brincou — Esse arroz tem que comer e beber água junto, pra ele cozinhar no estômago. Puta que pariu, eu não estava acreditando que aquilo estava acontecendo comigo. Peguei e joguei aquela brilhosa no lixo, não consegui comer aquilo de jeito nenhum. Eles fazem a comida de s*******m, da pior forma possível. Sentei lá no canto de uma comarca, e um maluco me chamou. Olhei e o cara tava em uma cadeira de rodas com as duas pernas engessadas. Achei aquilo estranho, mas não tinha ninguém pra conversar. — Chega aí novato, senta aqui. Bora trocar um papo Quem chamou foi o Ivan (vulgo Paulista). Um cara que já tinha sido preso várias outras vezes, por vários anos direto. Então já tinha uma experiência naquela situação. — Tu rodou no que? Pela cara de assustado tu é primário. Meu nome é Ivan, mas pode me chamar de Paulista. — Rodei no tráfico irmão, tava atravessando uns quilos pros amigos, os federal me pegou vindo de SP. E tu? Rodou no que? — p***a, tu é primário. Esse seu trafico aí é suave. Quilo fechado é mais fácil de sair do que droga endolada. Fica de boa. — Tomara irmão, se Deus quiser. Mas tu rodou no que? — p***a irmão, já rodei por tráfico, 157. Mas nessa agora tu vai até rir.. Rodei na Maria da Penha. Briguei com a mulher na sacada do prédio, e ela com raiva me empurrou lá de cima. Quebrei as duas pernas e agora to aqui, preso e na cadeira de rodas ainda. — c*****o irmão, que p**a. Essa mulher te fudeu em. Rodei vindo de SP, e logo um paulista me recebe na cadeia aqui no Rio, a vida é bagulho doido mesmo. — Papo reto irmão, daora falar contigo. Tá firmeza, qualquer bagulho to aqui pra te ajudar. Só a comida aqui que é uma merda, tu já deve ter percebido, mas é o que tem né. Achei engraçado aquelas gírias de paulistas “daora” e “firmeza”, mas até que achei ele maneiro. Fui no banheiro da uma mijada, p***a e eu pensava que banheiro de bar que fedia. Que cheiro insuportável mano, cheiro de mijo e de merda juntos, um banheiro super nojento. Na verdade nem é um banheiro, é um buraco do tamanho de uma laranja no chão, pra mijar e cagar ali abaixado. Mijei o mais rápido possível lá no buraco e meti o pé.
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