Melanie
Hoje o dia foi completamente perfeito e inutilmente normal como em todos os outros dias. Como toda pessoa normal de 20 anos, acordei bem cedo para ir à faculdade e assim eu fiz após tomar apenas um breve café acompanhada de meus pais. Já na faculdade encontrei Susan na entrada, ela era minha amiga desde sempre e fazíamos quase tudo juntas, até as mesmas aulas tínhamos, um pretexto pra passar mais tempo juntas. As aulas foram normais, nada de muito extravagante aconteceu. Os mesmos professores, as mesmas aulas... Tudo completamente igual.
Ao final do quinto período, quando o último sinal finalmente tocou, somos as primeiras alunas a sair da sala de aula e logo da escola. O carro do pai de Susan, o senhor Vasconcelos, já estava parado em frente ao portão, o que nos fez correr direto pra ele. Entramos no carro e, após cumprimentar o senhor Vasconcelos começamos uma longa conversa sobre meninos, escola e a festa que iria acontecer em algumas semanas na faculdade para dar as boas vindas dos veteranos aos novatos, nem nos demos por conta que já havíamos chegado no shopping quando o carro parou em frente ao mesmo. Agradecemos a carona e saímos do carro, entrando no shopping.
Fomos direto para a praça de alimentação, comendo um lanche por lá e depois seguimos andando por horas intermináveis olhando cada uma das vitrines de cada uma das lojas de todos os andares do lugar. Quando as 18 horas se aproximava, me despedi de Susan e fui para a minha casa, ao chegar na mesma logo encontro meus pais na sala conversando, coisa que param de fazer ao perceber minha presença no local.
- Oi pai, oi mãe - falo ao entrar, indo até eles e sentando no sofá em que os dois estavam sentados.
- Olá querida, como foi o dia? - pergunta minha mãe logo que o faço.
- Foi legal. Qual o assunto? - pergunto olhando de um para o outro, meu pai é quem me responde.
- Haverá um jantar hoje e eu queria que sua mãe e você fossem junto - fala e não deixo de ficar impressionada, ele sempre ia sozinho aos jantares de negócio. Ele percebe minha cara de espanto e completa. - Não é um jantar de negócios, é mais pra juntar as famílias de alguns acionistas mais importantes.
- E nós vamos também? - pergunto enfim, ainda estranhando um pouco tudo aquilo.
- Claro, se você é sua mãe quiserem..
- Queremos sim - fala mamãe contendo empolgação na voz. Ela sempre teve curiosidade em saber como eram os tais jantares de negócio que papai tanto ia e a olho concordando fazendo a mesma dar um sorriso de leve.
- Ótimo. O jantar é as 20 horas - meu pai fala e apenas sinto minha mãe me puxando fazendo levantar, saímos rumo ao quarto para podermos nos arrumar juntas e poupar tempo, se é que isso é possível.
Faltava pouco tempo para as 20 horas e já estávamos chegando em frente ao restaurante no qual iríamos jantar. Saímos do carro e acompanhei meus pais sempre um passo atrás dos mesmos, até o lado de dentro, onde um homem nos recebeu nos levando ate uma mesa na qual já se encontrava um homem sentado. Ele estava de costas pra nós, então a única coisa que podia ver do mesmo era o cabelo loiro e os ombros largos que estavam cobertos completamente por um terno preto. O garçom que nos acompanhava parou na mesa, provavelmente comunicando nossa chegada, e ele se levanta, virando-se em nossa direção, sorrindo levemente e... que sorriso! Cheguei a ficar com falta de ar. Seu rosto era bonito, não parecia tão jovem, mas com toda certeza não era tão velho. Seus cabelos e barba levemente por fazer lhe davam um ar de jovialidade.
Vejo ele cumprimentar meu pai, que logo aponta pra mim e minha mãe, nos apresentando a ele que nos cumprimenta educado e até um pouco formal. Sorri de leve quando me cumprimentou e me sentei assim que a cadeira pra mim foi puxada, agradecendo por isso também. Meu pai e seu amigo, que só agora descobri se chamar Daniel, começam a conversar sobre algo que deve ser relacionado ao trabalho, só sei que tem a ver com números e nomes...
Suspiro e vejo o garçom se aproximar, fizemos os pedidos e ele se foi novamente. Me ajeitei na cadeira e comecei a mexer em uma mecha de cabelo a enrolando no dedo distraidamente. De repente ouço a conversa na mesa cessar, sinto olhos sobre mim me fazendo erguer o olhar, percebo que todos estão me olhando. Olho para meu pai com a dúvida de qual era a pergunta este acaba por não entender como sempre... olho para minha mãe pelo canto de olho e então para Daniel, o amigo do papai, que está sentado à minha frente também me olhando, tento entender o motivo de tanta atenção, não dá.
- Então... Melanie - ouço a voz rouca de Daniel, ele deve ter me perguntado algo que não ouvi. Faço cara de desentendida, ele sorri e repete o que me parece ser a pergunta que fez anteriormente. - Seu pai me disse que estava cursando a faculdade, em que área irá se formar?
O ouço e nem preciso pensar muito para o responder. Arrumo minha postura na cadeira e o olhando nos olhos o respondo com um sorriso nos lábios,
- Estou cursando arquitetura. Desde muito pequena já sabia o que queria fazer e quando a escola acabou, acho que era a mais ansiosa para ir a faculdade.
Sinto os olhos da minha mãe sobre mim e percebo um sorriso em seus lábios, percebo que eu e Daniel estávamos nos encarando. O que? Para tudo, não! Desvio o olhar para os talheres que estava na mesa ficando levemente ruborizada. Vejo o garçom trazer a comida e me concentro em meu prato. O que eu tô fazendo encarando as pessoas de novo? Odeio quando isso acontece!!
Quando o jantar acaba e todos já estão satisfeitos, vejo que Daniel paga a conta, provavelmente pra ser educado ou ele tenha convidado e por isso se achou no dever de pagar, todos nós levantamos, andando juntos até a porta de saída do estabelecimento. Já do lado de fora paramos todos quase que lado a lado. Meu pai ainda fala alguma coisa com seu amigo em tom baixo, provavelmente pra ninguém ouvir, eu os observava. Logo um carro parou em frente à onde estávamos e dois homens altos saíram dele, Daniel os olha parando assim a conversa. Ele olha pra meu pai que assente e então pra mim, não entendo o porquê disso até ele vir até onde eu estava.
- Você vem comigo - ele fala já pegando em meu braço e eu o olho ainda sem entender, ele puxa de leve meu braço fazendo com que eu dê um passo para a frente, olho para meu pai que não se move.
- Senhor desculpa, mas acho que ocorre um engano.. Meu pai tem um carro, logo ele vai chegar e então iremos pra casa... - falava para ele alternando o olhar dele para meu pai ainda confusa com o que estava acontecendo ali.
- Não é pra sua casa que vamos Melanie - ele fala em tom calmo, bem natural. - Você vem comigo, és minha agora.
Um ponto de interrogação com certeza devia estar estampado bem no meio da minha cara. Ouvi a voz da minha mãe em algum protesto que parecia não ser ouvido por ninguém além de mim, mas não conseguia desviar o olhar. O que ele estava fazendo? Por que meu pai não falava nada?
- Eu não vou com você, tá bom? Agora me solta, quero ir pra minha casa - puxo meu braço ao falar, mas ele o segura com mais força, olho para meu pai. - Pai, faz alguma coisa - ele não se mexe. Vejo minha mãe vir até onde nos encontramos.
- Solte-a... Solte-a e todos saem bem ou então... Ou então eu vou gritar, chamarei a polícia - fala ela e vejo ele rir. - Dúvida?
- Você não vai fazer isso - ele fala e ela faz menção de gritar, mas então um dos caras altos, aqueles que saíram do carro, vai pra trás dela e a segura, vejo ele pondo um pano ou algo do tipo sobre a boca dela quando a mesma começa a se debater e tentar gritar. Sinto braços me segurando e vejo minha mãe ficar mole, seu corpo já não a sustenta mais e ela quase cai no chão se não pelos braços de meu pai, que a seguram. Tento ir até ela, um grito está entalado na garganta, mas então ouço a voz baixa, calma e rouca de Daniel em meu ouvido, sua voz me fazia sentir um arrepio involuntário que percorria todo o meu corpo. - Ela está bem, mas não vai ficar se você me desobedecer e tentar fugir.
- O que? Me deixa ir, a minha mãe... - minha voz era de um tom embargado pelas lágrimas que rolavam pelo meu rosto.
- É melhor você ir, se quiser o bem dela e o meu - ouço meu pai falar, é a primeira coisa que fala. Ele pega no colo e se afasta. Isso é um sonho, só pode ser um sonho. Estava perplexa com o que estava acontecendo ali na minha frente e confusa.
- Pai... - tentei falar algo, mas minha voz não saía e já não conseguia enxergar direito, pois tudo estava embaçado por conta das lágrimas.
- Vem logo - o aperto ao redor de mim fica mais forte e sou arrastada até o carro. Cadê as pessoas desse mundo que não vêem o que está acontecendo aqui? Eu estou sendo sequestrada?!
A porta é aberta e sou jogada contra o banco, olho pra fora pela janela, tento sair e bater nas janelas, mas os dois homens entram no carro, um de cada lado meu. Olhava para eles assustada enquanto as portas foram trancadas. O que estava acontecendo? Pra onde estava indo? Por que meu pai não havia feito nada? Não conseguia parar de pensar nisso. O que achavam que estavam fazendo comigo?