Ela estava deitada na cama, coberta de sangue...O que mais me aterrorizou foi que seus órgãos estavam para fora, sua barriga aberta...O pescoço com um corte relaxado, como se uma tesoura cega fosse passada ali. Eu gelei, lágrimas desciam descontroladamente, saí correndo e fui até o quarto do meu irmão...Entrei lá, e outra cena horripilante...Seu corpo estava sentado na cama, com as costas apoiadas na cabeceira e logo a frente, a cabeça dele.
Meu coração parecia que ia sair pela boca, então saí correndo, e quando estava fora da casa, me ajoelhei e comecei a gritar e chorar ao mesmo tempo. Em segundos, todos da rua estavam parados em frente à minha casa, uma mulher me abraçou, enquanto alguns vizinhos saíam de dentro da casa, perplexos e um deles falava ao telefone...Estava chamando a polícia e ambulância.
A cena de minha mãe e meu irmão não saía da minha mente, aquilo me perturbará para sempre...
— No hospital —
Estou aqui, numa sala grande e branca...Sozinha, com apenas minha mochila com alguns pertences meus...Aquela cena ainda rondava meus pensamentos, eu nunca irei conseguir dormir sem ter pesadelo com aquilo.
Um homem de terno e uma mulher com vestido simples, cabelo totalmente preso e uma sandália de feira entram em meu quarto.
Policial: Olá, sou David...E essa é a Amélia.
— Eles me cumprimentaram com apertos de mão e se sentaram em cadeiras que ficavam em frente à minha maca, mas eu não disse nada —
Policial: Seu nome é Alice? Alice Watters?
— Assenti —
Policial: Pode me dizer, qual foi a última coisa que fez antes do acontecido?
— Continuei calada, fitando o chão —
Policial: ...Isso vai ajudar bastante, você tem que falar...Vamos prender quem fez isso com sua família.
Eu: f**a-se minha família. — Eu disse fria. —
— Amélia regalou os olhos, surpresa...Enquanto o Policial anotou alguma coisa, também surpreso —
Policial: Por favor, nos diga...O que aconteceu antes do ocorrido.
Eu: Meu irmão, ele...ele...Abusou....de mim. Minha mãe me bateu e eu fui até a casa do meu amigo...E depois, eu dormi...E acordei em minha casa, a porta estava arrombada, a casa revirada, e minha mãe e meu irmão daquele jeito, depois, eu corri pra fora e gritei.
Policial: Você escutou algum barulho, em sua casa?
— Assenti em sinal negativo —
Eu: Não escutei barulho e nem sei quem me levou de volta pra casa.
Policial: Muito bem...— ele terminou de anotar — E como era o comportamento de seu irmão e mãe?
Eu: Meu irmão era como qualquer outro garoto, chato e encrenqueiro...Minha mãe era agressiva e ignorante.
Policial: Entendi...Enquanto a seu amigo, qual o nome dele?
Eu: Rafael...só sei isso.
Policial: Sabe o endereço da casa dele?!
Eu: Não. Mas sei onde fica.
Policial: Você pode nos levar lá?
Eu: Sim.
— O policial se virou pra mulher —
Mulher: Depois que saímos de lá, vamos encaminhá-la para o lugar combinado.
Eu: Que lugar? — interrompi —
Policial: Depois ela irá te explicar.
— Eles se retiraram e antes que pudessem fechar a porta, o homem pediu para que eu banhasse e me trocasse...que todas as coisas que eu iria precisar estavam na mochila. Então eu obedeci, tomei um banho gelado e rápido, me vesti, peguei minha mochila e saí, eles estavam lá, menos a mulher. Seguimos para uma viatura e os guiei até a casa do Rafael. Chegando lá, subimos e o policial tocou na porta, a mãe dele atendeu...Quando me viu, sorriu e nos convidou para entrar. Eu fui a primeira, vi Rafael saindo do quarto e corri para abraçá-lo —
Policial: Senhora, precisamos conversar...
Andrea: Tudo bem, vamos até a cozinha.
— Eles seguiram e eu fiquei na sala com o Rafael —
Rafael: O que aconteceu?
— Contei tudo a ele, que fez uma cara extremamente estranha e de espanto —
Eu: Agora eu não sei para onde vou.
Rafael: Você tem herança, quando fizer 18 anos, poderá pagá-la e viver sua vida, fazer faculdade, ter carro e seguir em frente.
Eu: Não quero...Eu não tenho família, Rafael !
Rafael: Você tem a mim...Sempre terá! Vou pedir para que minha mãe te adote.
Eu: Aqueles policiais não irão deixar.
Rafael: Como você sabe?!
Eu: Não sei...
Rafael: Sempre irei te visitar.
Eu: Jura?
Rafael: Quem jura mente. Eu prometo.
— Sorri e o abracei —
Eu: Pede pra sua mãe perguntar pra eles para onde vou...Tudo bem?
Rafael: Tudo.
Eu: Obrigada.
Rafael: Por nada... Ally...
Eu: Me chame de Ice. — Interrompi —
Rafael: Ice? — arqueou a sobrancelha —
Eu: Meu pai era o único que eu deixava me chamar assim... Foi quem eu mais amei em toda minha vida. E prometi a mim mesma, que só quem eu realmente amasse, iria deixar me chamar por esse apelido.
Rafael: Ai meu Deus...Eu também te...
— Antes que ele terminasse a frase que eu mais queria que ele dissesse, os policiais aparecem e interrompem tudo, me chamando pra irmos. Senti um frio na barriga e vontade de chorar...Me levantei e Rafael fez o mesmo logo em seguida. O abracei forte, e ele retribuiu. Saí de lá chorando e voltamos para a viatura. Perguntei para onde iríamos, mas o policial evitou me responder. Depois de longos minutos enjoativos, chegamos em uma espécie de hospital ou sei lá, achei que eles iriam me internar, se não tivesse visto uma placa em frente ao portão, com grandes letras brancas escritas: ´´ Adoção ´´, só essa palavra, fez minha vida inteira passar diante dos meus olhos...Isso era a última coisa que eu nunca imaginei que iria acontecer, parar numa adoção, com meus pais e meu irmão mortos, sem eu ter para onde ir, e não ter parentes que pudessem tomar minha guarda. De hoje em diante, serei mais uma criança abandonada, sem ninguém...Além do Rafael. —
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Entramos lá, o lugar era maior do que eu imaginava, tinha um gramado longo e espaçoso, com crianças correndo a alguns metros de distância, rindo. Chegamos até a entrada do orfanato, o Hall era realmente enorme, como de uma mansão. Tinha várias escadas, portas, crianças indo e vindo, e aquela mulher do hospital estava lá no meio, se destacando entre aqueles pequenos seres sem família que se vestiam de branco. Ela sorriu, seu sorriso era exageradamente branco, que formavam covinhas em suas bochechas carnudas e avermelhadas.
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Ela: Olá, Alice. Eu sou Amélia, e serei sua monitora...Seja bem-vinda, á seu novo lar.